438 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
podessemos resgatar escravos e tirar-lhes a gargalheira e as algemas; era necessario que houvesse um territorio onde esses homens estivessem livres para fazer contratos livres, que são os unicos que o governo póde e deve acceitar.
A proposito ainda de uma questão incidental no ponto que estou discutindo, mas que foi a principal da interpellação do illustre deputado, parece-me, depois que li os artigos que os jornaes consagraram á discussão, que s. exa. dissera, e peço que rectifique a minha asserção se for inexacta, que s. exa. dissera que a legislação franceza tornava facultativa para o governo a apresentação ou não apresentação á camara dos tratados que celebrava com as outras potencias.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Eu li a v. exa. e á camara o artigo 8.° da lei franceza.
O Orador: - Então vou ler esse artigo.
(Leu.)
Parece-me que este artigo não torna facultativo ao presidente da republica o apresentar ou não á camara os tratados, quando d'elles resulte a annexação de terrenos que não póde ser feita senão em virtude de uma lei.
Se a França considerasse como annexação de territorio o tratado que lhe dava a expansão do seu dominio colonial para o lado de Cotonum, tinha obrigação de o apresentar á camara.
Parece-me, pois, que o illustre deputado se esqueceu de ler o artigo completamente á camara.
O illustre deputado, tratando depois a questão com mais desenvolvimento e com mais largueza, entende que nós não devemos fazer annexações, que não devemos ampliar o nosso dominio colonial, porque esse dominio já é demasiadamente vasto; porque nós não temos uma população tão densa como a Allemanha e porque a nossa industria não está tão desenvolvida que precisemos de lhe abrir novos mercados.
Mas este argumento a ser verdadeiro, tinha um alcance muito maior do que aquelle que o illustre deputado lhe quiz dar: obrigava-nos a abandonar as colonias que possuimos. (Apoiados.)
É necessario que o illustre deputado tenha a coragem de pôr a questão em toda a sua largueza. Trata-se do saber se devemos ser ou não um paiz colonial.
Se o devemos ser, parece-me que não devemos arrancar ás nossas colonias todos os elementos que possam ter de prosperidade e de desenvolvimento; (Apoiados.) e, se o não devemos ser, digamol-o francamente, e n'esse caso, abandonemos as colonias, que não são de certo mais onerosas para a metropole e para o thesouro da metropole, porque se alargaram um pouco as fronteiras para alem de Moçambique, ou porque se lhes acrescentam alguns kilometros de costa ao vastissimo littoral que já possuiamos. (Apoiados.)
A nossa industria é bastante acanhada, diz o illustre deputado.
Ora o modo de desenvolver esta industria acanhada é abrir-lhe novos mercados, onde ella encontre vantagens para os seus productos, superiores aos productos similares da iudustria estrangeira. (Apoiados.)
Também não temos superabundancia de população, e conseguintemente, diz o illustre deputado, não precisamos de ir adquirir maior dominio colonial para lá expandirmos o que não superabunda.
Mas o illustre deputado vê que do nosso paiz emigram todos os annos milhares de braços que vão trabalhar para Demerara, Sandwich, America do Norte e Brazil; e não julga preferivel que esta emigração, que nós não podemos reter, vá para as nossas colonias em vez de ir concorrer; para o desenvolvimento e prosperidade dos paizes estrangeiros? (Apoiados.)
O sr. Consiglieri Pedroso: - Tratem de acabar com a divida fluctuante, que já acabam com a emigração (Apoiados.)
O Orador: - Ha muitas causas de certo que promovem a nossa emigração. Não é essa a principal. E o illustre deputado sabe que, se muitas d'estas causas podem ser destruidas, ou pelo menos ser attenuadas por leis sabias, ha comtudo uma, que é a indole expansiva do povo portuguez, este desejo de ir tentar fortuna, que é a causa que actua mais no espirito dos emigrantes do que a falta de subsistencia ou de meios no paiz onde nasceram (Apoiados.)
Essa causa é que é necessario aproveital-a de fórma que, em vez de ir concorrer para a prosperidade dos paizes estrangeiros, vá pelo contrario concorrer para a prosperidade dos territorios onde temos o nosso dominio. (Apoiados.)
De mais, o illustre deputado sabe perfeitamente que nós temos uma singular facilidade de assimilação; sabe que, como dizia Alexandre Herculano, o elemento estrangeiro dissolve-se entre nós com rara facilidade, a ponto de estar perfeitamente nacionalisado na segunda geração, e por consequencia é necessario que preparemos territorios, que n'um futuro mais ou menos longinquo, possam ser mercados sempre abertos ao nosso commercio, campos sempre abertos á nossa actividade, focos onde se vá retemperar a nossa boa sorte, como se retempera no Brazil, que está sendo um dos focos da nossa prosperidade.
Mas o illustre deputado entende que em se acabando com a divida fluctuante acabâmos com a emigração. O que tem isso com a questão? E como se póde vir dizer que, em se acabando com a divida fluctuante, se acaba com a emigração?
Se o illustre deputado entende que se não devem empregar os meios para fazer prosperar as nossas colonias, para que ellas se desenvolvam, então tenha a coragem de dizer que acabemos com ellas, e não venha dizer que é necessario não dar um passo, porque isso fará com que as colonias sejam ainda mais pesadas para a metropole.
O illustre deputado sabe que estamos numa situação critica; que toda as nações estão talhando á larga no continente africano, e se nós continuarmos assim, se nos descuidarmos, corremos o risco de ficarmos estreitamente apertados no litoral, e em algumas ilhas, sendo completamente expulsos dos mercados do interior.
Se assim pensassem tambem os nossos antepassados, os nossos gloriosos antepassados, no momento em que uma lucta homerica vinha exigir de nós pesados sacrificios, porque a questão da America em 1640, complicada com a questão da independencia portugueza, juntava contra nós a potencia terrestre mais importante, a Hespanha, e uma importante potencia maritima, a Hollanda, digo, se tambem n'esse tempo houvesse espiritos que tivessem menos confiança no futuro, não tinhamos feito do Brazil, como foi, e ainda é hoje, uma fonte de prosperidade para o nosso paiz.
Eu não gosto de idéas absolutas. Sei bem que muitas vezes ellas são inexactas; e percebo bem que é tão illegitimo condemnar em geral e em absoluto a doutrina das annexações, por que isso nos póde preparar um futuro desgraçado, como advogar sem restrições a theoria das annexações. Mas creio ter mostrado ao illustre deputado que eu, obedecendo a uma idéa determinada, estou seguindo quanto cabe em minhas forças, ou quanto cabe em nossas forças, uma politica de expansão, quer em Moçambique, quer em Angola, e uma bem entendida politica de expansão na costa da Mina, a fim de tornar o forte de S. João Baptista de Ajudá um auxiliar da provincia de S. Thomé e Principe, que póde concorrer muito para o seu desenvolvimento e prosperidade.
Mas se esta politica é condemnavel, por que applaudiram tanto a viagem de Capello e Ivens? (Apoiados.)
Se esta politica é condemnavel, por que consideraram no seu enthusiasmo essa viagem maravilhosa, como um