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SESSÃO DE 15 DE FEVEREIRO DE 1876

Presidencia do ex.ª sr. Joaquim Gonçalves Mamede

Secretarios — os srs. Francisco Augusto Florido da Monta e Vasconcellos Barão de Ferreira dós Santos

SUMMARIO

Apresentação de requerimentos, declarações, representações e renovação de iniciativa de um projecto de lei — antes da ordem do dia suscitou-se um pequeno debate entre os srs. Pinheiro Chagas e ministro do reino ácerca do theatro normal, e convento de Santa Cruz de Coimbra — Interroga o sr. Mariano de Carvalho o mesmo sr. ministro sobre violencias eleitoraes havidas em Macedo de Cavalleiros, e responde-lhe este lendo os telegrammas que d'ali tinha recebido — Falla o Sr. Barros e Cunha sobre differentes assumptos, dá o sr. Palma algumas explicações e responde o sr. ministro das obras publicas — Na ordem do dia entra em discussão o projecto n.º 150 do anno passado, creando um agronomo em cada um dos districtos administrativos do reino e ilhas adjacentes, é approvado com um additamento proposto pelo sr. Mariano de Carvalho — É tambem approvado o projecto n.º 9 do corrente anno, creando na universidade de Coimbra e nas escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto uma cadeira especial de pathologia geral, semeiologia e historia da medicina.

Presentes á chamada 62 senhores deputados. Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Adriano Sampaio, Agostinho da Rocha, Osorio de Vasconcellos, Braamcamp, Pereira de Miranda, Antunes Guerreiro, Avila Junior, A. J. Boavida, A. J. Teixeira, Cunha Belem, Pereira Carrilho, Rodrigues Sampaio, Barão de Ferreira dos Santos, Correia da Silva, Vieira da Mota, Conde da Graciosa, Forjaz de Sampaio, Eduardo Tavares, Vieira das Neves, Francisco de Albuquerque, Fonseca Osorio, Francisco Mendes, Mouta e Vasconcellos, Francisco Costa, Pinto Bessa, Guilherme de Abreu, Paula Medeiros, Palma, Illidio do Valle, Jeronymo Pimentel, Ferreira Braga, Barros e Cunha, Vasco Leão, Gonçalves Mamede, J. J. Alves, Matos Correia, Cardoso Klerck, Correia de Oliveira, Pereira da Costa, Figueiredo de Faria, Namorado, Moraes Rego, Pereira Rodrigues, Luiz de Lencastre, Luiz de Campos, Bivar, Manuel d'Assumpção, Rocha Peixoto (Manuel), Mello Simas, Pinheiro Chagas, Mariano de Carvalho, Cunha Monteiro, D. Miguel Coutinho, Pedro Franco, Pedro Jacomo, Pedro Roberto, Julio Ferraz, V. da Arriaga, V. da Azarujinha, V. de Carregoso, V. de Sieuve de Menezes, V. de Villa Nova da Rainha.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Rocha Peixoto (Alfredo), Arrobas, Ferreira de Mesquita, Sousa Lobo, Mello Gouveia, Neves Carneiro, Zeferino Rodrigues, Camello Lampreia, Dias Ferreira, Luciano de Castro, Mexia Salema, Pinto Bastos, V. de Moreira de Rey.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Teixeira de Vasconcellos, Cardoso Avelino, A. J. de Seixas, Telles de Vasconcellos', Barjona de Freitas, Falcão da Fonseca, Augusto Godinho, Carlos Testa, Conde de Bretiandos, Filippe de Carvalho, Van-Zeller, Quintino de Macedo, Perdigão, J. M. de Magalhães, Ribeiro dos Santos, Guilherme Pacheco, J. M. dos Santos, Nogueira, Julio de Vilhena, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Freitas Branco, Faria e Mello, Pires de Lima, Alves Passos, Marçal Pacheco, Placido de Abreu, Ricardo de Mello, Thomás Ribeiro, V. de Guedes Teixeira.

Abertura — A uma hora e meia da tarde. Acta — Approvada.

EXPEDIENTE Declarações

1.ª Declaro que se estivesse presente na sessão de 5 do corrente teria rejeitado a moção do sr. deputado Marçal Pacheco e se tambem estivesse presente nas sessões de 10 e 11 teria igualmente rejeitado as moções dos srs. Mariano de Carvalho e Boavida.

Igualmente declaro que não tenho podido comparecer ás ultimas sessões por motivo justificado.

Sala das sessões, 14 de fevereiro de 1876. = Augusto Godinho.

2.ª Declaro que faltei ás ultimas sessões d'esta camara, por justificados motivos de saude.

Camara dos deputados, 14 de fevereiro de 1876. = Rocha Peixoto.

Representações

1.ª Dos empregados do serviço interno da alfandega de 2.ª classe, da raia em Aldeia da Ponte, pedindo augmento de vencimento. (Apresentada pelo sr. deputado Carrilho.)

A commissão' de fazenda.

2.ª Da camara municipal do concelho de Marvão, pedindo auctorisação para despender uma verba que tem em cofre, na construcção da estrada de Marvão ao Valle de Sever. (Apresentada pelo sr. deputado Klerck.)

A commissão de obras publicas.

3.ª De alguns aspirantes da alfandega de Lisboa, pedindo para serem graduados em terceiros officiaes, para entrarem na effectividade. (Apresentada pelo sr. deputado Braga.)

A commissão de fazenda.

4.ª Dos representantes de differentes bancos, pedindo para serem eliminados do projecto de lei n.º 8 o artigo 6.º e § 4.°, e artigo 9.° (Apresentada pelo sr. deputado Dias Ferreira.)

A commissão de fazenda.

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio do reino e secção competente, seja remettida a esta camara copia dos documentos seguintes:

1.° Do averbamento da quantia de 15:378#660 réis, á disposição do juiz dos orphãos de S. Thomé, como pertencente aos menores Joaquim e Amélia, por effeito de carta de sentença, apresentada na junta do deposito publico.

2.° Da informação dada pela junta ao ministerio do reino, sobre a pretensão do levantamento da mesma quantia, a que a junta se oppoz.

3.° Da exposição feita pela junta ao ministerio do reino, no sentido de não poder dar cumprimento á portaria, que lhe fóra dirigida em 8 de maio de 1875.

4.° Da consulta da procuradoria geral da corôa, sobre esta questão.

Sala das sessões, 14 de fevereiro de 1876. = = O deputado, Adriano Carneiro de Sampaio.

Renovação de iniciativa Renovo a iniciativa do projecto de lei n.º 46 da sessão de 1873.

Sala da camara, 14 de fevereiro de 1876. = A. Carrilho.

E seguinte:

N.° 46

Senhores. — A lei de 11 de junho de 1867 estabeleceu em termos positivos, que a diuturnidade do serviço, por longo que tenha sido, não é fundamento legal para o decretamento de pensões. Não obstante, sustenta se com boa rasão, que havendo leis especiaes, e particularmente os alvarás de 13 e 14 de agosto de 1824, que não foram expressamente revogados pela citada lei de 11 de junho, deve applicar-se ás viuvas e filhas de alguns empregados

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da direcção geral dos correios e postas do reino a legislação especial, e não a decretada em 1867 geralmente para todos os empregados do estado.

Com o fim de estabelecer ajusta igualdade perante a lei entre todos os servidores do estado, a commissão de fazenda, de accordo com o governo, tem a honra de submetter ao vosso esclarecido exame e approvação o seguinte projecto lei:

Artigo 1.° Consideram-se expressamente revogadas pela carta de lei de 11 de junho de 1867 quaesquer disposições anteriores, contidas em leis especiaes, e particularmente os alvarás de 13 e 14 de agosto de 1824 sobre decretamento de pensões.

Art. 2.° Fica d'este modo interpretada ou ampliada a citada lei de 11 de junho de 1867, e revogada qualquer disposição em contrario.

Sala da commissão, em 28 de março de 1873. = Carlos Bento da Silva = Placido Antonio da Cunha e Abreu = Antonio José Teixeira = Antonio José de Barros e Sá = Joaquim José Gonçalves de Matos Correia = José de Mello Gouveia = Antonio Maria Barreiros Arrobas = Joaquim Gonçalves Mamede, relator.

Foi enviado á commissão de fazenda.

O sr. Pedro Jacome: — Mando para a mesa uma renovação de um projecto de lei apresentado na sessão passada.

O sr. Pinheiro Chagas: — No intervallo da sessão legislativa o sr. ministro do reino foi accommettido de súbito de um accesso de amor de arte, e vendo que o theatro nacional estava em lamentaveis condições nomeou uma commissão para propôr medidas que o melhorassem.

Esta commissão é composta de homens competentissimos, e pela escolha dos seus membros não posso senão felicitar o sr..ministro do reino.

Como, porém, s. ex.ª impunha a esta commissão, como condição previa, que não podia propôr auxilio do thesouro, a commissão achou se d'este modo com as mãos atadas, e não póde fazer mais do que propôr até á abertura das camaras um modus vivendi que não era senão a continuação do que até ahi existia incorrecto e peiorado. E digo incorrecto e peiorado, não por culpa da commissão, mas por culpa da indole provisoria imposta pelo governo ás medidas que ella tinha de propôr.

O facto é, porém, que d'esta resolução tomada pelo governo, e inspirada pelo amor da arte, não resultou senão desproveito para a arte e para os artistas.

A commissão propoz e o sr. ministro do reino resolveu que o concurso para a adjudicação do theatro de D. Maria II fosse aberto, não por tres annos, como era até ahi, mas simplesmente por um anno.

D'aqui resultou que os artistas, que até ahi eram escripturados por tres annos, apparecendo-lhes agora escriptura apenas por um anno, ou foram procurar desde logo uma collocação mais certa, ou tomaram as suas medidas para que no fim do praso marcado na adjudicação tivessem uma situação segura.

Por consequencia a portaria do sr. Sampaio, que tinha por fim melhorar as condições do theatro nacional, não fez senão peiora-las.

Se o theatro estava o anno passado em más condições, este anno está em condições peiores, e para o anno ha de estar peior ainda.

Se o anuo passado tinha um grupo de artistas bons, este anuo alguns d'elles, vendo se obrigados a escripturar-se apenas por um anno, foram procurar em outros theatros uma escriptura menos provisoria, o para o anno outros artistas, um grupo de actores, não sabendo qual será a sua sorte em julho, tomaram as precauções convenientes e escripturaram-se para ir para o Brazil.

Ha mais alguma cousa: os poucos auctores dramáticos que temos, têem-se abstido de escrever para o theatro de D. Maria II.

Ha aqui na camara alguns auctores dramáticos justamente festejados, e cujas obras têem a certeza de encontrar o applauso publico.

Elles que digam se vale a pena escrever alguma cousa para o theatro de D. Maria II, para terem a ventura de a ver cortada em pleno successo pelo termo da adjudicação marcado pela portaria do sr. ministro do reino.

