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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputado Osorio de Vasconcellos, principiado na sessão de 17 do corrente e concluido na de 19, que deverá lér-se a pag. 332, col. 1.º, e 344, col. 2.ª, d'este Diario.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Tenho a honra de mandar para a mesa a minha moção de ordem, que é uma substituição ao artigo 3.º do projecto (leu).

Já v. ex.ª vê que eu estou completamente na ordem, tendo pedido a palavra a favor do projecto em discussão, ainda que n'uma parte muito restricta e com o fim de manter os julgados actuaes.

Parecería um acto anormal e muito para admirar, que eu, tendo sido, sendo, e esperando continuar a ser, opposição constante, sem treguas e sem descanso, ao actual governo, o qual julgo com os seus actos estar infelicitando a nação, preparando-lhe gravissimos males e tremendas catastrophes; parecería admiravel, digo, que eu, como se houvesse feito um reviramento no meu credo politico, viesse pedir a palavra a favor de uma proposta ministerial. No que ella tem de carácter politico, jamais.

lias ainda quando na minha alma podesse ter entrado o convencimento de que o actual governo não é tão mau e adverso á felicidade publica, como ha muito tempo me convenci, ainda assim bastava o facto que acaba de passar-se, a rejeição que o governo e a maioria fizeram á nota de urgente no requerimento que eu havia mandado para a mesa; bastava isso, para que uma separação absoluta e completa se estabelecesse entre mim e o governo (apoiados).

Vejo que ha a sufficiente ousadia para invocar a pureza dos principios constitucionaes a favor da discussão e devoção pelo dogma parlamentar, mas estes protestos são logo desmentidos pelos factos. E se não, basta lembrar á camara que o sr. ministro do reino, a quem eu desejava censurar asperrimamente pelos actos que não tenho a menor duvida de classificar de escandalosos, passados no districto da Guarda; basta lembrar, repito, que o sr. ministro do reino lei o primeiro que prestou o seu voto contra a nota de urgente da minha proposta (apoiados).

Eu vinha, não só em nome dos meus constituintes, mas da moralidade, profunda e rasgadamente offendida e ultrajada, pedir contas ao governo. E como responde elle? Trancando a discussão, garrotando a palavra, impondo o silencio como norma e como lei, abafando até o grito de dor e indignação, que se ergue do seio de todos aquelles que, como eu, zelam acima de tudo as regalias e os fóros parlamentares e querem moralidade e justiça na administração.

Sr. presidente, por vezes tenho tentado desvendar á camara os escandalos e os arbitrios que se estão quotidianamente praticando no districto da Guarda por parte do delegado do poder central.

Foge o governo á discussão. Mas não imagine que se escapa á condemnação. Desenganem-se, que não me fazem emmudecer.

Debalde o governo e a maioria não admittem que um deputado, por ser da opposição, venha desenrolar o sudario de actos, sem nome, porque eu não os posso classificar 1 É debalde. Não me intimidara, estejam certos d'isso. Hão de ouvir, ainda que lhes custe (apoiados).

O sr. Boavida: — Ha já uma interpellação annunciada a este respeito.

O Orador: — Ha uma interpellação annunciada a este respeito, diz o meu illustre collega o sr. Boavida. Mas como responde o governo a essa interpellação? Com o silencio? (Apoiados.)

O governo não quer responder, porque, está escudado com a maioria que o cerca, e que segundo, a opinião do mesmo governo, representa a parte pensante do paiz.

O sr. Presidente: — Esse assumpto não é o que está dado para ordem do dia.

O Orador: — Já vou mostrar a v; ex.ª como tudo isto a que me estou referindo tem relação intima e completa com a minha moção de ordem. Pois não se trata de fazer justiça? Trata-se de juizes e réus. O juiz sou en, o réu o governo (riso). V. ex.ª não póde, apesar do muito respeito que me merecem as altas qualidades de v. ex.ª, interferir, de uma maneira despotica, na architectura das minhas ideas, no modo porque hei de expô-las, para me convencer do trilho e do caminho errado que sigo. Tenho o direito de procurar onde melhor me parecer os argumentos era defeza da rainha moção.

Mas se v. ex.ª quer vir em soccorro do governo, se quer lançar sobre elle a bandeira da misericordia, poderei ceder a v. ex.ª como homem; mas não em nome do regimento.

Dizia eu que, ainda quando qualquer sentimento de sympathia se tivesse alevantado no meu animo para com o governo, bastava-me esse facto a que alludi, recente, recentissimo, para que a sympathia se transformasse em antipathia, o o amor, o sentimento carinhoso, tomassem uma fórma, diametralmente opposta (apoiados).

O governo tem invocado constantemente o amor pela pureza dos principios, aquella convicção profunda nas excellencias da discussão. Mas por uma metamorphose altamente insolita, esse amor pelos principios demonstra-se arranhando, ferindo e ensanguentando os mesmos principios.

Portanto eu venho lavrar mais um protesto tão solemne quanto é a origem d'elle, tão duro quanto é o crime praticado contra este acto do sr. ministro do reino, contra esta ausencia de amor para com a, dignidade propria que o tolhe de responder ás minhas increpações, e de vir mostrar se são injustas, lavando o seu nome, a sua reputação, o seu carácter das accusações que de continuo lhe dirijo, e provando, emfim, que para ser ministro não basta só ter os preparatorios que se alcançam no cursar as escolas do artigo de fundo sophistico.

Sr. presidente, para ser ministro responsavel da corôa, é mister mais alguma cousa do que isso. E mister sobretudo não sophismar cora evasivas de jornalista argucioso e virulento as leis na sua applicação aos povos, e os sagrados e eternos principios da justiça,

Para ser ministro é necessario sobretudo, e como condição primordial e indeclinavel, despir a velha pelle do pamphletario (apoiados).

Os documentos officiaes, as leis, todas as manifestações escriptas do executivo não são, não podem ser, não podem continuar a ser pamphletos attentatorios da dignidade do poder.

Sr. ministro do reino, lembre-se que já não é pamphletario. Mudou de posição. Mude tambem de habito. Hontem não é hoje. Hontem eram-lhe licitas essas argucias. Hontem podia sophismar e tergiversar. Hoje é ministro.