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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

30.ªSESSÃO

EM 30 DE ABRIL DE 1909

SUMMARIO. - Lida e approvada a acta dá-se conta do expediente.- Tem segunda leitura uma proposta do Sr. Zeferino Candido, que é rejeitada. - O Sr. Pereira dos Santos pede explicações sobre o facto da maioria sair da sala quando principiou a falar o Sr. Caeiro da Matta.- O Sr. Presidente refere o procedimento que adoptou perante esse facto. - Os Srs. João de Menezes, Estevam de Vasconcellos, Ernesto Vilhena, Garcia Guerreiro e Egas Moniz, que estavam inscritos para antes da ordem do dia, desistem da palavra.- O Sr. Antonio Cabral faz diversas considerações sobre o incidente com o Sr. Caeiro da Matta.- Alguns Srs. Deputados enviam papeis para a mesa. - A requerimento do Sr. Pinto dos Santos o assunto em discussão torna-se em assunto de ordem, abrindo-se inscrição especial. - O Sr. Caeiro da Matta declara não dar explicação alguma. Estas palavras produzem tumulto, sendo interrompida a sessão. - Reaberta a sessão o Sr. Antonio José de Almeida requer a urgencia para tratar da remessa de documentos enviada á commissão dos adeantamentos. A Camara admitte a urgencia. Ao Sr. Antonio José de Almeida responde o Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Sebastião Telles). - O Sr. Brito Camacho apresenta um requerimento que é rejeitado. - O Sr. Affonso Costa requer, e a Camara approva, a urgencia para tratar de casos que se teem dado no policiamento de Benavente. Responde o Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Sebastião Telles). - Sobre o incidente relativo ao Sr. Caeiro da Matta usam da palavra os Srs. Conde de Paçô-Vieira, João Pinto dos Santos, Visconde de Villa Moura, José Tavares, Carlos Ferreira, Malheiro Reymão, João Castello Branco, Antonio Cabral, Mello Barreto e Rodrigues Nogueira, sendo este discurso cortado por apartes e interrupções, que determinaram sussurro e tumulto, tendo o Sr. Presidente de encerrar a sessão.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. José Joaquim Mendes Leal

Secretarios - os Exmos. Srs.:

João José Sinel de Cordes
João Pereira de Magalhães

Primeira chamada - Ás 2 horas.

Presentes - 10 Srs. Deputados.

Segunda chamada - Ás 2 horas e 45 minutos.

Presentes - 65 Srs. Deputados.

São os seguintes: - Abel de Mattos Abreu, Alfredo Carlos Le Cocq, Alfredo Pereira, Antonio de Almeida Pinto da Motta, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José de Almeida, Antonio José Garcia Guerreiro, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Tavares Festas, Augusto Vidal de Castilho. Barreto e Noronha, Carlos Augusto Ferreira, Conde da Arrochella, Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Eduardo Frederico Schwalbach Lucci, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Ernesto Jardim de Vilhena, Fernando de Almeida Loureiro e Vasconcellos, Francisco Miranda da Costa Lobo, Francisco Xavier Correia Mendes,
Henrique de Mello Archer da Silva, João Augusto Pereira, João do Canto e Castro Silva Antunes, João Carlos de Mello Barreto, João Correia Botelho Castello Branco, João Henrique Ulrich, João Ignacio de Araujo Lima, João Joaquim Isidro dos Reis, João José Sinel de Cordes, João Pereira de Magalhães, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Calvet de Magalhães, João de Sousa Tavares, Joaquim Heliodoro da Veiga, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Mattoso da Camara, Jorge Vieira, José de Ascensão Guimarães, José Augusto Moreira de Almeida, José Cabral Correia do Amaral, José Caeiro da Matta, José Estevam de Vasconcellos, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim da Silva Amado, José Julio Vieira Ramos, José Malheiro Reymão, José Maria Joaquim Tavares, José Maria de Queiroz Velloso, José Osorio da Gama e Castro, José Paulo Monteiro Cancella, José Ribeiro da Cunha, José dos Santos Pereira Jardim, Manuel Affonso da Silva Espregueira, Manuel de Brito Camacho, Manuel Joaquim Fratel, Miguel Augusto Bombarda, Paulo de Barros Pinto Osorio, Roberto da Cunha Baptista, Rodrigo Affonso Pequito, Vicente de Moura Coutinho de Almeida d'Eça, Visconde de Ollivã e Visconde de Villa Moura.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Affonso Augusto da Costa, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Alves Oliveira Guimarães, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Macedo Ramalho Ortigão, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Zeferino Candido da Piedade, Augusto de Castro Sampaio Côrte Real, Augusto Cesar Claro da Ricca, Aurelio Pinto Tavares Osorio Castello Branco, Christiano José de Sena Barcellos, Conde de Azevedo, Conde de Castro e Solla, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia, Diogo Domingues Peres, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, João Duarte de Menezes, João Soares Branco, Joaquim Anselmo da Matta Oliveira, Joaquim Pedro Martins, José Bento da Rocha e Mello, José Coelho da Motta Prego, José Francisco Teixeira de Azevedo, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Oliveira Simões, José Mathias Nunes, Luis Vaz de Carvalho Crespo, Manuel Antonio Moreira Junior, Matheus Augusto Ribeiro de Sampaio, Sabino Maria Teixeira Coelho e Thoinas de Aquino de Almeida Garrett.

Não compareceram a sessão os Srs.: - Abel Pereira de Andrade, Abilio Augusto de Madureira Beça, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alberto Pinheiro Torres, Alexandre Braga, Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Alvaro Rodrigues Valdez Penalva, Amadeu de Magalhães infante de La Cerda, Antonio Alberto Charulla Pessanha, Antonio Bellard da Fonseca, Antonio Duarte Ramada Curto, Antonio Hiutze Ribeiro, Antonio Rodrigues Costa da Silveira, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Conde de Mangualde, Eduardo Burnay, Emygdio Lino da Silva Junior, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Fernando de Sousa Botelho e Mello (D.), Francisco Cabral Metello, Francisco Joaquim Fernandes, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida eVasconcellos, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachoreta, João Feliciano Marques Pereira, João José da Silva Ferreira Neto, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Antonio da Rocha Lousa, José Caetano Rebello, José Jeronimo Rodrigues Monteiro, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria Cordeiro de Sousa, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria Pereira de Lima, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luis Filippe de Castro (D.), Luis da Gama, Manuel Francisco de Vargas, Manuel Nunes da Silva, Manuel de Sousa Avides, Manuel Telles de Vasconcellos, Mariano José da Silva Prezado, Mario Augusto deMiranda Monteiro, Thomas de Almeida Manuel de Vilhena (D.), Visconde de Coruche, Visconde de Reguengo (Jorge) e Visconde da Torre.

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ABERTURA DA SESSÃO - Ás 3 horas da tarde

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, remettendo um exemplar da Nova collecção de tratados, convenções, contratos e actas publicos, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado Conde de Azevedo.

Para a secretaria.

Do Sr. Deputado José Caetano Rebello, remettendo um cheque de 50$000 réis sobre o Montepio Geral, destinado ás victimas sobreviventes do terramoto do Ribatejo.

Para a secretaria.

Do juizo de direito da comarca de Viseu, remettendo um processo crime contra o Sr. Deputado Alexandre Braga.

Para a secretaria.

Segunda leitura

Proposta

Considerando que, em sessão de 9 de março findo, foi declarado a esta Camara, pelo Sr. Ministro da Marinha de então, que o tratado que se negociava em. Pretoria seria assinado ad referendum do Parlamento e elle e todo o processo ao Parlamento viria buscar a sua sancção;

Considerando que semelhante declaração invalidou todos os meios que ao Parlamento cabiam de impedir a celebração definitiva do tratado;

Considerando que as explicações dadas a esta Camara pelo illustre Deputado Sr. Conselheiro Antonio Cabral, se patenteiam a boa fé com que procedeu como Ministro, não aclaram e menos dirimem a responsabilidade da errada declaração;

E, emfim, considerando que d'ahi resultou um ataque ás regalias, direitos e deveres parlamentares, que seria grave perigo deixar como precedente:

Proponho que seja eleita uma commissão de onze membros, com representação de todos os agrupamentos politicos d'esta Camara, com o fim de averiguar, no espaço maximo de trinta dias, a quem cabe a responsabilidade d'esta errada informação, permittindo ao Parlamento que proceda como seja de seu direito e justiça. = Zeferino Candido.

O Sr. Affonso Costa: - Peço a palavra sobre o modo de votar.

O Sr. Presidente: - Eu não abri inscrição; portanto não pode V. Exa. pedir a palavra nem eu lha posso dar.

O Sr. Affonso Costa: - Eu peço a palavra sobre o modo de votar.

O Sr. Presidente: - Repito que não lha posso dar e se V. Exa. entende que eu não cumpro o regimento, V. Exa. diz o artigo que eu infringi.

Eu leio a V. Exa. O artigo 99.° diz:

"Nenhum Deputado nem Ministro de Estado poderá falar na Camara, sem ter pedido ao Presidente a palavra, e este lha ter concedido".

E o artigo 100.° diz:

"Os Deputados teem o direito de apresentar propostas, moções de ordem, projectos de lei, representações e requerimentos; de fazer declarações de voto, annunciar e realizar interpellações aos Ministros de Estado; interrogá-los por escrito ou verbalmente; tomar parte em todas as discussões que se suscitarem na Camara, e durante ellas propor additamentos, substituições e eliminações".

O Sr. Affonso Costa: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: -Os artigos 101.° e 102.° dizem:

"O uso dos direitos estabelecidos no artigo antecedente depende da prévia inscrição dos Deputados para usarem da palavra, que lhes será dada, segundo a ordem da inscrição.

Art. 102.° Haverá duas inscrições geraes: para antes da ordem do dia, podendo o Deputado, quando lhe for concedida a palavra, apresentar representações, propostas ou projectos de lei, annunciar interpellações, chamara attenção do Governo para assuntos de interesse publico, pedir por escrito esclarecimentos ao Governo, que poderá responder por qualquer dos seus membros, ou verbalmente, depois de feita a prevenção, nos termos do § unico do artigo 53.°

2.° Para tomar parte na discussão da materia dada para ordem do dia.

