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SESSÃO N.° 29 DE 5 DE MARÇO DE 1902 3

e não sei que mais, apesar de tudo isso, os dois concelhos da Terceira mostravam-se adversos á politica governamental e votavam o maior desprezo á maneira por que os agentes assalariados pelo Governo naquella ilha, queriam levar os eleitores a darem os seus votos ás listas regeneradoras.

Chamou então o Sr. Hintze Ribeiro, em seu auxilio, o seu collega da pasta da Guerra e disse-lhe que era necessario que as juntas regimentaes ou districtaes, emfim as juntas de inspecção que funccionam naquella ilha, se pusessem ao serviço dos agentes governamentaes, de forma a vencer assim o Governo as eleições municipaes d'quelles concelhos.

O Sr. Pimentel Pinto, que já se tinha tornado o heroe sublime e glorioso de Trajonce e Alcoitão, quis immortalizar de vez a sua gerencia com as vergonhas de Angra do Heroismo!...

Em Trajouce e Alcoitão, os pobres soldados, victimas infelizes da infinita vaidade do Sr. Pimentel Pinto, revolviam-se na lama, emquanto o Sr. Ministro da Guerra, bem comido e bem dormido, repousava em um dos melhores hoteis de Cintra.

Devem ter amaldiçoado o seu chefe supremo.

Pelo contrario, em Angra do Heroismo, os mancebos que foram á janta, deviam ter abençoado o nome de S. Exa., porque os mandou isentar a todos. É verdade que S. Exa. annullou depois as inspecções feitas pela junta regimental, desfazendo assim os sonhos de ventura dos 133 mancebos isentos; mas, no periodo eleitoral, foi para elles um anjo salvador, pois não teve duvida em os mandar isentar, sem excepção de um só!

É que S. Exa. via mal parados os negocios eleitoraes.

Como a junta districtal de inspecção e o respectivo medico se não prestavam ao que os agentes do Governo queriam, que era isentar todos os mancebos que se apresentavam á inspecção, lançou-se mão do seguinte estratagema: os mancebos apresentavam-se á junta districtal com attestados medicos que os declaravam doentes, para assim não serem inspeccionados por aquella junta, que não se sujeitava ás imposições do Governo ou dos seus agentes, e chegou o descaramento a tal ponto que alguns dos mancebos, muitos até, que tinham de ser inspeccionados, eram os proprios portadores d'esses attestados de doença!

Disse-se então que houve em Angra uma epidemia qualquer.

Eu posso asseverar a V. Exa. e á Camara que não existiu epidemia alguma, assim como posso affirmar que os mancebos eram os proprios portadores dos attestados de doença, com que assim justificavam a sua falta á junta districtal de inspecção.

Acabado o serviço d'esta junta districtal, em Angra, partiu esta, em 10 de outubro, para a Ilha de S. Jorge, ficando na Ilha Terceira o medico respectivo, com 15 dias de licença. Mas, acabando-se essa licença e querendo elle seguir para o exercicio das suas funcções, foi d'aqui, de Lisboa, ordem telegraphica para que elle continuasse gozando mais uma licença de 30 dias, licença que effectivamente continuou a gozar, e nomeou-se, por consequencia, um medico civil ad hoc, para fazer o serviço do regimento.

Veja V. Exa., Sr. Presidente, até onde se foi!

Concedeu-se licença a um medico vogal da junta que estava funccionando regularmente, na epoca respectiva, unica e simplesmente para nomear um medico civil que se prestasse a tudo quanto os agentes do Governo quisessem!

Isto só se passa com este Governo, quando é Presidente do Conselho o Sr. Hintze Ribeiro (Apoiados), e Ministro da Guerra o Sr. Pimentel Pinto! (Apoiados).

Depois, sophismou se o preceito legal que determina que, emquanto no districto de recrutamento o reserva funccione a junta districtal, não pode funccionar a junta regimental.

Como se sophismou este preceito legal?

Allegando-se que o districto era o administrativo e não o de recrutamento e reserva!

Como no districto de Angra estava funccionando a junta districtal, e a junta regimental não podia funccionar ao mesmo tempo, logo que a junta districtal passou para o districto administrativo da Horta, começou a funccionar em Angra a junta regimental, com o tal medico nomeado ad hoc, isentando todos os recrutas que appareceram para serem inspeccionados!

Já V. Exa. vê a illegalidade que d'aqui resultou: funccionaram conjuntamente duas juntas, a junta districtal e a junta regimental, no mesmo districto de recrutamento e reserva, mas com o sophisma de a junta districtal ter passado para outro districto administrativo! Custa a acreditar, mas é a pura verdade.

Começou, pois, a funccionar em Angra a junta regimental.

A maneira como ella funccionou di-lo a lista que tenho presente.

Todos os mancebos inspeccionados pela junta foram isentos; 133 recrutas apresentaram-se á junta regimental e todos, absolutamente todos, foram isentos! Prova o este documento official que me foi enviado pelo Sr. Ministro da Guerra.

Nem um só recruta deixou de ter um defeito physico que o isentasse do serviço militar! {Apoiados).

Ora, Sr. Presidente, para se fazer isto recorreu-se a todos os estratagemas, e até de alguns mancebos, quando não tinham defeito por onde lhes pegassem, dizia-se que tinham lesão valvular, e com as taes lesões valvulares saíam livres do serviço militar! De outros allegava-se que tinham os dedos dos pés em martello!

E com estas manobras e martelladas isentaram-se todos os mancebos que foram inspeccionados.

D'esta forma, o Governo conseguiu vencer as eleições.

Mas, perguntará V. Exa.: " Como?"

Vou dizê-lo.

É que os agentes do Governo impunham aos recrutas, que tivessem de ser inspeccionados pela junta, a obrigação de arranjar seis votos. Se arranjassem seis votos, eram isentos; não os arranjando, eram ameaçados com serem apurados para o serviço militar.

Claro é que todos conseguiram obter os seis votos exigidos.

Ora, multiplicando 133, o numero de mancebos, por 6, dá 798 votos.

Por esta maneira o Governo arranjou uma enorme votação, e com as suas habilidades politicas e a junta regimental a seu favor, conseguiu que os progressistas não pudessem ir á urna, em virtude do desfalque que soffreram nos seus votos.

De modo que o Governo, por esta forma indigna e illegal, pôde roubar as eleições municipaes ao partido progressista, que as tinha garantidas, pela sua superior votação, nos dois concelhos da Ilha Terceira.

Note V. Exa. e note a Camara, que o Governo e as auctoridades não podiam allegar a ignorancia dos factos, dos escandalos que se estavam para praticar na junta regimental, porque a 2 de setembro, muito antes da junta começar a funccionar, já o Angrense dizia o seguinte.

(Leu).

Isto escrevia-se a 2 de setembro; portanto já se sabia que estava projectado este escandalo.

Começou a burla das inspecções em 14 ou 15 de outubro, e no dia 24 do mesmo mês affirmava o mesmo jornal:

(Leu).

Portanto, o Governo e as auctoridades não podiam ter desconhecimento dos escandalos que a junta regimental estava praticando.