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SESSÃO DE 20 DE FEVEREIRO DE 1885 433

O sr. Vicente Pinheiro: - Começo por agradecer ao sr. ministro da marinha a honra que me fez de me citar pela terceira vez n'esta casa.

Agora vou entrar rapidamente na questão do Zaire, segundo os apontamentos que tomei durante o tempo que fallaram os srs. ministros da marinha e dos negocios estrangeiros.

Eu desejava saber se o sr. ministro da marinha tinha auctorisado ou não a posse das duas margens do Zaire. O sr. ministro antecipou a sua resposta á minha pergunta. S. exa. disse que de facto tinha auctorisado essa posse, quando na conferencia de Berlim se declarou que aquelle congresso diplomatico não trataria as questões da soberania das margens do Zaire.

Mas, sr. presidente, uma cousa é auctorisar a posse das duas margens d'esse rio e outra cousa é irem ali as nossas forças navaes fazer fundações.

Eu tive conhecimento pelos jornaes do teor d'essas fundações, e o sr. ministro da marinha confirmou agora que de facto ellas tiveram realidade.

Estas fundações, como actos de posse, são, a meu ver, actos de uma posse ridicula, (apoiados) porque se nós temos luctado durante tanto tempo para fazer valer o nosso direito á foz do Zaire, com estas fundações damos um documento do que só agora em virtude d'estes actos, ternos direito áquellas terras pela primeira vez, e isto, porque os indigenas nos pediram o nosso protectorado. Não foi, conseguintemente, uma posse baseada no nosso antigo direito. As fundações são factos de vassallagem; e ha seculos que os potentados d'aquellas paragens nos reconheceram a suzerania.

Tenho pena de não ter aqui os textos d'essas fundações, que foram hoje publicados no Jornal do commercio, porque se os tivesse, a simples leitura d'esses documentos daria a conhecer á camara que aquelles que em nome do governo portuguez fizeram essas fundações demonstravam que os indigenas não reconheciam até aqui o nosso direito áquellas terras: fizeram cedencia d'ellas agora porque, attendendo ás vexações que soffriam dos differentes povos europeus que ali vão cornmerciar, preferiam o protectorado dos portuguezes que conheciam ha mais tempo.

Com relação á minha opinião, e que o sr. ministra da marinha citou, declaro que é facto seguir no meu livro a opinião do marquez de Sá da Bandeira de que o nosso dominio na costa occidental de Africa devia ir apenas até á margem esquerda do Zaire; mas devo dizer que a minha opinião sobre este assumpto soffreu posteriormente uma modificação. É esta a primeira vez que tenho occasião de a declarar e de a explicar, se por acaso necessita explicação o que sobre esto assumpto escrevi.

O sr. ministro da marinha, que me honrou com a leitura conscienciosa do meu livro, sabe quaes são as minhas idéas a respeito da economia politica colonial. S. exa. sabe que eu na costa occidenial de Africa sou proteccionista e combato as amplas liberdades de commercio; porque as colónias morrem para nós que somos uma nação pequena, desde o momento em que desnacionalisemos o commercio que com ellas podemos entreter. E, para provar isto, que e um facto importante, basta saber-se o commercio que temos com as nossas colonias da costa oriental, para as quaes decretámos uma pauta mais ou menos liberal, e os interesses commerciaes que a praça de Lisboa tem nas colonias da costa occidental, em cujo regimen aduaneiro existe uma justa protecção.

Não quero dizer com isto que julgo as nossas pautas da Africa occidental completamente boas, e que não careçam de ser melhoradas, a que eu não quero é o livre cambismo apregoado como salvação das nossas colonias, se meu livro indiquei as reformas a fazer nas nossas pautas, acabando com os exageros que ellas contêem, mas sem me afastar do principio de protecção, porque quero e hei de pugnar sempre pôr uma rasoavel e sensata protecção, não tendo a menor duvida de declarar aqui, francamente, que sou proteccionista.

Para mim, pois, a questão do Zaire perdeu todo o interesse desde que foi, na conferencia de Berlim, amplamente decretada uma bacia commercial n'aquella região africana.

Eu quereria que, quando principiaram as negociações para tomarmos posse do que a carta constitucional diz que nos pertence, se fizesse um arranjo diplomatico em virtude do qual, seguindo a opinião do venerando marquez de Sá da Bandeira, a margem esquerda do Zaire fosse considerada nossa e annexada a Angola, como limite norte d'esta provincia. Queria que nos contentássemos com essas terras, mas que nos ficassem pertencendo com pleno dominio, com o direito de n'ellas estabelecermos o systema aduaneiro que melhor nos conviesse.

Mas, desde que só decretou na conferencia de Berlim essa ampla bacia commercial, o Zaire póde ser para nós um grande encargo, sem nunca poder representar especie alguma de interesse.

Não é, portanto, esta margem esquerda do Zaire, que agora nos dão, aquella que eu ambicionava para o meu paiz, e a que queria o nobre marquez de Sá. Geographicamente tambem não ficava essa margem em Noki. D'este ponto tratou o sr. Emygdio Navarro, e quanto ao saber-se se o illustre marquez conhecia ou não o Zaire, a mim só me resta dizer que o sr. Leon Cahun, bibliothecario da bibliotheca Mazarini, reeditou em Bruxellas, em 1883, o Roteiro do viajante portuguez Duarte Lopes, precedendo-o de um prefacio no qual diz - que só o sr. Stanley o tivesse lido antes de partir para a Africa lhe teria sido mais facil descobrir pela segunda vez o Zaire.

E, agora, respondendo ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, direi que acho notavel que s. exa. nos diga - que promoveu e não promoveu a conferencia de Berlim. De modo que da confusa explicação de s. exa., sou levado a concluir que quando o governo quiz uma conferencia o não ouviram, e quando a não queria o governo era impellido a acceital-a. para usar da palavra empregada pelo sr. ministro.

Diz ainda s. exa.: «O chanceller allemão era-nos contrario, recusava reconhecer os nossos direitos». Pois não disse aqui o sr. Barros Gomes, quando na discussão da resposta ao discurso da corôa tratou magistralmente da questão do Zaire, que o dr. Nachtigal tinha vindo a Lisboa com poderes do governo da Allemanha para conferenciar comnosco?

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barbosa du Bocage): - É completamente inexacto.

O Orador: - Então porque foi que quando s. exa. respondeu ao sr. Barros Gomes não provou que essa asserção era inexata? Como porém, só segue a fallar o sr. Barros Gomes, este illustre deputado dirá o que se lhe offerecer a este respeito.

Diz o sr. ministro dos negocios estrangeiros que as potencias europêas não reconheciam o nosso direito, mas não é isso o que consta das notas do sr. Serpa, publicadas no Livro branco.

Assegura o sr. Serpa n'esse documento, que todas as potencias reconheciam os nossos direitos ao Zaire com excepção da Inglaterra. O Livro branco que trata d'esta questão tem notas do sr. Bocage e foi trazido por s. exa. á camara.

Como é então, que o sr. ministro dos negocios estrangeiros nos vem dizer, que as potencias nos eram totalmente hostis?

O governo como disse, refere no Livro branco, que todas as potencias nos reconheciam os nossos direito ao Zaire, excepto a Inglaterra. Eu sei que o governo por parte da França, se escudava nas notas do nosso encarregado de negocios em Paris, mas sei tambem que o sr. Duclere n'um documento publicado no Livro amarello, desmentiu esse

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