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SESSÃO DE 24 DE FEVEREIRO DE 1885

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios - os exmos. srs.

Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Deu-se conta de um officio do ministerio da marinha em satisfação a um pedido do sr. Elvino de Brito. - Tiveram segunda leitura: um projecto de lei dos srs. J. J. Alves e Pequito, para que aos individuos pertencentes aos estabelecimentos fabris e deposito de material de guerra, do commando geral de artilheria, seja contado, para os effeitos da reforma, o tempo que tiverem servido nas fileiras do exercito; uma nota do sr. J. J. Alves, renovando a iniciativa do projecto de lei que apresentou em 21 de maio de 1879, e que tem por fim isentar da contribuição de registo os estabelecimentos comprehendidos no § 4.° do artigo 1.° do decreto de 31 de agosto de 1869; um projecto de lei do sr. Luiz Ferreira de Figueiredo, auctorisando a camara municipal de Fraguas, districto de Vizeu, a desviar dos fundos de viação municipal a quantia de 4:270$000 réis para ser applicada a diversas obras municipaes; um projecto de lei do gr. Reis Torgal, transferindo a séde do julgado de Silvares, na comarca do Fundão, para a Barroca, de que tomará a denominação; um projecto de lei do sr. Elvino de Brito, reorganisando a commissão central de estatistica do reino, instituida junto do ministerio das obras publicas pelo decreto de 16 de dezembro de 1869; uma nota do sr. Avellar Machado, renovando a iniciativa do projecto de lei que apresentou na sessão de 1884, e que é relativo ao general Placido de Abreu. - Approva-se um requerimento do sr. Carrilho, por parte da commissão de inquerito de sal para que sejam aggregados á mesma commissão mais sete srs. deputados, ficando prejudicado outro do sr. Fuschini, apresentado na sessão anterior, para que á commissão se aggregassem os srs. Barros Gomes, Pinto de Magalhães e Mariano de Carvalho, nomes que são incluidos no requerimento do sr. Carrilho. - Apresentam-se as seguintes representações: pelo sr. Pequito, da mesa administrativa da irmandade do Santissimo Sacramento da sé de Lisboa; pelo sr. Carlos Lobo d'Avila, da camara municipal da Gollegã; pelo sr. Jalles, da camara municipal dá Chamusca; pelo sr. Joaquim José Alves, dos operarios do arsenal da marinha; pelo sr. Eduardo Coelho, dos professores de instrucção primaria do concelho de Chaves; pelo sr. Mendes Pedroso, da associação commercial de Santarem. - Apresenta o sr. Santos Viegas um projecto de lei, e faz algumas considerações sobre o procedimento do governador de Angola com relação a uns missionarios protestantes no districto de Benguella. - Responde-lhe o sr. ministro da marinha. - O sr. Simões Ferreira faz uma pergunta ao governo, com relação ao arcebispo de Goa. - Responde o sr. ministro da marinha. - Apresentam requerimentos pedindo esclarecimentos pelos differentes ministerios os srs. Santos Viegas, Consiglieri Pedroso, Eduardo José Coelho e Lobo d'Avila. - Mandam declarações de voto os srs. Santos Viegas, Arouca, Rodrigo Pequito e Mendes Pedroso. - Justificam faltas os srs. Luiz Jardim, Cardoso Valente, conde da Praia da Victoria, Alves Matheus, Lopes Vieira, Mendes Pedroso e Rodrigo A. Pequito. - Trocam-se explicações entre os srs. Antonio Centeno, ministro da marinha e Santos Viegas, ácerca dos acontecimentos occorridos na provincia de S. Thomé e Principe, com relação ao curador geral de serviçaes e colonos e ao governador da mesma provincia.

Na primeira parte da ordem do dia approva-se o parecer sobre a eleição do circulo de Chaves, e seguidamente foi reenviado á commissão de poderes, afim de se declarar vago o circulo, visto que o sr. Eduardo José Coelho já tinha assento na camara, eleito por outro circulo.

