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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

governo e damnosa para o thesouro, ameaçando diminuir os rendimentos publicos em vez de os augmentar, como foi intenção e o fim a que mirou o sr. ministro da fazenda nas poucas e breves considerações que veiu fazer. Peço

particularmente ao sr. ministro da fazenda e aos meus colegas, que não queiram ver n'isto o desejo de fazer opposição a s. ex.ª, mas apenas a manifestação sincera de que não posso concordar com os principios economicos do artigo 1.° d'este projecto.

(Áparte que não se percebeu.)

Ouço dizer aos meus collegas que todos nós tivemos o mesmo fim, todos fizemos o mesmo. Exulto com isso, sr. presidente, e estimo que s. ex.ª fizessem o que eu vou agora fazer.

Ha um ponto em que o sr. ministro da fazenda, o illustre relator da commissão, todos os meus collegas n'esta camara, todos os financeiros, todos os publicistas concordam n'estes assumptos fiscaes e tributarios, e é que a contribuição deve ser proporcional á fortuna tributavel do contribuinte.

Mas qual ha de ser o criterio de que se lançará mão, para saber qual a fortuna tributavel do contribuinte? Ahi é que estão as difficuldades.

Ora o sr. ministro da fazenda, substituindo o actual systema de repartição pelo systema de quotidade, porque nenhuma outra modificação importante apresenta o projecto, vem destruir essas difficuldades, vem tornar mais facil o conhecimento da fortuna tributavel? Vem augmentar o rendimento do fisco? Não, sr. presidente.

Eu proponho-me a sustentar que esta substituição não destroe em nada as difficuldades existentes; ao contrario, que o reddito do fisco baixará, e que em vez do mal diminuir se ha de aggravar, pois que o remedio não chegará até onde se pretende que elle deve chegar.

Os economistas desde as classes dos athenienses, de que nos falla Pollux até ás indictiones dos romanos, até ao projecto do sr. ministro da fazenda, não têem ainda achado nenhum outros meios para conhecer qual é esta fortuna tributavel senão a declaração do contribuinte, ou os factos externos independentes da vontade d'elle, e demonstrativos d'aquella fortuna.

Estes factos reduzem se todos á superficie, ao rendimento bruto, ao rendimento liquido e ao valor venal.

Proponho-me demonstrar pois, sr. presidente, que qualquer d'estes criterios não melhora com as bases d'este projecto, e portanto que o projecto mesmo é deficiente e inutil.

Depois hei de demonstrar, segundo a minha ordem de idéas, que o projecto é prejudicial, pois que tem contra si a experiencia mesmo n'este paiz, e portanto que o governo, enganando-se nos seus intuitos, em vez de dotar o thesouro com uma boa instituição financeira que lhe augmente as receitas, receio muito que o dote com uma que lh'as vá diminuir (apoiados).

O illustre ministro da fazenda, o sr. relator, e muitos dos meus collegas, que usaram da palavra n'este assumpto, referiram-se por vezes ás falsas declarações dos contribuintes n'este paiz, como se fosse vicio privativo d'elle.

Esta apreciação, sr. presidente, é menos conforme com a verdade, que resulta das estatisticas que temos entre nós, e com a dos povos que foram citados como antithese ao nosso.

(Áparte do sr. ministro da fazenda, que se não ouviu.)

S. ex.ª, o sr. ministro da fazenda, diz-nos que as declarações dos contribuintes não são meios seguros de chegar á verdade, e que o systema do projecto corrige as imperfeições actuaes.

Mas, sr presidente, se a sciencia não tem outros meios, para saber qual é a fortuna collectavel sobre que tem de recaír a contribuição, senão aquelles que apontei e que s. ex.ª não contestam; se o systema do nobre ministro os não corrige, é evidente que o projecto pelo menos é inutil, mas é mais, é prejudicial. As declarações dos contribuintes são o meio mais simples, singelo e directo de conhecer a fortuna tributavel. Ninguem o negará, mas falla-se das declarações falsas!

