SESSÃO N.º 30 DE 8 DE MARÇO DE 1902 9
gencias da civilização, - e os mesmos effeitos - aggravamento de encargos para o contribuinte.
Mas se assim é, e é, esta escala progressiva ha de naturalmente ter um fim.
Tem por certo, e quem attentar no que se passa no annos das actuaes sociedades, não poderá deixar de reflectir nas affirmações, que se nos afiguram ousadas, dos mais avançados sociologos e economistas, e de pensar se de facto uma revolução se estará preparando, mais tremenda, do que aquella com que fechou o seculo XVIII, porque então apenas se pôs á prova de sangue a liberdade civil e politica, emquanto que a nova revolução talvez tenha de submetter a propriedade, atagantada pelas razzias do fisco, contundida pela pressão do imposto, á prova de dynamite.
Sr. Presidente: ou não pretendo com semelhante criterio desculpar erros que tenha havido na administração financeira do país; mas julgo ter provado que os augmentos de despesas são em toda a parte uma consequencia da civilização actual. (Vozes, muito bem - Apoiados). E outros maiores augmentos de despesas teremos ainda de effectuar, se não quisermos ficar inertes, retardados, na marcha triumphal dos povos, porque hoje, mais do que nunca, parar é morrer. (Apoiados).
Ora Portugal só num ponto se afastou dos demais povos, e já vamos ver a quem pertence principalmente essa responsabilidade.
Temos tido crises mais ou menos violentas, e sobretudo tivemos a crise de 1891 intensissima, cujas consequencias ainda estamos sentindo amarissimamente. Essa crise, diz-se, resultou de erros economicos e de erros financeiros, e só a isso se deve a situação em que nos encontramos. Ora, crises resultantes de erros economicos e de erros financeiros, e tambem de circumstancias varias, a que é estranha completamente a acção e direcção dos dos Governos - porque importa não esquecer que para a nossa crise de 1891- concorreram energicas correntes exteriores, originadas na situação geral da Europa (apoiados); - crises similares teem - nas tido todos os povos do mundo, até os mais ricos. (Apoiados).
O que determinou a crise dos Estados Unidos de 1893-1896, tão grande que ella é inteiramente comparavel á maior crise por que tem passado aquelle povo - a de 1837,- aquelle povo tão rico, tão industrial, onde as grandes fortunas se fazem na rutilação de um relampago, e onde tambem ás vezes desapparecem como as espumas que a onda forma e no mar se desfazem?
Foram tambem erros economicos - o alargamento da cunhagem da prata e a questão do bimetallismo, - e erros financeiros - por exemplo, a tarifa Wilson. (Apoiados).
Eu poderia, Sr. Presidente, referir-me agora á Inglaterra, e analysar a crise de 1890; á França - a nação typo da épargne, e ver a que deveu ella as suas crises de 1857, 1864, 1870 e 1882; á Allemanha, e descrever o que neste momento por lá se está passando, naquella luta titanica, que resulta do conflicto de interesses antagonicos, da drenagem do capital para as grandes explorações industriaes, que augmentaram assombrosamente a producção allemã, para a qual não ha mercados. Poderia fazer isto, se não estivesse convencido de que a Camara sabe perfeitamente que Portugal neste capitulo da sua historia está inteiramente ao lado de todos ou quasi todos os povos europeus. (Apoiados). Só ha um ponto, como disse ha pouco, em que Portugal se desviou completamente dos demais países: - foi em não ter estudado e posto em pratica um plano financeiro, amplo, rasgado e profundo, que remodelasse o nosso regime fiscal, lançando-o em bases novas. (Apoiados). Mas vamos ver a quem pertence a maior responsabilidade d'este facto.
O desastre de 1891, que nos foi ensinamento para melhorarmos a nossa vida economica, porque não ha duvida que a riqueza do país augmentou ao impulso do regime proteccionista, embora imperfeito, devia-nos ter sido lição saluberrima tambem para entrarmos de vez no trabalho, arduo por certo; mas utilissimo e pratico, da reorganização das finanças.
Todos os factos attestam a expansão da economia nacional. (Apoiados). Basta olhar para a estatistica, confrontá-la com as dos ultimos annos, e assim se verificará o augmento do nosso commercio, tanto com os diversos países, como com as colonias, o maior movimento dos nossos caminhos de ferro e dos nossos portos, a crescente receita da nossa circulação postal e telegraphica, o consumo da hulha, consequencia do incremento fabril e da expansão industrial, maior extracção de ferro das nossas minas, as companhias e sociedades anonymas que se teem constituido com capitaes portugueses, a elevada somma de descontos das instituições bancarias, como symptoma do maior circulação do capital, de onde tom resultado o estado de prosperidade d'esses estabelecimentos, como o provam os dividendos que distribuem, o numero de patentes de invenção de industrias ou de introducção de novas industrias concedidas pelo Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, emfim, todo um conjunto de factores economicos, que diariamente se offerecem á nossa ponderação, e que significam inilludivelmente a melhoria da vida economica do país. (Apoiados). O que não procurámos fui melhorar a situação financeira, como deviamos ter feito (Apoiados), seguindo um caminho recto e superiormente traçado.
Ora, em parte, iniciamos esse caminho. O Ministerio regenerador de 1893 deixou nos annaes da nossa vida politica algumas paginas brilhantes, porque traduzem um alto espirito administrativo e uma rigorosa comprehensão da conducta, que deveriamos ter seguido, se quisessemos caminhar pela estrada da vida nova, tão reclamada nos ultimos annos. (Apoiados).
Com effeito, o deficit real da gerencia de 1893-1894, foi de 74:000$000 réis, o de 1894-1895 foi de 175:000$000 réis, mas logo na gerencia de 1895-1896 se elevou a 1.449:000$000 réis, e d'ahi por deante o deficit cresceu, corporizou-se até chegar a 10.658:000$000 réis em 1896-1897. Foi como que uma reversão atavica ou uma força incoercivel da tradicção. E d'esta sorte tem o Estado exhaurido ao nosso meio economico capitaes que antes se deveriam ter derivado para empresas industriaes, e sobretudo para a indispensavel expansão agricola, que tem de ser necessariamente o fundamento sobre que ha de assentar o desafogo e bem estar economico do país. (Apoiados).
Sr. Presidente, eu procuro ser imparcial, analysando tão graves assumptos, e comprehendo que necessidades inadiaveis reclamaram grandes augmentos de despesa nos annos de 1897 e 1898.
Tivemos as guerras de Africa, onde, é certo, se affirmou o valor do exercito português, mas onde tambem se gastaram alguns milhares de contos de réis. Não ignoro que a elevação do agio do ouro importou pesados encargos para o Estado, e que só agora começamos a colher os beneficios do regime de protecção á agricultura, em que felizmente todos os Governos seguiram sem soluções de continuidade.
E não é por mero capricho de phrase que eu accentuo a circumstancia de terem seguido todos os Governos um regime de protecção á agricultura, porque um dos nossos grandes males tom sido a instabilidade dos serviços. Sei tambem que as condições da praça eram de ordem a soffrerem dolorosamente o influxo de circumstancias especiaes, que actuavam no mundo financeiro, perturbado pela crise da America do Norte, pela situação do Brasil, pela crise da praça de Londres, em 1890, e ainda pela grande affluencia de capitaes á Republica Argentina numa doida especulação de juros elevados.
Não ignoro isso, e sei que tudo isso teve um reflexo em Portugal. Mas era dever do Governo, então, lançar-se no