§ unico. No primeiro caso pedir-se-ba a palavra depois da approvação da acta e leitura do expediente a convite do Presidente; no segundo caso, só depois do Presidente declarar que se vae passar á ordem do dia".

O Sr. Affonso Costa: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Eu não posso dar a palavra ao Sr. Deputado.

Nos termos do regimento só posso dar a palavra na ordem, antes da ordem, sob a acta e para explicações.

O Sr. Affonso Costa: - Peço a palavra para invocar o regimento.

O Sr. Presidente: - Tem V. Exa. a palavra.

O Sr. Affonso Costa (para invocação do regimento): - Mando para a mesa a seguinte invocação do regimento:

Invoco, o artigo 99.° do regimento, a fim de me ser dada a palavra sobre o modo de votar uma proposta lida na mesa, visto que o regimento no artigo 142.° me dá o direito de que quero usar. = Affonso Cotta.

O Sr. Presidente: - Como a Camara viu, eu disse a razão e justifiquei-a, porque não podia dar a palavra ao Sr. Deputado. Os Srs. Deputados que entendem que eu infringi o regimento nos artigos 99.° e 142.° teem a bondade de se levantar.

A Camara resolveu que o regimento não foi infringido.

O Sr. Presidente: - Não infringi o regimento.

O Sr. Affonso Costa: - Em todo o caso desejo que fique consignado na acta que eu queria requerer, votação nominal. É uma contradição de V. Exa., porque V. Exa. tinha declarado que emquanto não fosse resolvido pela

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commissão o assunto, daria sempre a palavra sobre o modo de votar.

O Sr. Presidente: - Como é questão de facto, desejo que fique bem clara. Essa doutrina foi para a ordem do dia. Invoco o testemunho de todos os Srs. Deputados. (Apoiados).

O Sr. Affonso Costa: - Desde que V. Exa. tem a certeza de que é essa a declaração que fez, não a contesto.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que admittem á discussão a proposta que acaba de ser lida, teem a bondade de se levantar.

Não foi admittida.

O Sr. Affonso Costa: - Requeiro a contraprova.

O Sr. Presidente: - Approvaram 38 Srs. Deputados e rejeitaram 50.

O Sr. Pereira dos Santos: - Vou falar muito serenamente, em attenção á gravidade da questão e á minha situação nesta Camara. Vou referir-me facto que ante-hontem se produziu nesta Camara e que consistiu no seguinte: quando, um illustre membro desta Camara, o nosso illustro collega o Sr. Caeiro da Matta.

O Sr. Presidente : - Eu pedia ao Sr. Deputado que falasse um pouco mais alto para eu poder ouvir.

O Orador: - Quando ante-hontem um illustre Deputado, (Apoiados) o Sr. Caeiro da Matta procurava exercer o seu direito, (Apoiados) direito que nem V. Exa. contestou (Apoiados), nem pôs em duvida, por isso mesmo que lhe deu a palavra (Apoiados) succedeu o facto anormal, novo inteiramente na historia do Parlamento Português, de que um grande numero, ou quasi completamente, duas parcialidades politicas representantes da maioria se retirarem da sala em tropel.

O facto deu logar a varios commentarios, tanto nesta Camara como fora d'ella. (Apoiados).

Evidentemente, ao que parece, houve uma questão pessoal, e parece-me que ha tambem uma questão politica. (Apoiados). Como a questão pessoal, segando me consta, foi derimida em harmonia com os brios e com a dignidade entre um illustre membro da opposição e um illustre membro das maiorias parlamentares, julgo que está legitimamente liquidada com honra para todos.

É á questão politica que eu vou principalmente referir-me. Não discuto nem vou referir os motivos que determinaram esse facto, todavia, venho dizer o seguinte: a maneira como na ultima sessão se procedeu na Camara parece estar perfeitamente em contradição com a normalidade que a Camara deve sempre manter, principalmente a sua maioria e de certo modo representa uma provocação politica especialmente dirigida á minoria regeneradora. (Apoiados).

Antes de se produzir aqui na Camara aquella sessão tumultuaria, em virtude de não ter sido admittida á discussão a proposta do Sr. Magalhães Ramalho, antes da votação eu levantei-me e em nome do meu partido e do partido progressista dissidente eu declarei que este lado da Camara com tudo transigiria menos com o que de qualquer modo lhe viesse coarctar o seu livre direito de falar.

Veio depois a votação e a maioria rejeitou a admissão á discussão dessa proposta, representando esse seu acto uma offensa ao direito que temos de falar e que nos é confirmado pela lei organica d'esta casa do Parlamento. Foi depois deste facto que se produziram os tumultos na Camara, aos quaes se tem attribuido differentes causas.

Fazendo eu essa declaração em nome dos partidos regenerador e dissidente, tomando essa responsabilidade, não tendo havido por parte da maioria uma palavra sequer que justificasse o não admittir á discussão uma proposta de inquerito que approvei e que tinha sido apresentada pelo Sr. Magalhães Ramalho desviando toda a ideia de suspeição e nos termos mais correctos, que reputamos esse facto como uma offensa aos nossos legitimos direitos. (Apoiados).

Depois disso, Sr. Presidente, falando eu nesta Camara sobre o Discurso da Coroa e definindo a minha attitude e a dos meus amigos politicos em face desse projecto eu fiz a declaração de que nos eramos absolutamente ciosos dos nossos direitos e das nossas regalias parlamentares e repeti que com tudo podiamos transigir menos com isso, e foi precisamente num aggrava ao direito que o Sr. Caeiro da Matta tem de falar nesta Camara, direito que lhe é confirmado pelo Parlamento, direito que V. Exa., Sr. Presidente, confirmou dando-lhe a palavra, foi precisamente nisto que se manifestou o aggravo politico da maioria. Isto faz-me suppor que pela parte da maioria se havia escolhido esse meio, exactamente por ser aquelle de que nos somos absolutamente ciosos, e faz-me suppor tambem que da sua parte houve a intenção de um aggrayo politico a nos feito na pessoa do illustre Deputado Sr. Caeiro da Matta.

A minoria regeneradora é perfeitamente solidaria. (Apoiados).
Sr. Presidente, devo dizer desassombradamente que nos comprehendemos as nossas responsabilidades.

Eu disse nesta Camara quando se apresentou o Ministerio, definindo a attitude do meu partido, que o partido regenerador faria opposição intransigente, mas serena, e queria com isso significar que não tinhamos intenção de fazer na Camara opposição violenta e tumultuaria.

O que se .passou na ultima sessão, parece mostrar que, apesar das minhas declarações, ha o desejo por parte da minoria de nos fazer proceder de outro modo. Não vou por esse caminho por vontade, mas a minoria regeneradora precisa nesta Camara zelar os seus direitos. (Apoiados).

A minoria regeneradora tem sido perante as maiorias da mais absoluta e completa correcção, e muitas vezes se tem havido sessão nesta Camara, tem sido porque a minoria aqui tem estado. (Apoiados).

Quando nos accusaram de fazermos obstruccionismo pedimos aos nossos .amigos o sacrificio de desistirem da palavra em discussões pendentes e importantes, e todos que são parlamentares sabem quanto, custa fazer esse sacrificio quando se teem coordenado ideias para entrar numa discussão. Temos sido, portanto, da máxima correcção.

Discursos vehementes, discursos violentos tem havido muitas vezes, como é proprio no Parlamento da attitude de uma opposição intransigente. Isso é justificado, mas não tem havido da parte da minoria cousa alguma que signifique menos consideração, ou pôr entraves á marcha dos trabalhos.

Portanto, repito a V. Exa. e á Camara, definindo a nossa situação, nos declaramos que estamos decididos a fazer opposição intransigente mas reflectida e ponderada, e quanto ao facto que se deu estamos solidarios para que sejam restituidos a esse illustre Deputado os seus direitos.

Não temos absolutamente nenhum desejo de provocar questões, mas, se a maioria persistir na situação que provocou, a opposição encontrar-se-ha no mesmo campo. (Vozes: - Muito bem)

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - As más condições acusticas da sala não me permittiram ouvir com toda nitidez as con-

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siderações feitas pelo Sr. Deputado Pereira dos Santos, em todo o caso, como S. Exa. tratou do incidente levantado na sessão anterior, entendo da minha consciencia dever dar umas explicações á Camara.

No dia em que tive a honra de tomar posse do logar que occupo, disse á Camara que, quando não pudesse salvar a minha competencia, desejaria pelo menos salvar sempre a minha boa vontade na direcção dos trabalhos parlamentares e fora dos trabalhos e em varios incidentes que se teem levantado, a proposito d'elles, tenho procurado uma acção conciliadora (Apoiados geraes) e bem intencionada para resolver as difficuldades que teem apparecido, ( Apoiados geraes) o que entendo ser do meu dever, concorrendo assim d'este logar para que ellas se resolvam honradamente. (Apoiados).

Ora, numa das sessões anteriores deram-se factos que não quero recordar. O que é certo é que a situação do Sr. Deputado Caeiro da Matta e a situação da maioria não ficou boa, permitta-se-me a expressão.

Vozes na esquerda: - Não apoiado!

O Orador: - Vou explicar as minhas palavras.

(Interrupção).

Deixem-me V. Exas. falar.

Está claro que, empregando a palavra o boa referia-me ás boas relações entre o Sr. Deputado Caeiro da Matta e a maioria. (Apoiados).

Devo accentuar que estou dizendo só a verdade, sem procuração de ninguem. (Apoiados). - (Vozes: - Muito bem).

O Orador: - E appello para o Sr. Deputado Caeiro da Matta para immediatamente me interromper se acaso o que disser não for estrictamente a verdade. (Apoiados).

