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cias. Se assim fosse estaria o meu collega plenamente justificado aos olhos mesmo do nobre orador, visto que o nobre orador com igual rasão se justificou. Mas se assim fosse tambem a condição teria sido expressa no contrato, como cousa forçosamente derivada d'essa necessidade e d'essas circumstancias, do mesmo modo e pelo mesmo motivo que se deu com s. ex.ª quando contratou sob o imperio de taes circumstancias e necessidade (apoiados).

Nunca de certo aconselharei, nunca sustentarei que faltem os governos á palavra dada. Se a palavra obriga o homem, muito mais obriga a entidade moral chamada governo, que não falla só em seu nome. Forçoso porém é distinguir entre promessa e expectativa. Não seria decoroso illudir ninguem. Não concorreria eu para tal; mas onde as obrigações differentes rigorosamente procedem da diversidade intrinseca dos actos, não ha possibilidade de illusões, e se a houvesse os interessados saberiam acautela-la.

Pondera s. ex.ª, insistindo nas circumstancias que o obrigaram: «que o seu contrato foi celebrado ad referendum.» Não negarei nem impugnarei o valor das circumstancias allegadas. Não é esse o meu fito. Não desejo entrar no campo esteril das reconvenções que nada adiantam. Posto que a habilidade do negociador esteja em escolher as melhores circumstancias, se o póde fazer, reconheço que nem sempre se dá essa possibilidade diante de instancias de ordem superior, e ahi vejo um justo motivo de absolvição.

Pondo pois de parte as circumstancias que levaram s. ex.ª a celebrar tal contrato, e considerando unicamente as suas condições ad referendum, seja me licito observar que entre ellas figurava uma de qualidade necessariamente definitiva. Refiro-me ás 43:000 libras, quasi 200:000$000 réis, que s. ex.ª confessou haver logo saccado. Um Baque ad referendum! Mal sei como se poderá comprehender. Quem respondia por esta somma? S. ex.ª pessoalmente? E como respondia? Effectuado o saque não ficava logo inevitavel e forçada essa condição? E note-se que não havia opção, nem possibilidade de have-la. Era um acto consumado, era um encargo a que já se não podia fugir. Explicou o nobre -orador que a somma saccada era apenas um pagamento por conta de divida muito maior. Não o impugno, e acredito que assim fosse. Mas estava essa divida competentemente liquidada e devidamente legalisada? Havendo-se suscitado duvidas, questões — as mil difficuldades a que s. ex.ª se referiu —; questões e duvidas que deram logar a communicações e impressos que li, e com as quaes podéra por muito tempo entreter a camara e o publico; duvidas e questões que tanto se complicaram e tamanho rebate deram á opinião; era o governo o unico juiz e arbitro de taes contendas e d'aquella liquidação? Sem entrar mais na analyse d'estas particularidades, provando com isto o desejo sincero de não resuscitar um pleito findo apesar de chamado a isso pelo convite formal de s. ex.ª; sem entrar mais no exame d'estas particulares, basta o exposto para se concluir que a ponderação de ter sido feito aquelle contrato ad referendum, não colhe inteiramente, pois que uma parte d'elle, e parte essencial, era necessariamente obrigatoria, e como tal influia no resto.

Suppõe tambem s. ex.ª, e isso principalmente determina as suas censuras, que a preferencia actual, a preferencia não estipulada, prejudica os capitães nacionaes. Dada a igualdade de circumstancias o supposto prejuizo desappareceu; e a preferencia refere-se a igualdade de circumstancias. Mas s. ex.ª refutou a sua propria objecção, refutou-a do modo mais concludente, reconhecendo, como não podia deixar de reconhecer com a sua alta illustração e lição copiosa d'estes assumptos, reconhecendo e declarando — que os capitães não têem patria, são cosmopolitas, não passam de um instrumento. O capital nacionalisa-se com a applicação que recebe, nem tem outro cunho de nacionalidade. Nacionaes são, podem ser os seus possuidores. Por desgraça os possuidores nacionaes de fundos nem sempre mereceram, como hoje, os affectos e predilecções de s. ex.ª, predilecções que eu compartilho com o nobre orador, mas que applico por modo diverso. O beneficio de 1 1/2 por cento eventual, concedido em 1853 aos possuidores estrangeiros, com exclusão dos capitalistas portuguezes que tinham igualdade de direito, insurge-se contra esta recente dedicação. Justificar-se-ha s. ex.ª com as circumstancias que a isso o obrigaram; e tambem ahi o não censurarei, porque deixo as circumstancias de parte, e não entro na averiguação d'ellas, bem que a responsabilidade respectiva a alguem deva tocar. Não é todavia menos certo que se a nacionalidade dos capitães lhe deve agora grandes extremos, os seus actos como ministro não estão inteiramente de accordo com este novo sentimento.

