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APPENDICE Á SESSÃO N.º 30 DE 24 DE FEVEREIRO DE 1896 336-C

fil-o com todo o calor da minha alma, e se não o fiz tambem com a palavra é porque não sabendo exprimir com a mesma eloquencia com que o fizeram alguns oradores d'esta camara, illustres parlamentares conhecidos, tudo quanto se passava no meu intimo, preferi ficar calado. O que posso affirmar, porém, a v. exa. e à camara é que n'essa manifestação aos bravos militares que enalteceram o nome portuguez e o fizeram repercutir até os confins do globo, não fui eu dos que menos sentiram esse abalo enorme ao ver levantada a patria pelo esforço de um punhado de homens; esses sim, que são verdadeiros portuguezes! Mas triste approximação, como ia dizendo.

A par d'esses heroes, que ha dois dias o povo inteiro, n'uma acclamação unisona victoriava, apparecem agora esses outros, querendo tambem passar como taes, sendo apenas embusteiros, farçantes, pretendendo subir os degraus da escada social por meio de pavorosas, inventando cousas falsas, falsas, falsas, digo-o bem alto. O documento firmado pelo funccionario que está actualmente á testa dos negócios da India, parece tombem querer chamar a si o quinhão destas glorias vergonhosas, armadas sobre um montão de ruinas e alguns centenares de victimas, que hão de sempre deixar gravado o ferrete da ignominia no glorioso pendão das quinas.

A camara já conhece...

O sr. Presidente: - Peço ao sr. deputado, que não faça referencias a pessoas que estão ausentes e que não se podem defender, porque não têem voz n'esta casa.

O Orador: - Desculpe-me v. exa. e a camara se acaso proferi algum termo que sõe-menos bem aos ouvidos de pessoas prudentes. Estou analysando os actos de funccior narios e nunca os de homens que, por fortuna minha nem conheço, e pelo governo foram investidos no alto cargo da governação da India. Refiro-me a documentos publicados no Diario do governo. Sinto que o sr. ministro da marinha não esteja presente, mas está presente o governo, que responde pelos actos d'aquelle funccionario. Entretanto, agradeço muitíssimo a v. exa. a sua admoestação, porque o meu fim não é vir aqui melindrar ninguem, venho aqui tão sómente desaggravar-me.

Tenho a honra de conhecer a v. exa. ha muito pouco tempo, mas desde o primeiro dia em que o vi, notei em sua physionomia uma tal expressão de bondade, que logo attrahiu a minha sympathia, e me não permitte crer que v. exa. queira impedir-me de continuar a expor á camara o que tenho a expor, e que é indispensavel para o meu desaggravo. Mas comprehende v. exa. a situação excepcionalissima, em que me encontro exactamente n'este momento, e por isso v. exa. e a camara me desculparão alguma palavra menos correcta. Peço desculpa á camara; a minha intenção não é ferir, a minha intenção é, como disse, desaggravar-me.

Disse eu que essa rebellião dos marathas, cujas origens eu não conheço exactamente, fora um acto de indisciplina, um acto de insubordinação.

Com alguma rasão ou sem nenhuma, os marathas recusaram-se a marchar para Lourenço Marques quando lhes foi ordenado fazel-o, o ordens terminantes foram dadas para que se punissem os insubordinados. Ato aqui nada de anormal embora prudente fosse evitar o succedido, e sou eu o primeiro a applaudir, como disse, as instrucções do governo da metropole ou as ordens de quem quer que seja, para que fossem justamente castigados todos aquelles que se indisciplinaram e não souberam cumprir como deviam!

Mas nada tem essa rebellião, que é um facto effectivamente grave de disciplina, que se deve punir com toda a severidade, com uma campanha torpissima - creio que não offendo ninguem - feita contra uma pessoa veneranda e respeitavel, que produziu como consequencia o afastamento desse funccionario o a sua deportação para Diu, homem digno de toda a consideração, considerado sempre como um funccionario recto e leal.