Na segunda parte da ordem do dia realisa-se a interpellação do sr. Elvino de Brito ao sr. ministro da marinha sobre negocios relativos ao ultramar, a qual ficou ainda pendente.

Abertura - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada - 60 srs. deputados.

São os seguintes: - Albino Montenegro, A. da Rocha Peixoto, Alfredo Barjona de Freitas, Silva Cardoso, Sousa e Silva, Antonio Centeno, A. J. da Fonseca, A. J. d'Avila, Cunha Bellem, Jalles, Carrilho, A. M. Pedroso, Santos Viegas, A. Hintze Ribeiro, Augusto Poppe, Fuschini, Pereira Leite, Avelino Calixto, Sanches de Castro, Lobo d'Avila, Conde de Thomar, Cypriano Jardim, Ribeiro Cabral, E. Coelho, Elvino de Brito, Estevão de Oliveira, Fernando Geraldes, Francisco Beirão, Francisco de Campos, Guilherme de Abreu, Augusto Teixeira, J. C. Valente, Teixeira de Vasconcellos, Ferrão de Castello Branco, J. Alves Matheus, Joaquim de Sequeira, J. J. Alves. Coelho de Carvalho, Simões Ferreira, Avellar Machado, Azevedo Castello Branco, José Frederico, Lobo Lamare, Oliveira Peixoto, Simões Dias, Luiz Ferreira, Bivar, Luiz Jardim, M. J. Vieira, Guimarães Camões, Miguei Dantas, Gonçalves de Freitas, Rodrigo Pequito, Sebastião Centeno, Dantas Baracho, Vicente Pinheiro, Visconde de Ariz, Visconde de Balsemão, Visconde das Laranjeiras e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Agostinho Lucio, Garcia de Lima, Antonio Candido, Antonio Ennes, Lopes Navarro, Pereira Borges, Pinto de Magalhães, Almeida Pinheiro, Seguier, Urbano de Castro, Ferreira de Mesquita, Neves Carneiro, Bernardino Machado, Conde de Villa Real, Correia Barata, Monta e Vasconcellos, Castro Mattoso, Mártens Ferrão, Frederico Arouca, Matos de Mendia, Sant'Anna e Vasconcellos, Silveira da Motta, Costa Pinto, Melicio, Scarnichia, Franco Castello Branco, João Arroyo, Sousa Machado, Ponces de Carvalho, Correia de Barros, Ferreira de Almeida, Dias Ferreira, Elias Garcia, Laranjo, Pereira dos Santos, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Reis Torgal, Luiz Dias, Luiz Osorio, Manuel d'Assumpção, M. da Rocha Peixoto, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Santos Diniz e Tito de Carvalho.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Pimentel, Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Agostinho Fevereiro, Moraes Carvalho, Anselmo Braamcamp, Pereira Côrte Real, Garcia Lobo, Fontes Ganhado, Moraes Machado, Sousa Pavão, Augusto Barjona de Freitas, Barão de Ramalho, Caetano de Carvalho, Emygdio Navarro, Sousa Pinto Bastos, Goes Pinto, E. Hintze Ribeiro, Filippe de Carvalho, Firmino Lopes, Vieira das Neves, Wanzeller, Barros Gomes, Baima de Bastos, J. A. Pinto, Ferreira Braga, Souto Rodrigues, Ribeiro dos Santos, J. A. Neves, Teixeira Sampaio, Amorim Novaes, José Borges, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano, Ferreira Freire, J. M. dos Santos, Pinto de Mascarenhas, Loureneo Malheiro, Luiz de Lencastre, Aralla e Costa, M. P. Guedes, Mariano de Carvalho, Martinho Montenegro, Miguel Tudella, Pedro de Carvalho, Pedro Correia, Pedro Franco, Pedro Roberto, Pereira Bastos, Visconde de Alentem, Visconde de Reguengos, Visconde do Rio Sado e Wenceslau de Lima.