Portanto o resultado da portaria do sr. Sampaio foi simplesmente collocar o theatro de Maria II em condições más, debaixo do ponto de vista do reportório e do pessoal artístico.

Mas diz o sr. Sampaio: Esta medida era provisoria até á abertura das côrtes; e a commissão ficava encarregada de apresentar um projecto de reforma definitiva do theatro nacional que s. ex.ª viria depois submetter á approvação das côrtes.

Nós sabemos todos que a commissão não se tem reunido; e como a sessão vae adiantada, pergunto ao sr. Sampaio se tenciona effectivamente apresentar algum projecto de reforma do theatro nacional, ou se quando chegarmos a julho, que é o termo do praso da adjudicação actual, abre concurso nas mesmas condições que até aqui, sem auxilio do thesouro e sem imposição de obrigações artísticas.

Se assim for, posso dizer que a portaria do sr. Sampaio, inspirada pelo amor da arte, não faz senão completar a ruina da arte nacional. (Apoiados.)

Desde já direi a s. ex.ª, se acaso tiver tenção de apresentar alguma medida para reformar o theatro normal, que hei de votar contra qualquer proposta que tenda a entregar o theatro á administração directa do governo, e voto contra ella, porque detesto a administração directa do governo n'estes assumptos, debaixo do ponto de vista economico e debaixo do ponto de vista artístico. Detesto a arte com chancella official.

Todas as manifestações do pensamento humano, e principalmente a arte, que é uma das mais sublimes, precisam, para viver, respirar esta ar vital que se chama liberdade, e a liberdade n'estes assumptos é incompativel com a administração official, porque tal administração impõe á arte um circulo estreito e apertado, fóra do qual ella não póde saír.

Declaro, porém, que lhe voto com todo o gosto, e que sustentarei se for combatida, qualquer proposta que tenha por fim dar aos nossos artistas dramáticos um futuro menos contingente do que têem agora, e dar á arte nacional condições de vida e prosperidade.

Se se apresentar qualquer proposta n'este sentido, voto-a e sustento-a com as minhas debeis forças.

Todos os governos illustrados, sem se fazerem emprezarios, sem se fazerem editores, sem se fazerem negociantes de quadros, inscrevem nos seus orçamentos sommas mais ou menos importantes para auxiliar as letras, as artes e a sciencia.

O nosso proprio governo subsidia alguns estabelecimentos scientificos para publicarem obras de valor, cuja publicação não podia ser emprehendida por editores negociantes.

O nosso governo subsidia o theatro de S. Carlos para sustentar uma companhia lyrica, que não poderia ser sustentada por uma empreza particular desajudada do auxilio publico. Não é muito, portanto, que subsidie o theatro nacional para elle poder tambem sustentar a arte em uma altura em que a não podia manter uma empreza qualquer que pelas necessidades da existencia tem de transigir com o gosto multas vezes depravado do publico.

Voto portanto sem escrupulo algum, e antes pelo contrario entendo que faço n'este ponto um serviço ao meu paiz, para que elle mantenha na altura em que deve ter o seu nivel moral e intellectual, qualquer subsidio que s. ex.ª venha propôr para collocar a arte em condições seguras.

Entendo, porém, que para se conceder esse subsidio não

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se póde seguir o systema que foi seguido este armo, e creio que em mais alguns, para a adjudicação do theatro de S. Carlos.

Não podemos estar a votar subsidio para manter a arte em uma certa altura, para depois regatear uns vinténs, pondo completamente de parte as condições artísticas e as garantias que qualquer empreza possa offerecer. Subsidio fixo, e que seja preferido quem der maiores garantias de cumprir a missão elevada que deve incumbir ao theatro nacional.

Portanto s. ex.ª deve ver que n'este ponto não tenho o mais leve pensamento do hostilidade ao governo; pelo contrario, desejo favorece-lo, se elle quizer tomar a iniciativa n'um assumpto que interessa a todos. Creio que posso fallar não só por mim, mas por muitos collegas da opposição que têem o maior desejo de que a arte nacional seja favoneada e favorecida. (Apoiados.)

O que não posso deixar de lamentar, é que s. ex.ª, nomeando uma commissão composta de homens competentissimos para este fim, s. ex.ª não faça nada, ou, se faz alguma cousa, é completamento desacompanhado das luzes e conselhos d'essa commissão, porque tal commissão não se reuniu mais.

S. ex.ª, querendo zelar a arte nacional, ou não fez nada, e esteve zombando com o publico, ou então zombou da commissão, porque se fez alguma cousa, então n'esse caso zombou da commissão porque o fez completamente desacompanhado da sua opinião, porque nunca mais a consultou.

Não sei qual seja a resposta do sr. ministro do reino a - estas minhas breves considerações, mas responder-lhe-ei se necessario for.

Aproveito a occasião de estar com a palavra para chamar a attenção do sr. ministro, para um facto referido por alguns jornaes; refiro-me á noticia dada pelos jornaes de Coimbra, de que a camara municipal d'aquella cidade tinha o proposito de demolir parte do convento de Santa Cruz.

S. ex.ª já me disse particularmente, que tinha mandado colher informações, mas que ainda as não recebêra, e como é possivel que já hoje saiba alguma cousa, por isso me dirijo publicamente a s. ex.ª

Devo dizer, que um jornal de Coimbra, affecto ao governo, disse que a camara municipal d'aquella cidade tencionava demolir uma parte do convento de Santa Cruz que está amodernada, e onde ha muito pouco da primitiva construcção.

Ora, na verdade, confesso que este muito pouco assusta-me bastante, por isso que alguem disse ainda na ultima sessão da academia real das sciencias, que n'uma parte do edificio de Santa Cruz que a camara tencionava demolir estavam incluidos os claustros conhecidos pela denominação do silencio e da manga!

Se assim é, parece-me um vandalismo atroz e ainda mais vergonhoso por ser praticado n'uma cidade que é um dos focos da illustração do nosso paiz (apoiados), mas se a camara municipal effectivamente não tenciona senão demolir a parte modernada do edificio, que longe de contribuir para o embellezamento o attenua, direi que em vez de a condemnar, applaudo a; porque effectivamente acho que estes remendos maculam tanto essas paginas de pedra que nos foram legadas pelas idades heróicas de Portugal como o camartello dos destruidores.

Pedia pois a s. ex.ª que fizesse fiscalisar esta demolição para que não vão de envolta com os remendos alguns restos d'aquelle grandiosíssimo monumento notavel pela sua belleza artistica, ainda mais pelas gloriosas memorias que recorda ainda a todos os portuguezes. (Apoiados.)

Abusarei ainda um pouco da attenção da camara sobre um outro assumpto, que é para mandar para a mesa um requerimento pedindo alguns esclarecimentos pelo ministerio das obras publicas.

Quando aqui se discutiu a questão do ramal de Cacilhas, pedi eu ao sr. ministro das obras publicas alguns esclarecimentos a respeito de uma questão, a que só muito vagamente se alludia nos documentos publicados; refiro-me á questão de um requerimento do sr. Jorge Elliott.

Pediu-se ao sr. ministro das obras publicas que dissesse qual o motivo porque negara a esse cavalheiro a concessão que elle pedia, e s. ex.ª não disse nem uma só palavra a esse respeito, e os deputados da maioria, que fallaram na questão, tambem guardaram a esse respeito o mais prudente silencio. O sr. Filippe de Carvalho, porém, que é mais expansivo, hontem na Correspondencia de Portugal, teve a bondade de nos dizer, que effectivamente o sr. Elliott tinha requerido a concessão de um caminho de ferro do Pinhal Novo a Cacilhas; mas que esse caminho ía tirar ao caminho do sul e sueste parte do seu rendimento, sem lhe dar as vantagens do transporte do peixe de Cezimbra, com que s. ex.ª tenciona beneficiar o caminho de ferro do sul e o paiz. (Apoiados. — Riso).

Desejo, pois, saber qual o motivo porque o sr. ministro das obras publicas rejeitou o requerimento do sr. Elliott e depois concedeu ao sr. Filippe de Carvalho aquillo mesmo que negou ao sr. Elliott?

N'esse sentido mando pura a mesa o seguinte requerimento. (Leu.)

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — Ainda bem que sou accusado sómente de ter nomeado uma commissão pelo interesse da arte; confesso esse peccado, era a arte e nada mais que ou desejava aperfeiçoar.

Quando nomeei a commissão, e tenho tambem o prazer de o dizer, segui, embora o illustre deputado diga que não, o parecer d'ella para não abrir o concurso por mais de um anno.

Se a commissão era tão boa e me aconselhou isto, não sei que mal praticasse eu em seguir o seu conselho.

O governo não descura esse assumpto, sem comtudo eu deixar de dizer que as opiniões do illustre deputado, embora conformes em certo ponto ás minhas, a respeito da administração por conta do governo, não são partilhadas por muitas pessoas competentes. (Apoiados.)

O protesto por ora é mal cabido. Tomara eu não administrar cousa alguma; é esse o meu desejo. Administrem aquelles que melhor possam administrar.

Isto quanto á questão do theatro de que te trata; e visto ser tão fervoroso o desejo do illustre deputado, ainda que não venha tão cedo, como deseja, a proposta, creio que não terá impugnação, quando não sei... não digo... quando ha tanto desejo d’ella ser approvada.

Quanto ao assumpto de Coimbra, direi ao illustre deputado que me fez ha dias a fineza de me perguntar se eu sabia o que havia a este respeito, e que lhe disse que sabia o que se tinha dito pela imprensa, mas que não sabia nada officialmente, que n'esse mesmo dia telegraphei ao governador civil de Coimbra, que me diz o seguinte:

«Não ha demolição alguma, a camara projecta reformar os paços do concelho ou construir outros de novo, e a imprensa começou a gritar que se ía arrazar Santa Cruz. Nem sequer ainda ha projecto para os paços, e nem sei mesmo o que a camara deliberará sobre o assumpto.»

Em carta particular o mesmo governador civil diz-me o seguinte:

«O que se tem escripto a respeito da demolição de Santa Cruz é um desproposito e um disparate; não ha fundamento para nada d'aquillo que se inventou só para fazer bulha.

«As repartições publicas estão n'um lanço do antigo convento da Santa Cruz, e estão lá ha muitos annos; mas as suas condições são taes que uma das mais urgentes necessidades é reformar o edificio para ellas, ou fazer outro de novo, mas uma e outra cousa se póde fazer, e com certeza se faz sem tocar na igreja de Santa Cruz, nem nos ["claustros que têem merecimento historico e artístico,

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«A bulha foi tão intempestiva que nem a camara ainda mandou fazer projecto, nem sequer levantar a planta do edificio...»

O que sei officialmente é que os boatos referidos pela imprensa são infundados. Por isto respondo eu; pelo que diz a imprensa não posso responder, e o illustre deputado tambem não póde, nem de certo quer responder.

