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em 1864, quer dizer, mais de quatro annos depois do decreto de s. ex.ª de 1859, como julga s. ex.ª que seja ainda cedo para se decretar a codificação de todas as disposições regulamentares sobre contabilidade, se em 1859 já s. ex.ª julgava que era tempo, e se não o fez foi porque se não julgou auctorisado?! Pois se a legislação que existia n'esse tempo ainda não era bastante aperfeiçoada para permittir desde logo a codificação, como é que s. ex.ª teve esse pensamento, e como é que diz que só por se não julgar auctorisado é que o não fez? (Apoiados.) E se teve esse pensamento, porque me quer hoje irrogar censura, porque eu o fiz quatro annos depois?!

Ora, esse projecto do regulamento de contabilidade, disse s. ex.ª que = estava feito então por uma commissão de homens distinctissimos nesta especialidade =. É verdade que este assumpto tinha sido estudado, e ahi está esse projecto que então se elaborou, mas esse projecto não é o regulamento que eu tive a honra de publicar. Ali formulam-se diversas idéas geraes que são communs ao regulamento actual e ao que ha sobre esta especialidade, porque todos vão á mesma fonte, mas estava bem longe de ser este trabalho um regulamento de contabilidade. E tanto o não era, que no ultimo artigo d'esse projecto, assignado por homens distinctissimos na especialidade como eram os srs. visconde de Algés, José Joaquim Lobo e Antonio de Paiva Pereira, que foram os que se occuparam d'este trabalho em outubro de 1857, anteriormente á entrada do sr. Casal Ribeiro no ministerio. Este ultimo artigo diz:

«Os regimentos especiaes dos diversos serviços de contabilidade, reunidos e codificados n'um só corpo de instrucções, applicados debaixo dos mesmos principios e das mesmas fórmas ás escripturações administrativas das receitas e despezas do estado, ás gerencias dos exactores e responsaveis, e á acção fiscal e judiciaria do tribunal de contas, constituem o regulamento geral da contabilidade publica que deve completar o systema de organisação geral d'este ramo de serviço, a que o presente decreto se refere.»

Portanto este projecto refere-se a uma organisação geral, e diz que = para se completar era indispensavel o regulamento geral de contabilidade =, e por consequencia este projecto não era o regulamento geral de contabilidade, visto que o reputava necessario para o seu complemento (apoiados).

Isto não quer dizer nada, porque podia o projecto ter sido estudado então, e eu não tenho a pretensão de ter inventado o regulamento de contabilidade; mas effectivamente esta é a verdade: o trabalho não estava feito, foi feito no meu tempo, de accordo com pessoas muito competentes que consultei e ouvi sobre esta materia, e não foi copiado de trabalhos anteriores.

Disse s. ex.ª, a respeito da codificação, que = ella só se devia fazer quando existissem já leis, regulamentos e instrucções praticas a respeito da contabilidade publica; em uma palavra, quando houvesse elementos para fazer uma codificação que prestasse, o que por emquanto não existia entre nós =. Se eu visse que entre nós não existiam já os elementos a que se referiu o illustre deputado, não tinha feito aquelle regulamento. Não quer isto dizer que elle seja perfeito; mas o proprio regulamento geral francez, feito em 1838, a que se referiu o illustre deputado, foi já refundido em 1862, e com bastantes alterações, o que prova que se o nosso tiver de ser alterado, não se póde dizer que seja por defeito organico d'elle, mas por defeito inherente a todas as instituições humanas, que não podem ser perfeitas, pois a perfeição só pertence á Divindade. Portanto se o regulamento geral de contabilidade, que publiquei, for susceptivel de correcção, o que não póde deixar de ser, como o são todas as cousas, especialmente as quebro referem a assumptos d'aquella ordem, cuja pratica é difficilima, e exige longos e aturados estudos, não póde isso admirar, porque o mesmo regulamento de 1838, francez, foi refundido em 1862, e lá vem um novo e extenso relatorio, feito até pelo mesmo cavalheiro a quem o illustre deputado se referiu, o marquez de Audifret, que felizmente ainda vive.