Encontrei-me com o Sr. Caeiro da Matta, com quem tinha e tenho relações affectuosas, e falei com S. Exa. sobre o assunto, trocando impressões varias e affirmo a verdade, sem ficéiles que não quero empregar neste momento, (Apoiados) disse ao Sr. Caeiro da Matta que o incidente me tinha sido desagradavel e muito estimaria que S. Exa. pudesse collaborar nos trabalhos parlamentares e illustrar a Camara com o seu talento e saber, e por isso me parecia bem que S. Exa. se reservasse para entrar na discussão de qualquer assunto que não tivesse o caracter politico e lembrei até o projecto sobre casas baratas.

Vozes na esquerda: - Oh! Oh!

O Orador: - Lembrei a S. Exa. este facto e concordámos nisso.

S. Exa. disse que falaria ou não falaria conforme entendesse e disse que era sua intenção, quando falasse nesse assunto, referir-se á maioria, dizendo que não tinha tenção de ser desagradavel a ninguem.

O Sr. Caeiro da Matta: - No que não fazia senão confirmar as palavras finaes da sessão de 15 de março.

O Sr. Presidente: - Não. entro nesse ponto, pergunto a S. Exa. se o que digo é ou não a verdade dos factos Não estou empregando ficelles, estou dizendo como os factos se passaram, estou dizendo o que entendo em minha consciencia.

Conservando depois com alguns Srs. Deputados da maioria, declararam-me que o procedimento de ante-hontem não representava aggravo para o Sr. Caeiro da Matta.

O Sr. Caeiro da Matta: - De ante-hontem para e a minha situação modificou-se sensivelmente. Hoje não dou explicações algumas.

É realmente singular que, tendo V. Exa. affirmado á maioria os meus intuitos, a maioria respondesse do modo como procedeu.

O Sr. Presidente: - Ha um erro de facto em que V. Exa. não tomou bem sentido.
Eu e o Sr. Caeiro da Matta trocamos impressões, não foram declarações especiaes que V. Exa. fizesse, foram impressões para se ver e era impossivel arranjar uma situação definida. (Apoiados). Tambem não me dirigi á maioria para com ella tomar nem receber compromissos, simplesmente, com um ou outro membro da Camara, não posso dizer com quem alei nesse assunto no sentido de preparar uma situação definida, Não houve senão boa vontade para que este incidente se liquidasse do melhor modo.

(Interrupção do Sr. Caeiro da Matta).

O Sr. Presidente: -S. Exa. tomará a attitude que intender.

Pela minha parte, procurei, honestamente, explicar os incidentes lamentaveis occorridos.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. João de Menezes: - Peço a palavra sobre o assunto.

O Sr. Presidente: - S. Exa. requer uma inscrição especial, ou...

O Sr. Affonso Costa: - O assunto é bastante grave para se poder passar por cima d'elle...

O Sr. Conde de Paçô-Vieira: - Peço a palavra para um requerimento.

Vozes da esquerda: - Não ha requerimentos. Ha desistencia da palavra de quem está inscrito.

O Sr. João de Menezes: - Visto que se deseja resolver este incidente, eu desisto da palavra por agora, mas V. Exa. ha de me pôr depois na devida altura.

O Sr. Presidente: - S. Exa. desiste da palavra, mas quer que o inscreva novamente?

O Sr. João de Menezes: - Sim senhor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ernesto de Vilhena.

O Sr. Ernesto de Vilhena: - Pelas mesmas razões desisto da palavra, pedindo a V. Exa. que me inscreva depois na devida altura.

Seguidamente desistem da palavra os Srs. Estevam de Vasconcsllos, Garcia Guerreiro e Egas Moniz.

O Sr. Antonio Cabral: - Sr. Presidente: começo por agradecer aos iliustres Deputados que desistiram da palavra, evidentemente só para eu poder usar d'ella.

V. Exa. e a Camara ouviram o discurso do nosso collega o Sr. Pereira dos Santos da minoria regeneradora e que se referia ao incidente succedido na ultima sessão d'esta Camara.

S. Exa. não quis contar os factos que precederam esse incidente, mas eu não posso nem devo deixar de a elle me referir. (Apoiados).

Na sessão de 15 de março passada, na qual não estive

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presente mas que pelo Diario das Sessões que tenho aqui posso ver o que naquella sessão se passou, o Sr. Caeiro da Matta, num aviso prévio dirigido ao Sr. Ministro da Justiça para se occupar de assunto que pertencia áquella pasta, teve para o Sr. Ministro da Fazenda de então, o Sr. Espregueira que não estava na Camara, palavras que não quero reproduzir aqui mas que a Camara toda conhece e das quaes perfeitamente se recorda.

Nessa mesma sessão, tendo a maioria da Camara protestado energicamente contra essas palavras que reputava offensivas da dignidade de um Ministro da Coroa, foi increpada. violentamente pelo Sr. Deputado Caeiro da Matta, com palavras que eu tambem não quero reproduzir, mas que profundamente maguaram a maioria aggravada politicamente, e tanto assim foi, que V. Exa. Sr. Presidente, com a sua autoridade interrompeu o Sr. Caeiro da Matta, exigindo d'elle a explicação das suas palavras que a maioria reputava offensivas da sua dignidade.

Creio que estou falando com toda a verdade dos factos, e peço que me façam qualquer objecção e rectificação, porque como já disse, não estava presente nessa occasião, creio que estava na outra Camara até usando da palavra, e pelo que consta do Summario creio que estou referindo os factos exactamente como se passaram.

Como disse, V. Exa. Sr. Presidente interrompeu o Sr. Caeiro da Matta, houve dialogo, e vou ler nesse ponto o Summario das Sessões.

Diz assim:

(Leu).

Portanto, como se vê, a sessão interrompeu-se sem que o incidente ficasse liquidado, ficando de pé o aggravo politico feito á maioria e tendo-se liquidado depois em outro campo o aggravo feito pelo Sr. Caeiro da Matta ao Ministro da Fazenda de então.

Portanto não se trata de um aggravo pessoal, como disse o Sr. Pereira dos Santos, trata-se de um aggravo politico, porque se fosse pessoal á qualquer dos membros, a todos os membros da maioria, esses membros da maioria saberiam ter resolvido esse incidente, como pessoalmente todos os membros dá Camara resolvem os incidentes da sua honra.

Repito, não se trata de um aggravo pessoal, mas unicamente de um aggravo politico que está de pé, sem explicação. É necessario que não confundamos a questão.

Foi assim que na primeira occasião que o Sr. Caeiro da Matta, depois do incidente, usou da palavra, a maioria, aggravada pela offensa que lhe tinha sido feita e que ficara de pé, porque esse incidente não ficará liquidado, a maioria, mostrando a sua magua, retirou-se da sala.

Cada um aos Deputados procede no uso pleno do seu direito, que me parece não está coarctado, pois cada um dos membros d'esta Camara sae e entra nesta sala quando muito bem lhe appetecer. (Apoiados).

Houve provocação á parte regeneradora da minoria, como o Sr. Pereira dos Santos ha pouco pareceu querer afirmar? Mas onde está essa provocação?

Não basta dizer que da parte da maioria há qualquer offensa, qualquer aggravo á minoria regeneradora d'esta casa do Parlamento.

O que houve, unica e simplesmente, foi uma demonstração do resentimento da maioria para com o Sr. Deputado que a tinha aggravado e não explicara as suas palavras, nem havia dito á maioria aquillo que eu entendo que ella tem direito. (Apoiados).

Eu pergunto agora á minoria d'esta casa, a cada um dos membros que a compõem, que são homens capazes de se desaggravarem quando se julgarem offendidos, se porventura a maioria não tem, como S. Exas., as mesmas susceptibilidades? (Apoiados).

Porventura a maioria não tem ouvido com verdadeira paciencia tudo quanto a minoria lhe quer dirigir?

E porque é que ella, á menor palavra, um pouco mais exaltada, immediatamente se levanta, protestando, manifestando o seu desagrado com uma violencia que pode desculpasse por se tratar da opposição, mas tendo muitas vezes um certo excesso que da mesma maneira vae ferir os seus affectos politicos e repetidas vezes até com palavras bastante violentas - não talvez pela intenção do orador - mas que nem por isso deixam de ter a significação e pelo que se ouve precisam immediatamente de desaggravo. (Apoiados).

Mas, Sr. Presidente, continuo a referir-me ás palavras do Sr. Pereira dos Santos. Disse S. Exa. que o facto da maioria d'esta Camara era novo.

O anno passado, falando o Sr. Martins de Carvalho, houve uma manifestação perante S. Exa. e então pertencia o partido regenerador todo á maioria.

Eu não estava na Camara nessa occasião, encontrava-me fora do pais; mas sei que muitos membros desta gamara, de um e outro lado, como manifestação contra um Deputado saíram da sala das sessões.

O Sr. José Tavares: - Peço a palavra.

O Orador: - E appello para os Srs. Deputados que assim procederam. Portanto o facto não é novo.

Um grupo de Deputados em dois dias fizeram nesta Camara uma manifestação perfeitamente identica áquella que a maioria d'esta casa fez na sessão passada e não se venha com os argumentos de que a maioria, procedendo assim contra o Sr. Martins de Carvalho, o fizera como manifestação, contra a ditadura, porque respondo que tambem o fizeram já depois de passada áquella ditadura, e por isso foi um desaggravo, uma desaffronta, uma manifestação contra aquelle Deputado.

Mas a verdade, Sr. Presidente, é que não houve aggravo da maioria á minoria regeneradora. Houve apenas uma desaffronta da maioria, uma manifestação do seu resentimento, porque lhe tinham dirigido palavras de aggravo, e tanto que não havia aggravo para a minoria regeneradora, que muitos outros oradores d'aquelle lado da Camara usaram da palavra e a maioria ouviu-os com toda a attenção.

Como é então que o Sr. Pereira dos Santos quer ver no que se passou um aggravo á minoria regeneradora?!

O Sr. Presidente: - Previno V. Exa. que faltam 5 minutos para se passar á ordem do dia.

O Orador: - Sr. Presidente: se o incidente pode ficar liquidado com as declarações de V. Exa., a maioria que o julgue, se não fica, então que proceda como entender.