O sr. Palma: — As juntas de parochia das freguezias de Martim Longo, Vaqueiros e Giões, do concelho de Alcoutim, districto administrativo de Faro, encarregaram-me de apresentar uma representação em que pedem que seja alterado o artigo 2.° da carta de lei de 23 de novembro de 1859, e que o concelho de Alcoutim seja dividido em duas assembléas eleitoraes, uma em Alcoutim e outra em Martim Longo.

Como o pedido d'estas juntas de parochia não póde ser attendido senão por meio de lei, mando a representação acompanhada de um projecto de lei.

O sr. Pereira de Miranda: — A camara municipal de Lisboa fez a honra de me encarregar de apresentar á camara uma representação em que mais uma vez Tem expor as causas das circumstancias financeiras em que se encontra e as difficuldades com que luta constantemente para acudir ás suas instantes necessidades.

A camara pede a approvação de um projecto de lei que tive a honra de apresentar ha dias.

Peço que seja publicada a representação no Diario do governo, e enviada á commissão respectiva.

Espero que o sr. ministro do reino ha de empregar todos os esforços para que á camara municipal de Lisboa sejam concedidos alguns meios para melhorar a sua situação.

O sr. -Mariano de Carvalho: — Desejo primeiramente que o sr. ministro do reino se encarregue de lembrar ao seu collega das obras publicas os seus deveres constitucionaes (apoiados), porque emquanto o parlamento está aberto, os ministros tem obrigação de comparecer n'esta casa (apoiados) para dar as explicações que lhes sejam pedidas, e para assistir á discussão e analyse dos seus actos. Não se póde admittir esta ausencia completa do sr. ministro das obras publicas que nem exerce as funcções de deputado, nem cumpre os seus deveres de ministro constitucional.

D'esta censura excluo o sr. ministro do reino que sempre se apresenta cedo na camara.

Agora permitta V. ex.ª que eu leia um telegramma que recebi de Macedo de Cavalleiros sobre violencias eleitoraes; n'elle trata-se de um assumpto de que eu não tenho conhecimento, e por isso desejo que o sr. ministro do reino dê alguns esclarecimentos. (Leu)

Não conheço pessoalmente este cavalheiro, nem tenho outras informações senão este telegramma, e como n'elle se diz que o sr. ministro do reino recebeu outro telegramma, eu, em cumprimento do meu dever, peço ao sr. ministro que dê á camara as explicações que tiver a este respeito, e a V. ex.ª que me dê a palavra para depois de s. ex.ª fallar.

O sr. Ministro do Reino: — Recebi do sr. José de Almeida Pessanha que é um cavalheiro que eu conheço muito bem e a toda a sua familia, e que o devem conhecer alguns dos nossos collegas que são do tempo em que elle foi deputado, o seguinte telegramma.

«14 de fevereiro de 1876. — Macedo. — Ex.mo sr. ministro do reino. — O estado excepcional e aggressivo em que se acha este concelho força-me a dize lo a v. ex.ª pedindo providencias.

A eleição camarária duas vezes annullada só porque a auctoridade não venceu, é repetida terceira vez no dia 20 d'este!!

«O governo lançou se na luta lentamente estabelecendo entre mim o elle questão pessoal. A repetição da eleição do dia 16 de janeiro é um facto memoravel pelos actos

da violencia, pressão e illegalidade praticados pela auctoridade e seus agentes. Casa da assembléa invadida ao romper do dia pelos agentes da auctoridade e cabos de policia com o fim premeditado de obstarem á entrada, dos eleitores, que não votaram na lista da auctoridade, o que pozeram em pratica obstruindo a porta da entrada prohibindo por meios violentos que os eleitores independentes ali tivessem ingresso sendo preciso intervir a força armada requisitada pelos eleitores não auctoritarios para desimpedir a entrada da assembléa, sendo logo a mesma eleita tumultuosamente por eleitores e muitos individuos não eleitores.

«Agentes da auctoridade, regedores e escrivão de fazenda dão á bôca da uma as listas.

«No dia seguinte logo ao começar o escrutinio a mesa cercada por ordem do presidente da assembléa e da auctoridade administrativa, obstando d'este modo a que o escrutinio fosse fiscalisado pelos eleitores para os escrutinadores lerem as listas não auctoritarias pelas da auctoridade, o que realisaram, não podendo ainda com este meio violento e illegal falsificaram de todo o escrutinio, recorreu o presidente da mesa, recebedor da comarca, apoiados pela auctoridade administrativa ao meio inaudito e brutal de chamarem á casa da assembléa a força armada de caçadores n.º 3, para esta fazer evacuar a assembléa de todos os eleitores, de modo que alem da mesa ninguem podia fiscalisar os actos eleitoraes, o que felizmente não levaram a effeito, devido isto ás reflexões judiciosas do digno capitão commandante da força armada que fez ver ao presidente da mesa e á auctoridade administrativa a grande responsabilidade do acto violento e injusto que lhe ordenaram praticasse.

«Terminando o escrutinio da uma para as duas horas da tarde é a assembléa abandonada por toda a mesa sem affixarem o edital com o resultado da eleição e não apparecendo na casa da assembléa senão ao outro dia depois das dez horas da manhã com o fim premeditado de esperarem o resultado das outras assembléas para de todo falsificarem a verdade do escrutinio, o que não conseguiram devido á coragem o energia da opposição, mas apesar de toda esta orgia e violencia não poderam vencer e no dia do apuramento recorreram ao roubo das actas, que não obstou a que o apuramento se fizesse porque os eleitores da opposição apresentaram os editaes com o resultado d'esta, mas o governador civil não trepidou e fez em conselho administrativo annullar a eleição tomando por unico fundamento o roubo das actas e não receiando a grande responsabilidade que lhe cabe pela repetição de tres eleições camarárias.

«Está designado o dia 20 d'este mez para a terceira eleição e esmo se prevêem os mesmos actos violentos e illegaes por parte da auctoridade, reclamo pois a attenção de V. ex.ª para que, dignando se providenciar, ponha cobro a estes abusos e excessos que são a degradação do governo representativo e constitucional = José de Almeida Pessanha.»

Immediatamente dirigi ao governador civil este telegramma:

«Telegramma — Urgente — Fevereiro 14 — Ao governador civil de Bragança. — Recebo um telegramma de Macedo de Cavalleiros em que José Pessanha se queixa de violencias eleitoraes e pede providencias para a repetição da eleição no dia 20.

«Diga-me o que houve e o que ha a similhante respeito. Faça manter a liberdade e cumprir a lei. Não consinta violencias em nenhum sentido. = Sampaio.»

Recebi hoje este telegramma do governador civil:

«15 de fevereiro de 1876 — Bragança — Ex.mo sr. ministro do reino. — N'esta data dou ordem para que no correio da manhã depois sejam enviados a V. ex.ª todos os documentos relativos á eleição de Macedo, pensava remetter a V. ex.ª concluida que fosse no dia 20 a eleição a que

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se procede por ter sido annullada a da assembléa de Moraes.

«D'elles verá V. ex.ª que tenho cumprido rigorosamente, o meu dever fazendo manter a liberdade e a ordem.

«No dia 20 procede-se á eleição da annullada na assembléa de Moraes.

«Constou-me que por parte de ambas as parcialidades que se combatem queriam levar a Moraes massas de homens das diversas povoações do concelho, de certo no intuito de pesar no animo dos eleitores da assembléa.

«Convidei os chefes de ambas as parcialidades a uma conferencia, em que queria leva-los ao accordo de, por um e outro lado, não levarem á assembléa de Moraes gente de fóra d'ella para assim se evitarem excessos de desordem.

«Tres chefes da parcialidade adversa a José Pessanha vieram aqui hontem e comprometteram-se commigo a que por sua parte não iriam ahi se não fossem os influentes de fóra da assembléa de Moraes.

«Albino das Neves e José Pessanha recusaram-se a vir; provavelmente, entenderam que deviam antes telegraphar a V. ex.ª do que tratar de um accordo pacifico e amigavel vantajoso para todos.

«Ordenei ao administrador do concelho que convencesse os povos estranhos á assembléa para não irem a Moraes.

«Tenho tomado e tomarei as medidas necessarias para que se mantenha plenissima liberdade eleitoral e não seja alterada a ordem.

«Esteja V. ex.ª seguro de que por fim ambas as parcialidades se queixaram de auctoridades porque ambas não são intoleráveis e violentas, que é mister vigor para as fazer conter na ordem e ambas gritam porque a auctoridade se não põe do seu lado. (L. S.) = O governador civil.»

Aqui está o que eu posso informar ao illustre deputado.

Não quero fazer reflexões geraes ao que disse o sr. José de Almeida Pessanha, nem ao que diz a auctoridade. A camara fica sabendo o que ha.

O sr. Barros e Cunha: — Dirigi por intermedio de V. ex.ª logo nos primeiros dias da sessão um requerimento ao sr. ministro da marinha para que enviasse a esta camara os documentos que diziam respeito a uma reunião feita na ilha de S. Thomé pelos proprietarios d'aquella possessão, e em que elles resolveram representar ao governo, pedindo a abolição da condição servil na ilha de S. Thomé. E pedi tambem que fossem mandadas as informações do governador a tal respeito e até hoje ainda não chegaram taes informações para se poder saber qual o alcance da lei que foi votada n'esta casa.

E visto que outro dia não me póde caber mais a palavra, quando o sr. ministro da marinha respondeu ás informações que eu lhe pedi sobre os factos a que se refere a questão Albert Grant, e em que se acha involvido o marechal duque de Saldanha, nosso ministro na corte de Inglaterra, aproveito a palavra n'este momento.

O argumento mais forte apresentado pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros para refutar o meu reparo foi que o marechal Saldanha estava no seu direito de negociar como negociou a concessão, e eu não lhe contestei similhante direito, nem censuro que fosse concessionario do tramway para Torres Vedras.

Mas como s. ex.ª, o sr. ministro dos negocios estrangeiros, não vem á camara, e os dias de sessão vão correndo, tomo a liberdade de declarar que, visto que estou debaixo do desmentido de s. ex.ª, desmentido que se acha publicado no Diario das camaras, o sr. marechal Saldanha continua a ser presidente da direcção da companhia formada em Londres e como tal, é responsavel e tem de ser necessariamente citado para todos os actos em que a sua responsabilidade se ache ligada á companhia, e isto não é segredo porque foi impresso nos programmas que se distribuiram, na subscripção que se abriu e em todos os annuncios que se publicaram nos jornaes, e mesmo no Times, que sou muito censurado em citar, e sinto que o Times seja jornal de uma importancia tão secundaria, que pareça mal o cita-lo, mas creio que não devo citar os jornaes de Freixo de Espada á Cinta ou de Seixo de Gatões, com quanto mais lidos e bem informados.