Sr. presidente, que tem uma cousa com outra? Era Bernardo Francisco da Costa um homem recto, era um homem serio, e os homens serios, honrados e leaes fazem sombra aquelles que nem sempre procedem da mesma fórma.

Depois encetou-se uma perseguição...

São tantas as cousas que tenho que dizer ao parlamento, é tal a confusão em que tenho o meu espirito, que as minhas idéas se atropellam ao descrever esta campanha aggressiva, em que as auctoridades superiores que estão a testa do governo da India se assignalaram.

Alguns funccionarios e empregados europeu começaram a receber os seus vencimentos com 60 por cento de augmento, como o governo póde attestar, e até foi perseguido um funccionario muito serio e honrado, porque não acceitou a proposta do augmento do seu vencimento em 60 por cento; retirou da capital, e foi fazer uso do seu ministerio em Salsete... um pouco longe - refiro-me ao arcebispo da India e primaz do oriente, a osse illustre prelado honradissimo, a esse personagem prestigioso, que é europeu e está isento de qualquer suspeição.

Como era natural, desagradou a attitude correctissima e independente d'este illustre prelado. Foram aproveitadas as mais pequenas cousas para o maguarem e o incommodarem. E assim o fizeram, tanto nas questões relativas ao seu alto ministerio, como mesmo nas que diziam respeito á sua vida particular.

Desconsideraram-no quando se fez uma missa campal. E embora fosse prudente e até de boa tactica evitar qualquer conflicto, em tal se não pensou. Appareceu o conflicto. Houve queixas á auctoridade superior. E não só isto. As cousas tomaram depois outra feição. Quando o capellão do palacio do Cabo ia dizer a missa costumada, o governador geral mandou-o retirar, dizendo-lhe: "Vá-se embora, não precisamos de missas, estamos em tempo de guerra e em estado de sitio! O governador não precisa de missas".

Isto, numa colonia como a da India, em que as tradições religiosas estão tão arreigadas e tem sido respeitadas através de seculos! A desorientação era completa. Desejava-se sobretudo o fim ha muito appetecido de incommodar e perseguir os naturaes da India, e a mais nada se attendia. Mesmo aquelles dos europeus de cá mandados, que não commuugavam nos mesmos sentimentos de odios e vingança, eram perseguidos.

Visou-se naturalmente a cabeça de Bernardo Francisco da Costa, como honradíssimo que era, homem serio e afastado de tudo, como eu hei de provar com cartas particulares, especialmente uma que eu me permittirei ler á camara, embora a enfade, porque a verdade deve sempre mostrar-se - carta que me chegou às mãos dois dias depois do seu fallecimento. Como disse visava-se a cabeça de um homem prestigioso, como era Bernardo Francisco da Costa. Desculpe-me a camara esta maneira de fallar a respeito de meu pae. Hoje quando tanta gente tem receio de dizer quem é seu pae, eu orgulho-me em dizer que sou filho de Bernardo Francisco da Costa. Isto não offende ninguem, e enaltece-me a mim, filho de tal pae. Repito, visou-se a cabeça d'aquelle funccionario.

Bernardo Francisco da Costa, como inspector dos estudos, tinha obrigação de inspeccionar as escolas da India. Servindo-se deste pretexto, a coberto da lei, desejando incommodal-o e desfazerem-se d'elle, mandaram-no para, Diu. Ora o clima de Diu é o mais mortifero da India, e tanto que quando se manda para lá um individuo na occasião der ali grassarem com mais intensidade as febres, costuma dizer-se coitado, aquelle tem pouco tempo de vida... vox populi, vox Dei. Meu pae partiu. Qualquer dos membros do governo que vejo presentes póde dizer se eu pedi para elle não ir. Degredaram para Diu um homem de setenta e cinco annos, com serviços relevantes prestados ao paiz, homem respeitabilissimo que mereceu sempre a confiança e a estima de Fontes Pereira de Mello e Sampaio. Esse homem não é respeitado em tão avançada idade.