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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Conheceu-se que a experiencia tinha dado maus resultados, e os administradores voltaram a ser, como até ali, de nomeação governamental.

São estes factos que o legislador deve ter em vista e estudar, e não as theorias, porque essas conhecem-n'as todos aquelles que no seu gabinete se têem dedicado ao estudo do direito administrativo.

O sr. ministro do reino podia fazer uma reforma com essas theorias, mas s. ex.ª não legisla para a Cidade de Deus de S. Agostinho nem para a Utopia de Morus, legisla para a sociedade portugueza. (Vozes: — Muito bem.)

Eu sei o que dizem os partidarios do meu illustre amigo o sr. José Luciano de. Castro: «Mas nós temos a descentralisação em muitos paizes da Europa, temol-a na Suissa e na Inglaterra». É verdade, mas estudem as condições peculiares da Suissa e da Inglaterra, e digam-me se a descentralisação que vegeta ali, como uma planta natural d'aquelle sólo o sob a influencia d'aquelle clima, póde ser transplantada para um solo differente o para clima diverso.

Na Suissa não póde haver outra cousa que não seja a descentralisação; porque a descentralisação está gravada pela natureza nas condições positivas d'aquelle povo. As leis não fizeram mais do que traduzir no diploma o que já estava escripto no territorio, nas linguas e raças dos habitantes.

Não ignora de certo a camara, que é bastante illustrada, que a Suissa é habitada por povoações de differente origem ethographica, umas de origem tentonica, outras de origem latina. Ali falla-se o allemão, o italiano, o francez e o romano, que e uma especie do dialecto latino. Ao lado d'isto ha as condições do territorio.

Ainda que o governo da Suissa quizesse centralisar, não podia, porque a centralisação é a unidade, o não se estabelece a unidade entro elementos heterogeneos. Profundos valles e altas cordilheiras separam as povoações da Suissa; a acção do governo não póde dominar do centro até chegar á extremidade; a natureza é a primeira defensora da descentralisação.

Aqui está, pois, a rasão por que eu digo que acho prejudicial para a sociedade portugueza implantar-se um systema que se vae estudar no estrangeiro, sem se saber as condições que se dão n'esse paiz. Podem chamar-me o que quizerem; theorico é que eu não sou. (Apoiados.)

O sr. José Luciano fallou-nos na administração ingleza.

Confesso que não sou muito affecto á administração ingleza.

Todos sabem que o condado é o principio em, que assenta a descentralisação ingleza. O chefe civil do condado é de nomeação governamental; os juizes de paz são igualmente filhos do poder executivo. E sabe v. ex.ª o que lá acontece? E que os juizes de paz, entidades de nomeação governamental, têem attribuições judiciaes e attribuições administrativas. Quer dizer, a separação do poder judicial da administração, que é, uma conquista da philosophia moderna e da revolução do 1789, não existe na Inglaterra. Podemos nós acceitar o systema inglez? De modo nenhum. Os juizes do paz inglezes, que são de nomeação regia, decidem as questões sobre, impostos. Veja, v. ex.ª até que ponto chega o principio descentralisador da Inglaterra Conserva se isto, porque os povos estão habituados aquella administração, porque aquellas auctoridades estão, deixem-me assim dizer, na posse d'essa faculdade por uma prescripção ou usucapião secular. Ainda que o legislador queira tirar as attribuições que pertencem a essas auctoridades, protestam contra isso os habitos, os costumes e as tradicções d'aquelle povo. (Apoiados.)

Aqui tem v. ex.ª quaes são as minhas idéas ácerca d'esta importante questão de descentralisação. Não acceito a descentralisação completa, porque a sociedade portugueza não está nas condições de a receber.

Quando vem a tempestade invadir os campos, o que acontece entre nós? Vem o lavrador pedir ao governo que lhe dê sementes (Apoiados.) que a cheia lhe levou.

Quando as fallencias surgem nos bancos, vemos os directores pedir ao governo que lhes empreste o dinheiro de que precisam. (Apoiados.)

E quando as camaras municipaes augmentam a despeza, vem submissas pedir ao governo que lhes dê os meios que ellas não têem. (Apoiados.)

Pois n'um paiz aonde ha uma tendencia tão manifesta para a centralisação, onde a educação politica não está, largamente desenvolvida, onde a eleição popular é abandonada, por parto dos eleitores que abandonam a urna, póde decretar-se larga e amplamente a descentralisação?

Não póde ser; porque isso seria uma descentralisação theorica, e essa descentralisação não aproveita a ninguem.

O illustre deputado o meu amigo, passando d'este a outro assumpto, atacou a reforma em algumas das suas disposições fundamentaes.

Quanto ao direito de dissolver as camaras municipaes, já o nobre ministro do reino respondeu. E na verdade nós não podemos tirar ao podei central a faculdade da dissolução nos casos marcados no projecto.

Diz-se que se póde abusar. Mas se o governo exorbita, lá está o suffragio para lhe corrigir as demazias.

Parece á primeira vista mais liberal que só se concedesse ao governo a faculdade de dissolver os corpos administrativos depois de terem sido condemnados pelo conselho de districto pela transgressão das leis o regulamentos, ou pelos tribunaes judiciaes, quando qualquer dos seus membros tenha praticado um crime commum. Mas n'este caso havia pelo menos de conceder-se ao governo a faculdade de suspensão, que o illustre deputado lhe nega.

Desde que se concede ao poder central o direito de fiscalisação, é justo que se lhe dê o direito de dissolução.

Se o governo exorbita, o governo tem a responsabilidade que se lhe torna effectiva no parlamento. Os parlamentos exigem dos governos a explicação do seu procedimento, e se elle não é o mais conforme aos principios da justiça e aos interesses publicos, os parlamentos têem o meio de tornar effectiva a responsabilidade aos governos que por tal fórma procedem.

Disse tambem o illustre deputado que era necessario supprimir a disposição da reforma, que concedo ao governo a faculdade de, confirmar a demissão dos empregados locaes.

Segundo o projecto, a junta geral não póde demittir os seus empregados sem confirmação do governo.

Aqui não ha centralisação: o que nós queremos é que a junta geral, muitas vezes para se vingar de um acto qualquer praticado por um empregado, não vá demittir esse empregado.

Queremos dar uma garantia aos individuos, e tirar uma prerogativa ás juntas geraes.

O illustre deputado disse tambem que ha centralisação na organisação do conselho de districto, porque na sua opinião este tribunal é amovível o póde ser dissolvido á vontade do governo.

Em primeiro logar o conselho de districto não póde ser dissolvido, porque não é, segundo o projecto, um corpo administrativo: é um tribunal. Alem d'isso, é conveniente notar, que é uma corporação local, que faz a lista d'onde têem de, saír os membros do conselho de districto, e n'isto ha um principio descentralisador.

Deseja o illustre deputado que se estabeleça em cada districto um tribunal collectivo, composto de membros do poder judicial que julguem os negocios administrativos? Isso equivale a estabelecer vinte e uma relações, que trarão um grande augmento de despeza.

O illustre deputado quer economias, mas não as podia conseguir com a sua reforma, porque a despeza com o pessoal devia de ser exorbitante. (Apoiados.)

O illustre deputado quer que, acabe o contencioso administrativo. N'esse ponto concordo com o illustre deputado.