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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputado Candido de Moraes, que devia ter entrado na sessão de 17 do corrente a pag. 329, col. 1.º

O sr. Candido de Moraes: — Pouco tenho a dizer. Pedi a palavra unicamente, porque desejava que o sr. ministro da fazenda me désse uma explicação categorica das intenções do governo, relativamente ao estado da questão tributaria, no que esta diz respeito ás nossas ilhas adjacentes.

A minha opinião em relação a essas ilhas, e que já mais de uma vez tenho manifestado n'esta casa, é que se encontram em condições economicas inteiramente differentes das da metropole, e portanto não se póde applicar sem modificação alguma o systema tributario que se segue no continente, convindo por justificadas modificações adequa-lo ás circumstancias d'aquellas terras.

Esta opinião levantei a já quando se discutiu aqui a reforma da pauta das alfandegas, e insisto novamente sobre este ponto, porque desejo que o sr. ministro da fazenda declare qual é a fórma porque s. ex.ª deseja resolver esta questão com relação aos Açores.

S. ex.ª sabe perfeitamente que as ilhas dos Açores lutam com difficuldades que lhe provém das condições especiaes em que se encontram. Alem d'isto, s. ex.ª sabe muito bem que ha uma grande crise monetaria em algumas das ilhas os Açores, e que deve ainda ter em vista a situação politica d'aquella importante parte da monarchia, e que convem principalmente, debaixo d'este ponto de vista, attender muito ás circumstancias d'aquellas ilhas.

Eu não alargo muito as considerações que poderia fazer, porque só desejo provocar uma explicação da parte do sr. ministro da fazenda.

S. ex.ª mandou à ilha Terceira um delegado do seu ministerio, a fim de estudar as circumstancias que ali se davam para, com as informações colhidas por aquelle empregado, se habilitar a resolver como fosse de justiça, ácerca

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das reclamações feitas por parte dos povos d'aquelle districto, e ás instancias que tinham sido tambem feitas pela junta geral do mesmo, sobre o modo por que conviria proceder à repartição e cobrança dos impostos.

S. ex.ª deve hoje conhecer perfeitamente quaes são as condições que se dão n'aquelle districto, e as que se dão em todas as outras ilhas, porque eu julgo-as analogas que qualquer solução que se adopte e que convenha para uma d'ellas, não póde deixar de convir a todas as outras.

Os povos d'aquellas ilhas foram longo tempo exceptuados na applicação do systema de impostos seguidos no continente.

Em 1863 existia ali uma legislação excepcional, que eram os antigos dízimos; depois fez-se a reforma da contribuição sem grande reluctancia da parte dos povos que, já então considerando-se onerados com o imposto, mais do que era justo, attendendo, à sua capacidade tributaria, e confiados na boa fé dos que exercitam os poderes superiores do estado, aceitaram como base das novas contribuições o rendimento dos antigos dizimos. Era uma base arbitraria e que se estabelecia, attendendo à urgencia do tempo, e era promettido aos contribuintes que esta base se corrigiria com a maior promptidão possivel.

Adoptar para a distribuição do imposto uma base indubitavelmente inexacta, emquanto se trata de a substituir por outra racional e se procede para isso aos trabalhos indispensaveis, póde ter uma certa justificação na necessidade; mas é reconhecidamente injusto manter esse estado de cousas por mais tempo que o indispensavel.

De então para cá nenhumas correcções se fizeram nas matrizes, tanto na contribuição predial como nas da industrial e pessoal, concorrendo talvez para isso a instabilidade das nossas cousas politicas, e as perturbações provenientes das interrupções repetidas do systema parlamentar.

Sem as alterações indispensaveis, as matrizes originariamente defeituosas, tornaram-se monstruosas, e causas de se praticarem grandes injustiças, porque em vez de acompanharem em todas as suas diversas phases e evoluções da riqueza publica, eram apenas um indicador incorrecto do estado d'essa riqueza, alguns annos antes d'aquelle em que convinha aprecia-la. Se isto continuar assim, o mal crescerá por falta de convenientes applicações, a ponto de se tornar incuravel.

É preciso attender a isto, porque a causa efficiente de muitas grandes revoluções, são geralmente as exigencias exageradas do fisco, e muitas colonias se tem tornado independentes por não attenderem os governos ás suas reclamações contra impostos exagerados ou injustos.

Eu já outro dia disse n'esta casa, e não me refiro a isso sem uma grande magua, que começavam nos Açores a manifestar-se tendencias que não são muito para tranquillisar, nem para lisonjear o governo. É necessario fechar os olhos para não ver que se resfriam os sentimentos patrioticos dos povos açorianos, e que um mal, cujos prodromos são recentes, se vae ali enraizando mais do que convinha aos interesses portuguezes.

