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470 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mente que se havia realisado a occupação. O governo desejava, pois, que se acreditasse nella, como acreditou toda a Europa; e tanto assim, que toda a imprensa regeneradora, e até a mais chegada aos ministros, a festejou e exalçou como uma façanha.

Logo, porém, que se receberam noticias, mais exactas, dos tristes acontecimentos que realmente se haviam dado no Zaire, logo mudaram as cousas de figura; começou-se então a dizer que a esquadra tinha ido simplesmente observar quaes eram as disposições dos indígenas, que a esquadra tinha ido apenas como que fazer um reconhecimento. Em vista destas duas versões, pergunto, qual é a verdadeira? (Apoiados.) A esquadra foi ao Zaire effectuar a occupação, ou foi fazer uma simples verificação? (Apoiados.)

Se apenas se queria observar o que se passava nas margens do rio, para que se deu tanto apparato, tanta solemnidade, a similhante acto, em circumstancias melindrosas, quando se sabia que as potências andavam desde muito desconfiadas de que Portugal queria occupar os territórios que lhe estavam sendo disputados? Porque se mandaram sair de Loanda quatro navios como para uma batalha, chegando-se até a nomear, segundo consta, os officiaes que haviam de effectuar os desembarques? Se estes factos não tinham a significação que pareciam ter, eram então imprudentes, como imprudente foi o sr. ministro da marinha vindo ler ao parlamento o telegramma em que o governador geral lhos noticiou?

Se, porém, a expedição teve realmente por fim a occupação da margem direita do Zaire, porque não se realisou essa occupação? Por erro ou fraqueza do chefe da divisão naval? Não foi. Falta-me conhecimento circumstanciado dos factos, mas não duvido abonar o procedimento dos briosos officiaes de marinha neste lance. (Apoiados.)

Admittiria facilmente que elles houvessem transgredido as instrucções recebidas no sentido do brio; não acreditarei nunca que as transgredissem em sentido contrario ao do brio. (Apoiados.) O facto é que quatro navios de guerra portuguezes foram ao Zaire, parecendo e dizendo-se que iam occupal-o, e em presença de protestos de negociantes estrangeiros, e não sei bem se tambem do commandante de uma canhoneira britannica, desistiram da occupação acceitando os protestos; ora, se as cousas assim se passaram, tenho o profundo convencimento de que foi porque assim o ordenavam as instrucções com que o commandante da divisão saiu de Loanda, e por isso desejo saber: essas instrucções procederam do governador geral de Angola, ou foram-lhe dadas a elle pelo governo?

Quer fossem do governo, quer do governador geral de Angola, acho-as incomprehensiveis. Podiam-se dar muitas eventualidades no acto da occupação projectada; mas a minha com que se não podia contar era a de não haver protestos. Era forçoso, portanto, prevel-os, pois que só deixariam de apparecer em um de dois casos: ou serem surprehendidos os interessados em protestar, e as surprezas serão hábeis, mas não são leaes, se não é que só são hábeis quando as protege a força; ou não haver quem tivese interesse em protestar, caso em que a occupação seria desnecessária, porque as negociações diplomáticas deveriam produzir o mesmo ou melhor resultado. Não era, pois, licito deixar de contar com os protestos, e se não se queria affrontal-os, nunca se devia tel-os provocado ou occasionado.

A vergonhosa, a ridícula contradicção de mandar uma esquadra ao Zaire como para o occupar, e fazel-a recuar diante de resistências verbaes, precisa, pois, ser explicada, se tem explicação possível, e eu pergunto ao sr. ministro da marinha se foi em virtude de instrucções do governo, em cumprimento de ordens do governador de Angola, ou por culpa do commandante da esquadra, que essa contradicção se deu.

Sr. presidente, eu considero os acontecimentos de que me tenho occupado como profundamente desagradáveis para Portugal. Dado que não compromettessem interesses moraes, prejudicaram interesses moraes, mais elevados ainda. O nosso paiz, pequeno, fraco, pobre, só póde fazer-se respeitar pela seriedade e pelo brio, o neste deplorável incidente faltou-se ao brio e á seriedade. (Apoiados.) Repito: os factos occorridos no Zaire são gravíssimos, e eu desejaria que ácerca d'elles se tomasse uma deliberação tambem grave, que tivesse mais significação e mais alcance do que as simples discussões. (Apoiados.) O sr. ministro da marinha já aqui disse que, se algum subordinado seu delinquiu, ha de castigal-o; por mim quizera que o parlamento se animasse da necessaria resolução para castigar tambem o governo se acaso foi elle o principal delinquente, dando assim uma satisfação ao paiz e á Europa. Para isto, lembrei-me de propor um inquérito parlamentar; como, porém, talvez não haja ainda todos os elementos e todas as informações necessárias para elle; como, por outra parte, as circumstancias ainda permittem que o governo se proteja com as reservas diplomáticas; desisto por emquanto dessa idéa. Talvez, porém, procure realisal-a quando cessarem as circumstancias que mencionei, invocando então o patriotismo da camara para que não deixe sem censura severa quem, pelos seus actos, haja compromettido a dignidade da nação.

Aguardo as respostas do sr. ministro da marinha.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - Ás vezes parece que os illustres deputados se esquecem da distancia a que a província de Angola está de Portugal, e de que não temos meios de mantermos com essa província communicações rápidas.

O discurso de s. exa. baseou-se, na traducção que fez a seu modo, duma declaração feita por mim.

Eu declarei que tinha auctorisado o governador geral de Angola a proceder de certo modo, e, dadas certas hypotheses, a ir até á occupação do Zaire, se a reputasse necessaria, para manter a dignidade e o brio da corôa portugueza.

S. exa. traduziu a minha declaração doesta forma: seu mandei occupar o Zaire». Sobre esta declaração architectou todo o seu discurso que se destroe desde que caia a base em que elle assenta.

Quando eu expedi a auctorisação ao governador geral de Angola para poder proceder desembaraçadamente quando se tornasse necessario tomar uma deliberação rápida, foi no momento em que, apezar da conferencia de Berlim ter declarado que não se occupava da questão de soberania, porque essa questão ficaria para ser resolvida pelos meios diplomáticos ordinários, algumas potências que estavam ali representadas iam tratando de occupar diversos pontos da costa de Africa, como fez a Allemanha na Angra Pequena, e a Inglaterra em Santa Luzia.

O governo teve receio de que a associação internacional, ou qualquer grande potência, tomasse a deliberação de occupar pontos a que tínhamos direito, emquanto não tivéssemos negociado um accordo diplomatico.

Era, pois, necessario habilitar o governador geral de Angola, visto que os factos ali passados não podiam ser conhecidos em Lisboa senão depois de algum tempo, para empregar a força a fim de impedir a occupação de territórios que julgávamos pertencerem a Portugal, emquanto a respeito delles não tivéssemos negociado com as outras nações.

O governador geral de Angola e a divisão que elle mandou ao Zaire não precisaram de se oppôr á occupação por parte de qualquer potência ou da associação internacional, o que a divisão fez simplesmente foi acceder ao pedido dos indígenas que reclamavam a nossa protecção, celebrando com elles tratados e accordos.

Da recommendação que se fez não podia resultar senão a occupação pacifica de accordo com os indígenas, mas se