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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Como se defendeu o sr. ministro do reino? S. ex.ª defendeu a portaria de 16 de janeiro com a portaria de 3 de maio de 1873, dando como assentado, parece, que aquelles oito dias tão fallados, tão celebrados e considerados tão livres, dando como assentado, dizia eu, que a doutrina d'aquella portaria estava sanccionada pelo poder legislativo. E foi sobre esta base falsa que s. ex.ª questionou e se defendeu. E foi elogiando-se pelo seu proceder liberal que s. ex.ª arredou de si a questão da legalidade.

E necessario accentuar-se bem esta verdade: —

Não ha portarias liberaes quando contrariam actos do poder legislativo. (Apoiados.) Não, sr. presidente, não é com uma portaria que vae transtornar a divisão dos poderes, base de todos os systemas liberaes, que se ha de apresentar um principio liberal, que se não limpa a fonte envenenando a nascente.

Consentirmos que se affrontem d'este modo as prerogativas da camara não me parece digno de quem se assenta n'estas cadeiras que representam um grande favor popular mas tambem uma responsabilidade enorme. (Apoiados.)

Pois que, sr. presidente!?

E aggredido no parlamento um conselheiro da corôa, porque usou de uma portaria illegal, mostra-se claramente que esta portaria tenta revogar uma lei, e s. ex.ª vem ao seio da representação nacional e diz-nos: «O meu proceder foi liberal, e depois remissões ou substituições vem tudo a dar na mesma.»

E a maioria recebe esta affronta entre applausos e apoiados!.. Lastimo deveras aquelles applausos da camara, e se eu não tivesse muita consideração para com todos os meus collegas, que me estão escutando com tanta benevolencia e favor, e agora que fallei em consideração estimo ter occasião de dizer que tenho tambem muita por todos os cavalheiros que se assentam n'aquellas cadeiras (dirigindo se para os bancos dos ministros.)

Dizia eu, sr. presidente, que se não receiasse magoar alguem havia de pedir licença ao sr. ministro do reino para empregar tambem o meu latim e diria que os apoiados da camara á defeza do sr. ministro do reino me lembraram a phrase da Roma imperial — Ave Cesar morituri te salutant!

Até aqui, como muito bem disse o sr. D. Luiz da Camara Leme, não tinham sequencia quasi nunca os projectos da iniciativa do deputado, e só os que vinham d'aquellas cadeiras (apontando para os bancos dos ministros) é que se discutiam, ainda que muitas vezes só por amor da arte, e consinta-me o sr. ministro do reino que eu use n'este logar da sua phrase que me parece aqui mais bem cabida do que o foi no discurso de s. ex.ª E esses projectos recebiam quasi sempre a sancção legislativa e voltavam como tinham vindo porque julgados vestaes pelas maiorias, — e eu fallo agora de todas as maiorias, — quasi se não consentia que fossem emendados. Mas, sr. presidente, ao menos os projectos vinham ao parlamento, ainda que não fosse senão fingirem que se sujeitavam corajosamente á discussão e ás emendas da camara. (Apoiados.) Guardavam-se sempre as apparencias!

Agora não, agora já nem essa delicadeza se tem com o parlamento. (Apoiados.) O sr. ministro do reino legisla á vontade, revoga sua leis a seu falante e conforme lhe apraz!

S. ex.ª já nem sequer nos dá licença a nós representantes do povo que chancellemos as suas medidas!

E a maioria applaude! (Apoiados.) Rasga-se e divide-se a túnica entre os applausos dos christãos! (Apoiados.)

Sr. presidente, vejo que o sr. ministro do reino está em completa desharmonia com a opinião habilmente sustentada pelo sr. presidente do conselho.

O sr. Fontes n'um admiravel discurso pronunciado em 1873, reprovou as remissões a dinheiro, dizendo que ellas eram escandalosas e repugnantes, que traziam mercenários ao serviço do exercito.

E o grande estadista foi larga e justamente apoiado. Justamente sim, que é indigno para o estado rebaixar-se a servir de intermediario entre o substituindo e o substituto, alugar soldados, como quem angaria negros, como quem angaria escravos. (Apoiados.)

E necessario guardar intemerata a honra das nações e não lhes consentir que desçam a regatear a vida d'aquelles que as hão de defender quando apertar o perigo.

É necessario que se não diga nos boletins officiaes: tos soldados estão a tanto, um pouco mais caros, um pouco maia baratos do que o anno passado.»

Emquanto quizermos ter exercito conservemos-lhes honradas as suas fardas. (Apoiados.)

O sr. Fontes sustentou aqui esta opinião. E agora o sr. ministro do reino diz que substituições ou remissões vem tudo a dar na mesma!

Eu bem sei, e todos sabemos que o soldado que vae servir por outro recebe quasi sempre ou sempre uma somma; mas como muito bem disse o meu collega e talentoso amigo o sr. Pinheiro Chagas, ha uma grande differença entre ser ou não ser o estado o intermediario d'esses ajustes. (Apoiados.) E é n'esse intermedio que está o aviltamento para o estado.

Nas substituições a nação pede soldados, não pede dinheiro; o recrutado apresenta um homem por si, e a nação não pergunta a esse homem por quanto se vendeu ou se se vendeu. E o soldado quando no exercicio do seu dever for ferido pelo inimigo, não poderá receber entre sarcasmos a mais dolorosa das injurias: «Vae, e dize a Portugal, que setenta moedas são pequeno preço para tantos perigos e sustos»! (Apoiados.)

Mas, repito, está ou não em desaccordo o sr. ministro do reino com o sr. presidente do conselho?

O sr. Fontes reprova as remissões, faz-lhe uma lei n'esse sentido, e o sr. ministro do reino contraria a disposição d'essa lei, e declaramos depois que substituições ou remissões vem tudo a dar na mesma! Insisti n'este desaccordo que vejo existir entre os dois illustres ministros, porque entendo que é preciso que o paiz saiba qual é a final a opinião do gabinete a respeito d'este assumpto. (Apoiados.)

Estou cansado, sr. presidente, e de mais tenho abusado da paciencia da camara, á qual muito agradeço a attenção com que me ouviu.

Desejava fazer ainda algumas considerações sobre a proposta em discussão, mas, repito, estou cansado e não quero cansar mais a camara.

Reservo-me, pois, para quando vier á tela dos debates ~ o projecto de que falla a proposta, se algum dia esse projecto apparecer.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

(O orador foi comprimentado.)