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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

podiam ter sido consideradas muitas das cousas que disse, facilmente, e sem objecção.

Agora creio que é tarde, e que nós não podemos estar a renovar uma discussão finda, porque seriam assim interminaveis as questões e nunca chegaria cousa alguma ao seu termo.

O sr. José Luciano de Castro achou que nós não poderemos acabar esta empreza, e creio que a julgou superior ás nossas forças. Mesmo porque a empreza é boa, não me parece que a descrença d'elle seja motivo para nós esmorecermos, devo ser antes incentivo para levarmos a cabo aquillo que se reconhece bom.

Eu tambem não penso que esta reforma seja a ultima palavra que se possa dizer a respeito dos assumptos de que ella trata, terá talvez algumas imperfeições que com o tempo se hão do corrigir; mas uma vez que ella tem disposições boas, uma vez que tem disposições acceitaveis, uma vez que é bastante descentralisadora approvemol-a, porque sempre com isso aproveita o paiz alguma cousa; e não estejamos a esperar pelo optimo, porque muitas vezes é o inimigo do bom.

Notou o illustre deputado, e comtudo achou bom, que eu desistisse da circumscripção administrativa igual á judicial.

O meu ideal é ainda aquelle. Desejaria que o concelho tivesse a mesma area da marca, que o recebedor, e o magistrado administrativo residisse onde reside o recebedor e o juiz da comarca, que o thesoureiro do districto fosse o thesoureiro pagador, tudo isto harmonicamente; mas fui obrigado a sacrificar á ordem publica uma idéa que me parece excellente.

E devo dizer que esta idéa não é orginariamente minha. Esta idéa estava n'uma proposta apresentada em 1863 pelo sr. Anselmo José Braamcamp á camara electiva.

Se essa reforma não póde ser levada a effeito, não se segue que a idéa não fosse boa.

Notou mais o sr. José Luciano de Castro como uma grande imperfeição a faculdade de dissolver as camaras municipaes.

Minghetti, tratando em Italia da reforma administrativa, e tocando este ponto, disse que lhe parecia altamente inconsequente que se podesse dissolver a camara dos deputados e não se podesse dissolver uma camara municipal.

Eu devo declarar que em cinco annos e meio que estive no poder dissolvi duas camaras municipaes, e nenhuma d'ellas foi dissolvida por motivos politicos; ambas foram dissolvidas por erros de administração, sendo os seus vereadores entregues ao poder judicial.

Os abusos não tem sido frequentes, e eu admiro-me de ouvir esta doutrina a um sr. deputado que pertence a um partido que ainda ha poucos dias dava os seus applausos a uma imprensa que sustentava o direito da dissolução da camara municipal de Lisboa, e até quasi o de serem apedrejados os seus vereadores. (Apoiados.)

Àpplaudir a dissolução n'este caso, e notar agora os inconvenientes que podem vir da possibilidade de qualquer dissolução, não me parece muito coherente. (Apoiados.)

Não defendi essa dissolução, mas tambem não a ataquei, porque julguei que o governo estava no seu direito, ainda que eu não teria talvez usado d'elle.

O direito da dissolução é um bom direito, é um direito conveniente, é um direito que póde ser muitas vezes necessario, e querer pôr tantos obstaculos ao seu exercicio, não sei mesmo se ouvir o conselho d'estado; creio que é exagerar muito os riscos do exercicio d'elle.

O illustre deputado fallou tambem no celebre artigo dos casos omissos, e parece que n'esse artigo viu pendente sempre sobre todos os cidadãos a espada de Damocles.

Devo dizer á camara que não vejo n'este artigo os perigos que s. ex.ª viu. Este artigo existe actualmente nas nossas leis. D'este artigo fez-se em certa epocha um notavel abuso, mas ninguem combateu o artigo; o que se combateu foi o abuso que se fazia d'elle. E, porque se póde abusar de um direito qualquer, não é logico destruir esse mesmo direito.

Houve tempo em que um governador civil, ao qual é tambem applicavel o mesmo artigo dos casos omissos, suffocava a voz da imprensa, supprimia-a e allegava este artigo. Creio que nem a lei de imprensa nem as suas disposições são casos omissos, e elle achou-a caso omisso, porque queria perseguir; mas lá estava o poder competente, o poder judicial, que julgou que o caso não ora omisso. Por consequencia foi um abuso do direito e não foi o uso d'elle. (Apoiados.)

Ora, esse abuso combati o eu, mas a disposição do artigo não a combati nem a podia combater, porque talvez a suppressão d'elle podesse significar que em casos urgentes e omissos o administrador do concelho não podia fazer nada. Dizia-se-lhe; — Porque não preveniu ou evitou este acontecimento? Ou porque não fez minorar as suas consequencias? — E elle respondia: — Não posso fazer nada quando o caso é omisso.

Por isso, parece-me que não ha rasão para combater o artigo, nem para o eliminar; e tanto assim que só n'uma epocha se abusou, e d'ahi por diante têem estado quasi todos os partidos no governo, e não me consta que nenhum até hoje tenha abusado d'este direito. (Apoiados.)

Tambem se notou a faculdade que se dava ao governo de, em certos casos, se substituir ás juntas geraes de districto.

É preciso que se saiba que a demasiada descentralisação não deixa de ter alguns inconvenientes. Eu não tenho receio de demasiada agitação na administração; de que tenho receio é da sua inercia. N'aquelle caso o governo suppre a inacção dos corpos administrativos. E, segundo esta disposição, se tal corporação abusou do seu poder, lá estão os corpos superiores para a fazer entrar nos seus deveres.

O illustre deputado lamentou a sorte das populações que parece ficavam oneradas com grandes encargos que se lhes podem impor depois d'esta reforma. Eu confesso francamente que não tenho esse receio. Como o exercicio das funcções da municipalidade deve ser entregue aos que têem interesses no municipio, não acredito que elles vão carregar os povos com impostos que os mesmos vereadores têem de pagar. Não o receio.

Ha muita gente que tem grande medo dos corpos municipaes, e que entendo que é preciso ter o governo sempre a mão em cima d'elles. Eu acredito que as localidades se podem governar melhor por si, do que o governo nas secretarias a estabelecer as regras que ellas hão de seguir e os generos que hão de tributar. (Apoiados.)

Estou farto de ver cousas que mal se podem conceber. Os corpos administrativos carecem de recursos, que não podem obter por meio da venda a retalho, que se não sabe bem se é a medida antiga do quartilho, da meia canada, da canada, ou o que é, e d'aqui resulta que o pobre que póde apenas comprar um quartilho de vinho, pagava; e o que comprava uma, canada ficava livre do imposto. Ora eu não gosto do impostos que vão saír só da bolsa do pobre.

Não póde haver definição que tenha menos inconvenientes do que a do projecto; mas se se começar a regular os impostos como se regulou muito tempo na, secretaria, então digo que não póde haver administração possivel. So não derem ás camaras municipaes materia collectavel, ellas não podem fazer cousa alguma: dizemos lhes que podem voar, mas não têem azas; que podem andar, mas não têem pés.

E comtudo é o que resulta das leis do retalho, do miudo e do grosso.

Esta reforma, não foi feita para isso; esta reforma, dando attribuições largas ás municipalidades, entendeu que ellas tinham capacidade para se administrar; e nós que continuâmos sempre a fallar do governo do povo pelo povo, parece-me que não fazemos bem em fingir que damos ao povo o seu governo; tendo, porém, a secretaria do reino, ou outra