Sr. presidente, as declarações falsas dos contribuintes não são de agora, nem só d'este paiz. Se o nobre ministro se desse ao trabalho de examinar o alvará de 26 de setembro de 1762, havia de ver que já o marquez de Pombal ali dizia na declaração 3.ª, que era necessario que o povo portuguez se convencesse de que cada contribuinte devia pagar a decima que lhe competia, e que não continuasse o abuso de haver proprietarios de predios rusticos e urbanos, que, tendo 200$000 e 300$000 réis de renda, pagavam apenas 2$000 e 3$000 réis de decima: quer dizer, 1 por cento; e negociantes que, maneiando com 50:000 e 100:000 cruzados que lhes rendiam 20 por cento e mais, pagavam sómente de decima 1$200 e 1$600 réis, quer dizer, tres ou quatro decimas milesimas por cento! Veja v. ex.ª até que ponto as declarações de então satisfaziam á verdade: eram tão falsas ou mais ainda do que as de hoje! (Apoiados).

Desgraçadamente é uma realidade que as falsas declarações dos contribuintes produzem tristes e injustissimos resultados, porque verdade é que se ha quem pague duas ou tres decimas milessimas, devendo aliás contribuir com muito mais, quinhentas, trezentas vezes mais, fatalmente ha de acontecer que outros contribuintes hão de pagar muito mais do que deviam, e estes são os contribuintes pobres, para quem a lei não tem favores nem os seus fiscaes privilegios! (Apoiados.)

Mas este mal das declarações falsas, sr. presidente, não é só proprio do nosso paiz; e fazendo esta observação, refiro-me aos exemplos que da Inglaterra e da Allemanha aqui citavam alguns dos meus illustres collegas para provar, segundo s. ex.ªs, que o exemplo d'aquelles paizes seguidores da repartição não poderia aproveitar ao nosso, menos moral n'esta parte.

Sinto não poder acompanhar a s. ex.ªs n'essa opinião, mais phantasiosa do que real.

As falsas declarações dos contribuintes não são uma planta indigena, desgraçada ou felizmente, d'este paiz; e eu, respeitando muito a proficiencia dos nobres deputados e do sr. relator da commissão, que é um dos mancebos mais eruditos que conheço n'estes assumptos, não posso todavia acatar n'esse ponto a opinião de s. ex.ªs, porque todas as cousas tem o seu limite, e contra a verdade não é possivel que prevaleçam auctoridades scientificas.

Se s. ex.ªs se quizessem dar ao incommodo de examinar os excellentes trabalhos de Dudley Baxter sobre o income-tax inglez de 1867, haviam de ver que a conclusão a que chega aquelle excellente financeiro é — que as declarações dos contribuintes inglezes estão para o rendimento real em Inglaterra como um está para dois, dois e meio e tres; precisamente a mesma relação entre o rendimento collectavel das nossas matrizes e o rendimento real que se presuppõe corresponder-lhe.

Mas não é só este grande trabalho estatistico, como disse, de 1867, sobre o income-tax; podia citar outros e entre elles o relatorio official ao governo inglez, tambem sobre o income-tax, do sr. Lowes, em 1861. Esse chega ao mesmo resultado, e affirma mais que a declaração do contribuinte inglez não tem outra garantia solida e verdadeira senão a sua consciencia. Todos sabem o que valerá a consciencia n'um estado, que sonega dois terços da sua fortuna e que se penitenceia apenas com as insignificantes sommas de que aqui nos fallou o meu amigo, talentoso e incansavel investigador de factos economicos, o sr. Barros e Cunha, quando s. ex.ª nos citou o rendimento do conscience-money de Inglaterra. Citou-se tambem o exemplo da Allemanha. Peço licença ao nobre deputado, que se soccorreu a esse exemplo, para dizer a s. ex.ª, que ninguem é mais respeitador, mais enthusiasta do que eu pela Allemanha scientifica, industrial e litteraria, mas todas as cousas têem o seu senão, e aqui dá-se