Acta. - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio da marinha, participando que não tendo ainda sido decretada a applicação especial do codigo administrativo para as provincias ultramarinas não póde por isso satisfazer aos esclarecimentos pedidos pelo sr. deputado Elvino de Brito.

A secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - Não se contando para os effeitos da reforma aos empregados dos estabelecimentos fabris, e deposito ge-

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ral de material de guerra do commando geral de artilheria, o tempo que serviram como militares:

Considerando que pelo contrario se conta para todos os effeitos o tempo que serviram no exercito aos empregados das alfandegas, correio e telegraphos do reino e de outras repartições;

Considerando que esta desigualdade é incompativel com o codigo fundamental do estado que entende a lei igual para todos;

Considerando que estes empregados, desempenhando iguaes serviços, fazem parte de repartições dependetes directamente do ministerio da guerra;

Por estas rasões, tenho a honra de submetter á vossa apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Aos individuos pertencentes aos estabelecimentos fabris e deposito geral do material de guerra do cominando geral de artilheria, é contado para os effeitos da reforma o tempo que tiverem, servido nas fileiras do exercito.

§ unico. Exceptua-se das disposições d'este artigo o tempo de serviço como substituição.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Lisboa e sala das sessões cia camara dos senhoras deputados em 23 de fevereiro de 1885.= Joaquim José Alves, deputado por Lisboa. = Rodrigo Affonso Pequito.

Enviado á commissão de guerra ouvida a de fazenda.

Projecto de lei

Senhores.- Os fundos especiaes para viação municipal no concelho de Fragoas, districto de Vizeu, até ao dia 31 de dezembro de 1884, podem ter outra e mais util applicação.

Aquelle concelho vae ser atravessado, em diversas direcções, pelas estradas districtaes n.° 40, do Vizeu á Foz do Pinhão, passando por Moimenta da Beira, pela bifurcação d'esta estrada para Mondim da Beira e pela estrada districtal de Castro Daire a Gouveia.

A viação districtal, pondo em communicação as freguezias do concelho de Fragoas dispensa as estradas municipaes.

Precisando a camara de Fragoas de construir sem demora os paços do concelho e de melhorar urgentemente pontes, caminhos, das e fontes nau consegue receita para estas obras por ser diminuta a do municipio e ser difficil por em quanto eleval-a.

N'estas circumstancias removiam-se obstaculos invenciveis e promoviam-se altas conveniencias d'aquelle concelho, approvando o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal do concelho de Fragoas, districto de Vizeu, a desviar dos fundos da viação municipal, existentes no cofre e na caixa geral de depositos, a quantia de 4:270$000 réis para serem applicados á construcção dos paços do concelho, concerto e aformoseamento de pontos, das e fontes do mesmo concelho.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões em 23 de fevereiro de 1885. = Luiz Ferreira de Figueiredo.

Enviado ás commissões de obras publicas e de administração.

Projecto de lei

Senhores.- Pertencem já á historia as notaveis discussões que entretinham os philosophos na investigação dos limites que a theoria pretendia assignar ás sciencias estatisticas nas suas relações com as demais sciencias sociaes no vasto quadro dos conhecimentos humanos. A viva e longa discussão iniciada por Gloja o Romagnosi, e depois continuada pelos estatisticos da Italia meridional, era o reflexo da eterna questão que separava os realistas dos idealistas, isto é, os que conhecem a legitimidade de cada facto dos que sustentam que as idéas antecedem, preparam e produzem os factos. As interessantes o sabias obras
d'aquelles dois publicistas sobre a philosophia da estatistica não têem, na verdade, outra significação ou diverso intuito; e nem elles, nem os seus discipulos, se preoccuparam nunca com a questão pratica da organisação publica das estatisticas.