As tendencias que claramente se manifestam n'aquelles povos, tem uma origem fundada, não na sua amisade para com qualquer povo ser superior à que nos liga reciprocamente como portuguezes; mas na presumpção um tanto fundada de que os interesses dos Açores e Madeira não são attendidos por igual com os das provincias continentaes. Eu não tomo a responsabilidade da asserção, nem me allio a ella, mas quero que o governo e agora o sr. ministro da fazenda, principalmente, a desmintam com factos significativos.

Nós não podemos deixar de reconhecer que o resultado d'estas tendencias, quando ellas cheguem a affirmar-se mais energicamente, virá a ser uma cousa de grande desgosto para todos nós; esta doutrina que tende a desunir-nos quando mais precisâmos de união, não póde deixar de ser considerada como muito perniciosa, e convem tanto mais combate-la, quanto é certo que são extremamente simples os meios de o fazermos efficazmente.

Não poderia eu concordar com os meus patricios quando elles excedessem certos limites no modo de reclamar; mas tambem não posso deixar de reconhecer que as reclamações são justas; que os meios empregados até ao presente são indubitavelmente legaes, e que aquelles cidadãos têem todo o direito de esperar que sejam attendidos os seus justos pedidos; comtudo força é confessar que não têem sido sempre attendidos pelos poderes superiores do estado.

Desejava que se chegasse a um termo n'este caminho, que se me afigura errado e nos desvia cada vez mais do fim a que deveriamos mirar. Ainda uma vez, repito, que não pretendo proclamar os principios de um falso federalismo, mas seria tão absurdo querer sujeitar os povos do continente a um systema tributario inteiramente opposto à sua educação e aos seus habitos, sómente porque me lisonjeavam as opiniões dos açorianos, como é querer que estes adoptem o systema que convem aos continentaes, se porventura lhes convem, só para não desarranjar a harmonia do systema proposto pelo sr. Carlos Bento.

Não é possivel, ou pelo menos não é politico, sujeitar os Açores a uma imposição que reputam iniqua os seus habitantes. Já mais de uma vez tive a honra de dizer n'esta casa, e revele-me v. ex.ª que eu insista n'este ponto, que não é possivel promover as sympathias dos açorianos para os seus irmãos do continente, senão convencendo aquelles de que se faz partilha igual entre todos, de beneficios e de onus.

Sem que me mova nenhum interesse particular, eu tenho instado com o governo por mais de uma vez pelo deferimento de pretensões, que me parece não só collocariam os Açores em muito melhor situação, mas seriam tambem origem de riquezas para o paiz, porque não podem deixar de ser solidarias as diversas provincias do reino.

Estou convencido de que os meus esforços não serão baldados, e folgaria reconhecer que tinham em relação ao ponto de que particularmente me occupo na presente occasião, produzido os resultados desejados.

Que se estude por uma vez esta questão e se tome sobre ella uma resolução satisfactoria para todos é o meu desejo. Applique-se no continente o systema mais compativel com os habitos e educação do povo; proceda-se do mesmo modo em relação ás ilhas adjacentes; mas faça-se isso por uma vez e com brevidade, e não continuem os governos a prometter que hão de tomar em consideração um assumpto, que até agora pouca attenção lhe tem merecido, apesar da sua reconhecida importancia.

Resolva-se o problema considerando os seus dados; iguale-se o que for igualavel; e distinga se o que dever admittir distincção.

Lembre se o governo que a denominação — ilhas adjacentes — não faz que desappareçam as distancias que as separa do continente; e que o dador da carta não quiz aggravar aquellas ilhas com a denominação que lhe deu; foi premio de relevantes serviços o equipara-las à metropole em direitos e obrigações; a uniformidade da legislação não póde ir alem do ponto em que aquella igualdade se realisa.

O que eu não posso admittir, e tenho pena de ser obrigado a repeti-lo, é que se subordinem a uma legislação uniforme, povos que se encontram em condições differentes.

Limito aqui as minhas observações, e concluindo peço ao sr. ministro da fazenda, que declare, se entende que esta contribuição deve ter um caracter permanente em relação ao paiz e à parte d'elle, a que me tenho referido mais particularmente; que declare quaes os estudos a que tem mandado proceder, a fim de resolver de uma maneira completa a questão tributaria em relação ao paiz açoriano; quaes são as opiniões de s. ex.ª sobre o estabelecimento, ou não, de impostos exclusivos para aquelle povo, e, se s. ex.ª entende que os actuaes impostos não devem continuar, quaes as disposições que se deverão inserir na legislação, ou quaes as modificações que julga convenientes n'esta hypothese.

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