Mas se por acaso é um erro ou defeito, peço licença á camara para dizer que não posso ter um conhecimento dos negocios que interessam á nação portugueza, por meio da publicidade, senão referindo-me ao jornal em que esses documentos se publicam (apoiados).

Agora, passando a outro assumpto, tenho a dizer que os srs. Mariano de Carvalho e Pinheiro Chagas referiram-se já ao desprezo homérico com que o sr. ministro das obras publicas tratou o parlamento, e eu declaro a V. ex.ª que, se por acaso a responsabilidade de qualquer dos meus collegas se achasse de algum modo compromettida, como está a do sr. ministro das obras publicas, nos negocios para que eu tenho solicitado a sua presença, creio que nenhum d'elles deixaria de vir aqui para fulminar, para pulverisar as accusações que lhe faço, porque isto não é outra cousa do que accusações.

O sr. ministro das obras publicas não vem, e ainda que isso me seja desagradavel, e desagradavel para a camara, não terei remedio senão provocar uma deliberação do parlamento para ver se é possivel conduzir ao aprisco ministerial aquella ovelha desgarrada.

O sr. Pinheiro Chagas mostrou que a questão é de tal maneira importante, que não ha voto do parlamento que possa extinguir a excitação que tem produzido em todo o paiz.

Desejo ver aqui o sr. ministro das obras publicas, para saber por que modo, e reconhecendo que a concessão é legal, visto que o parlamento já se declarou satisfeito com as explicações de s. ex.ª, repito, por que modo s. ex.ª quer recorrer ás obras importantes que é necessario realizar na estação do Barreiro, para evitar a concorrencia que em consequencia da concessão gratuita que se lhe deu, póde fazer ao estado o sr. Filippe de Carvalho. E eu que prometti a V. ex.ª que não abandonava a questão, hei de cumprir a minha palavra.

(Interrupção do sr. Palma).

O illustre deputado que é auctoridade competente n'este negocio da concessão do sr. Filippe de Carvalho, e que tem a sua opinião compromettida, empenhada em demonstrar ao parlamento o prejuizo que vinha d'essa concessão á linha do governo, acaba de substituir o sr. ministro das obras publicas, e de dar a explicação de que as obras que se estão fazendo podem ser feitas pelo director do caminho de ferro do sul sem auctorisação do sr. ministro.

Eu respeito muito o illustre deputado, mas as suas explicações não me satisfazem; muito mais me satisfaz a sua opinião exarada no parecer que s. ex.ª assignou, e que foi presente á camara. Mas eu considero que s. ex.ª ainda não póde substituir completamente nem constitucionalmente o sr. ministro das obras publicas. (Apoiados.) E por isso que, podendo ser a sua explicação tudo quanto geria para desejar que a camara soubesse, eu não me dou por satisfeito com esta explicação, e espero que o sr. ministro das obras publicas venha ao parlamento.

Ora, eu pedi tambem informações ácerca do modo por que o governo tem feito o contrato do fornecimento do material do caminho de ferro do Minho; e tambem o sr. Cardoso Avelino, ministro das obras publicas, não se dignou vir dizer á camara qual é o systema por que o governo procede para eu saber se effectivamente tenho de propôr alguma providencia legislativa, a fim de se abrir concurso constantemente para o fornecimento do material que o estado tenha de adquirir.

Esta questão não é nova; esteve muito tempo em pratica nas obras publicas, e não sei porque rasão o ministerio actual se desvia de regra tão salutar.

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Pedi o anno passado ao sr. ministro que me désse informações de qual era o resultado pratico que se tinha tirado da exposição de Londres para os productos da agricultura portugueza.

S. ex.ª prometteu então que tencionava mandar distribuir o relatorio, logo que tivesse o trabalho do commissario que tinha sido enviado aquella exposição.

Não sei se por acaso o governo julga do somenos importancia que o parlamento saiba qual foi o resultado da exposição internacional para os productos da nossa agricultura.

Eu entendo tambem que tenho obrigação, como deputado, de saber o que se passou, como os nossos productos foram classificados em relação aos productos similhantes aos das outras nações; emfim qual foi o resultado pratico, O resultado commercial e o resultado economico para a riqueza publica, para a industria do paiz n'aquella exposição.

Ha aqui já um projecto de lei para legalisar as despezas feitas com a exposição de Londres, e outro para auctorisar a despeza que se vae fazer com a exposição de Philadelphia; e eu não estou resolvido a auctorisar despezas das quaes o unico resultado que conheço foi desacreditar os productos mais importantes da agricultura nacional.

Desejo, portanto, ter antecipadamente o relatorio que deve ter sido dirigido ao ministerio das obras publicas pelo commissario que nos representou n'aquella exposição.

Isto são negocios muito serios; e creio que a camara dos deputados, opposição o maioria, fariam muito bem se pozessem de lado a politica, para cuidar d'aquillo que principalmente nos devo interessar.

Por consequencia não me cançarei da renovar hoje, ámanhã e todos os dias estas questões.

O sr. Palma (para um requerimento): — Requeria a V. ex.ª que consultasse a camara se permittia que eu desse uma explicação antes de se entrar na ordem do dia. Vozes: — Falle, falle.

O sr. Presidente: — Consulto a camara.

A camara consentiu que fosse dada a palavra ao sr. deputado.

O sr. Palma: — V. ex.ª e a camara sabem que eu rarissimas vezes occupo a sua attenção, porque conheço a insufficiencia dos meus dotes oratorios para a poder esclarecer nas questões; mas é certo que, apesar de considerar muito e de contar no numero dos meus amigos quasi todos os srs. deputados da opposição na actual camara, tem-me parecido que da parte d'elles (não direi que haja uma especie de intenção malévola), tem-se querido provocar-me a que falle na celebre questão da concessão do caminho de ferro do Pinhal Novo, e eu vou fazer-lhes a vontade.

Quando se tratava d'essa questão eu pedi a V. ex.ª a palavra e pedi que se se votasse a questão antes d'ella me chegar na materia, V. ex.ª m'a desse para explicações depois da votação. V. ex.ª e a camara sabem como se fez n'esse dia a ultima votação, que foi nominal, sobre uma proposta do sr. Barros e Cunha; os srs. deputados, como a votação era a ultima, á proporção que iam votando retiravam-se; e não póde haver explicações.

Em outra occasião, em que o sr. Barros e Cunha teve a bondade de ceder a palavra a differentes collegas, eu tinha pedido a palavra para explicações, mas V. ex.ª não ouviu e não m'a concedeu.

Agora porém, que s. ex.ª fallava, e a meu ver injustamente, e fazendo apreciações erradas da questão de que tratava, fiz-lhe uma interrupção no meu pleno direito e não com a pretensão de me julgar na altura de ser ministro, ambição, que me não contaminou ainda, apesar de ser muito vulgar.

Quando fiz esta interrupção levantei as iras do illustre deputado que é meu amigo velho, e s. ex.ª renovou a insinuação de eu não dar explicações ácerca da questão da concessão do caminho de ferro.

Eu tenho a honra de ser vogal da junta consultiva de obras publicas; como tal assignei uma consulta de accordo com os meus collegas, uma unica consulta das differentes, que deu ácerca d'essa questão, e diz o sr. deputado que essa opinião emittida está em diametral opposição com o procedimento do governo na concessão feita.

Como deputado, dei aqui o meu voto. Eu não digo a V. ex.ª. que esse meu voto se subordinou á conveniencia de sustentar uma situação. V. ex.ª sabe que eu sou de velha data um soldado obscuro sim, mas lealissimo. Mas dei esse voto conscienciosamente e a politica ficou satisfeita sem que a minha consciencia podesse ser abalada.

O conselho de obras publicas na consulta, que eu assignei, formula as suas conclusões em tres pontos, sendo o principal, que a concessão pedida podia affectar os interesses do estado.

Não fallarei dos outros dois, que são de menor importancia.

Ora, a concessão foi feita tendo-se em consideração todas as idéas que a junta consultiva de obras publicas emittiu no seu parecer. (Apoiados.)

O governo impossibilitou o concessionario, ou a empreza que fizesse aquelle caminho de ferro, se acaso o fizesse, de ser concorrente com a linha do estado, e por consequencia, não podendo por fórma alguma haver essa concorrencia, não eram affectados os interesses do estado.

As outras rasões parece-me que não eram taes que me impossibilitassem de votar.

Diz se que podia haver divergencias que é uma d'essas rasões; mas essas divergencias não podem existir, porque o assumpto está sujeito a regulamentos prescriptos pelo governo, que não podem deixar de ser cumpridos, e que impossibilitam a concorrencia.

Por consequencia a respeito do voto que dei direi com toda a consciencia que, áparte mesmo o sentimento politico, votei sem constrangimento algum.

Agora outra questão a que se referiu o illustre deputado e meu amigo.

Todos sabem que os directores dos caminhos de ferro do Minho e do Douro são dois homens distinctos (apoiados), dois homens honestissimos e probos (apoiados), um d'elles é nosso collega aqui na camara, e dizer o illustre deputado, que tambem é homem de bem, na ausencia d'esse cavalheiro, que se fizeram adjudicações de fornecimentos de carris preterindo em concurso as propostas mais vantajosas para se admittirem as propostas menos vantajosas, parece me que não é uma cousa muito regular. Eu peço a?. ex.ª que me diga com a mão na consciencia se acha isto proprio de boa camaradagem. (Apoiados.)

Mas não ha nada do que o illustre deputado disse; absolutamente nada.

O concurso para os fornecimentos de carris de ferro passou-se como eu vou dizer á camara, a quem peço que me desculpe por lhe tomar algum tempo.

O sr. Matos, um dos directores a que me referi, mandou para o ministerio das obras publicas os desenhos e as condições de fornecimento dos carris de ferro. As condições, já se vê, referiam-se ao peso, á quantidade, á resistencia, á maneira de ligação dos carris, etc..

Esta proposta foi remettida oficialmente, como devia ser, á junta consultiva de obras publicas.

Era então vivo um homem distinctissimo d'este paiz, e eu aproveito esta occasião para prestar uma homenagem ao seu talento e ás suas qualidades; era então vivo o sr. José Victorino Damásio, que foi quem consultou a respeito d'esta proposta ou officio.

O sr. José Victorino Damásio introduziu uma modificação no typo dos carris de ferro, e o director do caminho de ferro, acceitando essa modificação, como não podia deixar de acceitar, porque era rasoavel, passou a mandar redigir os desenhos e as condições n'essa conformidade, e convidou as fabricas que, ou já haviam feito propostas

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para o fornecimento de carris, ou aquellas que costumam fabricar esse material.

Depois d'esta adjudicação de fornecimento de carris, fez-se outra de carris de aço a uma casa allemã, e sobre esse adjudicação foi ouvido o conselho das obras publicas, que consultou favoravelmente.