A concepção scientifica da estatistica póde, pela divinisação do genio, pretender investigar não sómente as leis sociaes e economicas, mas ainda as que regem é desenvolvimento physiologico e moral da humanidade. É um vasto campo, que os talentos especulativos podem percorrer em toda a sua extensão. Ao passo que, ao contrario, no terreno pratico e verdadeiramente util da actividade e labores da moderna estatistica, tal como convem á administração dos estados e aos interesses do sciencia positiva, é mister proceder com rigorosa disciplina, sem pretensões ao optimismo a que, não raro, aspiram os devaneios ou a pujança dos talentos isolados, mas pela acção cuidada de cooperadores associados, sob o regimen de uma fiscalisação legal e permanente, em que a um tempo influenceiam os benefecios da mais larga publicidade e as garantias proprias de instituições publicas e officiaes. N'isto consiste a distincção entre os processos antigos e os modernos.

Emquanto outr'ora citámos para exemplo a republica veneziana e a maioria dos governos monarchicos do velho regimen, a nota predominante nos trabalhos estatisticos eram as reservas diplomaticas, os intuitos particulares dos sabios da epocha e as instrucções severas dos ministros que governavam, ante as quaes se enfileiravam, como por magia, os numeros, em ordens e series appetecidas, as instituições estatisticas modernas, ao contrario, assentam sobre seis, que tiram a sua origem do influxo das idéas o principios liberaes e têem o seu fundamento, no interesse na sciencia e da humanidade, solidamente cimentado na sinceridade das investigações officiaes sujeitas á maxima publicidade, e na intervenção publica pela salutar pratica da livre discussão.

Constituem por si uma parte dos poderes publicos, concorrendo principalmente para encaminhar, elucidar e tornar, por assim dizer, scientifica a opinião popular, sobre que se funda actualmente o desenvolvimento dos poderes politicos.

E, em verdade, as alternativas das idéas praticas e das paixões populares, que se succedem na vida das nações, só podem ser attribuidas á mutabilidade que provém da ampla discussão e livre exame dos elementos e factos que a sciencia positiva vae dia a dia apurando em proveito da sociedade. A medida que os factos publicos e sociaes cessam de parecer contradictorios o confusos, e se chega a determinar a sua serie e as relações e liames que as harmonisam e estreitam, a opinião publica, formando-se de um modo mais estavel, adquire uma marcha mais segura e, sem duvida, mais logica.

Estas considerações tendem a mostrar como as instituições estatisticas, sendo estabelecidas de modo que offereçam plena garantia de sinceridade, podem contribuir, melhor que nenhuma outra, para dar valor e estabilidade á opinião popular e para esclarecer a consciencia publica. Mas, para que ellas apresentem sinceramente os factos sociaes, convem:

1.° Que assentem em methodos taes, que possam garantir rapidez nas suas operações, sem o que o tempo, que passa, dispersa e perturba os factos elementares e impede que d'elles se deduzam conclusões seguras;

2.° Que essas operações sejam extensas e completas, o que só se consegue com o auxilio de muitos e mui competentes collaboradores, e, em certos casos, com o concurso espontâneo de toda a sociedade civil;

3.° Finalmente, que a exactidão e a veracidade da elementos sejam garantidas pela possibilidade das provas, pela multiplicidade das contraprovas, pela distribuição natural das diversas series dos factos e pela rigorosa exactidão nas

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deducções e analyse final, que devem ser isentas de arbitrios e preconceitos.

Foram estes os principios que diversos paizes da Europa tiveram em vista, quando ao lado das direcções ou repartições centraes de estatistica estabeleceram conselhos superiores e consultivos, indicando para os formar homens de reconhecida competencia, não só escolhidos nas diversas administrações, mas eleitos fóra da burocracia official, entre as illustrações e notabilidades, versadas em sciencias economicas ou sociaes. Tal foi tambem o pensamento que presidiu á creação do primeiro corpo consultivo de estatistica em Portugal; mas força é confessar que nem as primeiras organizações, decretadas em 1857 e 1864, nem a que ainda vigora e data de 16 de dezembro de 1869, attingiram o fim que se tivera em vista e foram cercadas de exito appetecido, sem duvida por deficiencia ou ausencia de providencias que, consideradas inuteis ou de somenos importancia n'aquellas epochas, se reconhecem indispensaveis e importantes hoje, já pelo que de propria experiencia temos colhido, já pelo que nos tem ensinado os paizes que formam a vanguarda no aperfeiçoamento e multiplicidade dos processos estatisticos.