Mas quero agora referir-me ao discurso do Sr. Pereira dos Santos e ás ameaças que nelle se conteem.

O Sr. Zeferino Candido: - Ameaças?! ...

O Sr. Pereira dos Santos: - Eu não ameacei!

O Sr. Visconde de Villa Moura: - Não ameaçou, mas disse que iria até a violencia.

O Orador: - Está muito bem. S. Exa. não ameaçou, mas disse que a minoria regeneradora recorreria á violencia, se fosse preciso.

O Sr. Pereira dos Santos (interrompendo): - Havemos de procurar um .meio para responder á provocação da maioria.

Se esta procura criar incompatibilidade com a opposição, nós não transigimos e havemos tornar publico por todo o país, a quem cabem as responsabilidades d'esta questão.

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O Orador: - Eu creio não estar em erro dizendo que S. Exa. empregou a palavra "violencia". S. Exa. explicou agora que não houve ameaças da sua parte, perfeitamente, mas a verdade é que tambem não houve da nossa parte, porque, como já disse ha pouco, muitos membros da minoria regeneradora falaram depois d'esse incidente e foram ouvidos com o maximo silencio e respeito.

Tambem não fomos nos que escolhemos esse Sr. Deputado, esse Sr. Deputado é que aggravou a maioria e a maioria quis mostrar o seu sentimento por. esse facto.

É isto que eu tinha a dizer á Camara.

Se em face das declarações de V. Exa. o incidente se pode considerar liquidado em virtude d'ellas, entendo que a maioria nenhum prazer poderá ter em protelar um incidente desagradavel, se pelo contrario a maioria se não julga satisfeita com ellas ella procederá como entender, com a dignidade com que tem procedido até aqui.

Tenho dito.

CO orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Deu a hora de se passar á ordem do dia. Os. Srs. Deputados que tenham papeis a enviar para a mesa podem fazê-lo.

ORDEM DO DIA

O Sr. João Pinto dos Santos: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que o assunto em discussão se transforme em assunto de ordem, abrindo-se inscrição especial. = O Deputado, João Pinto dos Santos.

Foi approvado.

O Sr. Caeiro da Matta: - Sr. Presidente: pedi a palavra exclusivamente para fazer uma declaração muito simples e muito peremptoria: declaro a V. Exa. e á Camara que as conversas particulares que com V. Exa. tive acêrca do incidente occorrido no dia 15 de março proximo passado, as considero nullas e de nenhum effeito perante as attitude tomada pela maioria na sessão de hontem e, mais declaro a V. Exa. que não dou explicações algumas desde* que a maioria procedeu como procedeu.

(Estas palavras são cobertas por uma ruidosa salva de palmas).

Vozes da esquerda: - Muito bem, muito bem. A maioria da Camara sae da sala.

O Sr. Presidente: - Interrompo, a sessão por meia hora.

Eram 4 horas e 10 minutos da tarde.

O Sr. Presidente: - Nos termos do artigo 179.° do regimento, interrompi ha pouco a sessão. Está reaberta a sessão.

Eram 5 horas menos um quarto.

O Sr. Antonio José de Almeida: - Peço a palavra para um negocio urgente.

O Sr. Presidente: - Convido o Sr. Deputado a vir á mesa declarar qual o negocio urgente que S. Exa. deseja versar.

(Pausa).

O Sr. Presidente: - Peço a attenção da Camara. O assunto urgente que o Sr. Antonio José de Almeida deseja versar, é o seguinte:

Havendo o Sr. Presidente do Conselho dito na sessão de quarta feira, em que o Sr. Deputado não estava presente, que era convicção sua que todos os documentos pedidos pela commissão de inquerito lhe tinham sido fornecidos, deseja mostrar á Camara que S. Exa. se encontra enganado, pois muitos documentos, apesar de instantemente reclamados, ainda não foram fornecidos pelo Governo á referida commissão de inquerito.

Os Srs. Deputados que entendem que este assunto é urgente e que se deve dar a palavra a S. Exa., tenham a bondade pé se levantar.

Foi approvado.

O Sr. Antonio José de Almeida: - Sr. Presidente: vou apenas dizer duas palavras para rebater o que disse o Sr. Presidente do Conselho na sessão de hontem, relativamente ao fornecimento de documentos á commissão de inquerito e que eu li no Summario das sessões.

Eu não me posso alongar em considerações e para fazer estes pequenos reparos, tive que pedir licença aos meus collegas da commissão de inquerito.

Entretanto, para V. Exa. e a Camara saberem que essa commissão tem reclamado por varios documentos, desde ha meses a esta parte, bastará dizer que em junho de 1901 foram pedidos documentos, e todavia um grande numero d'elles ainda não foram presentes á commissão de inquerito; que em 26 de janeiro se pediram esclarecimentos de adeantamentos feitos a funccionarios publicos e todavia ainda não vieram; que em 28 de julho de 1908 e em novembro do mesmo anno se pediram, documentos relativos a adeantamentos feitos a particulares e que, apesar das reclamações, instantes que nesse sentido se 6ze-ram, só vieram os seguintes:

(Leu).

Dizia o officio, que foi mandado para essa commissão, que o resto viria breve.

Pelo que respeita ao Ministerio do Ultramar, devo dizer que, no officio que o Sr. Antonio Cabral dirigiu á commissão de inquerito, dizia-se o seguinte:

(Leu).

Este officio tem a data de 3 de fevereiro de 1909 e responde ao officio que essa commissão enviou áquelle Ministerio, com a data de 6 de janeiro.

O Sr. Antonio Cabral: - Devo dizer, como esclarecimento, que antes de sair do Ministerio da Marinha, se bem me recordo, mandei remetter á commissão de inquerito todos os documentos, parecendo-me que já lá devem estar.

O Orador: - Eu refiro-me a adeantamentos feitos a funccionarios publicos.

O Sr. Antonio Cabral: - Com respeito a adeantamentos feitos a funccionarios publicos, devo dizer que existiam uma grande quantidade de adeantamentos d'essa natureza e que era necessario descriminar aqueiles que eram legaes, d'aquelles que o não eram, achando-se todos elles descritos em livros.

Quando esse trabalho estava quasi concluido, deixei de ser Ministro da Marinha e por consequencia nada mais posso acrescentar.

O Orador: - Se pedi a palavra para tratar deste assunto, foi por notar nas palavras do Sr. Presidente do Conselho que S. Exa. talava num tem de quem se sentia um pouco mal humorado.

Daqui se conclue que o Sr. Presidente do Conselho não

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8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tinha razão quando dizia que lhe parecia que todos os documentos tinham sido enviados á commissão.

Se S. Exa. tinha essa convicção, ela desapparece em face desta declaração.

Não posso fazer sobre este assunto os considerandos que podia e desejava fazer, em primeiro logar porque não estou habilitado a isso, em segundo logar porque o estado da minha larynge não me permitte.

No entanto ficam exaradas estas notas e a todo o tempo se extrahirá d'ellas a philosophia que é na verdade interessante.

Tenho dito.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Sr. Presidente: como entrei ha pouco na sala, não sei bem até o assunto de que se trata, mas como ouvi dizer ao illustre Deputado que acaba de falar, que eu na sessão anterior tinha affirmado que todos os documentos haviam sido enviados ...

O Sr. Antonio José de Almeida: - Eu disse que V. Exa. tinha affirmado ter a convicção de que todos os documentos haviam sido enviados á commissão.

O Orador: - O que eu disse foi que do Ministerio da Guerra tinham ido todos, os documentos e que a todos os Ministros que fizeram parte do Gabinete Ferreira do Amaral eu tinha ouvido a declaração de que mandariam á commissão todos os documentos pedidos.

Disse ainda ao illustre Deputado Sr. Affonso Costa que perguntaria ao Sr. secretario da commissão de inquerito se faltavam alguns documentos, e se elle dissesse que sim eu instaria junto dos respectivos Ministros para que sem demora enviassem esses documentos. (Apoiados).

Foi isto que disse aqui na Camara.

Tenho dito.

O Sr. Antonio José de Almeida: - Agradeço as explicações de V. Exa. e peço-lhe que se informe pelo Sr. secretario da commissão, porque a falta de documentos, principalmente pelo Ministerio da Marinha, é grande.

O Sr. Presidente: - Vae continuar-se na ordem do dia.

O Sr. Brito Camacho (Para um requerimento): - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que a Presidencia consulte a Camara sobre se consente que sejam publicados no Diario do Governo os documentos que sobre adeantamentos fossem enviados á respectiva commissão logo que ella os tenha examinado. = Brito Camacho.

Lê se na mesa e procede-se á votação.

Foi rejeitado.

O Sr. Affonso Gostar - Peço a palavra para um negocio urgente.

O Sr. Presidente: - Comido o illustre Deputado a vir dizer á presidencia o assunto do seu negocio urgente.

(O Sr. Affonso Costa dirige-se á presidencia).

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Affonso Costa pede para tratar em assunto urgente uma noticia que vem publicada nos jornaes e que diz respeito ás ordens que foram dadas aos militares que estão em Benavente para fazerem fogo sobre quem seja encontrado a roubar.

Vou consultar a Camara nesse sentido.

Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.

O Sr. Affonso Costa: - Sr. Presidente: a razão do meu negocio urgente é a seguinte:

No Diario de Noticias, jornal que costuma ser bem informado, encontram-se as seguintes palavras.

(Leu).

Sr. Presidente: segundo a lei não se pode fazer mais nada a quem é apanhado em flagrante delicto, seja ainda o crime mais grave, do que effectuar a sua prisão e enviá-lo ás autoridades competentes.

Não pode applicar-se a pena summaria de morte a ninguem. (Apoiados).

Nestes termos é absolutamente indispensavel que o Governo desminta esta affirmativa do alludido jornal, e não posso acreditar que tenha sido dada semelhante ordem que, sobre ser illegal, seria uma barbaridade da parte de quem a desse - e não tenho duvida em responder por esta afirmação, pois começo por declarar que não acredito que alguem, a tenha dado, mas tambem não tenho duvida em a manter nos seus precisos termos.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - No Ministerio da Guerra não se deram ordens nenhumas especiaes, a não ser ás forças militares encarregadas da policia das povoações feridas pelo terramoto, mas essas instrucções foram sobre o serviço de abastecimento e serviço de abarracamento.