Mas disse s. ex.ª que = entre nós quasi que não havia ainda legislação que codificar, nem regulamentos =. Parece-me que s. ex.ª n'esta parte tratou com demasiado desfavor os esforços que se têem feito de 1834 para cá, e as diversas disposições que se têem publicado em differentes annos a este respeito, esquecendo que existe mesmo uma especie de regulamento de contabilidade feito em 1850, emfim que a contabilidade se faria por algum systema; parece que se esqueceu que esse systema foi estudado por pessoas competentes, como o sr. Carlos Morato Roma, homem de muito talento, instrucção e aptidão para esta especialidade, não se podendo dizer que o trabalho d'esse homem não foi nada, e que successivamente não foi sendo aperfeiçoado (apoiados). Aqui tenho esta nota que indica os differentes decretos, portarias, instrucções e cartas de lei, tudo a respeito de contabilidade publica anterior a 1834 e posterior a 1834, e que passo a ler, para a camara ver que alguma cousa existe:

«Carta constitucional de 1826, artigos 136.° a 138.°;

«Acto addicional á carta, artigos 12.° e 13.°;

«Decreto de 16 de maio de 1832; Decreto de 12 de junho de 1835;

«Decreto e instrucções de 2 de dezembro de 1835;

«Decreto de 30 de dezembro de 1839;

«Carta de lei de 16 de novembro de 1841;

«Instrucções de 8 de fevereiro de 1843;

«Regulamento de 18 de agosto de 1843;

«Instrucções de 21 de agosto de 1843;

«Decreto de 26 de setembro de 1849;

«Instrucções de 30 de outubro de 1849;

«Ditas de 9 de novembro de 1849;

«Decreto de 10 de novembro de 1849;

«Regulamento de 28 de janeiro de 1850;

«Dito de 11 de junho de 1850;

«Portaria de 20 de maio de 1853;,

«Dita de 10 de fevereiro de 1855;

«Carta de lei de 15 de junho de 1857;

«Portarias de 17 de junho e 30 de setembro de 1858;

«Decreto n.° 3 de 19 de agosto de 18591»

Portanto não é justo nem fundado o dizer-se que = se foi fazer uma codificação só pelo prurido de a fazer sem haver elementos para ella =. Havia, como fica demonstrado, uma legislação que successivamente se tinha promulgado sobre este objecto, com aperfeiçoamentos continuos.

O regulamento não fez senão systematisar, agrupar, harmonisar, colligir, uniformisar, codificar, n'uma palavra, todas estas disposições (apoiados). O regulamento não inventou disposição alguma legislativa, o regulamento não fez leis (apoiados). Portanto não invadiu as attribuições do poder legislativo, porque o poder legislativo pela carta constitucional vota todas receitas e despezas do estado. Não é infringir a lei dizer — o poder legislativo ha de votar todas as despezas e receitas do estado (apoiados). Não se fez senão repetir o facto (apoiados). Mesmo quando se tratou d'esta discussão houve quem fizesse, com muita justiça, um parallelo.

Pois dizer-se — tal facto existirá, porque está na ordem legal, na ordem constitucional que exista, isto importa, impõe á camara a obrigação de o praticar? Não. Pois, por exemplo, quando se faz uma tabua das marés, e se diz — haverá maré cheia ás oito horas e meia da manhã, e haverá maré vasia ás duas horas e meia, isto implica a violação das leis da natureza, e impõe uma obrigação ao Ente Supremo? (Riso.) Não de certo. Isto não é senão a explicação de um facto que está promulgado pelas leis da natureza e pela vontade do Ente Supremo. Creio que o nobre deputado, que respeita, como eu, o poder legislativo, não o quer collocar acima do Ente Supremo. E todavia diz se isto sem lhe dar nenhuma interpretação offensiva aos attributos da Divindade e das leis da natureza, porque se não faz senão annunciar um facto (apoiados). Dizer — haverá maré cheia ás tantas horas, será porventura ordenar que a haja, será invadir as leis da natureza? Não é assim. Não se faz senão annunciar o facto. Dizer que o parlamento fará isto, votará aquillo, será o mesmo que ordenar? Não, indica se unicamente o que o parlamento faz em virtude do seu direito, da constituição do estado e das leis (apoiados). Mais nada.