Toda acção official ficou entre nós circumscripta n'um ponto, sem elementos nem faculdade de poder estender-se aos diversos centros administrativos do paiz, e, o que é peior, pela disposição equivoca, mal combinada e inefficaz das providencias decretadas, impossibilitada até de ir alem da esphera traçada aos serviços dependentes do ministerio das obras publicas. Esse não poderia ter sido, não era de certo, o intuito dos illustres ministros que tão dedicadamente procuraram melhorar, em diversas epochas, as instituições estatisticas no paiz. A propria repartição de estatistica do referido ministerio, a qual serve de secretaria á commissão central de estatistica do reino, perde o caracter centralizador e ao mesmo tempo geral, que por esse facto lhe cabe, desde que, em obediencia ás disposições expressas, embora antinomicas, n'esta parte, com as de 16 de dezembro de 1869, se considera ligada e por assim dizer adstricta á alçada de uma simples direcção geral do ministerio, com attribuições assás exiguas e apertadas.

Por este modo, a commissão central, sem ramificações ou centros parciaes, no resto do paiz, e a repartição de estatistica, reduzida de facto no papel assas modesto e inglorio, que as circumstancias apontadas, aliás alheias á vontade dos legisladores, lhe têem traçado, não podiam produzir trabalho util e proficuo, á altura das aspirações da moderna sciencia e das necessidades publicas.

Esta é a verdade da situação, que sem rebuços e peio amor á verdade tornâmos aqui conhecida.

Acudir a este mal e acudir com remedio prompto e radical, deve ser o sincero empenho dos homens publicos. Isto, porém, obrigaria a despezas e encargos, que é prudente, quanto possivel, evitar ou adiar. Nos limites dos recursos actuaes julgâmos que podem, por agora, conter-se as providencias que mais urge estabelecer, esperando que, mais tarde, o parlamento dotará com mais ampla organisação as instituições estatisticas de Portugal.

No plano de reforma que temos a honra de submetter á vossa apreciação procurou-se attender, o mais que foi possivel, á unificação dos trabalhos estatisticos, alargando ao mesmo tempo, a exemplo do que praticaram a Belgica, a Austria, a França e outros paizes da Europa, a esphera da acção por todos os districtos do reino, com a creação de commissões districtaes de estatistica, cuja necessidade era reclamada pela própria natureza das attribuições commettidas á commissão central, e cuja utilidade e vantagens, largamente demonstradas em paizes estrangeiros por instituições identicas, esperâmos ver realisadas praticamente em breve espaço de tempo.

Na contextura do nosso plano de organisação, attendemos ás necessidades do paiz e ás indicações dos ultimos congressos, realisados na Europa, as quaes, em resumo se podem reduzir aos dois seguintes pontos:

1.° Creação de um centro director e consultivo, composto de homens, que façam auctoridade, não só pela sua posição na burocracia official, senão tambem pelos seus merecimentos e competencia especial na sciencia estatistica ou nas que com ella se relacionam; e armado de poderes bastantes para consultar sobre os methodos mais scientificos e praticos de investigar e recolher os factos, sobre o plano mais adequado de os ordenar e resumir e, emfim, sobre a melhor maneira de publicar e vulgarisar os estudos estatisticos no paiz.

2.° Uma repartição de estatistica geral, que seja a executora dos trabalhos e planos preparados pela commissão e approvados pelo governo, e onde possam convergir todos os elementos e trabalhos estatisticos, estudados e recolhidos nas secções dos diversos centros de administração e nas estações dependentes da commissão.

