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432 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Quando se convocou a conferencia de Berlim, qual foi a opinião propalada por todos os meios pelos orgãos da opposição ?

Foi que a nossa causa estava completamente perdida, que não se podia esperar absolutamente nada d'aquella conferencia. (Muitos apoiados.)

E esta opinião pessimista não era exclusiva da opposição (Apoiados.); algumas pessoas, que não pertencem á opposição, e aliás illustradas, tambem a partilhavam.

Mas o governo não se deixou dominar por essa desesperança e entendeu, que para defeza da dignidade e dos interesses do paiz, deviam os seus representantes ir á conferencia e manifestar desde logo as idéas em que íam, affirmando que reconheciam os principios que a conferencia proclamava e estavam dispostos a fazer a applicação d'esses principios aos territórios que Portugal considerava seus.

N'aquella occasião as disposições das potencias eram-nos geralmente desfavoraveis. Não ha negal-o. Não devemos estabelecer discussões baseadas em hypotheses, mas partir dos factos como elles são. Entretanto, nós apresentando-nos na conferencia não haviamos de dizer que tinhamos os nossos direitos por menos validos e menos seguros, e que estavamos dispostos a ceder d'elles. (Apoiados.)

A memoria a que o illustre deputado se referiu é uma memoria juridica, habilmente feita, como são todas as que sáem da penna do abalizado jurisconsulto que a redigiu. (Apoiados.) Mas essa memoria onde se apresentam os factos sob o ponto de vista juridico. De resto o governo manteve sempre as conclusões d'aquella memoria, sustentou sempre com firmeza os direitos da corôa de Portugal.

O que o illustre deputado não provou, nem podia provar, era a posição em que ficaria o governo se nos collocassemos n'uma situação intransigente.

Considere-se qual seria a situação do nosso paiz isolado.

Poderão dizer-me que um grande estado já se collocou em situação analoga e d'ella resurgiu poderoso e forte como dantes. E verdade, mas era um grande estado. Esse estado, considerando-se melindrado por uma grande injustiça que soffrêra, concentrou se, tratou de augmentar as suas forças, de restabelecer o seu poderio, e depois voltou novamente, com melhores disposições, ao convivio das nações. Mas nós, uma pequena potencia, declarando-nos amuados, isolados de todos, ver-nos-íamos n'uma situação deploravel e perigosa; porque umas certas injustiças em vez de captarem a benevolencia em favor das victimas, pelo contrario augmentam a má disposição dos próprios que as praticam. (Apoiados.)

Demais, cumpre não desconhecer que havia argumentos a allegar contra nós, e argumentos fornecidos por nós mesmos.

Pois não andamos ha muito tempo a deprimir e calumniar constantemente na imprensa e no parlamento os nossos funccionarios, a apreciar de um modo desfavoravel os seus actos, a attribuir-lhes injustamente responsabilidades que não têem e a amesquinhar a nossa administração colonial? (Apoiados.)

Quando se negociava o tratado de 26 de fevereiro e se levantava no parlamento inglez uma grande e energica opposição contra elle, accusando-nos de negreiros, o que fazia a imprensa da opposição? Transformando factos occorridos na Guiné e dando-lhes uma certa cor de escravatura, accusava o governo por as auctoridades consentirem e promoverem esses factos. (Apoiados.)

Annunciou-se mesmo no parlamento uma interpellação sobre isso. Eram outros tantos argumentos que se forneciam aos traficantes de Manchester e Liverpool, e que collocavam o governo inglez na situação do poder ratificar o tratado. (Apoiados.)

Ultimamente o que tem acontecido? Desde que começaram as negociações difficeis e trabalhosas em que temos andado empenhados para arrancar á má vontade das potencias uma parte que nós considerâmos nossa por direitos tradicionaes não temos encontrado sempre por adversarios os que sómente deviam ser nossos adversarios no que não affectasse a honra e os interesses de Portugal?

Que auxilio nos tem prestado em favor da causa que defendiamos uma parte da imprensa do paiz? Tem andado a fornecer armas aos adversarios do paiz. Hoje diz que não temos forças para occupar tão extensos territórios; ámanhã cita auctoridades competentes a favor do cerceamento dos nossos direitos. (Apoiados.) Espalhavam se a todo o momento, vozes de terror e até se publicavam memórias, mnnographias com toda a feição scientitica, para mostrar a necessidade de limitar a nossa occupação á margem esquerda.

(Aparte do sr. Emygdio Navarro.)

Pretendo o illustre deputado que o marquez de Sá, a cuja veneranda memoria ninguem consigna um maior tributo de admiração e respeito, quando propunha a margem esquerda do Zaire como fronteira da nossa occupação tinha em vista a posse de extensos territorios que o governo agora abandonou, territorios comprehendidos entre o parallelo de Noki e a confluencia do Quango com o Zaire. Ha n'isto manifesto engano da parte de s. exa. O marquez de Sá da Bandeira não conhecia nem podia conhecer o curso exacto do Zaire, então desconhecido; ninguem sabia n'aquelles tempos que o Zaire se dirigia para o norte indo transpor ainda o Equador. Não tinha, pois, nem podia ter em vista a posse de tão dilatados territorios, citava apenas a margem esquerda do Zaire no percurso então conhecido d'este rio, como uma fronteira natural que muito conviria se adoptasse. Na adopção d'esta idéa teria insistido o governo se tivesse tido alguma possibilidade de o conseguir.

Tambem o marquez de Sá se não podia referir á confluencia da Europa com o Zaire pois que n'aquella epocha o verdadeiro curso do Cuango estava inteiramente por descobrir; hoje mesmo não ha d'elle um conhecimento rigorosamente exacto e completo.

Sobre outro ponto pediu o illustre deputado explicações. Parece que s. exa. tem graves apprehensões de que o curso do Cuango venha restringir a nossa occupação, mesmo no interior da provincia de Angola. N'esta parte não tem rasão o illustre deputado.

O Cuango marca os limites de Portugal até o parallelo do rio Loge que é a fronteira das nossas antigas possessões de Angola.

Entendo como o illustre deputado que devemos empregar os maiores esforços para não acceitar limitação no sertão da provincia; no emtanto, devemos notar que este desejo de possuir tudo que possa marcar-se por um parallelo, sem empregar grandes esforços para transportar ao sertão, occupando-o effectivamente, os beneficios da civilisação, não póde sustentar-se hoje.

Quando se quizer attender ao risco que corremos de perder completamente os territorios, por cujo dominio sempre pugnámos; quando se podér bem avaliar a lucta difficil e laboriosa que tivemos de sustentar para que não passassem tambem ás mãos da internacional esses vastos territorios que nos ficam pertencendo, ha de fazer-se justiça ao governo e reconhecer-se que os nossos representantes na conferencia de Berlim bem merecem da patria.

A posse de Cabinda e Malembo, de que hoje se quer desdenhar, representa, alem de uma justa reivindicação do direitos consignados no nosso codigo fundamental, o dominio effectivo num territorio que comprchende uma das melhores enseadas da costa occidental e é habitado pela raça mais adiantada em civilisação, mais aproveitavel e de melhores intuitos.

Não sei se me esqueceu tratar de algum outro ponto a que se referiu o illustre deputado, e reservo-me para responder mais detidamente quando podér apresentar ao lado das minhas allegações os documentos que as comprovam e fundamentam.