Vamos aos pontos precisos, determinados e definidos em que se suppõe que houve exorbitancia. Um d'elles refere-se ao thesoureiro pagador da junta do credito publico, e diz se que o governo tanto reconheceu que tinha havido exorbitancia n'este ponto, que tinha vindo legalisar o acto por uma proposta de lei. Não é exactamente assim.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Apoiado.

O Orador: — O decreto com força de lei n.° 1, de 19 de agosto de 1859, promulgado no tempo de s. ex.ª o sr. Casal Ribeiro, e que lhe faz muita honra, porque elle prestou um serviço ao paiz e á contabilidade publica, reorganisando o tribunal de contas sobre as bases convenientes, e estabelecendo assim o modo de regular a contabilidade judiciaria, que é indispensavel para o processo das contas. Mas n'este decreto, artigo 11.°, já se estabelece a regra de que o tribunal de contas tomará conta a todos os thesoureiros pagadores (apoiados) das diversas repartições do estado e da junta do credito publico. Designa-se mesmo — e da junta do credito publico. Portanto, esse decreto presuppõe que existe thesoureiro pagador da junta do credito publico; e tanto isto é assim, e tanto se entendeu por este modo que o tribunal de contas tem exigido as contas n'esses termos á junta do credito publico. E d'aqui tem nascido um conflicto entre a junta e o tribunal de contas; porque a junta entende que ella deve ser ordenadora e pagadora ao mesmo tempo, que deve accumular estas duas responsabilidades, que são inaccumulaveis e incompativeis; porque quem tem a responsabilidade da legalidade de uma despeza é quem a ordena, e quem tem a responsabilidade do pagamento, é quem paga. Ora quem paga não póde ao mesmo tempo ter o direito de ordenar, porque n'esse caso accumularia duas responsabilidades, que são incompativeis, e poderia dispor livremente dos meios que tem na sua mão a dependencia de ordem alguma. Portanto é um principio rudimental n'esta materia de que as funcções de ordenar e pagar são incompativeis, não podem existir no mesmo individuo. E assim tem entendido o tribunal de contas, e nos termos do decreto organico do mesmo tribunal tem pedido as contas á junta (apoiados). No regimento do tribunal de contas lá estão consignadas estas mesmas idéas, esta é a interpretação do decreto organico do tribunal de contas, e não podiam estar consignadas outras, porque quaesquer outras eram contrarias aos verdadeiros principios que devem reger a contabilidade publica. Portanto não fiz no meu regulamento mais do que s. ex.ª fez no seu decreto. Presuppuz a existencia d'esse thesoureiro pagador, e assim como s. ex.ª referendou o decreto no qual se auctorisava a junta a tomar contas a esse funccionario, eu suppuz tambem que elle existia. Mas não pratiquei illegalidade nenhuma, porque nem creei o emprego, nem lhe fixei o ordenado. Suppuz que de facto elle existia na junta do credito publico, assim como o suppoz o nobre deputado quando foi ministro (apoiados).

Portanto, já se vê que não infringi lei alguma; fiz exactamente o mesmo que fez o illustre deputado quando referendou o decreto de 19 de agosto de 1859. E como se deprehendia das leis existentes que havia um thesoureiro pagador, não obstante existir esta duvida a respeito do empregado, entendi que era melhor em logar de presuppor a existencia d'elle, que acabassemos este conflicto, e que se interpretasse e declarasse a lei de um modo authentico. Por conseguinte, torno a repetir, não se apresenta nenhum acto illegal por mim praticado.

E disse-se que eu era o proprio que vim reconhecer que tinha violado a lei! A camara vê que eu fiz uma proposta para interpretar e declarar uma lei, e mais nada (apoiados).