Ouvi aqui dizer, que houve uma fabrica que offerecera carris a 9 1/2 libras por tonelada, e que se adoptara uma offerta de 11 libras.

Ora o illustre deputado, que é muito lido em documentos da imprensa ingleza que dizem respeito ás industrias, se analysar os documentos d'essa epocha, documentos que vem tambem publicados no Times (riso), digo, se o illustre deputado consultar esses documentos ha de ver que o preço corrente dos carris era de 13 a 14 libras, e a proposta que veiu apresentar-se offerecendo os carris a 9 1/2 libras, o mesmo illustre deputado se fosse ministro não a acceitava.

Aqui tem o illustre deputado o que ha a respeito do fornecimento dos carris de ferro. Isto passou pelo corpo consultivo a que tenho a honra de pertencer.

Ora sendo isto assim, não é bom, não é de justiça levantarem-se suspeitas contra funccionarios honrados e distinctos, nem contra o ministro que approva as suas propostas depois de consultar as estações competentes; sem com isto querer dizer que a opposição não deva empregar todos os meios licitos para tirar força ao governo.

Contrista ver um deputado levantar insinuações que podem affectar os creditos de funccionarios distinctos, bem como os dos srs. ministros, que por serem ministros não devem ser tratados n'esta casa por modo differente do que empregam os homens da boa sociedade. Parece-me que isto não é bom. (Apoiados.)

Por esta tendencia de querer fallar pouco é que me não levantei logo da primeira vez que se fallou n'este negocio, de que peço desculpa aos meus collegas; e sinto-me agora satisfeito por expor aqui a questão como ella é e levantar o credito dos meus camaradas e amigos. (Apoiados.)

Parece-me que ha ainda uma outra questão a respeito da qual devo tambem dizer alguma cousa. Trata-se do director do caminho de ferro do sul e sueste.

O sr. Taborda é um official distincto (apoiados), e um funccionario honestíssimo (apoiados). Tem muitos inimigos. Elle é um homem de um aspecto um pouco concentrado e, com tudo, é uma das melhores pessoas que tenho visto, é um perfeito cavalheiro (apoiados); mas como zeloso no desempenho das suas obrigações e no serviço publico... não conheço outro.

Mas o sr. Taborda é director do caminho de ferro e tem por consequencia a seu cargo a estação do Barreiro; e eu pergunto aos illustres deputados se o sr. Taborda precisa de auctorisação do governo, das camaras, das consultas do conselho de obras publicas ou de qualquer pessoa para melhorar a estação do Barreiro!...

(Interrupção que se não percebeu.)

Não precisa, não senhor; porque se o sr. Taborda vir que em consequencia do movimento de passageiros, é de conveniencia e interesse publico pôr-se, por exemplo, uma via de resguardo, póde mandar pô-la, porque é uma cousa

Que está perfeitamente nas suas attribuições e de todos os directores, sem necessidade de vir pedir auctorisação ao ministro nem ao parlamento.

Mas, digam os illustres deputados o que disserem, todos sabem que a estação terminus do caminho de sul e sueste ha de ser no Barreiro, é no Barreiro... (Interrupção.)

Mas a nossa linha ferrea ha de ter a testa n'uma das margens do rio de Coina e ali é que se hão de fazer obras importantes, sendo de certo consultado o conselho de obras publicas.

E quando se tratar do projecto das obras, que ali se tem de fazer, o ar. ministro sabe qual é o seu dever; e se muitas vezes estão affectos á junta consultiva negocios que o sr. ministro podia resolver, estou certo de que quando se tratar d'este assumpto, s. ex.ª ha de ouvir a junta e resolver conforme ella lhe aconselhar.

O sr. Pinheiro Chagas: — Pedi a palavra quando fallava o sr. ministro do reino; 8. ex.ª tem a habilidade de inverter de tal fórma os argumentos doa seus adversarios, ainda mesmo nas cousas mais simples, que nos vemos sempre forçados a fazer rectificações.

Não accusei o sr. ministro por ter nomeado a commissão, applaudi-o por isso, e se o accusei foi por não fazer caso d'ella.

E, finalmente, vejo que o Sr. ministro do reino não affirmou cousa alguma a respeito da questão do theatro nacional, e por consequencia fica tudo como está.

Mas, já que estou com a palavra, vou responder a algumas das considerações que acaba de fazer o sr. Hermenegildo Gomes da Palma, porque á maior parte d'ellas ha de responder o ar. Barros e Cunha.

Mas, por maiores que sejam os esforços do illustre deputado, a. ex.ª não póde demonstrar que não está em absoluta contradicção o seu parecer na junta consultiva com o seu voto n'esta camara, e desde o momento que não havia companhia não havia esses inconvenientes. Desculpe V. ex.ª (dirigindo-se ao sr. Palma); a consulta dizia mais, dizia que todos esses inconvenientes crescem e augmentam muito, sendo o governo proprietario do caminho de ferro do sueste. (Apoiados.) É isto que dizia a consulta assignada pelo sr. Gomes da Palma. Explique e considere 8. ex.ª o seu voto como entender, mas não queira dizer que não estava em contradicção o seu parecer como membro da junta consultiva com o seu voto como deputado.

O ar. Mariano de Carvalho: — Direi apenas duas palavras em resposta ao ar. ministro do reino.

O que se vê é que a situação do concelho de Macedo de Cavalleiros é effectivamente muitissimo anormal. Se tem rasão o partido anomalo que á primeira vista parece ser o partido da auctoridade, se tem rasão o outro que se diz ser da opposição, não o posso dizer n'este momento porque me faltam os esclarecimentos necessarios. Mas o que noto já é uma circumstancia; é que no concelho de Macedo de Cavalleiros estão succedendo factos tão importantes, como o ter sido annullada já por duas vezes a eleição da camara municipal, estarmos em 15 de fevereiro e não estar ainda eleita a camara municipal que devia funccionar ha muito, e o sr. ministro do reino nada sabia a I respeito d'este facto de bastante gravidade, não sabia que a situação d'aquelle concelho era reputada pela propria auctoridade administrativa tão perigosa, que mandou chamar os influentes dos dois partidos procurando concilia-los; não sabia nada d'isto e foi necessario chegar um telegramma do sr. Pessanha pedindo providencias, para que s. ex.ª pedisse informações ao governador civil! S. ex.ª não sabia nada absolutamente e só o soube depois que recebeu o telegramma do sr. Pessanha!

Á conclusão que eu quero tirar é que ou seja por culpa da auctoridade, ou por culpa da opposição, é certo que a situação do concelho de Macedo de Cavalleiros é muitissimo anormal, é certo que é uma singularidade difficil de explicar o silencio e procedimento do governador civil de Bragança.

Agora o sr. ministro do reino está informado de tudo e desde já prometto a s. ex.ª que se não tomar as providencias necessarias para manter a liberdade eleitoral em toda a sua plenitude hei de pedir-lhe severas contas. (Apoiados.)

Não quero entrar na discussão que se suscitou posteriormente, porque comprehendo a necessidade que tem o nosso collega o sr. Barros e Cunha de responder ao sr. Palma; mas de umas palavras que disse o sr. Palma eu concluo que a anarchia vae lavrando em todas as re-

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partições publicas e em todos os ministerios em maiores proporções que eu imaginava.

Segundo o regulamento do ministerio das obras publicas, os engenheiros nem as grandes reparações podem fazer sem auctorisação superior; entretanto o director do caminho de ferro do sueste tem mandado fazer movimentos de terra para obras futuras, obras que se hão de fazer, que se não sabe quaes são e de que não ha projectos, sem auctorisação superior. Quem lhe deu auctorisação para melhorar a estação?

E claro que as informações do sr. Palma não são exactas ou então o sr. ministro das obras publicas está tolerando que o director do caminho de ferro do sueste falte ao respeito que deve a s. ex.ª, e ainda mais, ao respeito que deve ás leis d'este paiz.

Em todo o caso o que é necessario é que a respeito d'estas obras no Barreiro, é que a respeito do dinheiro que se gasta com ellas o sr. ministro dê explicações cathegoricas perante a camara. (Apoiados.)

(S. ex.ª, não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro do Reino: — O sr. ministro das obras publicas já está presente, e se os outros meus collegas ainda não o estão, é porque se acham occupados n'outro serviço.

Elogia-me a opposição pela minha assiduidade. Não é para me fazer justiça, é para censurar os meus collegas. Não posso, pois, agradecer o louvor, nem acceita-lo sem reserva.

Se na camara dos pares me fizessem a mim igual censura pela falta da minha presença, seria tão injusta como é o louvor que aqui me querem dar.

(Apartes.)

Muitas vezes vem aqui os meus collegas e os illustres deputados agora interpellantes não comparecem então.

Parece-me que, em logar de estarem a chama-los para conversarem com elles, era melhor, sendo os negocios graves, formularem as devidas notas de interpellação (apoiados); e é aliás o que manda o regimento.

O sr. Barros e Cunha: — Está uma annunciada ha mais de um mez ao sr. ministro da fazenda, e ainda não teve resposta.

O Orador: — Não está annunciada nenhuma ao sr. ministro das obras publicas. Está annunciada uma ou mais ao sr. ministro da fazenda, mas ao sr. ministro das obras publicas é que têem querido martyrisar; ora, parece-me que não ha n'isto igualdade.

Parece-me, repito, que era melhor para todos e mesmo para os negocios publicos, que se annunciassem as devidas interpellações.

Agora, quanto á questão de Macedo de Cavalleiros, a que o sr. Mariano de Carvalho tornou a referir-se, eu não tenho que saber quando a eleição municipal de uma freguezia foi annullada. Para que me hei de eu estar a occupar d'aquillo que me não compete resolver?

Parece-me que se estranhou que não viessem individuos de fóra da assembléa de Moraes intervir n'ella. Creio que o accordo proposto pelo governador civil era um meio conciliador e coherente; comtudo uma parcialidade quiz ser intransigente. Seja-o á sua vontade; eu não posso concilia-la á força.

Aqui tem o illustre deputado o que posso dizer a respeito das suas observações.

Eu creio que a liberdade ha de ser mantida.

Quanto á interrupção a respeito da pessoa do governador civil de Bragança, ex-commissario do Porto, direi sómente que remetti ao poder judicial uma syndicancia a que mandei proceder. O poder judicial ao qual foi remettida não achou que condemnar. O que hei de eu fazer? Querem que usurpe as attribuições do poder independente para castigar os que elle não achou culpados?

Não póde ser.

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Pedi a

palavra quando o sr. Barros e Cunha, na ausencia do sr. ministro das obras publicas, dirigiu algumas insinuações um pouco desagradaveis a s. ex.ª

O meu fim unicamente pedindo a palavra, e declarar ao sr. Barros e Cunha, que é um deputado muito antigo, que quando se quer chamar mais especialmente a attenção do governo sobre qualquer objecto importante, manda-se uma nota de interpellação para a mesa, que se discute quando os srs. ministros se dão por habilitados. Entretanto parece-me que o sr. Barros e Cunha prefere o systema que tem seguido até agora a este que é natural e parlamentar.