Escuso referir-me ás propostas em que mais se tem insistido, pois que o nobre orador não póde deixar de reconhecer que foram feitas depois de celebrado o contrato. Não podia haver risco em offerecer, porque não havia obrigação de cumprir.

Argumentação temerosa — temerosa não para o governo, não para a maioria, mas para os impugnadores do gabinete e os seus amigos — me pareceu a de s. ex.ª quando se referiu ao augmento de 1/2 por cento no preço primitivo do contrato. Condemnou-a por ser uma novação! Dado que o fosse, e não concordo que o seja, seria apenas novação para mais. As d'esta ordem não são vulgares na nossa historia financeira o economica. Com que rasão se condemnaria pois uma novação para mais, quando se tem approvado e applaudido, creio que até applaudido, tantas novações para menos!

«Concordou a casa Stern Brothers na elevação do preço a 48 por cento? Acto inqualificavel! perigosa vantagem! Os banqueiros não contratam senão para ganhar. Elles que proporcionaram essa vantagem é porque esperavam lucro equivalente». E onde estão os banqueiros philantrhopicos que despejam gratuitamente as suas arcas nos cofres do estado? Onde estão as casas bancarias que querem reduzir-se á mendicidade em beneficio exclusivo d'aquelles com quem contratam? Certamente o dinheiro é mercadoria como outra qualquer. Quem n'ella commercio não é para perder. Mas esse não é attributo especial e exclusivo da casa Stern Brothers. Se é perigosa a vantagem contratada com esse banqueiro, não vedes que suscitaes iguaes apprehensões contra quaesquer outras offerecidas? Perigosa!... Perigoso, mais que tudo perigoso, é esse argumento de suspeição que por este modo se volta contra os mesmos que o empregam.

Lucrara os banqueiros, quaesquer banqueiros, com o desenvolvimento do credito? Tanto melhor para elles; mas tambem tanto melhor para o paiz. Feliz coincidencia que permitte aos argentarios o ganho, e dá á nação os meios de adquirir os instrumentos necessarios para aproveitar a sua riqueza.

Queixou-se o illustre deputado do rigor com que nos tempos a que se referiu foram julgados os seus actos. Terá rasão; mas as contas d'essa epocha poderá toma las a muitos que são hoje seus amigos politicos. Se o calumniaram sinto-o por s. ex.ª, e sinto-o por todos. Ainda mal que assim foi, é ainda mal que o sestro se não perdeu. Podia s. ex.ª errar apesar de illustrado, como têem errado os homens mais notaveis, mais esclarecidos e mais conscienciosos, porque homem é tambem, e errare humanum est. Podia errar, erraria, mas nem por isso é a calumnia menos erro, menos vicio e menos crime. Extranhar-se-ha só que tendo tanto horror á calumnia quando o offende, não a condemne igualmente quando os tiros d'ella partem do seu lado.

Ha differentes especies de calumnias: ha a calumnia de Pasquino e a calumnia de D. Bazilio; ha a calumnia das praças e a calumnia que tanto ao vivo representou um espirituoso auctor dramatico n'uma das suas mais festejadas e applaudidas composições scenicas; ha esta calumnia tambem, calumnia apurada, calumnia perfumada, calumnia segredada, calumnia elegante, calumnia polida... Polida como o aço, mas cortante como elle. Essas calumnias detesto-as a todas igualmente! (Vozes: — Muito bem.)

Detesto, e o que me dá o direito de as detestar é que não censuro umas para incitar as outras, é que não afago nenhuma d'ellas, é que tenho por todas igual tedio e repulsão. Para mim a calumnia é sempre calumnia, sejam quaes for as vestes que trajar, seja qual for a mascara de que se cobrir, sejam quaes for os disfarces em que se envolver! (Muitos apoiados.) Pouco importam as exterioridades, o acto será sempre odioso. Não sorriu affavelmente á calumnia que punge os meus adversarios, não trato, não pactuo com ella. Ou vá ferir o meu mais encarniçado inimigo, ou se dirija ao mais dilecto dos meus amigos, abomino-a do mesmo modo, proscrevo-a igualmente. É calumnia, e basta. (Vozes: — Muito bem.) Não a quero para attacar, não a quero para me defender. Não festejo o vilipendio dos contrarios para só o maldizer quando me toca!