Qual é a outra accusação? Tambem se me fez uma accusação, porque estabeleci a prescripção para as dividas do estado, que não estava auctorisada na nossa legislação. Ora, todos que conhecem as ordenanças de fazenda de 17 de setembro de 1516, capitulos 209.°, 210.° e 211.º; sabem perfeitamente que é um principio da nossa legislação a prescripção d'essas dividas dentro do praso de cinco annos que marquei (apoiados). Argumenta-se que essas ordenanças da fazenda são obsoletas. Mas este argumento não é exacto por dois fundamentos, ambos muito valiosos. Primeiro, porque existindo, nos capitulos a que acabo de me referir, a prescripção pelo que respeita ás dividas dos particulares para com a fazenda, n'esta parte tem sido applicado o capitulo 210.°, e nunca se entendeu que esta legislação tinha caducado ou era obsoleta; e isto é a confirmação do que acabo de dizer, para mostrar que tal legislação nunca se entendeu que era obsoleta.

E porque é que á face d'esta mesma legislação haviam de prescrever as dividas activas do estado e não as passivas? Pois então ha prescripção para as dividas activas do estado, e para as passivas não? Se não caducou para as dividas activas do estado, tambem não deve caducar para as passivas (apoiados). Mas os argumentos que se citaram para provar que esta legislação tinha caducado, são contraproducentes, porque se ha leis posteriores que estabelecem a excepção, como a lei de 1853 e as outras, isso não faz se não confirmar a regra, e provar que as ordenanças de 1516 vigoram (apoiados).

Portanto, esta legislação está em vigor, não está obsoleta, e se eu não fiz mais de que consignar o principio que está na lei, como é que eu infringi a lei? (Apoiados.)

Não só não infringi lei nenhuma, mas passei para o regulamento um principio que é conveniente e que é proclamado como o principio mais util pelo proprio marquez de Audifret que se citou; principio que está introduzido em França, na Belgica e em toda a parte onde está bem organisada a contabilidade publica.

Por consequencia, não se pôde dizer que esta lei é obsoleta. Não é assim.

Ora, parece-me, que estando o governo auctorisado pela lei fundamental do estado para fazer os regulamentos para a execução das leis, eu creio que se lhe não pôde negar esse direito, quanto á contabilidade publica, que é um ramo importante da administração do estado. Ora se se não póde negar ao governo a auctorisação para codificar todas as disposições relativas a este negocio, auctorisação que se deriva da carta, e alem d'isso está reconhecida e enunciada nos artigos 3.° e 4.° do decreto n.° 2, com força de lei de 19 de agosto de 1859, referendado pelo sr. Casal Ribeiro, que dizem os artigos 3.° e 4.° do referido decreto? Dizem:

«Artigo 3.° Ao ministerio da fazenda, pela direcção geral da contabilidade, incumbe:

«1.° Prescrever as formulas e modelos, e expedir as instrucções precisas para simplificar, harmonisar e facilitar a escripturação a cargo de todas as repartições de contabilidade e dos funccionarios d'ellas dependentes.

«2.° Promover, por intervenção dos ministros respectivos, a exacta observancia dos regulamentos e instrucções de contabilidade publica.

«3.° Reunir e centralisar todos se elementos necessarios para reorganisarem as contas geraes do estado, a fim de serem enviadas nas devidas epochas ao tribunal de contas, e depois apresentadas as côrtes.

«Art. 4.° O governo fará os regulamentos necessarios para a execução do presente decreto.»

Portanto se estas disposições não importam uma auctorisação dada ao governo, como pretende o illustre deputado, significam pelo menos que elle entendeu que o governo tinha direito de regular a contabilidade publica.

Ora isto não se podia fazer sem um regulamento (apoiados). Logo estava reconhecida a necessidade do regulamento e a legalidade com que elle se podia fazer (apoiados); porque não se refere só á escripturação a cargo do ministerio da fazenda, mas a cargo de todas as repartições de contabilidade de todos os ministerios: logo, repito, reconheceu-se a necessidade de se fazer este regulamento e a legalidade d'essa providencia (apoiados).

Vozes: — Já deu a hora.

O Orador: — Como a hora já deu, e eu ainda não conclui as reflexões que desejo fazer sobre este negocio, peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para a primeira sessão.

O sr. Presidente: — Fica reservada a palavra ao sr. ministro da fazenda. Na quarta feira não ha sessão, e a ordem do dia para sexta feira é a continuação da de hoje.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.