Nada mais tenho a dizer. (Apoiados.)

O sr. Barros e Cunha: — Principio pelo fim. Tenho a dizer ao meu illustre e honrado amigo o sr. visconde de Sieuve de Menezes, que por ora a interpellação que se realisou n'esta casa foi a minha; e que se não tenho feito mais interpellações sobre assumptos igualmente graves, é porque os documentos que tenho pedido não me têem sido remettidos; porque em outro assumpto annunciei igualmente interpellação no mesmo dia em que o sr. ministro da fazenda me remetteu os documentos que se referiam á questão dos assucares.

Por consequencia, já vê o sr. visconde de Sieuve de Menezes, que eu não tenho o systema exclusivo, em vez das interpellações, nem prefiro outro qualquer systema a que s. ex.ª se referiu, mas uso de ambos reunidos, e não uso de mais alguns porque não está nas disposições regimentaes.

V. ex.ª comprehende que me não era possivel deixar de responder ás considerações, ou por outra, á resposta que o sr. Hermenegildo Gomes da Palma offereceu ao que eu disse em relação a s. ex.ª

S. ex.ª disse que eu tinha feito uma insinuação ao seu voto como membro da junta consultiva em desharmonia com o seu voto como membro da camara dos deputados. Isto póde chamar-se tudo quanto quizerem, menos insinuação.

Referi-me a um documento publico assignado por s. ex.ª, declarando que estimava mais o seu voto como membro da junta consultiva, do que a explicação que me dava n'aquella occasião, e não disse que estava em contraposição o seu voto na junta consultiva com o seu voto como membro da camara dos deputados, mas sim com a explicação que b. ex.ª me dava.

Não tratei de fazer insinuação alguma, não fiz insinuação a ninguem.

No que vim dizer não me referi ao sr. director do caminho de ferro do Minho nem remotamente, porque não foi nem no Douro nem no Minho que se fez a arrematação, adjudicação ou contraio dos carris de ferro de que se trata, mas sim em Lisboa no ministerio das obras publicas.

Pelo menos é d'isso que se queixam as pessoas que declaram que tendo feito offertas, propostas mais vantajosas para o thesouro, essas propostas não foram attendidas.

O que eu entendo é que o governo deve á camara dos deputados explicação do systema porque fez estes contratos, se por acaso usou do meio do concurso, ou se o fez em particular. Isto não é injurioso para pessoa alguma.

Tenho feito esta pergunta, tenho pedido explicações, a culpa não é minha se não têem sido dadas.

Como está presente o sr. ministro das obras publicas, vou reproduzir o que disse na ausencia de s. ex.ª

Eu disse que estando o governo a proceder a obras no Barreiro, onde deve ser a estação terminus da linha ferrea do sul e sueste para collocar aquella estação em condições de poder competir com a concorrencia que lhe póde fazer a linha que o governo gratuitamente concedeu ao sr. Filippe de Carvalho, desejava saber em virtude de que auctorisação estava o governo procedendo a essas obras; e se o governo não estava procedendo a ellas, pergunto para

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quando reserva trazer á camara dos deputados as propostas para ser auctorisado a collocar effectivamente o Barreiro em condições de poder vantajosamente competir com o sr. Filippe de Carvalho. Esta é a minha questão.

O governo não podia dar gratuitamente ao sr. Filippe de Carvalho a ligação com uma rede, com uma linha de caminho de ferro de primeira classe, pertencendo ao estado, para deixar, por falta de providencias, que reconhecidamente são indispensaveis, que o proprio sr. ministro reconhece, de fazer as obras necessarias para que o sr. Filippe de Carvalho não venha fatalmente a impor-se como um obstaculo a qualquer contrato que o governo queira fazer para a alienação do caminho de ferro do sul, ou para desviar o rendimento d'essa linha no caso do governo querer conserva-la sob sua administração.

Esta explicação é que desejo, e deseja-a commigo a opinião do paiz, que vê de certo com desagrado que se passe de leve sobre questão tão importante, a qual não perdeu nada por a camara ter julgado em uma votação que as explicações do sr. ministro das obras publicas a satisfaziam completamente; e tanto que o sr. Pinheiro Chagas apresentou uma nova allegação do concessionario, o qual declara que se não se concedeu ao sr. Jorge Elliott o que se concedeu a elle Filippe de Carvalho, era porque a ligação com a linha do caminho de ferro do sul, como aquelle propunha, ía prejudicar os interesses da linha do estado. Isto acaba elle de publicar ha pouco tempo n'um jornal de que é proprietario, e que está especialmente ao serviço do governo.

Eu não mando nota de interpellação senão quando os assumptos a reclamam. Este assumpto não precisa por ora nota de interpellação, precisa de explicações.

Eu não trato de fazer d'isso questão politica. A opposição perdeu a questão politica; ella resigna-se perfeitamente com o que a sorte lhe destinou; a questão foi considerada questão politica, mas ha outra questão que é os interesses nacionaes e o modo de manter a propriedade do estado livre de qualquer concorrencia ou prejuizo que lhe possa fazer um concessionario particular. E mais tarde, porque eu tenciono não levantar mão d'este assumpto, direi o mais que tenho a dizer ácerca d'elle, que não tem tão pequena importancia como se pretende aparentar, para adormecer a fiscalisação publica no interesse que o paiz deve ter para defender as propriedades nacionaes.

Tenho de renovar igualmente a declaração que fiz referindo-me ao sr. ministro dos negocios estrangeiros.

Quando aqui trouxe o negocio do sr. duque de Saldanha, teve em vista saber que difficuldades havia sobre o nosso ministro na corte de Londres, e não individualmente á pessoa do sr. duque de Saldanha, que estava no seu direito de dispor de uma concessão que era sua e com a qual eu nada tenho.

O sr. ministro dos negocios estrangeiros, respondendo-me, disse que não era exacto que o sr. duque de Saldanha estivesse implicado em cousa alguma nos negocios da companhia, representada por Alberto Grant, porque tinha traspassado o caminho de ferro e nada tinha com a companhia.

Não nego que isto seja exacto, mas o que digo é que, não corresponde rigorosamente ao que dizem os programmas que se distribuiram na occasião em que se tratou d'este negocio.

O sr. duque de Saldanha representa como director aquella companhia, e por consequencia tem a mesma responsabilidade que tem Alberto Grant.

Creio que a boa fé do sr. duque de Saldanha foi surprehendida, porque estou certo que se elle soubesse que lhe adviriam consequencias tão desagradaveis, não teria tomado parte alguma na direcção d'aquella empreza.

Faço esta declaração, porque se tem querido fazer figurar o meu nome como sendo instrumento de odio ou animadversão contra o sr. duque de Saldanha, que eu não tenho, assim como não tenho contra pessoa alguma.

Eu entendo que o ministro de Portugal em Inglaterra é o ministro de Portugal em Inglaterra e não póde ser outra cousa.

Tenho concluido.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Cardoso Avelino): — Poucas palavras direi em resposta ao sr. Barros e Cunha.

S. ex.ª tratou de dois assumptos. O primeiro era relativo ao contrato para o fornecimento dos carris para os caminhos de ferro do Douro e Minho.

A este respeito, pelo que eu li no discurso de s. ex.ª, publicado no Diario da camara, ha completa inexactidão, por defeito das suas informações, e isto seguramente contra a sua vontade.

A questão, como a camara facilmente percebe, é muito importante para os interesses do thesouro, e não póde ser esclarecida com as explicações que eu possa aqui dar, e mesmo a camara não tem obrigação de confiar na minha palavra.

Todos estes negocios têem um processo no ministerio das obras publicas. O processo que se refere a este negocio lá está; e desde o momento em que s. ex.ª queira fazer um exame sobre elle, póde pedir os documentos que quizer, que eu mando-os immediatamente para a camara.

Pôde depois fazer uma nota de interpellação a este respeito, que eu desde já me declaro habilitado a responder ao illustre deputado, a fim de que a camara possa ficar esclarecida e fazer o seu juizo sobre se os interesses do thesouro foram ou não descurados, e se a adjudicação foi feita no Porto ou em Lisboa.

Repito, eu podia informar a camara desde já do processo que seguiu este negocio, mas a camara tem o direito de conhece-lo todo, e eu o mandarei quando for requerido. Será tambem publicado, se a camara o entender, e então s. ex.ª terá occasião de com justiça, e com os fundamentos todos do proprio processo, verificar a sua interpellação.

Quanto ás obras do Barreiro, a camara sabe muito bem que esse negocio se tratou aqui quando se discutiu a questão do ramal de Cacilhas ao Pinhal Novo.

O governo mandou proceder a estudos para fixar definitivamente no Barreiro o terminus da linha do sul e sueste; esses estudos ainda não foram feitos, mas quando o forem, serão submettidos á junta consultiva, e só depois d'isso é que o governo está habilitado para pedir ao parlamento as auctorisações precisas. (Apoiados.)

As obras que se fazem na estação do Barreiro, são iguaes aquellas que se fazem em todas as estações, em face do direito que o governo tem como explorador e conservador d'aquella linha. (Apoiados.)

O governo tem feito obras em todas as estações d'aquella linha, porque as recebeu em muito más condições; porque não havia caes cobertos para mercadorias, não havia armazens, e porque emfim o movimento tem crescido, principalmente na estação do Barreiro.

O governo não precisava de auctorisação alguma especial para estas obras, porque ella está no decreto em que o governo foi auctorisado a explorar a linha, e por consequencia, a fazer-lhe as obras indispensaveis ao serviço da exploração.

Agora a grande obra de aproveitar a doca natural que ali existe; a de melhorar definitivamente as condições de embarque e desembarque no rio de Coina, para fazer no Barreiro a estação definitiva da linha do sul e sueste, essa depende de um projecto que se está elaborando, que ha de vir acompanhado dos necessarios estudos, e é então que o governo, tendo ouvido a junta consultiva, ha de pedir ao parlamento a auctorisação e os meios necessarios para a sua construcção.

Tenho dito.

(S. ex.ª não reviu as notas tachygraphicas.)

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ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Passa-se á ordem do dia. Entra em discussão o projecto n.º 150. Vae ler-se.

É ò seguinte:

Projecto de lei n.º 150

Senhores. — A commissão de administração publica, tendo examinado attentamente a proposta de lei n.º 59-B, vem dar-vos sobre ella a seu parecer.

Tem ella por fim completar o pensamento enunciado na lei de 14 de junho de 1871, que creou os logares de agrónomos de districto. Sendo por aquella lei facultativo ás juntas geraes o estabelecer agrónomos nos seus districtos, apenas quatro pediram a sua creação.