Portanto, não se deram nenhumas instrucções especiaes, ás forças e as que vigoram lá são as instrucções geraes, nas quaes não se permitte a que o illustre Deputado se referiu.

Com respeito á noticia do jornal nada tenho.

O Sr. Affonso Costa: - Certamente. Pedi apenas um esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Continua o incidente. Tem a palavra o Sr. Conde de Paçô-Vieira.

O Sr. Conde de Paçô-Vieira: - Sr. Presidente: depois das palavras do Sr. Deputado Caeiro da Matta pensei em desistir da palavra, mas não sou nesta Camara simplesmente o leader de um grupo de amigos politicos, sou tambem Deputado e é unicamente nessa qualidade, sem prender nenhum dos meus amigos politicos á responsabilidade que me caiba no que vou dizer e que entendo dever a mim proprio, como collega do Sr. Caeiro da Matta nesta Camara e seu correligionario, porque, embora estejamos em differentes campos, estamos no mesmo partido e ha poucos dias trabalhavamos juntos para o mesmofim, com a mesma fé e calor.

Permitta S. Exa. que como velho parlamentar que, sou, pois tenho vinte annos, lhe diga o que sinto em frente deste acontecimento.

Devo dizer a V. Ex.a, Sr. Presidente, que na minha já larga carreira politica é o maior desgosto que tenho tido e neste desgosto me acompanha toda a Camara (Apoiados), pois ninguem é indifferente a um acto d'estes que obrigou a cortar relações politicas com um camarada cheio de talento. (Apoiados).

Sr. Presidente: se o Sr. Caeiro da Matta me permitte, unicamente porque sou mais velho que S. Exa. e tenho mais pratica politica do que o illustre Deputado, diria que fizesse, o que vinte annos fiz nesta casa numa situação quasi identica á de S. Exa.

O facto que se deu com o illustre Deputado não é unico.

Ha sempre nestas campanhas palavras que nos escapam, frases em que não pensamos muito e não reflectimos, e, todavia, nunca ninguem se sentiu diminuido na sua honra em confessar que não teve intenção de aggravar, ou offender.

Sr. Presidente: quando em 1890, ao discutir-se alei de

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imprensa na Camara dos Senhores Deputados, realizava a minha estreia parlamentar, fiz uma afirmação de caracter politico que um illustre Deputado, meu amigo, entendeu offensiva e provocou da parte de S. Exa. um aparte que a minha honra me obrigou, não simplesmente a aparte de palavra, mas a um acto de força sobre S. Exa.

Foi depois d'esse conflicto que a sessão se interrompeu.

E quando toda a gente suppunha que um acto d'aquelles devia terminar por um duello gravissimo, por um acto irreconciliavel entre nos, immediatamente o Sr. Presidente, ouvindo-me a mim e a esse illustre Deputado, e vendo que o meu acto nasceu de uma indignação de momento, e não tinha havido da minha parte nem da parte d'esse illustre Deputado intenção offensiva, declarou que, embora o acto em si fosse grave, desapparecia sob o ponto de vista politico e estava inteiramente liquidado, quer pessoalmente, quer politicamente, e nos sahiamos da Camara amigos como até então.

Aqui tem S. Exa. o precedente.

Reabrindo V. Exa. a sessão, repetiu nobremente as palavras que o Sr. Caeiro da Matta lhe disse em conversa particular.

Portanto, Sr. Presidente, não ha cousa que não possa remediar-se, o que é necessario é que o Parlamento trabalhe e não haja incompatibilidades. E se as palavras que V. Exa. proferiu são verdadeiras, traduzem o pensar do Sr. Caeiro da Matta, eu, deste lado da Camara, digo que esse aggravo deixou de existir.

Oxalá que esta sessão termine como terminou a de 1890. é o meu desejo e o d'aquelle lado da Camara.

E agora, Sr. Presidente, vou referir-se ao Sr. Pereira dos Santos. Disse S. Exa. que havia, effectivamente, o desejo de tornar as maiorias parlamentares incompativeis com o partido. regenerador.

Oxalá que a sessão termine como V. Exa. deseja, como nos queremos e desejamos.

Tenho dito. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. João Pinto dos Santos: - Sr. Presidente: a atmosphera está tempestuosa como V. Exa. tem visto, e apesar do Sr. Conde de Paçô-Vieira ter feito um discurso pequeno, mas conciliador, parece-me que os ares estão turvos e não se pode prever se a calma será duradoura,- o decurso da sessão o demonstrará.

Eu exactamente porque a situação é muito difficil, é que quero falar com serenidade para pôr a questão nos termos precisos, mas para isso é necessario narrar e ver como os factos se passaram na sessão em que o Sr. Caeiro da Matta offendeu a maioria. Tenho aqui, não o extracto official d'essa sessão, mas o extracto de um jornal, e todos que assistiram a essa sessão dirão se elle está ou não conforme a verdade dos factos.

O Sr. Caeiro da Matta, apreciando o Governo, dizia o seguinte:

(Leu).

Sr. Presidente: como era seu dever, interveio neste debate pedindo explicações e o Sr. Caeiro da Mata dizia o seguinte:

(Leu).

Portanto, o que vejo é que V. Exa., usando da sua autoridade como Presidente, interveio neste momento e o Sr. Caeiro da Matta deu uma explicação. Não constou que S. Exa. dissesse que essa explicação não era satisfatoria. Se V. Exa. entendia que não era satisfatoria, o dever da maioria era declarar que o Sr. Caeiro da Matta não tinha dado explicações.

Em que situação ficaria uma maioria esperando durante trinta e cinco dias silenciosa deante de um homem que a tinha offendido e só mais tarde, ao cabo de tanto tempo, sem que lhe pedissem a mais pequena explicação se dicidisse a desaffrontar-se.

Não precisava que S. Exa. falasse; provocavam o Sr. Caeiro da Matta que a offendera politicamente a dar explicações. satisfatorias, e ou S. Exa. dava explicações satisfatorias ou então derimiam a questão por uma pendencia de honra.

O Sr. Antonio Centeno: - Deram para ordem do dia um parecer em que S. Exa. era relator e não queriam que falasse.

O Orador: - É verdade, mas isso é ponto pouco importante, e por isso prosigo nas minhas considerações.

Quando o Sr. Caeiro da Matta foi aqui offendido por um acto da maioria, e eu devo confessar que é uma offensa grave de que não tenho conhecimento que se tivesse feito senão a Wilson, quando era accusado em França por ter feito a venda de condecorações, e quando era considerado um homem desqualificado, e o Sr. Caeiro da Matta não é um homem desqualificado...

O Sr. Rodrigues Nogueira: V. Exa. fez aqui o mesmo o anno passado.

O Orador: - Não fiz, eu individualmente posso sair, mas ficou o Sr. Centeno. (Apoiados).

O Sr. Rodrigues Nogueira: - V. Exa. dá-me licença? Eu sou incapaz de fazer uma affirmação inexacta. V. Exas. nesta Camara estavam sete e ficou só o Sr. Centeno.

O Sr. Moreira de Almeida: - Eu não estava.

O Sr. Egas Moniz: - Eu estava no estrangeiro. O Sr. Moreira de Almeida não estava presente, eu estava no estrangeiro, o Sr. Pedro Martins estava em Coimbra, estavam presentes só dois, ficou um e saiu o outro.

O Sr. Rodrigues Nogueira: - É preciso que nós entendamos. Da parte da maioria não houve complot, cada um saiu expontaneamente e praticou o acto expontaneamente.

Vozes da esquerda: - Oh! Oh!

O Sr. Rodrigues Nogueira: - Eu aflfirmo a V. Exa. que isto é uma verdade, pelo menos pela parte que me respeita, é não me consta que houvesse qualquer instrucção nesse sentido. É um facto como o que S. Exa. praticou o anno passado.

O Sr. Antonio Cabral: - Eu não estava na Camara quando isso se passou, estava no estrangeiro, e o que disse foi por informações que tive.

O Sr. José Tavares: - Foi V. Exa. muito precipitado em fazer semelhante affirmação.

O Sr. Antonio Cabral:- Porque?

O Sr. José Tavares: - Porque V. Exa. fez uma affirmação concreta e agora vem dizer que nem cá estava.

O Sr. Antonio Cabral: - Eu disse ha pouco que não estava no país quando isso se passou, e as informações que recebi foram essas que disse á Camara.

O Sr. Presidente: - Eu peço aos Srs. Deputados que não interrompam o orador.

O Orador: - Toda a gente sabe a maneira violenta

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como ataquei o Governo franquista. Quando depois de caído esse Governo falava o Sr. Martins de Carvalho fui-me embora.

O Sr. Presidente:-Peço aos illustros Deputados que deixem falar o orador.

O Orador: - Eu explico os meus actos com uma clareza absoluta.

Todos sabem que quando me encontrei aqui pela primeira vez, depois de factos conhecidos de todos, todos sabem as palavras que aqui pronunciei, ausentando-me quando falava o Sr. Martins de Carvalho. Foi uma manifestação pessoal e não collectiva.

Ficou na sala muita gente, e se não ficaram mais do meu partido foi porque não estavam nessa occasião na Camara. (Apoiados).

A manifestação d'esta natureza que se fez a Wilson fez-se em condições excepcionaes; foi porque se considerou um homem desclassificado. Ora o Sr. Caeiro da Matta não é um homem desclassificado; (Apoiados) e que o não é prova-o o facto do Sr. Ministro da Fazenda o mandar desafiar por dois illustres membros do partido progressista.

O filho do Sr. Ministro da Fazenda igualmente mandou desafiar o Sr. Caeiro da Matta por dois homens de bem. Portanto, o partido progressista tinha quatro entidades que reconheciam que o Sr. Caeiro da Matta não é um homem desclassificado; logo, a manifestação feita na Camara foi um acto extraordinario. (Apoiados).