Não sei se ha quem acompanhe o apparato da urbanidade com o recurso ás saturnaes da palavra; quem na presença do mundo componha o rosto e os modos, e no recato do gabinete recorra ás velhas tradicções, aos sarcasmos decrepitos e ás diffamações caducas. Dizem que ha. Não sei. Não o conheço, nem o sigo. Que haja; não o censuro, deploro-o. Devo até suppor que não existe, porque seria uma monstruosidade moral, porque seria um absurdo politico. Absurdo politico certamente, porque essa politica passou! (Apoiados.)

Sou filho da imprensa, e glorio-me da filiação. Com anciã desejo e espero voltar a ella. Os abusos que se fazem d'essa instituição protectora das liberdades não me induzem a perder-lhe o amor. Os que abusara desacreditam-se, mas não conseguirão desacredita-la. «A imprensa — com muito acerto o disse o orador da commissão, cuja voz crente e juvenil, sincera e eloquente, tanto applaude e estima a camara - a imprensa a si mesma se corrige.» E será esse o mais efficaz e seguro correctivo. Será uma nova regeneração, regeneração verdadeira, porque modificará os costumes politicos, e substituirá ao tumulto dos convictos a influencia dos raciocinios. Começou já. Se alguns jornaes persistem nas praticas nefandas que a opinião condemna, outros, fazendo profissão de cordura e sizudeza, elevando o encargo á altura de um sacerdocio, honrando-se a si e ao paiz, attestam que o movimento das mais escolhidas intelligencias segue outra direcção. Estes exemplos são ao mesmo tempo uma condemnação do mal e um estimulo para o bem. Estes emendarão aquelles, ou os substituirão (muitos apoiados).

Terminarei ácerca da questão do emprestimo com uma expressiva phrase do nobre orador: «ha paizes onde os fundos de 3 por cento têem maior valor, porque esses paizes têem melhor politica». É justamente a paraphrase, senão é a confirmação, da famosa maxima do barão Louis, que, se não me engano, s. ex.ª quiz impugnar; «dae-me boa politica, dar-vos-hei boas finanças». Ha com effeito paizes, mais adiantados já em prosperidade, onde os fundos de 3 por cento têem maior valor. Sobe o valor dos fundos porque a politica melhora. Aceito a confissão, quando está mais alto o preço dos fundos. Noto o commentario ás difficuldades financeiras, que s. ex.ª mencionou fallando da sua gerencia. E pelo menos singular que profira tal sentença a mesma bôca d'onde saíram estas palavras: «quando negociei achei sempre obstaculos; não se me offereciam propostas, tinha eu de solicitar contratos!» Inútil seria ir mais longe. Que poderia acrescentar? (Apoiados.)

Entremos agora n'outra parte do discurso do illustre deputado, a quem respondo. Allegou s. ex.ª que a sua exhumação do passado fôra provocada por um sympathico orador da maioria. Observarei que o orador da maioria não fez mais do que responder ao illustre deputado, meu esclarecido amigo, que encetou este debate. Se houve provocação veiu d'esse lado. Desse lado partiu o doesto «não fazeis senão cartazes»! Foi um repto formal, que logo nos impoz a mais formal obrigação.

Pouco importa averiguar quem faz cartazes. O paiz só se preoccupa das realidades que se conseguem. Isso investigarei, porque unicamente isso é util. Insinuou o nobre orador que todos os grandes commettimentos pertenceram ás administrações de que fez parte. Da primeira, sobretudo, declarou que viu realisados todos os melhoramentos que emprehendêra. Se assim fosse, o que tocaria aos outros? Façamos justiça a todos. Justiça igual, para ser justiça (apoiados). Contemos a historia inteira, enchendo as lacunas da historia mutilada.