Este facto não revela, por certo, desconhecimento da summa importancia que tem para a agricultura a diffusão do ensino theorico, que deve sempre acompanhar as praticas agrarias, para que aquella importantissima industria se eleve ao aperfeiçoamento que exigo.

A satisfação de outras necessidades, tambem imperiosas e imprescriptiveis, a cargo dos districtos, demanda avultadas despezas, sempre crescentes com as exigencias do progresso, e as juntas geraes têem sido forçadas a preterir este e outros melhoramentos de primeira ordem para não aggravarem os encargos districtaes.

Infelizmente ainda ha n'este paiz muitos descrentes nas vantagens do ensino theorico para a agricultura, que por isso quasi em toda a parte jaz ainda manietada ao empirismo e á rotina, que a não deixam seguir o caminho que lhes apontam as praticas aperfeiçoadas e as innovações da sciencia agronómica.

E forçoso pois evangelisar entre nós os principios da sciencia agricola; apostolar a conveniencia de levar ao centro das povoações ruraes o conhecimento dos processos aperfeiçoados; conquistar para o progresso da agricultura os que n'elle ainda descrêem, mostrando-lhes experimentalmente a conveniencia de alliar a theoria á pratica.

Serão os agrónomos os apostolos d'esse utilissimo pensamento; os missionarios que, desbravando a ignorancia que, por mal da nossa agricultura, a domina ainda, levarão com a palavra e com a experiencia a convicção aos infiéis para com a religião do progresso agricola.

A creação forçada dos agrónomos districtaes deve ser um poderoso elemento para melhorar as condições agricolas do nosso paiz.

Mais tarde virão outras medidas completar o pensamento grandioso dos que vêem no desenvolvimento e progresso da nossa agricultura a principal base da nova regeneração moral, politica e economica.

Pareceu porém conveniente á vossa commissão que desde já se auctorisasse o governo a dar nova organisação ás sociedades agricolas, de maneira a satisfazer ao fim que presidiu á sua creação.

A vossa commissão não se demora a encarecer-vos as vantagens de crear os agrónomos districtaes.

As considerações que justificaram a lei de 14 de junho de 1871 vem ainda motivar a proposta de lei que o governo vos apresentou.

Se são uteis e necessarios mesmo os agrónomos districtaes, é forçoso tornar preceptivo o que por aquella lei era apenas facultativo. A experiencia de quatro annos abona a medida que hoje se vos propõe.

Pareceu porém justo á vossa commissão que áquelle encargo, que vae pesar sobre os districtos, correspondesse tambem alguma attribuição. É por isso que ella vos propõe que a nomeação dos agrónomos seja da junta geral, confirmada pelo governo.

Como ficam especificadas as habilitações que se exigem para os agrónomos, não póde haver duvida em conceder ás juntas geraes o direito de escolha, salva a confirmação do governo.

Por estas considerações a vossa commissão, • de accordo

com o governo e tendo ouvido a illustrada commissão de agricultura, entende que deve merecer a vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Em cada um dos districtos administrativos do reino e ilhas adjacentes haverá um agrónomo nomeado pela junta geral e confirmado pelo governo, sendo o seu ordenado pago pelo cofre districtal.

§ 1.° Unicamente poderão ser nomeados agrónomos districtaes os individuos que se mostrarem habilitados com diploma de curso completo no instituto geral de agricultura, ou com diploma de curso completo em escolas agricolas estrangeiras de igual categoria, se tiverem n'ellas obtido qualificações distinctas.

§ 2.° Os agrónomos de districto vencerão o ordenado de 500$000.

Art. 2.° As juntas geraes, no exercicio das attribuições que lhes confere o artigo 216.°, n.ºs III e IV do codigo administrativo, são obrigadas a votar no orçamento annual a receita e despeza necessarias para pagar o ordenado do agrónomo e para melhoramentos agricolas no districto.

Art. 3.° O governo, sobre consulta do conselho do instituto geral de agricultura, decretará em regulamento especial:

1.° Os direitos e obrigações, assim das juntas geraes, como dos governadores civis, com relação aos melhoramentos e necessidades agricolas do districto;

2.° As funcções que n'este ramo de administração publica devem desempenhar, e o auxilio que devem prestar ás sociedades agricolas;

3.° As obrigações e os direitos dos agrónomos do districto, a sua responsabilidade e modo de lh'a tornar effectiva nos termos das leis geraes;

4.° Os meios de promover o melhoramento das condições agricolas dos districtos;

5.° E todas as demais providencias para que seja efficaz e util a execução d'esta lei.

Art. 4.° Promulgada a presente lei e publicado o regulamento, a que se refere o artigo 3.°, se abrirá concurso documental, pelo ministerio das obras publicas, commercio e industria, para approvação e classificação dos individuos que podem ser nomeados agrónomos de districto.

§ 1.° Igual concurso e para os mesmos fins será aberto no mez de dezembro de cada anno.

§ 2.° No regulamento ordenado pelo artigo 3.° se determinará o processo d'estes concursos.

Art. 5.° Fica o governo auctorisado a organisar convenientemente as sociedades agricolas districtaes, de modo a predominar n'ellas o elemento agricultor.

Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão, em 29 de março de 1875. = Jacinto Antonio Perdigão = Thomás Ribeiro = Francisco Van-Zeller = Augusto Correia Godinho Ferreira da Costa = Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel = Jeronymo da Cunha Pimentel, relator.

A commissão de administração publica envia á illustre commissão de agricultura a proposta de lei n.º 59-B, para sobre ella dar o seu parecer interlocutorio.

Sala das sessões da commissão, 9 de março de 1875. = = Jeronymo da Cunha Pimentel, relator.

Senhores. — A vossa commissão de agricultura, achando muito conveniente a proposta do governo n.º 59-B, é de parecer que ella seja convertida em lei.

Sala das sessões, 14 de março de 1875. = Visconde de Sieuve de Menezes = João Maria de Magalhães = Augusto Cesar Falcão da Fonseca = Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos = Joaquim José Figueiredo Faria = Jeronymo da Cunha Pimentel, relator.

O sr. Pedro Franco: — Mando para a mesa uma proposta de adiamento a este projecto. (Leu.)

Temos a mesma questão da instrucção publica. Não me

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opponho a que se crie em cada districto um agrónomo, mas o que não sei é como as camaras municipaes poderão pagar a esses agrónomos.

Temos vinte e um districtos administrativos, para cada um cria-se um agrónomo que recebe o ordenado de réis 500$000, são por consequencia mais 10:500$000 réis de encargos para os municipios, fera o preciso para melhoramentos agricolas!

No artigo 2.° d'este projecto diz-se que as juntas geraes derramarão em conformidade do n.º 4.º do artigo 216.° do codigo administrativo a receita precisa para pagar aos agrónomos, e note-se, e para melhoramentos agricolas no districto! E d'onde ha do vir a receita para tanto encargo?

Ora, realmente acredito muito nas palavras do sr. ministro do reino e nas dos meus dignos collegas, de que a reforma administrativa ha de vir este anno á tela da discussão; mas como já fizeram iguaes promessas no anno passado, peço licença para dizer a s. ex.ªs que receio que isso torne a acontecer.

Entendo, pois, que as camaras municipaes não podem occorrer a estas despezas, sem que primeiro se lhes votem os meios necessarios, e era por isso que desejava que viesse primeiro a reforma administrativa.

Mando, pois, a minha proposta para a mesa.

É a seguinte

Proposta

Proponho o adiamento do projecto de lei n.º 150 de 1875, emquanto se não votar n'esta casa a reforma administrativa. = Pedro Augusto Franco.

Foi apoiado o adiamento e entrou em discussão.

O sr. Jeronymo Pimentel: — Confiando na importancia do assumpto e na necessidade de attender á instrucção agricola, tão necessaria no nosso paiz, não esperava que este projecto fosse combatido. É verdade que talvez devesse esperar opposição da parte do sr. Pedro Franco, que se apresenta n'esta casa, o paladino das administrações locaes.

Todo o projecto que aqui se discutir e que importar augmento de despeza para as localidades, encontra sempre de frente o sr. deputado por Belem, embora esse projecto seja de incontestavel importancia para o paiz.

Como o illustre deputado não combateu o projecto e apenas propoz o adiamento, fundado em não saber d'onde é que hão de vir os meios com que as camaras hão de satisfazer aos encargos que vem d'este projecto, não tenho necessidade de o sustentar, mas só de combater o adiamento.

S. ex.ª não reparou de certo que não são as camaras as encarregadas de satisfazer essas despezas, mas sim as juntas geraes.

A camara sabe que o serviço dos agrónomos é indispensavel para bem da nossa agricultura, e por isso demorar a satisfação d'essa necessidade, é uma grande inconveniencia, que nenhuma rasão justifica.

A questão do sr. Pedro Franco limita-se ao adiamento do projecto emquanto não vier a reforma administrativa; mas o que tem a reforma administrativa com este projecto?

Aquella reforma não é uma nova fonte de receita para os districtos; de certo ha de alargar a area das attribuições das juntas geraes, mas não póde ser para ellas uma mina de novos recursos.

Os meios para fazer face a este encargo vem da mesma origem que vem os outros para os mais encargos que as juntas geraes são obrigadas a satisfazer.

Não vejo, pois, necessidade de adiar o projecto até que venha a reforma administrativa.

Portanto, por parte das commissões de administração e de agricultura, não posso acceitar a proposta de adiamento.

Como o projecto não foi combatido não direi mais nada, mas estou prompto a sustenta-lo, se o sr. deputado ou outro qualquer o impugnar.

O sr. Pedro Franco: — Acabei de ouvir o sr. relator da commissão, e parece-me que ambos abundamos nas mesmas idéas.

O nobre deputado acaba de dizer que os meios para fazer face a este novo encargo, vem da mesma fórma que os que são votados para os outros encargos que pesam sobre as camaras; mas as camaras têem já tantos encargos, que eu não sei d'onde hão de vir os meios para occorrer a mais este.

Reconheço a utilidade do projecto, mas desejava que o illustre relator me dissesse como as camaras hão de crear mais receita para poderem occorrer ás suas despezas e a mais esta: e diga o illustre deputado d'onde hão de vir os meios para pagar o ordenado de 500$000 réis aos agrónomos, e a despeza precisa para melhoramentos agricolas, que ainda se não sabe a quanto montará?

Disse tambem o illustre deputado que a despeza é districtal e não municipal. Peço perdão: o projecto diz o seguinte. (Leu.)

Ora o artigo 216.° do codigo é bem claro, tenho-o aqui, e vou le-lo á camara. (Leu.)

D'aqui se deduz que, em as juntas lançando a derrama ás camaras, ou ellas hão de pagar, ou o governador civil, por um alvará, exige-o dos thesoureiros das camaras, cá está tambem previsto no codigo.