Se eu estivesse na maioria, se me julgasse aggravado pessoalmente pelas palavras do Sr. Caeiro da Matta, pedia-lhe Explicações, e então S. Exa. ou dava essas explicações, com que pudesse ficar satisfeito, ou não as dava e então ficaria nas condições de se bater.

Vê se, portanto, Sr. Presidente, que foi uma offensa feita ao Sr. Caeiro da Matta e S. Exa. cumpriu os seus deveres de honra desafiando o leader como representante da maioria.

E, pois, uma questão pessoal que ficou liquidada com honra.

Mas parece que querem dar um aspecto differente de aggravo collectivo á opposição; e assim será julgado se repetirem o aggravo quando o Sr. Caeiro da Matta usar da palavra.

Estavam inscritos oradores de todos os lados da Camara; aclarava-se a situação e esclarecia-se tudo.

Mas agora, depois do leader do partido regenerador ter dito - e eu nesse ponto estou de acordo com S. Exa. - que desde que o Sr. Caeiro da Matta não podia usar da palavra, havia um proposito de cercear os seus direitos de Deputado.

Aqui está como V. Exas. querem arranjar um conflicto comnosco, quando dizem que querem trabalhar.

Isto não representa nada; representa uma cousa impensada da parte de V. Exas. Foi preciso uma maioria de 70 pessoas praticar um acto destes contra um homem honrado, quando V. Exas. podiam dizer ao Sr. Caeiro da Matta que o não deixavam pôr o pé no Parlamento, emquanto não desse explicações.

De forma semelhante, o Sr. Ministro da Fazenda Es-pregueira foi offendido e bateu-se.

Era a offensa do Sr. Caeiro da Matta uma offensa politica?

Alto lá com tal politica.

Eu comprehendo que a maioria devia ficar silenciosa desde que S. Exa. disse que não lhe applicava senão primeira parte do que disse. O facto de ter comiseração pelos outros não representa um crime, não é uma injuria

Que V. Exas. se tivessem retirado uma vez, vá; mas que tivesssm feito isso segunda vez, é inexplicavel, é um movimento irreflectido que não tem explicação.

Em frente d'esse movimento da maioria contra a minoria, accentuando positivamente que o Sr. Caeiro da Matta não havia de falar nesta casa ou havia de explicar as suas palavras, eu digo ao Sr. Caeiro da Matta que não dê explicações, porque já as deu.

A maioria não tem que pedir explicações. O que a maioria quer é collocar o Parlamento em condições de não poder funccionar. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Visconde de Villa Moura: -Sr. Presidente: pedi a palavra para breves explicações, e breves explicações vou dar a V. Exa. e á Camara sobre a minha attitude no presente conflicto.

Eu não retirei da Camara na sessão passada ao usar da palavra o Sr. Dr. Caeiro da Matta; mantive-me aqui até que o Sr. Presidente declarou que aquelle Sr. Deputado usaria da palavra na sessão seguinte e aqui estive a ouvi-lo hoje.

O Sr. Affonso Costa: - Apoiado; muito bem.

O Orador: - Contrariamente insinuaram os jornaes a minha retirada. Erradamente o fizeram, repito.

E que por fim fui obrigado a dizer de mim, rectificando uma questão de facto, releve-me a Camara que eu junte ao caso as razões que me determinaram a proceder como procedi. Serei ainda breve.

Sr. Presidente: pelo conhecimento que tinha do Sr. Dr. Caeiro da Mattam, pelo que sabia do conflicto, e pelo que d'aquelle nosso camarada esperava quando usasse da palavra, devia-lhe toda a attenção e esta lhe dei publicamente.

Isto não envolve confronto com o proceder dos meus correligionarios e alliados politicos. O meu caso era diverso, visto que tiveram de julgar o Sr. Dr. Caeiro pelas suas aliás bem infelizes palavras da sessão de março, demais aggravadas pela deficiencia do Extracto official no que concerne á tentativa da sua reproducção.

Eu tinha por muitas razões acceitado a ideia do que a despeito das suas expressões, elle não tivera o intento de offender a maioria.

Infelizmente a sua declaração de. hoje, se bem que não collida com a minha attitude de hontem, visto importar um caso peorado, é certo que me pauta o incontestavel dever de me solidarizar com todos os collegas d'este lado da Camara, no seguimento do caso.

Penaliza-me o facto. E se posso intervir no espirito de S. Exa. de forma a insinuar-lhe, que não pedir-lhe, uma reconsideração, á exhortação do Sr. Conde de Paçô-Vieira ouso sommar as minhas palavras que dão a medida do meu pensamento e empenho.

É tambem, a final, á orientação do Sr. Conde de Paçô-Vieira, dirigente aqui do partido regenerador da extrema direita e meu amigo que allijo a minha orientação e proceder futuro no caso.

Devo-lhe esta prova da mais justa e documentada confiança, pelo que foram e representaram as suas palavras, pela situação politica que conquistou aqui, pela maneira sobremodo notavel e nobilissima de conciliação e ordem porque apercebeu e encarou o conflicto.

Disse.

O Sr. José Tavares: - Foi bem contrariado que pediu a palavra para responder ao Sr. Deputado Antonio Cabral.

Com effeito, falando S. Exa. não só em seu nome, mas em nome da maioria progressista, para se defender da attitude assumida, já fez as declarações que entendeu e que elle, orador, se abstem de apreciar.

O Sr. Antonio Cabral tem, por vezes, o mau sestro, que evidentemente tem revelado, de provocar os homens do

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partido d'elle, orador; se assim não fosse, não teria feito a citação de um discurso do Sr. Martins de Carvalho.

Ora, estando presente, não podia deixar passar uma affirmação d'esta, sem pedir a palavra para restabelecer a verdade dos factos.

E porque costuma sempre ser preciso nas suas affirmações, dirá que S. Exa. foi um pouco precipitado em fazer a invocação que fez.

Estava o orador presente na sessão transacta em que falou o Sr. Martins de Carvalho, para fazer um discurso didactico, literario, scientifico e legal.

Nessa occasião saíram da sala tres, quatro ou cinco Srs. Deputados, mas não houve uma manifestação de desagrado.

De resto, o orador appella para os membros da Camara, que já naquella epoca a ella pertenciam, para que o desmintam.

Portanto, está feita a demonstração tanto quanto possivel, evidente e incontestavel, de que contra o Sr. Conselheiro Martins de Carvalho tal manifestação se não fez Não pode haver duvida alguma de verdade do que affirma.
Está demonstrado que foi propositadamente que o Sr. Conselheiro Antonio Cabral fez semelhante allusão ao facto a que não assistiu.

De resto, se quisesse dizer mais alguma cousa para de monstração do que tinha affirmado, tinha sido o proprio Sr. Conselheiro Antonio Cabral quem lhe tinha fornecido os argumentos, porquanto S. Exa. não estava em Portugal, como declarou, e apenas falou do acto porque tinha lido os jornaes e obtido informações dos seus amigos Mas tanto as declarações dos jornaes, como as informações que lhe foram dadas, não podem prevalecer perante a demonstração categorica que elle, orador, acaba de fazer.

(O discurso será publicado na integra guando o oradoi restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Carlos Ferreira: - As observações ou declarações que a Camara acaba de ouvir, feitas por um Deputado regenerador-liberal em resposta ao Sr. Conselheiro Antonio Cabral, pode o illustre Deputado estar tranquillo que hão ficam sem resposta.

Manifesta a sua impressão de espanto, de admiração, porque do discurso de S. Exa. poderá a Camara concluir que o apparecimento ou reapparecimento nesta sala de Deputados regeneradores-liberaes, em seguida aos tragicos acontecimentos passados em Portugal, era um caso muito festejado.

O Sr. José Tavares: - Pode S. Exa. repetir o que disse?

O Sr. Malheiro Reymão: - Pede para que o Sr. Carlos Ferreira repita as suas ultimas palavras, porque não se perceberam.

O Orador: - Que pelas palavras do Sr. José Tavares quasi que a Camara ficaria convencida de que o apparecimento ou reapparecimento nesta Camara de Deputados regeneradores-liberaes, em seguida a acontecimentos que tanto agitaram o país, eram recebidos festivamente.

Elle, orador, não assistiu á sessão em que falou nesta Camara o Sr. Conselheiro Martins de Carvalho, mas o que pode affirmar é que não existe paridade com a questão que neste momento se está debatendo.

Limita-se a .dizer que estamos num incidente grave muito desagradavelmente, politicamente muito melindroso, mas está longe de parecer-se ou assemelhar-se do incidente produzido nesta Camara com o Sr. Martins de Carvalho.

A Camara acabou de ouvir uma declaração clara, terminante, categorica, feita pelo Sr. João Pinto dos Santos, em termos bastante frisantes. O Sr. João Pinto dos Santos explicou o motivo á Camara em concisas palavras, de um valor incisivo.

Deve dizer que em sua consciencia e em sua intelligencia, por pouco esclarecida que seja, não considera o final da sessão de 15 de março liquidado. A situação está de pó. Esse aggravo politico, absolutamente politico, como tal nos o consideramos - e nem de outra forma podia ser considerado - não está desfeito.

Sabe elle, orador, a differença de um aggravo politico e de um aggravo pessoal.

O Sr. Presidente da Camara - como consta do Summario das Sessões- pediu, insistiu, instou, convidou o Sr. Caeiro da Mata a retirar ou explicar as suas palavras. S. Exa. não retirou, nem explicou. Subsiste, portanto, o aggravo politico.

No facto succedido hontem, o Sr. Moreira Junior, illustre leader do partido progressista, não teve conhecimento da attitude da maioria. O acto do Sr. Conselheiro Moreira Junior ha de ficar escrito, gravado, nos annaes parlamentares desta Camara, como modelo de lealdade e honradez.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. João Castello Branco: - Será breve, não deseja tomar a palavra neste debate nem para discutir a sua essencia, nem para aclarar as referencias que o Sr. Antonio Cabral fizera, e tão somente para esclarecer o seu procedimento na sessão passada.