Vejamos primeiro o capitulo das promessas. Não irei revolver os archivos da camara. Seriam ahi innumeraveis os exemplos dos projectos abortados; e á camara nem sempre póde chegar o tempo para examinar n'uma só sessão tudo o que se lhe apresenta, principalmente quando se intercallam nas uteis discussões prolongados e diffusos debates de expediente politico, como se faz agora. Não revolverei os archivos da camara, ainda que s. ex.ª teve mais desassombrada vida parlamentar. Encontrarei a mais solemne promessa n'uma lei do estado. E não em qualquer lei, senão na propria lei fundamental, n'uma disposição proposta, apresentada e approvada pela situação a que me refiro e s. ex.ª representa. Diz textualmente o artigo 13.° do acto addicional: «nos primeiros quinze dias, depois de constituida a camara dos deputados, o governo lhe apresentará o orçamento da receita e despeza do anno seguinte». Era esta no regime representativo a obrigação das obrigações. E como foi desempenhada? Falle o argumento incontestavel das datas. Em 1852 foi a camara constituida em 17 de janeiro, e o orçamento foi apresentado em 15 de março. Em 1853 constituiu-se a camara em 31 de janeiro, e o orçamento apresentado em 19 de fevereiro com data de 12. Em 1854 foi constituida a camara em 5 de janeiro, e o orçamento foi apresentado em 28 com data de 20.

E a lei do estado dizia apresentar-se-ha, e não datar-se-ha!

Aqui está como se cumpriu a mais importante promessa do governo constitucional por parte de quem a fizera e a lavrara!

E não se podia n'isto allegar o impedimento das opposições, porque ahi o desempenho dependia exclusivamente dos governos. Podem todavia as opposições ser impedimentos. Podem. Tem-no sido, e bem vimos como o foram ainda o anno passado (apoiados). Tambem não as censuro. Procedem como entendem. Têem faculdade para o fazer, mas o paiz tem igualmente a faculdade de julga-las (apoiados). Usam de um direito, mas corresponde-lhes uma responsabilidade.

Já aqui ouvi na anterior sessão dizer-se: «que a opposição não tinha responsabilidade». Ouviram todos como eu. Não aceito por honra sua similhante doutrina. Como corpo politico, a opposição exerce uma acção directa ou indirecta nos negocios publicos. Pelo que resulta de tal acção responde ella e só ella. Para que não tivesse responsabilidade era preciso que não tivesse intelligencia, que não exercesse influxo, que não estivesse sui júris. Eis o que se não póde aceitar; eis o que a propria opposição não aceitará. Pois que! Ha de a opposição impedir, estorvar, pôr obstaculos, e não ha de responder por isso? Não póde ser, não póde ser porque não deve ser. «Se vos obstamos, passae» observam-nos. A maioria passa, e responde quando passa; mas dos actos da opposição responde ella. Usa de liberdade a opposição, e esse uso tem uma responsabilidade equivalente. Estes os verdadeiros principios constitucionaes. Não comprehendo opposição sem taes principios. É a homenagem que lhe tributo (apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Continuemos a indagar o cumprimento das promessas.

O decreto de 30 de agosto de 1852 foi tambem uma solemnissima promessa. Prometteu-se applicar o fundo especial de amortisação á construcção do caminho de ferro do norte. E o fundo especial de amortisação não se applicou a esse caminho (apoiados).

Prometteu-se no discurso da corôa prover legislativamente ácerca dos cereaes e dos vinhos. E as promessas ficaram em aberto (apoiados). Prometteu-se mais abolir o commando em chefe dentro em seis mezes ou um anno, e o commando em chefe continuou.

Quantas promessas não cumpridas se poderiam mais citar. Bastaria reler á camara as sessões do mez de abril de 1856, que o nobre orador poderá ter esquecido, mas que de certo não esqueceram nem ao paiz nem aos que n'ellas tomaram parte. Não o faço, não o farei agora, porque não desejo ir alem dos limites impostos, porque o meu fim não é retaliar, mas unicamente rectificar. Não arguo, porque se não realisou tudo; faço a justiça de acreditar que todos os homens publicos desejam o bem do seu paiz levando á execução quanto lhes é possivel. Indico sómente a profunda injustiça com que procedem os mesmos que d'essa injustiça se queixam.

Celebrou igualmente o nobre orador a economia da sua gerencia. Encaremos de perto essa economia. No orçamento de 1851-1852 assignado ainda pelo ministro da fazenda, o sr. Antonio José d'Avila, a despeza era de 12:600 e tantos contos. No orçamento de 1852-1853 assignado já pelo ministro da fazenda, o sr. Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello, a despeza era de 13:500 e tantos contos, 900:000$000 réis para mais. Não é grande a economia? (apoiados).

Effectuaram-se reducções, é verdade. Effectuou-se uma reducção nos vencimentos já exiguos dos servidores do estado, impondo-lhes mais meia decima. Effectuou-se outra reducção nos juros da divida publica por meio de uma conversão, não facultativa como é de uso, mas violenta e forçada. Reducções d'estas em epochas anormaes