Com este impulso, não ficarão completamente dotadas as instituições estatisticas em Portugal, mas por sem duvida tomarão ellas uma fórma estavel e regular e servirão a um tempo ao duplo fim de esclarecer a opinião publica sobre a marcha dos factos sociaes, e de espargir luz sobre os diversos assumptos, cujo conhecimento especial e technico muito interessa ao governo da paiz.

Temos, pois, a honra de submetter ao vosso exame o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A commissão central de estatistica do reino, instituida junto do ministerio das obras publicas, commercio e industria, pelo decreto de 16 de dezembro de 1869, passará a denominar-se «Commissão central de estatistica de Portugal» e compor-se-ha do modo seguinte:

Sete delegados das secretarias de estado escolhidos de entre aquelles que reunirem, em cada ministerio, melhores titulos de competencia;

Quatro vogaos nomeados de entre os professores das escolas superiores ou especiaes, membros da academia real das sciencias, ou escriptores publicos de merito reconhecido;

Mais dois vogaes: O director geral do commercio e industria, que será o vice-presidente da commissão, e o chefe da repartição de estatistica do ministerio das obras publicas, que será o secretario.

Art. 2.° O ministro e secretario de estado das obras publicas, commercio e industria, é presidente nato da commissão.

Art. 3.° Á commissão central compete:

1.° Elaborar um plano completo da estatistica do paiz;

2.° Formular um plano para a elaboração e publicação periodica do annuario geral de estatistica, e para a compilação e publicação dos documentos estatisticos, concernentes aos diversos ramos da administração;

3.° Propor ao governo a adopção de methodos e modelos para a estatistica dos sei viços dependentes dos diversos ministerios, em ordem a imprimir unidade e systema nos trabalhos que, pelas leis vigentes, são directamente executados por aquellas repartições do estado;

4.° Propor quaesquer aperfeiçoamentos na maneira de realizar o recenseamento geral da população, que continuará a cargo do ministerio das obras publicas;

5.° Dirigir ao governo propostas que lhe parecerem convenientes para uniformisar e methodisar quaesquer trabalhos de estatistica official;

6.° Informar os negocios que para isso lhe sejam remettidos por qualquer ministerio.

Art. 4.° A commissão central de estatistica será dividida em secções permanentes, cujo numero, organisação e attribuições serão designadas em regulamento especial, devendo ser por ellas distribuidos os seguintes assumptos, comprehendendo o continente do reino, ilhas adjacentes e provincias ultramarinas:

Territorio:

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População;
Industrias;
Administração civil;
Saude publica;
Beneficencia publica;
Instrucção publica;
Administração ecclesiastica;
Administração judicial;
Administração financeira; e
Administração militar.

§ unico. Quando circumstancias eventuaes o reclamarem, poderão funccionar secções temporarias, eleitas pela commissão nos termos do regulamento.

Art. 5.° A commissão publicará, periodicamente e nos termos do regulamento, um boletim dos seus trabalhos, fazendo n'elle inserir:

1.° Extracto das actas das sessões, ou as proprias actas, quando abranjam materia de interesse geral;

2.° Todos os documentos relativos á estatistica do paiz, que não possam constituir objecto de publicações especiaes;

3.° Noticias ou memorias officiaes relativas á estatistica nacional, estrangeira ou comparada;

4.° Relatorios ou pareceres, cuja publicação offereça interesse.

§ unico. Com auctorisação do governo, a commissão poderá inserir no bolttim documentos e memorias particulares que lhe sejam offerecidas, não devendo todavia assumir a responsabilidade das opiniões emittidas pelos auctores.

Art. 6.° A commissão poderá, com auctorisação do ministro das obras publicas, commercio e industria, estabelecer relações directas com as corporações scientificas ou homens eminentes que, em Portugal e no estrangeiro, se occuparem de estatistica ou das sciencias que com ella se relacionam.

