O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

SESSÃO N.º 27 DE 6 DE SETEMBRO DE 1905 5

attenção aos caminhos de ferro, que na ultima situação tiveram um notavel defensor no Sr. Conde de Paçô-Vieira, urge que d'este lado da Camara se levante mais uma voz em favor da esquecida hydraulica agricola, de que depende o futuro de Portugal.

Houve, é certo, um Ministro regenerador, o Sr. Pedro Victor, que foi o auctor da lei que hoje vigora sobre o assumpto, mas desde 1892 nunca mais os illustres Ministros das Obras Publicas d'esse grande partido de governo cuidaram sequer das obras hidraulicas existentes, estando hoje arruinados todos os diques e canaes do Tejo, como sejam entre os primeiros os diques dos Vinte, Junceira, etc.; e entre os segundos os canaes de Alpiarça, Azambuja, etc.

Nada se fez, nem talvez se possa já fazer, attenta a importancia de algumas d'essas ruinas, que de anno para anno vão augmentando por forma a não poderem, a não ser com grandes gastos, ter as necessarias reparações.

E, no entanto, os campos lá vão soffrendo todos os prejuizos provenientes d'este abandono, e, o que é peor, sem que os, seus proprietarios tenham a esperança de qualquer medida governativa verdadeiramente efficaz!

Sabido é, porém, que o partido progressista pela voz dos seus illustres representantes Oliveira Martins, Emygdio Navarro, Augusto José da Cunha e por ultimo Elvino de Brito se tem occupado da hydraulica agricola, é a elle que naturalmente cumpre o dever de acompanhar esses illustres correligionarios no empenho que elles sempre tiveram de proteger a agricultura nacional, de que, sem duvida alguma, depende o futuro da nossa patria.

Sem querer cansar a Camara vou dizer que em Hespanha é tal o desenvolvimento dos trabalhos hydraulicos que, por assim dizer, deixa a nossa iniciativa reduzida a uma cousa minima, e mostra bem que é tempo de começar a pensar a serio no assumpto.

Em Hespanha a questão hydraulica vem sendo cuidadosa e pertinazmente estudada desde os romanos, progredindo consideravelmente no tempo dos arabes, que lá deixaram normas e costumes que os seus successores teem mantido, como preciosas tradições, de que teem sabido tirar os mais vantajosos resultados.

Basta percorrer Murcia e Valência para admirarmos os trabalhos que tão grande proveito e gloria teem dado á Hespanha.

Não ousarei tocar, ligeiramente que seja, na coriosissima historia da hydraulica hespanhola, mas o que não posso deixar de dizer é que, ao passo que no nosso paiz nada, absolutamente nada, se tem feito nesse sentido, lá se caminha sempre no aperfeiçoamento da captagem das aguas e na sua distribuição, que os nossos vizinhos e hermanos consideram á altura dos mais ponderosos problemas da sua vida economica.

Referindo-me, pois, só ao que ultimamente ali se tem feito, lembrarei á camara que o Sr. Gasset, Ministro com Sagasta, e um dos que melhor teem tratado d'essa importantissima questão nos jornaes e na Camara, pelo que mereceu o epigramma de gostar de viver nos pantanos (albufeiras), teve a satisfação de inaugurar alguns embalses parciales - pequenos reservatorios ou albufeiras - vendo o seu snccessor, Conde de Romanones, continuar ainda mais rasgadamente o programma dos melhoramentos hydraulicos, não só para a irrigação da Andaluzia, mas para todos os 1.250:000 hectares que poderão ser irrigados em toda a Hespanha.

Para isto, segundo um artigo do Diario Universal; evidentemente inspirado ou talvez mesmo escripto pelo actual Ministro hespanhol, Conde de Romanones, defende elle a expropriação forçada dos terrenos precisos para a abertura dos canales de riego, comprando o Estado as terras de sequeiro e vendendo-as depois de irrigadas, o que daria em poucos annos ao Governo um lucro de 500 milhões de pesetas, sem o minimo prejuizo para ninguem, excepto para os proprietarios teimosos que porfiassem em fazer az perros del hortelano...

