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490 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Em regra, sr. presidente, quando se recorre a um argumento d'esta ordem, é indispensavel em primeiro logar demonstrar a igualdade de condições economicas dos paizes comparados.

A organisação da propriedade, a distribuição da riqueza, a alimentação das classes pobres, os systemas de cultura e a sua relativa proporção, e outros muitos elementos ainda, que constituem os dados indispensaveis para o pleno conhecimento do regimen economico de um paiz, comparados e apreciados, porque só a similhança, senão a igualdade, das condições economicas de dois paizes póde dar valor ao argumento.

E não basta ainda isto, é indispensavel tambem conhecer o regimen fiscal, a que em ambos os paizes está sujeito o assumpto, que se estuda.

Quer v. exa. sr. presidente, saber as condições fiscaes da França em relação ao trigo?

Eu trouxe commigo a pauta aduaneira tranceza, para que os meus collegas possam verificar a exacção do que vou dizer.

Quer v. exa. saber qual é o direito sobre os cereaes em França? É de 60 centimos por 100 kilogrammas de grão importado, isto é, 108 réis da nossa moeda, ao cambio de 180 réis o franco.

Entre nós a mesma quantidade de grão, isto é 100 kilogrammas, paga o imposto de 1:060 réis, comprehendendo o ultimo addicional de 6 por cento pela lei de 1882.

Ora. sr. presidente, já é audacia comparar a França, com um imposto dez vezes inferior ao nosso, a Potugal?

Quando as condições geraes economicas as mesmas fossem, o que infelizmente para nós não acontece, bastava esta differença enorme da tarifa aduaneira para que aquelle grande paiz não nos podesse servir de exemplo em assumptos d'esta ordem.

Mas não é só isso. Um imposto protector sobre o trigo ha de recaír principalmente sobre as classes pobres da capital, e digo principalmente, porque as classes pobres do resto do paiz terão, ou poderão ter, ou poderão ter, certas compensações que procurarei explanar em occasião opportuna.
Suppõe porventura alguem que a população pobre de Lisboa não está já bem carregada de impostos de consumo?

Querem v. exas. saber qual a relação da pauta municipal de Paris para a de Lisboa?

Vou citar alguns exemplos.

Eu compendiei n'este pequeno mappa, que tenho presente, os direitos do consumo da duas cidades, para o peso de 100 Kilogrammas dos generos mais proprios para a alimentação das classes pobres.

[Ver tabela na imagem]

1 Em Lisboa, peso das rezes vivas; em Paris, de carne limpa.

A pauta da barreira de Paris lança em cada 100 Kilogrammas de carne 1$755 réis, e nós lançamos 2$500 réis, devendo fazer notar á camara que lá é sobre a carne limpa, e cá sobre o pezo da rez viva, o que ainda augmenta a desproporção.

O municipio de Paris lança sobre a carne limpa vinda de fóra das barreiras 2$090 réis de imposto em cada 100 kilogrammas, e nós lançamos 6$000 réis; o mesmo se observa em relação á carne de porco em Paris pagando réis 1$755, em Lisboa 6$500 réis.

Em Paris o vinho paga 1$910 réis por cada 100 Kilogrammas, e em Lisboa paga 3$100 réis por cada hectolitro, ou, approximadamente, 100 Kilogrammas.

A manteiga paga em Paris 2$59õ réis, em Lisboa réis 3$000.

Os ovos pagam em Lisboa 2$200 réis, em Paris apenas 756 réis!

De fórma que estas substancias de primeira necessidade para consumo das classes pobres pagam em media em Lisboa mais 52 por cento do que em Paris.

Se v. exa., sr. presidente, comparar elemento a elemento as duas pautas, quasi não encontra excepção a esta regra, e no seu conjuncto os impostos de consumo, propriamente ditos, podem considerar-se em Paria inferiores em 25 por cento aos de Lisboa.

Ali o systema de taxação é perfeitamente justo; tendendo talvez a carregar mais o consumo das classes ricas, como vou mostrar á camara, emquanto entre nós é o contrario. (Apoiados.)

A pauta de Paris no artigo «caça e aves», que classifica em quatro categorias, lança 13$500 réis de imposto sobre cada 100 kilogrammas de caça de primeira categoria: faisões, perdizes, gallinholas, etc.; sobre a de segunda categria: patos, perus, etc., 5$400 réis; sobre a de terceira categoria: gallinhas, pombos, etc., 3$240 réis; e, finalmente, quando desce á quarta categoria, que comprehende a caça mais ordinaria e as aves mais vulgares e baratas, que por isso podem servir de alimentação ás classes pobres, desde o imposto a 1$620 réis.

Pois nós comemos trufas, faisões e perdizes que passando ao lado da carne, elevadamente sobrecarregada pelo imposto de consumo, não pagam nada na barreira da cidade. (Apoiados.)

Comparem as duas pautas e vejam o espirito de uma e de outra; a de Paris tende a proteger o consumo das classes menos abastadas, a nossa... a nossa parece ainda embuida d'aquelle velho preceito do antigo regimen, cae desapiedadamente sobre a massa... taillable et corvéable á merci. (Apoiadas.)

Eu não venho concitar paixões, mas tambem ninguem espere que eu trema diante das paixões, que tenha de levantar quando diga a verdade.

Assim querem ir sobre a massa proletária de Lisboa e lançar ainda um imposto pesado, e para que? Para que hei de eu dizer um dia, porque desses sacrificios pecuniarios, que não podem calcular-se em menos de 300:000$000 réis, nada, ou quasi nada, irá infelizmente proteger a nossa agricultura. (Apoiados.)

Vejamos agora um outro argumento, em que se procura impressionar a opinião publica.

Diz-se que ha vinte annos a esta parte o trigo tem variado de preço, baixando consideravelmente, emquanto que o pão se tem conservado constantemente na mesma altura; e tem-se querido d'aqui inferir, que um augmento protector não contribuirá para o encarecimento do pão!

Oh! sr. presidente, por muita que seja a auctoridade dos sabios economistas que inventaram este raciocinio, eu desejaria que s. exas. fizessem acompanhar estas considerações subjectivas e metaphysicas de alguns raciocinios e dados práticos, que nos evidenciassem a sua singular proposição.

Alguns vou eu expor a v. exa. e á camara, que provam exactamente o contrario.

Sr. presidente, actualmente cada kilogramma de trigo póde custar de 48 a 50 reis, e o kilogramma de trigo panificado produz um kilogramma de pão, que se vende a 95 réis; logo esta differença de 45 réis no minimo é embolsados pelos intermediários entre o productor e o consumidor, isto é, pelo fabricante de farinhas o peio padeiro.

(Interrupção.)