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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Ha, porém, n’este documento alguns pontos ácerca dos quaes eu devo explicar-mo antes de o votar. A resposta termina, dizendo: (Leu.)

Quer-me parecer que nem a illustre commissão de resposta ao discurso da corôa, nem a maioria parlamentar querem n'estas palavras significai' que são contrarias a qualquer reforma nas instituições, uma vez feita dentro dos limites marcados na carta. (Apoiados.)

Aliás a carta seria um instrumento de revolução em logar de um instrumento de ordem e de paz.

E por ser a carta não só um progresso notavel, mas tambem um meio de transformações salutares, que ella representa uma das maiores glorias de D. Pedro ] V.

Outro ponto do projecto de resposta é aquelle que se refere ás nossas colonias.

Diz-se ahi.

(Leu.)

Ignoro se as idéas que tenho ácerca das colonias são populares ou impopulares; declaro, porém, que não vejo na conservação de algumas das nossas terras do ultramar as vantagens que tantas vezes ouço attribuir-lhe. (Apoiados.); francamente o digo, e creio ser eu o primeiro que apresenta esta opinião no seio do parlamento. Das nossas colonias, durante longos annos, não temos recebido senão tristes noticias, senão a nova da perda de tantos concidadãos; ellas nos lêem servido, principalmente, para grandes gastos e para alimentarmos esperanças que eu supponho vãs; á prompta colonisação de tantas terras seria necessario um povo muito mais numeroso, mais robustecido physica o intelectualmente; eu faltaria aos deveres da minha consciencia se não declarasse francamente, que não reputo as provincias ultramarinas tão vantajosas para a nossa independencia e para a nossa importancia politica, como reiteradamente se tem dito n'esta camara, em relatorios, em discursos e na imprensa. A minha opinião, pelo contrario, é que nas actuaes circumstancias precisámos seguir politica colonial muito diversa d'aquella que vejo inalteravelmente professada.

Venero tanto quanto devem ser veneradas todas as glorias que os nossos antepassados alcançaram; mas eu pertenceria a uma deploravel e mísera aristocracia, se quizesse encobrir com as glorias dos antecessores, a nossa actual fraqueza relativa para a colonisação. Como disse outro dia á camara, entendo que um dos nossos primeiros deveres, e uma grande conveniencia para tratar devidamente os assumptos economico-politicos, é pôr de lado tudo quanto seja ficção e apresentar os factos na sua realidade.

No discurso da corôa diz-se, que o governo de Sua Magestade apresentará ao parlamento uma proposta para a reforma da instrucção secundaria.

Sei a necessidade que ha de a reformar. Mas o que admiro, e a esse respeito não me dirijo, decerto, ao sr. relator da commissão, e sim ao governo, é que tendo sido votada, no anno passado, uma lei de reforma de instrução primaria, a qual dentro em dez annos devia estar completamente em execução, até hoje nem sequer os regulamentos apparecessem, pelos quaes se provasse que os desejos dos reformadores não tinham desapparecido logo que se votara a lei e as casas do parlamento se fecharam.

A lei foi promulgada em 2 de março de 1878, até agora não sei de um só acto, por parte do governo, que mostrasse sincera vontade de a pôr em execução.

Se comparo (e digo-o sem o menor desejo de travar polemica politica), se comparo o procedimento em relação á instrucção primaria com os cuidados no campo eleitoral, vejo que no exercicio de uma das suas funcções o governo teve a maior incuria, emquanto que na invasão dos direitos dos eleitores não foi demasiadamente escrupuloso. Não duvido acceitar a declaração ha dias feita pelo sr. ministro do reino, cujas altas qualidades eu venero. A declaração era de que n'outro tempo tambem houve abusos. Mas este tambem quer dizer de certo que o governo entendeu conveniente, não só ter candidatos officiaes, mas tambem, com todos os recursos ao seu alcance, cultivar o campo eleitoral, cuja cultura pertence unicamente aos eleitores; o é de notar que quanto mais os governos respeitarem os direitos dos eleitores, maior será a majestade do parlamento, e melhor serão recebidas pelo paiz, em igualdade de circumstancias, as leis que promulgarmos. Tanto empenho pelas eleições, e tanto desleixo pela instrucção publica, parece-me, na epocha actual, uma contradicção flagrante com o procedimento dos mais illustrados governos estrangeiros, o é impropria dos cavalheiros tão illustrados que hoje se sentam nas cadeiras do governo; se não fóra a sua elevada illustração, eu diria que estes factos representam ausencia completa de idéas.

O que vemos nos paizes mais adiantados da Europa? Os partidos tomai]), como um dos fructos mais importantes dos seus programmas e das suas discussões, a instrucção publica; ao passo que o nosso governo, que em 1872 apresentou uma proposta de reforma da instrucção primaria, ainda até hoje não começou a pôr em execução a respectiva lei!

Se confronto o movimento do paiz, favoravel ao progresso da instrucção publica, com os actos do ministerio, vejo n'estes um grave erro politico.

Quem não sabe quanto se tem debatido no paiz uma questão que para alguns homens publicos póde ser considerada como bagatella, mas que, para as nações adiantadas, é um assumpto do alta gravidade? Quem não sabe quanto se tem discutido no paiz o methodo de aprender a ler? Quem não sabe a polemica travada nos jornaes ácerca do methodo João de Deus?

Creio que foi uma senhora allemã, residente no Porto, devidamente estimada pelos mais distinctos philologos, quem primeiro escreveu com profundo conhecimento d'esse methodo. Muitas camaras deram evidentes provas do seu desejo de o propagar. O mesmo empenho mostraram professores e escriptores distinctos. O nome de João de Deus é conhecido em todo o paiz; é o nome de um dos maiores poetas portuguezes d'este seculo, e de um grande coração; a sua fama cresceu desde que frequentou a universidade até agora.

Não sei se o governo tinha inteiro conhecimento do que era o methodo de João de Deus, o que sei é que foi necessario que na legislatura passada os nossos illustres collegas, os srs. Osorio de Vasconcellos e Pires de Lima, solicitassem do sr. ministro do reino que mandasse estudar aquelle methodo; s. ex.ª respondeu affirmativamente, porém só no fim de 1878, ou no principio de 1879, os commissarios dos estudos de diversos districtos dirigiram aos professores e professoras de instrucção primaria uma circular, em que lhes ordenavam que dissessem ácerca d'este methodo tudo quanto soubessem por experiencia propria. Reprehensivelmenle demorado foi este acto do governo, principalmente n'um tempo em que é universal o reconhecimento da importancia do ensino primario.

Poderia eu repelir a phrase de um dos generaes mais destemidos da Europa, phrase conhecidissima, e segundo a qual a victoria de Sadowa deve ser attribuida antes aos mestres de instrucção primaria do que exclusivamente ao exercito.

Não investigo se hoje alguns escriptores da Allemanha julgam exagerada e funesta a importancia que se deu na sua patria aos mestres e professores; direi, porém, que se na Allemanha existe certo desequilibrio entre o desenvolvimento intelleclual e o desenvolvimento da liberdade nas instituições, me parece que entre nós succede o contrario; gozámos de liberdade; temos no nosso systema politico, e em alto grau, certa especie de tolerancia; mas cuido que o desenvolvimento intelleclual é por ora tão acanhado, que muitas vezes o uso d'essa liberdade é mais prejudicial do que benefico.

Sessão de 7 de fevereiro de 3879