A França, apesar de natural e abundantemente provida de agua pela, intrincada e vastissima rede dos seus rios e canaes, tem grandes reservatorios que, como os de Furens e de Bouzey, abastecem cidades e campos, fornecendo potencias para um numero consideravel de fabricas, como a de Santo Estevam, que emprega mais de 15:000 operarios. E é tal a importancia que ali se presta á questão hydraulica que ainda ha pouco foi passada para o Ministerio da Agricultura, criando-se duas direcções especiaes, que d'ella tratam exclusivamente 1. Na Italia vae abrir-se o canal da Apulia, destinado á irrigação da parte meridional da peninsula, e nos Estados Unidos da America é de tal maneira importante a obra já realizada que um Ministro da marinha d'aquella grande nação affirmava ainda ha pouco que, tendo sido gastos mais de 125 milhões de dollars em obras hydraulicas, poderia a America offerecer á Inglaterra uma esquadra tão poderosa quanto esta julgasse precisa para que, junta com a inglesa, pudessem tornar impossivel qualquer guerra futura, mesmo que contra ellas se unissem as esquadras de todo o mundo. Não citarei as obras da Argelia, do Egypto e da India, mas fá-lo-hei em. occasião mais opportuna, se bem que tão bellos exemplos me pareçam muito proprios a orientarem a opinião do nosso paiz, que, a tal respeito, parece inteiramente transviada 2.

Sem mais demora, para não fatigar a attenção da Camar, fiz a apresentação d'estas ideias, que já tiveram, sob o ponto de vista particular, qualquer principio de iniciativa por parte do meu illustre collega, o Sr. Dr. Pereira de Lima, no seu projecto, a que ha pouco me referi, para a ligação do Tejo ao Sado, por meio de um canal através das províncias do Alemtejo e Ext.remadura, com parte das aguas fornecidas pelos futuros reservatorios da serra de Ossa.

Depois d'esse projecto que, reduzido a condições viaveis, poderia levar a irrigação ao grande celleiro portuguez, que é a provincia do Alemtejo, nada mais se projectou em Portugal que tendesse aos melhoramentos hydraulicos, o que certamente é devido á falta de uma lei protectora das empresas de irrigação, semelhante á hespanhola de 1890.

Houve tão sómente a ideia da abertura do canal do Sorraia, ideia que já por duas vezes fez parte de propostas

1 O decreto de 27 de janeiro do 1903 criou uma nova direcção para os melhoramentos agricolas, em que se trata de proteger a iniciativa dos proprietarios para a troca e annexação de parcellas, sem o que as irrigações e drainagens seriam impossiveis e ainda para levar á execução todos os melhoramentos materiaes, como abertura de novos caminhos de exploração, etc., á semelhança do que ha mais de trinta annos só faz com grande exito na Allemanha e na Austria.

É de crer que a França, com o trabalho dos seus mil duzentos e tantos engenheiros-agronomos, dirigidos pelo grande sabio Mr. Dabat, realize todos os progressos agricolas, que tarde chegarão até nós.

2 Para não falar senão da grande obra hydraulica dos inglezes no Egypto, citarei uma phrase do bello livro de Mr. Brunhes, "L'irrigation dans la péninsule ibérique et l'Afrique du Nord": Ou un ruipeau caule la vie naît. O Egypto é uma prova brilhante d'este facto phisico e economico.

A barragem de Assonan, estudada em quatro annos pelo grande engenheiro Willcokes, armazena 1 milhar de metros cubicos, - devendo armazenar 3,5, mas ficando nesse caso submergido todo o templo de Philoc - dando como está mais 70.000:000 francos de augmento de producção agricola.

Esta obra collossal, que, a par das inudianas, dá a maior honra aos inglezes, será dentro em breve conjugada com a barragem de Assiout, orçada em £. 2.245:000.

Nos Estados Unidos da America tem sido construida uma infinidade de barragens de variados systemas, rock-fril, masonry, hydraulic-dams, que nos explicam a abundancia de colheitas de cereaes, fructas, etc., d'aquelle grande paiz, com que a propria Inglaterra difficilmente poderia estar de mal por ser tambem o seu celleiro.