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418 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Todos os partidos, Bem excepção, cometteram essa grandissima falta, (Apoiados.) porque todos annunciavam ás massas populares de Lisboa, que não fossem ao cemiterio acompanhar os que ali íam depor coroas no tumulo de Fernandes Thomás, porque a força publica estava lá para manter a ordem, não; estava... para castigar, que é palavra usada agora, mas que nem é propria d'esta casa, nem d'este documento, nem do discurso, nem da resposta, estava prompta a promover uma scena de sangue na cidade!

Contristou-nos muito o ver que o sr. ministro do reino que pela sua ascendencia devia conservar uma recordação agradavel d'aquella epocha, porque se pretendia ir a um dos cemiterios da capital prestar aquella homenagem, se arrecetasse da população da cidade, e permittisse uma scena de verdadeiro cannibalismo, que não tem outro nome, o mandar postar a força publica ás portas do cemiterio, e dar-lhe por ventura instrucções para que essa mesma força procedesse como não é licito.

N'esse dia, permitia s. exa. que lh'o diga com toda a franqueza, mostrou a sua inhabilidade para gerir os negocios publicos, e o seu profundo desconhecimento das funcções que a força publica tem a desempenhar.

O papel que representa a força publica nunca póde ser o de aggressora de cidadãos inermes.

Nós já ouvimos ao sr. presidente do conselho explicar os factos occorridos no Porto, e não sei se tambem os que se deram na Madeira, parecendo que um coração tão bondoso não se sensibilisára com os factos que se tinham passado ali.

Entendeu-se que a força publica tinha cumprido o seu dever, quando aliás, para manter a ordem, não tinha conseguido senão fazer victimas, como succedeu na ilha da Madeira, e ainda ha pouco nas barreiras do Porto, o que prova simplesmente que o governo, em vez de representar o principio da ordem, representa o principio da desordem, e da provocação; e que em logar de desejar que a força publica represente um papel sympathico para com a população, acarrete odios sobre si mesma; porque a população não póde ter sympathias por quem a fuzila.

O sr. presidente do conselho, que tem a sua responsabilidade presa a este facto, e digo isto porque não ha acto algum da parte de s. exa., pelo qual desligasse d'elles essa mesma responsabilidade, ao mesmo tempo que obriga a força publica a representar este papel, consente que ella ande a servir de guarda pretoriana não sei a quem que anda perdido por uma cidade do Minho.

Pois é preciso recorrer a taes excessos para manter a ordem e para executar com firmeza as resoluções do governo, quando elle se mantenha na orbita legal?

É indispensavel recorrer a estes meios condemnaveis, ferozes, barbaros e selvagens?

Não é.

Felizmente têem-se dado factos entre nós que mostram bem que não é indispensavel recorrer a esses meios.

Ha um facto muito honroso para um distincto official do nosso exercito, o sr. general Mello Breyner que por occasião da saída do regimento de infanteria n.° 13 de Chaves, pela sua muita prudencia, pela sua compostura e dignidade de verdadeiro militar, conseguiu que o acto se praticasse sem haver nenhuma desgraça a lamentar.

Lembro-me que José Estevão em quem ninguem podia deixar de reconhecer a coragem e o valor com que elle sabia bater-se, dizia não comprehender que a espada de um militar podesse servir para acutilar os cidadãos inermes.

Lembro-me ainda de que em um dia que se preparava um comicio em honra d'elle, porque podia embaraçar o governo, solicitára dos seus amigos, que o evitassem; e José Estevão ía ás duas horas da noite para casa do sr. Braamcamp constituir-se como prisioneiro, para mostrar que era incapaz de concitar as massas populares contra a auctoridade.

Pois se nós temos militares como o sr. Mello Breyner que cumprem tão nobremente os seus deveres, para que havemos de entregar em certas o determinadas occasiões o cumprimento de certas resoluções, a quem não é o mais habil para as cumprir?

Nós temos mesmo um facto a que já se alludiu n'esta camara, e que foi passado ás portas da cidade.

Quero referir-me á dissolução do regimento de lanceiros n.° 2.

Como é que edsa dissolução se operou?

De uma maneira dignissima, porque o illustre general a quem foi incumbida essa commissão, por ser dotado de grande prudencia, procedeu por fórma que tanto o honra a elle- como á dignissima e bisarra officialidade d'aquelle remento. (Apoiados.)

Se nós temos homens tão distinctos, tão valentes, tão exactos no cumprimento dos seus deveres, que sabem desatar todas as difficuldades que se apresentam, pela maneira distincta como sabem cumprir as suas obrigações, é lastima que o serviço de policia seja feito por modo que só nos póde rebaixar perante o mundo civilisado, porque não terá outro effeito o saber-se lá fóra o modo como o governo dispoz as cousas no dia 24 de agosto do anno passado.

E quem tem um tal susto e temor torna-se incapaz de occupar as cadeiras do poder porque essas cadeiras não são para os medrosos, nem o podem ser.

É por esse mesmo motivo que quando a imprensa de Lisboa se preparava para fazer uma demonstração publica na qual se podessem adquirir recursos para acudir aos povos de Andaluzia, empenho de toda a imprensa, sem distincção de cores ou de partidos, o sr. ministro do reino se arreceou de tumultos e de desordens, e não deu licença. Pois como póde comprehender-se receio de perturbação da ordem, quando alem da meios ordinarios, ha a cooperação da imprensa de todos os partidos, e de todos os cidadãos? Por que não respondia o sr. ministro por a ordem, n'estas condições?

É porque se atemorisou de ver a cidade nobre, altiva e digna, mostrar o que é, quando lhe acordam seus nobres e generosos sentimentos.

Sr. presidente, o discurso da corôa falla da necessidade de restabelecer o imperio da lei e o respeito da auctoridade.

Eu acabei de dizer como o governo tratava de assegurar o imperio da lei e o respeito da auctoridade. Esta fórma, a que o governo se soccorre, não attrahe respeito sobre a auctoridade; póde attrahir inimisades e odios, respeito nunca.

Mas é singular que este paragrapho em que se falla no imperio da lei venha exactamente como preambulo ao outro que diz:

«A camara examinará as medidas de natureza legislativa que já o governo decretou...»

De forma que o governo vangloria-se por um lado de restabelecer o imperio da lei, e é elle quem immediatamente rasga essa mesma lei, é elle que se accusa de praticar um acto anti-constitucional para o qual pede um bill de indemnidade.

Como é, pois, que póde comprehender-se um governo que quer restabelecer a lei e a infringe ao mesmo tempo?

Devo tambem notar que n'este discurso da corôa se falla no estado da nossa fazenda publica e diz-se n'este o que nós não lemos ha muito tempo em nenhum discurso da corôa, que a nossa situação financeira é desaffogada!

Pois, sr. presidente, este dizer é uma verdadeira ironia como o é quasi todo o discurso da corôa.

Diz se: «eleições livremente feitas».

Ora, a prova de que ellas foram feitas livremente é que ainda hontem um collega nosso contou como o foram