Quanto ao incidente em si lembra que a sessão ha pouco falada não foi interrompida por falta de numero, não tendo o incidente de então nenhuma paridade com o que se passou presentemente.

Somos absolutamente solidarios. Da nossa parte declara - não ha intenção alguma de perturbar os trabalhos parlamentares.

Resta-lhe declarar que mantem a sua solidariedade e faz votos para que a situação se não embarace e a minoria não persista num aggravo que parece não ter razão de ser depois das explicações feitas leal e correctamente pelo Sr. João Pinto dos Santos.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

Antonio Cabral: - Sr. Presidente, não pediria a palavra a V. Exa. se não fosse provocado pelo Sr. José Tavares que se referiu directamente ás palavras que ha pouco proferi. Creio que o Sr. José Tavares não ouviu bem o que eu disse. Eu declarei muito claramente que, não estando no país quando se passou esse facto, só pelas informações que me tinham sido dadas me pareceu ter lido em alguns jornaes que, na occasião em que failava o Sr. Martins de Carvalho, alguns Srs. Deputados d'este lado da Camara, não sei se muitos, se poucos, saíram, o que foi nessa occasião tomado como uma manifestação contra esse Deputado.

Foi isto é que eu disse muito terminantemente.

Disse S. Exa. que não podia deixar de fallar para que não se dissesse que a um Deputado do seu partido tinha sido lembrado, que podia maguar e que não tinha havido protestos no grupo de que S. Exa. fazia parte.

Mas, Sr. Presidente, V. Exa. ouviu ha pouco as palavras do illustre Deputado, o Sr. Carlos Ferreira, referindo-se ás que pronunciou ainda este anno o Sr. João Pinto dos Santos com relação a esse Sr. Deputado e sobre essas palavras do Sr. João Pinto dos Santos o Sr. Tavares não disse uma unica palavra.

Nas minhas não houve a menor offensa para o Sr. Marins de Carvalho, das outras não me compete dizer se a louve, mas a verdade é que não houve a menor referen-

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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

cia ás palavras do Sr. João Pinto dos Santos e para mim é que foram todas as inflamrnadas palavras de S. Exa., quando a verdade é que eu não disse nada mais nem menos do que V. Exa. ouviu claramente, que estava no estrangeiro que portanto não tinha assistido á sessão, mas que fora informado por algumas pessoas de que nessa occasião alguns Deputados saíram, e que saíram, ainda ha pouco o Sr. João Castello Branco o confirmou. O que eu não sabia era se os Deputados que saíram tinham saído como manifestação a esse Deputado, mas as palavras do Sr. João Castello Branco affirmam que alguns Deputados saíram. As informações que me deram, e o que me está dizendo o Sr. Correia Mendes, de cujo caracter ninguem pode duvidar, é de que não foram poucos esses Deputados. Já o illustre Deputado vê que não foi mau sestro da minha parte.

Interrupção do Sr. Correia Mendes que não foi ouvida.

Aqui tem V. Exa., portanto, que não é mau sestro da minha parte, implicar com quem quer que seja; o que eu tenho, e fique S. Exa. certo disso, como norma inabalavel da minha vida, é o desaggravar-me sem pré que me aggravam, defender-me sempre que me atacam, quando esse ataque é injusto. Isso é que hei-de fazer sempre. Eu não sou provocador, nunca parti uma carteira, nunca fui chamado á ordem, nunca tive que retirar uma palavra nem que a explicar.

Não provoco, mas quando me aggravam ou se me dirigem de maneira que eu entendo que não mereço, quando a actos meus corresponde a injustiça da parte d'aquelles a quem a não mereço, quando porventura alguem, ou politicamente ou pessoalmente, se me dirige de uma maneira, ou me ataca de forma que eu refuto incompativel com - aquelle a que entendo tenho direito, então sim, então sou violento no aggravo, chego a ser feroz na aggressão.

Fique S. Exa. sabendo que isto é que eu entendo que fazem todos aquelles que teem acima de tudo a noção da justiça e a par disso a noção da dignidade. Se eu provocar e se nessa provocação eu for violento teem o direito de me censurar, mas quando não provoco e me vêem offender e atacar com aquella injustiça que entendo que não mereço, então eu vou ao aggravo pessoal, se o aggravo for pessoal, e politico se for politico.

E essa a minha norma invariavel de proceder, desaggravar-me quando me aggravam, defender-me quando me atacam, se é na imprensa é na imprensa, se é no Parlamento é no Parlamento se é no campo pessoal é ainda ahi que me encontram.

Qual foi a palavra em todo o meu discurso que S. Exa. viu que representasse, de longe sequer, qualquer má vontade contra o Sr. Martins de Carvalho? Referir-me a esse facto que eu não tinha presenciado, porque não estava no país e que conheço apenas por informações?

Mas essa informação vejo eu ainda agora confirmadas pelas palavras do meu querido amigo Sr. Correia Mendes que acaba de me dizer que estando na sala dos Passos Perdidos com o Sr. Paulo de Barros e outros Srs. Deputados ouviu a varios membros d'esta Camara que para ali se dirigiam que saiam da sala par começar a fallar o Sr. Martins de Carvalho.

Portanto, Sr. Presidente, da minha parte não houve a menor desconsideração, referi-me simplesmente a informações que recebi.

Precipitado foi o illustre Deputado e não eu em vir referir-se de tal maneira ás informações que me tinham sido dadas. (Apoiados).

Mas voltando á questão devo dizer que ella não o facil, é uma questão em que está empenhada a dignidade de toda a maioria porque ella foi aggravada politicamente.

Se pessoalmente tivesse sido feito um aggravo a qualquer dos seus membros então sim, havia uma outra maneira de se desaggravar, mas o que houve foi um aggravo politico e esse aggravo foi desaffrontado na primeira occasião propicia. (Apoiados). Como havia de proceder a maioria ao sentir-se aggravada como se sentiu com o incidente de 15 de março, depois de ver que o Sr. Caeiro da Matta não explicava as más palavras e que portanto o assunto não ficou de modo algum liquidado?

Pelo contrario, V. Exa. referindo-se ás conferencias que o Sr. Caeiro da Matta tinha tido com V. Exa., dizia que elle era o proprio a reconhecer que houvera, da sua parte, um aggravo para com a maioria. (Apoiados).

E tanto S. Exa. o reconhecia que dizia que, tendo de falar sobre o projecto das "Casas baratas" aproveitaria a opportunidade para explicar o seu procedimento.

Portanto, era o proprio Sr. Caeiro da Matta que dizia que tinha feito um aggravo politico á maioria (Apoiados) e que não tinha duvida nenhuma, na primeira vez que falasse nesta Camara, em declarar que tinha a maior estima e consideração por todos os seus membros.

Já vê, pois, V. Exa. que era o proprio Sr. Caeiro da Matta que reconhecia que estava de pé o seu aggravo, e de que era necessario, na primeira occasião opportuna, desfazer esse seu aggravo. (Apoiados).

E não queiram ver neste procedimento da maioria o desejo de não trabalhar, esta é já a parte da especulação politica. (Apoiados).

Não é já a ?evelação da dignidade, que todos os homens devem ter que se quer ver nesta questão, mas simplesmente o prurido dos interesses politicos, quando o nosso desejo é trabalhar e corresponder, com as nossas forças, áquillo que o país reclama, (Apoiados) e ás resoluções dos problemas mais importantes, que interessam ao nosso pais. (Apoiados).

Protesto, pela minha parte, contra qualquer desvirtuamento de um acto da maioria.

O procedimento na maioria foi unica e simplesmente a manifestação da sua dignidade aggravada, que o proprio Sr. Caeiro da Matta reconheceu, (Apoiados) foi unica e simplesmente, repito, a sua manifestação de sentimento para com aquelle Sr. Deputado que, tendo vindo tantas vezes a esta Camara, depois d'aquella memoravel sessão, que foi interrompida por um grande ruido, não tinha declarado ainda que não tivera a menor intenção de aggravar a maioria.

Não queiram, portanto, quer na imprensa, quer nesta Camara, levar a questão para outro terreno, que não seja aquelle em que ella está posta.

Não se queira dizer que a saída hoje desta Camara da maioria foi um aggravo para toda a opposicão, porque eu já ha pouco disse, bem claramente, que não houve o menor aggravo para com os Deputados d'aquelle lado da Camara. (Apoiados).

Foram ouvidos varios Deputados d'aquelle lado da Camara, sem a menor satisfação da maioria, que não fosse a da máxima consideração.

O Sr. Caeiro da Matta pôs nesse discurso toda a acuidade e toda a violencia e a maioria respondeu a isso com toda a correcção de que tem dado provas nesta casa do Parlamento.

Fica bem assente que da parte da maioria não houve mais do que a .demonstração do seu resentimento pelas palavras do Sr. Caeiro da Matta e fê-lo na primeira occasião que teve. Não tenho nenhum meio dg mostrar o seu resentimento e de fazer uma desafronta, senão esse.

Tem havido da parte da maioria, quer no discurso do Sr. Conde de Paçô-Vieira, quer no discurso do Sr. Carlos Ferreira, quer ainda nas palavras dos outros oradores, o proposito, a manifestação da maior sinceridade e o desejo de que se liquide o incidente honrosamente para uns e outros.

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SESSÃO N.° 30 DE 30 DE ABRIL DE 1909 13

O Sr. João Pinto dos Santos: - Não revejo os meus discursos mas não exijo da tachygraphia que escreva tudo o que eu digo.

As palavras que eu aqui disse, tenho, porem a certeza de que foram pronunciadas.

O Sr. Mello Barreto: - As palavras a que o Sr. João Pinto se referiu foram as que vieram nas Novidades e foram-me cbommunicadas pelo Sr. Caeiro da Matta.

Foi tal o meu escrupulo nesse assunto, que pedi ao Sr. Caeiro da Matta que redigisse essa noticia, e foi isso que veio publicado nas Novidades.

O Orador: - S. Exas. dão licença?

