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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nem se póde abusar á face dos preceitos constitucionaes, porque aqui está a camara para corrigir os abusos, como os corrigiria o parlamento francez, se se abusasse dos creditos complementares para despezas desnecessarias e superfluas.

Disse o illustre deputado, que o tribunal de contas não tinha feito a sua declaração, e que, por consequencia a camara não tinha meios de fiscalisar os dinheiros publicos.

Eu direi ao illustre deputado, que o governo apresentou as contas á camara e póde ella fiscalisar os dinheiros publicos á vista d'essas contas... (Interrupção.)

O illustre deputado, o sr. Luciano de Castro, quer que o governo mande á camara todos os documentos para esta examinar as contas da despeza...

O sr. Luciano de Castro: — Eu não pedi isso; eu o que disse foi, que nós não temos nem podemos ter elementos para poder apreciar as contas de despeza emquanto não houver a declaração do tribunal de contas: é preciso, para a camara examinar essas contas, a declaração do tribunal de contas, não basta a apresentação d'ellas aqui.

O Orador: — Nós temos perfeitamente elementos para fiscalisar a gerencia do governo e apreciar o excesso da despeza; o que não temos é elementos bastantes para que o tribunal de coutas possa proferir a sua declaração annual. Mas é preciso notar que o tribunal de contas ha muito tempo que diz nos seus relatorios que a nossa contabilidade não está ainda organisada de maneira que possa dar-se no tempo devido essa declaração. O tribunal de contas tem por mais de uma vez mostrado a impossibilidade em que está de dar essa declaração.

Para a regularidade completa das contas era isso conveniente, mas a camara tem as contas dadas pelo governo, e á vista d'ellas tem elementos muito importantes para fiscalisar as despezas e a gerencia dos dinheiros publicos, a não ser que duvide da exactidão d'essas contas. Mas tanto não duvida que se serve d'ellas para as suas apreciações, e aqui estão todos os documentos para avaliar a responsabilidade do governo.

Parece-me, pois, que é uma heresia constitucional dizer-se — que a discussão do orçamento é inutil! A camara póde dispensar-se de discutir o orçamento quando não tem nada a dizer sobre elle, e até em muitos paizes a discussão e votação do orçamento dura unicamente uma, duas sessões, mas não se póde dizer que a sua discussão é uma inutilidade. (Apoiados.)

Por via de regra o orçamento não é mais do que uma serie de verbas de receita e despeza que estão determinadas por lei, podendo a camara julgar que não deve fazer n'elle alterações. Muitas vezes, em projectos de importancia, a camara não discute, approva simplesmente, porém mantem o seu direito em votar. A obrigação da camara é votar o orçamento, discutindo-o, se quer; e a obrigação do governo é fazer o possivel para que se vote o orçamento. (Apoiados.)

São estas as reflexões que tenho a fazer em resposta ás que apresentou o illustre deputado.

O sr. Luciano de Castro: — Poucas palavras direi em resposta ás considerações que acaba de fazer o sr. ministro da fazenda.

S. ex.ª deslocou completamente a questão. (Apoiados.) Não censurei o governo nem a camara por discutir o orçamento; dei só as rasões por que eu não discuto. Essas rasões obrigavam-me a dizer á camara que esta discussão é inutil. E affirmo ainda que o é.

O governo cumpriu o seu dever apresentando o orçamento; mas a camara não está habilitada para apreciar devidamente a gerencia financeira do estado.

Foi isso o que disse, e repito.

Diz o sr. ministro: «O governo dá todas as contas! » Mas eu pergunto, que meios tem o parlamento para verificar se essas contas exprimem a verdade? (Apoiados.)

Desde que ha fiscalisação, ha direito de duvidar. Essa

desconfiança é legal. É a lei que encarrega ao tribunal competente a fiscalisação e julgamento das contas dos ministerios. Este tribunal não tem cumprido o seu dever. A camara não póde por isso considerar-se habilitada para fiscalisar a applicação dos dinheiros publicos.

Diz s. ex.ª que apresentou já as suas contas. Mas que importa isso? Ás contas comprehendem as verbas de despeza, que s. ex.ª ali manda inserir. Para se poder averiguar se essas despezas foram ou não conformes ás deliberações das côrtes, era preciso que fossem remettidos á camara os respectivos documentos da despeza. E isso não póde ser, porque a lei os manda remetter ao tribunal de contas; mas como este tribunal não póde cumprir o seu dever, estamos inhabilitados para apreciar a gerencia financeira do estado.

Sr. presidente, o nosso systema de contabilidade, como o de outras nações, funda-se não só na apresentação do orçamento ás côrtes, mas na fiscalisação do orçamento, isto é, no exame e julgamento das contas. Os srs. ministros mandam, é verdade, aqui as contas.

E nem todos as mandam, porque a conta da gerencia do ministerio das obras publicas, no ultimo anno economico, ainda cá não appareceu. Mas supponhamos que todos cumprem esse dever constitucional. Pergunto eu: a que commissão são remettidas essas contas? (Apoiados.) Qual é o parecer que recáe sobre ellas? Qual é a lei que as approva? Nenhuma. Nem a camara as podia approvar, porque não tem os elementos necessarios para essa apreciação. C Apoiados.)

As minhas observações não se referem especialmente ao sr. ministro da fazenda, referem-se ao defectivo e vicioso systema de fiscalisação parlamentar sobre a gerencia dos dinheiros publicos.

O sr. ministro citou-nos a França. Pois eu citar-lhe-hei um paiz modelo em contabilidade publica, como em muitos outros assumptos, um paiz que póde servir de exemplo a outras nações no tocante a reformas economicas e administrativas. E a Italia.

A Italia, desde que conseguiu unificar o seu regimen interno, e fundir n'uma só a legislação diversíssima de todos os povos d'aquella vasta peninsula, tem procurado remodelar cuidadosamente todos os ramos da sua administração.

Tenho lido trabalhos apresentados ao parlamento d'aquelle paiz, que podem rivalisar com os mais perfeitos e acabados em assumptos de governação publica.

(Aparte do sr. Carrilho que se não percebeu.)

E exactamente em contabilidade que nós temos muito que aprender ali. Se s. ex.ª ler a lei de 2 de março de 1869, do ministro Sella, verá que ha ahi idéas luminosas a aproveitar. Por exemplo, os creditos supplementares, complementares e extraordinarios, toda essa forragem da velha e mysteriosa sciencia financeira desappareceu. A differença entre exercicio e gerencia desappareceu igualmente. As contas de gerencia comprehendem sem distincção todas as receitas e despezas do anno economico. Ha um orçamento provisorio e outro definitivo. Ha um fundo para despezas eventuaes, e outro de reserva para despezas imprevistas. D'aqui resultam importantissimas simplificações.

Ha mais. Nenhuma ordem ou mandado para pagamento de despeza póde ser executado sem que seja registado pelo tribunal de contas, e o tribunal de contas não o regista se não for conforme á lei. (Apoiados.)

Isto não é censura ao illustre ministro. Mas é certo que entre nós todos os ministros gastam o que querem e como querem, porque não ha fiscalisação sobre a sua gerencia.

Disse s. ex.ª, pois não vem o governo á camara pedir a legalisação das despezas? Oh! senhores, é verdade; mas que significa este mesmo facto de vir o governo constantemente ao parlamento pedir a legalisação de despeza? Que significam estes bills de indemnidade tão frequentemente pedidos? Significam que o orçamento é uma burla (apoia

Sessão de 18 de fevereiro