¦ De modo que as camaras municipaes ficam obrigadas a satisfazer esta quantia, embora s. ex.ª lhe chame districtal, é o districto que paga, mas são as camaras municipaes que pagam para o districto, mas não sei a maneira de satisfazer aos encargos.

Estou de accordo na necessidade da creação dos logares de agrónomos, mas não estou de accordo no modo das camaras municipaes satisfazerem esses encargos; entendia que o governo ou a junta geral é que devia satisfaze-los, sem onerar as camaras.

Não acceitando esta condição, limito-me a votar contra o projecto.

O sr. Mariano de Carvalho: — Voto contra o projecto, mas não me opponho ao seu pensamento. Preferia antes o pensamento enunciado na lei de 14 de junho de 1871 para a creação dos logares de agrónomos.

Pela lei de 1871 as juntas geraes tinham a faculdade de, quando julgassem conveniente, crear o logar de agrónomo, quando d'ahi resultasse vantagem, e assim com facilidade os districtos pagavam o encargo. Agora pretende-se impor um agrónomo ás juntas geraes, redundando em augmento de despeza para as camaras, despeza com que muitas d'ellas não podem. Portanto voto contra o projecto.

Como sei que quer vote contra ou a favor elle ha de ser approvado (apoiados), não me canso em demonstrar largamente os inconvenientes que da approvação do projecto hão de resultar.

A querer alguma cousa util, parece-me que seria de muito agrado que ao sr. ministro da marinha e ultramar se desse auctorisação para crear estes logares em algumas das nossas possessões ultramarinas; porque vejo em todos os relatorios dos governadores geraes do ultramar notada a necessidade e conveniencia da existencia de um agrónomo n'aquellas possessões, e especialmente no do illustre cavalheiro governador de Cabo Verde.

O sr. governador geral insistiu pela nomeação do logar de agrónomo para aquella provincia. Mas eu entendo que deve haver um em cada uma das nossas possessões ultramarinas, não só pelos grandes serviços que podem prestar á agricultura, como pelos muitos esclarecimentos que podem fornecer aos homens de sciencia, que vão ali tentar a exploração dos ricos productos d'aquelles terrenos. Mando a minha proposta para a mesa, e peço que sobre ella seja ouvida a commissão.

(O sr. deputado não reviu as notas tachygraphicas.)

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Leu se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que ao projecto se junte o seguinte artigo: «Em cada uma das provincias ultramarinas haverá um agrónomo, pago pelo cofre da provincia e nomeado pelo governo, com o vencimento de 900$000 réis. Estes agrónomos serão nomeados com as mesmas condições, attribuições e deveres, que os agrónomos districtaes.» = Mariano de Carvalho. Foi admittida.

O sr. Ministro da Marinha (Andrade Corvo): — Pedi a palavra para dizer que o governo se occupa de desenvolver os estudos scientificos nas nossas colonias; o tanto que ultimamente fez um contrato com naturalistas estrangeiros para uma exploração scientifica nas nossas possessões.

Quanto á proposta especial do sr. deputado, eu, por parte do governo, acceito a.

O sr. D. Miguel Coutinho: — Não tencionava usar hoje da palavra; mas sendo eu opposição ao actual governo, e votando este projecto que é da sua iniciativa, entendi dever explicar á camara e ao paiz a rasão do meu voto. Por isso pedi a palavra.

Estou inteiramente convencido que o futuro do nosso paiz depende da terra, que é inquestionavelmente uma das fontes mais seguras da riqueza de qualquer povo, se os que tem de a laborar conhecerem os meios mais adequados ao seu cultivo. Em Portugal o progresso tem invadido e melhorado mais ou menos todas as industrias; só a industria agricola deixou paralysada.

Sr. presidente, os melhoramentos d'este importantissimo ramo de industria humana tem sido pouco comprehendidos e ainda menos executados entre nós. E isto deve-se, na minha humilde opinião, á falta de instrucção technica que não deixa comprehender as vantagens dos novos inventos: aos habitos adquiridos que passam como herança de paes para filhos, e que constituem uma forca terrivel, porque só oppõem a sua inercia e indifferença aos raciocinios contrarios; aos erros de alguns que sem criterio sufficiente para comprehender os casos uteis da applicação de um novo systema alteram o methodo antigo, inconscientemente, não colhendo por isso os resultados esperados.

Sr. presidente, luta a nossa industria agricola com innumeraveis difficuldades; as maiores, e que mais de perto a asfixiam, são a falta de capitães, que sempre avidos de grandes lucros fogem d'estas industrias, e a ignorancia. Deixemos pois que a luz da sciencia venha esclarecer com o seu brilhante reflexo os enganos dos menos prudentes, afastar indecisões e vencer preconceitos! Bem basta a pouca protecção que a industria agricola tem sempre tido da parte de todos os governos d'este paiz!

E explicada fica assim a rasão do meu voto. Tenho fé, e muita, nas transformações que a sciencia bem dirigida póde operar na nossa industria agricola.

Emquanto ao adiamento proposto pelo meu collega e amigo o sr. Pedro Franco direi apenas duas palavras expondo a rasão porque o não voto.

É verdade que o projecto vae sobrecarregar as camaras municipaes, mas tambem é verdade que pela disposição da lei que hoje vigora todos os districtos podem crear agrónomos, e muitos d'elles têem usado d'esta auctorisação, e têem, sem difficuldade nem opposição dos povos, creado a receita para os encargos que contrahiram com a instituição da agronomia.

Já vê, pois, o meu illustre amigo que para fim tão util os povos não se recusarão hoje a satisfazer encargos, que em muitos districtos já existem.

E termino aqui as minhas considerações que só tiveram por fim explicar o meu voto.

O sr. Pedro Franco: — Em vista das explicações dadas pela meu collega o sr. D. Miguel Coutinho, peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se consente que eu retire a minha proposta de adiamento.

Consultada a camara resolveu afirmativamente e em seguida foi approvado o projecto na generalidade.

O sr. Presidente: — Ao artigo 1.° offereceu o sr. Mariano de Carvalho uma proposta.

E costume serem remettidas á commissão todas as propostas apresentadas a qualquer projecto em discussão, mas como o governo declarou que a acceitava, vae ler se para se votar.

Leu se e foi approvada conjunctamente com o artigo. Seguidamente foram approvados sem discussão os artigos 2.°, 3.°, 4.º, 5.° e 6.°

Entrou em discussão o projecto n.º 9 d'este anno. E o seguinte:

Projecto de lei n.º 9

Senhores. — A commissão de instrucção publica tem a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o parecer ácerca da proposta de lei n.º 80-A, de iniciativa do governo, para creação de uma cadeira especial de pathologia geral e semeiologia, nas escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto.

Ha muito que estas escolas reclamam o desdobramento das materias da quarta cadeira, que, segundo é disposto no artigo 88.º do decreto de 23 de abril de 1840, abrange o ensino da pathologia geral, pathologia e therapeutica cirúrgica e a anatomia pathologica descriptiva correspondente.

A impossibilidade de bem leccionar no curto espaço de um anno lectivo tão importantes e diversas doutrinas justifica o empenho constante dos conselhos cathedraticos das duas escolas, para a creação de uma cadeira especial de pathologia geral e semeiologia, como propõe o governo, em que possa desenvolver-se o ensino do diagnostico por todos os processos modernos, que podem levar o medico á precisão dos seus juizos; taes são a ophtalmoscopia, a laryngoscopia, a esthetoscopia, a microscopia, o emprego das sondas, dos especulos, do sphymographo, a analyse dos liquidos normaes e pathologicos, etc. etc.. cujo estudo, sem o desdobramento pedido pelas duas escolas medico-cirurgicas, e proposto pelo governo, é incompleto e insufficiente.

Não podendo o governo, por falta de providencia legislativa, levar a effeito este importante melhoramento para o ensino medico; mas querendo remediar uma tão grande falta, accedeu a uma proposta das duas escolas, auctorisando n'ellas a regencia gratuita da nova cadeira por um dos substitutos. Ha cinco annos que nas escolas medico-cirurgicas está d'este modo realisado o desdobramento das importantes e diversas disciplinas da quarta cadeira, e ha tambem cinco annos que a experiencia tem mostrado as vantagens da nova cadeira.

Mas não deve continuar o estado provisorio de tão importante melhoramento, não só porque os substitutos não são obrigados, perante a lei, a um encargo constante e gratuito, que os impossibilita de concentrar as suas faculdades no estudo das materias de outras cadeiras, que legalmente são chamados a substituir; mas porque seria comprometter o ensino, deixando de acompanhar com elle o progressivo aperfeiçoamento das sciencias medicas.

A vossa commissão foi tambem presente uma representação da faculdade de medicina da universidade de Coimbra, pedindo que o melhoramento, proposto pelo governo para as duas escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto, seja tambem concedido á dita faculdade; porque sendo igual nos tres estabelecimentos a accumulação de tão importantes e diversas disciplinas, iguaes são os motivos para a reforma. E acrescenta a mesma faculdade que á nova cadeira de pathologia geral se póde ajuntar o estudo da historia da medicina, assumpto importantissimo, que já em consulta de 28 de janeiro de 1867 ao governo de Sua Magestade a faculdade propozera para entrar no quadro dos seus estudos.

E considerando a vossa commissão que é de justiça do

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tar os tres estabelecimentos com o melhoramento proposto pelo governo, e que igualmente convem desdobrar da cadeira de pathologia interna para a de pathologia geral, o estudo da historia da medicina, como tambem já foi pedido por parte das escolas medico-cirurgicas, com o que muito aproveitará o ensino, é esta commissão de parecer que seja convertido em lei o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E creada na faculdade de medicina da universidade de Coimbra e nas escolas medico-cirurgicas de Lisboa e do Porto uma cadeira especial de pathologia geral, semeiologia e historia da medicina.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão de instrucção publica, em 15 de março de 1875. — Diogo Pereira Forjaz de Sampaio Pimentel — Julio Marques Vilhena — Antonio José Teixeira — Manuel Pinheiro Chagas = Augusto Maria da Costa e Sousa Lobo = Illidio Ayres Pereira do Valle = Manuel Joaquim Alves Passos, relator.

Senhores. — A vossa commissão de fazenda, de accordo com a resolução que já havia tomado na sessão anterior, é de parecer que não ha inconveniente na approvação d'este projecto.

Sala da commissão, aos 29 de janeiro de 1876. = Visconde de Guedes Teixeira = Joaquim José Gonçalves de Matos Correia — Antonio José Teixeira = Antonio Maria Barreiros Arrobas — Visconde da Azarujinha = A. C. Ferreira de Mesquita = Antonio Maria Pereira Carrilho.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Neves Carneiro: — Mando para a mesa o parecer da commissão de verificação de poderes declarando vagos alguns logares de deputados.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada, começando pela discussão do orçamento da despeza do estado.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

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