Está isso aqui no Summario de 15 de março.

(Leu).

Isto sem a explicação que dou depois.

O Sr. Mello Barreto: - A explicação é aquella que eu já fiz.

O Sr. Rodrigues Nogueira: - S. Exa. está habilitado a fazer essa declaração em nome do Sr. Caeiro da Matta?

O Sr. Mello Barreto: - É a expressão da verdade. Havia duvidas sobre a interpretação dessas palavras que constavam do extracto, e foi tal o meu escrupulo em que as Novidades não publicassem cousa alguma que não fosse a fiel expressão da verdade, que a elle proprio pedi que as redigisse.

O Sr. Caeiro da Matta: - É verdade; mantenho essa declaração. (Apoiados).

O Sr. Rodrigues Nogueira: -Foi então o Sr. Caeiro da Matta quem redigiu o artigo que veiu nas Novidades?...

Do lado das opposições levanta-se certa agitação.

O Sr. Presidente: - Peço a attencão da Camara.

O Orador (continuando): - Vou concluir rapidamente as minhas considerações.

Da parte da maioria tem havido o proposito de fazer como que uma ponte de passagem para que se liquide este incidente. (Apoiados).

Desde o momento em que á maioria forem dadas aquellas provas de consideração a que tem direito, o conflicto fica liquidado, porem, desde que lhe não forem dadas essas provas de consideração, o conflicto fica de pé.

Tenho dito.

(O orador não reviu).

O Sr. Malheiro Reymão: - Pediu a palavra quando falava o Sr. Carlos Ferreira, porque ficou duvidoso sobre o que S. Exa. queria significar quando disse que não discutia a attitude dos Deputados do partido regenerador-liberal, e não percebeu a que proposito ou desproposito vinha essa declaração, porquanto o seu illustre collega nesta Camara tinha pedido a palavra apenas para fazer uma rectificação de facto.

Permitta-se-lhe que diga que a maioria desta casa do Parlamento está seguindo por um caminho errado e pernicioso, e não tem o direito, em nome dos interesses do pais, de collocar-se numa situação irreductivel para com as minorias.

Todos são homens de honra e brio pessoal e sabem discutir todas as questões que os affectam, más não podem levantar, uma questão politica d'esta natureza sobre um pretendido aggravo politico que se devia julgar liquidado. Não tem a maioria esse direito.

Aggravados individual ou collectivamente, todos os Senhores sabem como desaggravar-se; não é preciso indicar-lhes o caminho. Um aggravo politico, porem, sacrificando o regular furiccionamento das sessões aos interesses, ás vaidades, ás condescendencias, talvez, dos partidos politicos, é lamentavel.

Protesta contra tal, em nome dos verdadeiros interesses do país, em que tantas vezes se fala e tantas vezes se desconhece.

Os aggravos politicos não podem existir entre as maiorias e as opposições. As maiorias votam, vencem pelo numero.

Não conhece elle, orador, especie alguma de aggravo politico que não seja por sua natureza aggravo pessoal. E aggravo de homem para homem, de collectividade para collectividade. Tudo se discute por outra maneira.

Que singular vento de loucura está passando por sobre este desgraçado país!

Como estão dando este deprimente e vergonhoso espectaculo, fazendo-se respeitar pelos outros, sacrificando ás suas ambições ou ás suas furias, ás suas maguas ou ás suas irritações as grandes questões vitaes que tanto interessam á nação!

Contra isso é que quero deixar bem lavrado o meu protesto. A maioria não tem o direito - e elle, orador, não quer ferir susceptibilidades pessoaes - de impedir o bom funccionamento dos trabalhos parlamentares.

Se houve aggravo a desaggravar, houve muita occasião opportuna.

Mas para a maioria se cerrar numa intransigencia absoluta, ella que deve ser o fiel registador das funcções do Parlamento, é necessario que corra veloz o vento de loucura que sopra sobre o país.

Isto é fantasticamente extraordinario!

Pensem immediatamente no que vão fazer e attentem no que deve julgar o país quando amanhã aprecie o procedimento de cada um, vendo como defendem os seus interesses.

Repete que é a seu pesar que interveio na questão mas entende que faltava aos deveres da propria consciencia se não se declarasse aberta e formalmente contra o desastroso caminho em que vê a maioria parlamentar lançar-se.

É grandeza de animo o ceder quando se conimette uma loucura. Cedam, transijam, que essa é a obrigação dos fortes. A maioria representa a força; não é cobardia a transigencia. Os actos de todos e o procedimento de cada um ha de ser apreciado e julgado em ultimast instancias por aquelles todos que nos devem apreciam e julgar - esses são o país.

Cumpra a maioria o seu dever. A opposição tambem cumprirá o seu.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Rodrigues Nogueira: - Sr. Presidente: de longe o vento de loucura sopra sobre a nossa terra, e se alguma cousa pode assombrar o país é o que eu acabo de ouvir ao illustre orador que me precedeu.

Bem prega frei Thomás... Vem dar conselhos quem não teve, sequer, um vislumbre de juizo para segui-los.

O Sr. Malheiro Reymão: - S. Exas. estão até a justificar isso mesmo.

O Orador: - Ainda bem que S. Exa. me fez essa interrupção, porque se na minha alma podesse haver uma commiseração por aquelle que anda fugido, ella desapparecia agora.

O Sr. Matheiro Sampaio: - Nunca em parte alguma

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14 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

se viu uma cousa d'estas! Aggravar um desgraçado que anda longe da sua patria!

O Orador: - Eu creio que nas minhas palavras não ha o menor aggravo para ninguem, appello para a Camara, mas se porventura pronunciei qualquer palavra de aggravo eu devo dizer que ella não estava no meu animo e por isso nenhuma duvida tenho em a dar por não dita.

Eu vejo, Sr. Presidente, que alguem é interessado em que deste conflicto provenham difficuldades para a marcha do Governo, vejo Sr. Presidente, que, alem dos interessados particularmente neste incidente, mais alguem tem vindo de fora illaquear, tolher, uma boa solução para esse conflicto.

Estamos numa epoca em que cada um deve ter a coragem das suas affirmações e dizer desassombradamente o que pensa.

Não teem sido os estrictamente interessados neste assunto, aquelles que só teem intervindo nelle; pelas declarações que aqui se teem feito nos vemos que mais de um collaborador houve neste assunto.

Eu vou formular uma pergunta ao Sr. Pereira dos Santos. Gosto muito das situações definidas porque só em situações bem definidas é que se marcam bem as posições.

O incidente que se deu. foi entre a maioria e o Sr. Caeiro da Matta?

Já mais de um orador declarou que não houve intuito de maguar a minoria na forma como a maioria procedeu.

O Sr. Visconde de Villa Moura: - V. Exa. refere-se á minha declaração?

O Orador: - Refiro-me ás declarações do Sr. Antonio Cabral, Conde de Paçô-Vieira, etc.

O Sr. Pereira dos Santos: - Fui tão discreto na maneira como falei que nem alludi ao incidente de hontem por entender que a quentão em si tinha sido resolvida pessoalmente.

As minhas considerações foram simplesmente- de outra ordem, porque, segundo o meu modo de ver, realmente o que houve de um e outro lado está liquidado.

V. Exa., todavia, pôs a questão noutro pé; por isso vou repetir as minhas palavras.

O Orador: - Vamos a ver.

O Sr. Pereira dos Santos: - O que a .maioria fez na sessão de hontem, foi um aggravamento contra as reclamações que se tinham feito, com o que a opposição não pode transigir, pois vem coarctar os seus legitimes direitos, alem de representar mais um aggravo feito a nos e uma offensa aos nossos legitimos direitos.

É assim que pus a questão, para se poder resolver dignamente.

De forma que representando o procedimento da maioria um aggravo politico á minoria, confirmado pelas declarações feitas, a maioria comtudo pode transigir, menos com o que representa um aggravo politico.

A maioria, portanto, procedendo como fez, veiu aggravar essa situação, tornando-a irreductivel.

O Orador: - Parece que da parte do Sr. Caeiro da Matta, não havia a intenção pessoal, ou individual de aggravar e deixava entrever durante esta discussão uma solução honrosa para todos.

O Sr. Caeiro da Matta tinha explicado as suas palavras que saíram impressas nas Novidade, dizendo que não havia da sua parte ideia de offender.

Vamos pôr a questão como ella está actualmente, vamos ver quaes as consequencias logicas que d'aqui proveem.

O Sr. João de Menezes: - Não ha logica.

O Orador: - Em face das declarações do Sr. Presidente da Camara e das explicações do Sr. Mello Barreto...

O Sr. Mello Barreto (interrompendo): - Não dei explicações nenhumas, absolutamente nenhumas, nem tão pouco as dou. Tanto mais que se tomou como aggravo á minoria regeneradora o aggravo feito ao Sr. Caeiro da Matta.

Não dei explicações nem o Sr. Caeiro da Matta as dá. Somente disse que o que vinha publicado nas Novidades representava a expressão da verdade.

O Oradora - Eu posso referir-me aos factos passados na Camara e que todos conhecem.

O Sr. João Pinto dos Santos: - Pois sim, mas ha de precisar esses factos e tomar a responsabilidade das suas palavras.

O Sr. Mello Barreto: - Diga tudo, diga tudo.

O Sr. Zeferino Candido: - Fale, fale.

O Orador: - Ah! querem que diga tudo?

Então ahi vae.

Quando o Sr. Mello Barreto proferiu aqui estas palavras, o Sr. Caeiro da Mata foi de dentro das bancadas falar com o Sr. Teixeira de Sousa.

Vozes na esquerda: - Isso é falso, isso é mentira.

(Levanta-se grande tumulto).

O Sr. Presidente (pondo o chapeu na cabeça): - Encerro a sessão, e marco a seguinte para amanhã, 1 de maio, dando para ordem do dia a continuação do incidente com a maioria parlamentar, fixação da força naval, construcção de casas baratas e organização da Caixa Geral de Depositos.

Eram 6 horas e 45 minutos da tarde.

O REDACTOR = Sergio de Castro.

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