O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

582

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

desembarcassem e viessem defender París e incorporar-se no exercito, combatendo heroicamente em terra.

Por aqui se póde ver a alta importancia dos torpedos, sem citar factos analogos das guerras da America do Norte e do Paraguay.

Ora o sr. ministro da guerra, que em nome da sua solicitude patriotica fez a compra do couraçado, que custa, pelo menos, 500:000$000 réis (creio que ha de custar mais alguma cousa com o armamento), porque rasão não manda ou não tem mandado alguns officiaes de marinha, de engenheria e artilheria estudar lá fóra esta invenção dos torpedos? Porque é tambem que s. ex.ª não compra desde já o segredo de fazer e applicar torpedos, que já lhe foi offerecido? E s. ex.ª sabe bem que eu tenho rasões especiaes para lhe fazer esta pergunta.

Eu entendo, e esta minha opinião é validada por auctoridades muito respeitaveis, entendo que para a defeza dos portos e das costas os torpedos são meios mais efficazes que os couraçados.

Podia fazer uma larga dissertação ácerca da excellencia dos torpedos, e das experiencias que d'elles se tem feito na Italia, Belgica, Hollanda, Prussia, Inglaterra, Austria, Suecia, Russia e na propria França. E quando digo na propria França, é porque a França n'estas questões militares está ainda muito atrazada.

A França, apesar da tremenda derrota que soffreu, ainda não tem a sua organisação militar na altura em que deve estar.

Seja-me permittido agora incidentalmente pedir ao illustre deputado, o sr. Thomás Ribeiro, que não me amaldiçoe por estar a dizer estas verdades. Mas eu ainda estou na mesma opinião, como s. ex.ª vê perfeitamente.

Não acredito que seja com manifestações patrioticas que se defende o paiz, mas com elementos de força que se criam durante muito tempo com grande solicitude, (apoiados), com muito estudo e com muita despeza. (Apoiados.)

Recommendo a s. ex.ª que leia o livro do coronel federal suisso, o sr. Rustow, que é hoje o primeiro escriptor militar.

A arte da guerra está hoje toda mudada.

Já Napoleão dizia que «toda a nação que não quizesse ser conquistada, precisava mudar de dez em dez annos a sua tactica!»

As guerras da Criméa e da Italia, que são dos nossos dias — e eu não sou dos mais velhos que têem entrada n'esta casa — pertencem hoje á archeologia militar.

Os meios de guerra estão todos absolutamente alterados; e os unicos acontecimentos que se podem acceitar como auctoridade, e que se analysam proveitosamente, são os da guerra austro-prussiana em 1864, e os da guerra franco-prussiana em 1869-1870, e os da guerra da separação norte-americano.

Todo o homem que quizesse citar hoje as campanhas de Frederico ou mesmo de Napoleão I, é o mesmo que citar as manobras de Cyro, de Alexandre Magno ou de Cesar. Se a estrategia é immudavel, a tactica e os movimentos variaram inteiramente.

Eu, sr. presidente, confesso que tenho sempre grande difficuldade em entrar n'estes assumptos, porque se por um lado receio, sem figuras de rhetorica, cançar a attenção da camara, que de certo não está disposta a estudar materias tão áridas, por outro lado, depois de se encerrar o debate, o orador fica sempre com pena de não ter citado muitos outros factos que vinham em apoio da sua these.

Ora, sr. presidente, as experiencias que ultimamente se tem feito na Prussia ácerca da balistica tanto interna como externa, são de tal importancia e gravidade, que as machinas industriaes estão soffrendo uma revolução completa com o descobrimento de novas leis da physica mollecular.

A experiencia ácerca da constituição interna dos corpos tem soffrido uma revolução completa depois das experiencias que se tem feito em Dusseldorf e outros pontos da Allemanha. E isto o que prova? Prova que a guerra é hoje uma sciencia complicadíssima, que para adquiri-la são poucos todos os esforços combinados, nos quaes se recorre sempre ao verdadeiro patriotismo. (Muitos apoiados.)

Voltemos, porém, ao assumpto, se o illustre ministro póde ser absolvido por ter illegalmente (sublinho o adverbio) comprado o couraçado, e eu de mim não tenho duvida em o absolver, mesmo porque a maioria teria o cuidado de o fazer, se isso fosse necessario (riso); se porventura o illustre ministro póde ser absolvido por ter comprado o couraçado, no caso d'elle ser simplesmente para a defeza do porto, se é um navio de alto bordo é duplamente para lamentar essa compra ruinosa. E tambem lamento que não quizesse o governo fazer estudar convenientemente a questão dos torpedos que não mandasse officiaes ao estrangeiro com esse intuito e essa missão estricta, e que o sr. Andrade Corvo pelo ministerio dos negocios estrangeiros não tratasse de comprar o segredo dos torpedos, segredo que já tem sido comprado por umas poucas de nações.

E creio que havia de custar muito menos dos 600 contos que custou o couraçado. E acredite V. ex.ª que para o effeito defensivo da barra de Lisboa havia de ser muito mais efficaz esta pequena despeza do que o ostentoso couraçado, navio de alto bordo.

Repito outra vez, que não sei o que seja o couraçado. Discute-se muito o couraçado, e não sabemos o que é.

O talentoso deputado e notavel professor, o sr. Carlos Testa, não nos disse o que era o couraçado. S. ex.ª apenas fez retaliações, que não vinham muito para o caso. S. ex.ª deve ter bastante experiencia do parlamento, para saber que as retaliações nada provam.

De se demonstrar que a entidade  commetteu um erro, não se póde concluir que a entidade B, tendo commettido o mesmo erro, fique absolvida. Isto pertence um pouco ao modo de argumentar que hoje vejo triumphante no governo, mas ninguem creia que fica assim absolvido.

A defeza do governo é sempre retaliações. Não trata de se desculpar. Dizem os srs. ministros: «Vós accusaes-nos de taes factos; pois se não fostes vós, alguns cavalheiros que têem comvosco certas relações já commetteram outros factos iguaes».

Por isso mesmo que os srs. ministros, que devem conhecer os factos da historia contemporanea, conhecem os erros que se têem commettido, incumbe-lhes preveni-los e evita-los. Este modo de argumentar do governo, longe de o levantar em consideração publica, longe de o absolver, pelo contrario mais o condemna.

Por isso mesmo que os antecessores de s. ex.ªs commetteram uns certos e determinados erros conhecidos de s. ex.ª, é que os srs. ministros não os devem commetter de novo. A isto póde chamar-se a inercia do erro. (Riso.)

Os nossos antecessores commetteram factos que nós conhecemos que são erros, por isso mesmo devemos nós commette-los. O absurdo iguala a impenitencia. (Apoiados.)

Assim fez sr. Carlos Testa, que não definiu o que era o couraçado, e mostrando mais uma vez que tem dotes de argumentador, limitou-se a ler á camara trechos de relatorios de alguns ministros da marinha que deixaram de si muito boa memoria. Foi citado o sr. Mendes Leal, que é hoje empregado de confiança do governo, e portanto se a censura coubesse a um partido cabia tambem ao governo actual.

Mais um inconveniente d'aquella argumentação de reconvenção a que ainda agora me referi.

Mas ía eu dizendo, sr. presidente, que o illustre deputado apenas citou pedaços truncados dos relatorios dos srs. Mendes Leal, Rebello da Silva e Latino Coelho.

Ora, foi logo respondido ao illustre deputado pelo sr. Mariano de Carvalho, e não sei se por mais alguem, que esses relatorios tratavam do armamento naval em termos