SESSÃO N.º 30 DE 8 DE MARÇO DE 1902 3
todos uma magua que é profundissima e uma saudade que será eterna.
Vozes: - Muito bem.
(O orador não reviu).
O Sr. João Arroyo: - Sr. Presidente: em nome da maioria parlamentar associo-me á proposta que V. Exa. acaba de dirigir á Camara. V. Exa. comprehende, já não direi a viva magua, mas a profunda commoção com que, neste momento, ergo a minha voz para commemorar, em simples e sentidas palavras, a morte d'aquelle que em vida se chamou Frederico Arouca, meu companheiro nas lides parlamentares e nos Conselhos da Coroa.
Foi uma das figuras que encontrei no Parlamento Português, assignalada já por triumphos de palavra de grande valia, quando me foi dada a honra de entrar neste casa; e não é preciso dizer a V. Exa. como, através da sua vida parlamentar e ministerial, a minha estima e consideração para com Frederico Arouca augmentava dia a dia.
Frederico Arouca trouxe para a vida publica uma grande qualidade, qualidade que, se se não impõe á primeira vista por manifestações de brilhantismo, todavia se accentua através da vida politica com efficacia inegualavel.
Essa qualidade foi a aprimorada instrucção, a aprimorada educação, a sua linha de perfeita gentilhomeria, que elle teve o talento de transportar da vida particular para a vida publica, e que fez com que, através de todas as vicissitudes da vida politica, mantivesse a elegancia moral e a pura correcção que todos admirámos. (Apoiados).
Como parlamentar, Frederico Arouca pertenceu ao numero d'aquelles que, sabendo estudar os assumptos que eram dados para o debate parlamentar, sabia ao mesmo tempo manter o culto da arte da palavra. (Apoiados).
A phrase, na boca de Frederico Arouca, era sempre distincta, bem recortada e fina, como a de um homem que sabia prestar attenção aos assumptos parlamentares e ao mesmo tempo render o seu culto á arte. (apoiados).
Como homem do Estado, Frederico Arouca distinguiu-se sempre pelo seu criterio seguro, pelo seu ponto de vista sensato e pratico (Apoiados), por uma absoluta lealdade de camaradagem para com aquelles que, conjuntamente com elle, occupavam as cadeiras do poder. (Apoiados).
Não devo tambem deixar de pôr ainda em saliencia a indefectivel lealdade de Frederico Arouca, manifestada através de toda a sua longa carreira politica, quer elle terçasse as suas armas de leal partidario sob a chefia de Fontes, quer sob a chefia de Antonio de Serpa e de Hintze Ribeiro. (Apoiados).
E se, por certo, é grande a magua e saudade de todos nós ao ver extinguir aquelle vulto distincto da politica portuguesa, estou convencido de que dobrada magua será a do actual chefe do partido, que nelle coutava um dos mais valiosos collaboradores.
O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Apoiado.
O Orador: - Por tudo isto, associo-me de todo o coração á proposta que V. Exa. fez.
Saudo nestas poucas palavras a brilhante passagem de Frederico Arouca através da scena politica portuguesa, e endereço-lhe d'aqui, em nome da maioria parlamentar, o nosso adeus, a mais sentida expressão da nossa saudade e do nosso agradecimento.
Vozes:- Muito bem.
(O orador não reviu, as notas tachygraphicas).
O Sr. Antonio Centeno: - Em nome da minoria progressista venho associar-me ao voto de sentimento proposto por V. Exa., pela morte de Frederico Arouca. (Apoiados).
Não faço o elogio do extincto illustre, porque acaba elle de ser feito pelas vozes eloquentes e auctorizadas dos seus amigos e correligionarios. Limito-me apenas a assegurar a V. Exa. e á Camara que o partido progressista tem a honra de acompanhar o partido regenerador na dor profunda que este acaba de soffrer.
Vozes: - Muito bem.
(O orador não reviu).
Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Camara, considero a minha proposta approvada.
Far-se hão as communicações devidas.
Pela ordem da inscripção devia dar agora a palavra ao Sr. Deputado Antonio Cabral, para S. Exa. realizar o seu aviso previo ao Sr. Presidente do Conselho, mas como falta pouco tempo para se entrar na ordem do dia, não sei se S. Exa. quererá usar hoje da palavra.
O Sr. Antonio Cabral: - Agradeço a amabilidade de V. Exa. e como V. Exa. me consulta, prefiro usar da palavra na proxima sessão, visto que o tempo de que poderia agora dispor é resumido e o assumpto que tenho a tratar é vasto.
O Sr. Presidente: - Reservo a V. Ex. a palavra para o primeiro dia de sessão.
O Sr. Belchior Machado: - Pedi a palavra para fazer algumas referencias ás campanhas de Africa, que encheram a nossa historia de paginas gloriosas. (Apoiados).
Tenho lido em muitos jornaes e em alguns livros, e tenho ouvido em assembléas constituidas por pessoas eruditas, que o inicio das campanhas de Africa foi a batalha de Marracuene. Esta affirmação é menos exacta. O inicio das campanhas de Africa foi a batalha de Lourenço Marques, em que se distingiu o valente tenente-coronel de artilharia António José de Araújo; e se essa batalha não teve echos repetidos que a recommendassem aos chronistas do reino, foi devido á modestia dos individuos que nella tomaram parte e que não fizeram propaganda alguma do seu heroismo.
O official a que tenho a honra de me referir é um dos mais distinctos do nosso exercito; é um africanista prestimoso, um grande heroe modesto.
Este official, que durante 20 annos successivos desempenhou serviços importantissimos na Africa, quer como director de obras publicas na provincia de Moçambique, quer como director do Caminho de Ferro de Lourenço Marques, quer como governador d'este districto, mereceu sempre a maior attenção dos poderes publicos. Mas não são esses serviços que eu desejo mencionar, mas sim referir-me á parte activa que elle tomou na defesa de Lourenço Marques, em 1894.
Deve estar na memoria de todos a causa da revolta dos
cafres, que teve Lourenço Marques a dois passos da ruina;
e se ainda hoje esta cidade pertence á Coroa Portuguesa,
é isso unicamente devido ao Sr. Tenente-Coronel Araujo.
Governando a provincia de Moçambique, em 1894, o Sr. General Fernando de Magalhães foi informado de que 5:000 indigenas cafres tentavam atacar a cidade. Em Lourenço Marques havia 22 soldados de policia e alguns soldados indigenas. Faltava tudo para defender uma cidade aberta, faltavam os officiaes, as praças, as munições!
Recorreu o Governador ao tenente-coronel Antonio José de Araujo, que organizou a defesa da cidade com uma proficiencia e uma promptidão inexcediveis. Estabeleceu postos, organizou barricadas e estabeleceu uma linha de defesa na extensão de 3:000 metros.
Este official teve muito naturalmente de recorrer aos habitantes da cidade, macaistas, mouros, baneanes, persas, aos de todas as nacionalidades, para defenderem a cidade.
Comprehende-se que, com tal organização era indispensavel uma vigilancia continua, successiva, não abandonando um só momento as improvisadas linhas de defesa.
Os ataques eram constantes e os habitantes passaram dias angustiosos, porque tinham a certeza de que se os indigenas entrassem em Lourenço Marques seria tudo destruido e todos ali mortos.
No dia 14 de outubro de 1894, pelas 7 horas da ma-