Art. 7.° O governo tem a faculdade de nomear, sobre proposta ou ouvindo a commissão central, membros honorarios ou correspondentes da commissão central de estatistica de Portugal, conferindo-lhes diplomas pela fórma e nos termos do regulamento.

Art. 8.° A repartição de estatistica do ministerio das obras publicas passara a denominar-se: Repartição central de estatistica do reino; servirá de secretaria á commissão central, receberá ordens directamente do ministerio, e corresponder-se-ha com todas as direcções e repartições internas ou externas do referido ministerio.

Art. 9.° A commissão corresponder-se-ha, no exercicio das suas attribuições, com o ministro das obras publicas, e só por seu intermedio submetterá á apreciação dos demais ministros e secretarios d'estado quaesquer propostas ou consultas que digam respeito ás repartições em que elles superintendem.

§ unico. As relações entre a commissão central e as auctoridades e funccionarios do estado, e as corporações scientificas ou os particulares, serão sempre encaminhadas pela repartição central de estatistica.

Art. 10.° A commissão central terá quatro sessões ordinarias em cada mez, e as extraordinarias que, por ordem do governo, forem mandadas convocar.

Art. 11.° A nomeação dos vogaes da commissão central será por decreto, referendado pelo ministro e secretario d'estado das obras publicas, commercio e industria, ou por este e pelo ministro respectivo, quando se trate dos delegados das diversas secretarias d'estado.

Art. 12.° Crear-se-hão, nas capitães de districto, commissões districtaes de estatistica, cuja composição, attrições e relações com a commissão central serão decretadas em regulamento.

§ unico. As despezas com o expediente d'estas commissões ficarão a cargo das juntas geraes.

Art. 13.° O governador civil do districto e o presidente da junta geral serão membros natos da commissão districtal de estatistica, servindo o primeiro de presidente e o segundo de vice-presidente; e os demais vogaes, cujo numero se fixara em regulamento, serão nomeados pelo governo em decreto.

Art. 14.° Cada vogal da commissão central receberá uma cedula de presença equivalente á importancia de 3$000 réis por cada sessão a que comparecer.

§ unico. A importancia das cedulas será paga pela verba consignada na secção IV do capitulo I - Despezas diversas - da tabella da distribuição da despeza do ministerio das obras publicas, commercio e industria, emquanto as côrtes não deliberarem definitivamente sobre o assumpto.

Art. 15.° A commissão central, apenas reunida, fará os regulamentos necessarios para a execução d'esta lei, os quaes serão devidamente decretados pelo governo.

Art. 16.° Fica por esta lei sem effeito o decreto de 16 de dezembro de 1869 e toda a legislação em contrario.

Camara dos deputados, 23 de fevereiro de 1880. = Elvino de Brito.

Á commissão de estatistica, ouvida a de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - Emendar quanto possivel os erros da nossa circumscripção judicial á proporção que se vão tornando conhecidos, é certamente um dever publico, a que não devemos nem podemos subtrahir-nos.

Na impossibilidade de podermos conseguir justiça gratuita, procuremos ao menos tornal-a facil e commoda aos povos.

O julgado de Silvares, na comarca do Fundão, é composto de povoações importantes, algumas das quaes distam da séde do julgado mais de 25 kilometros de caminhos intransitaveis e de serranias.

As povoações de Bagas e Jamiro de Cimo, por exemplo, ficam a grandes distancias da cabeça do julgado e da séde da comarca, e os seus habitantes estão quasi impossibilitados de poderem recorrer aos beneficios da justiça. A maior parte das pessoas morrem intestadas; ou porque não têem meios para remunerar de prompto o tabellião, ou porque a morte lhes não dá tempo que o mandem chamar e que elle se resolva a fazer uma jornada longa e incommoda.

Este mal póde e deve ser promptamente remediado, transferindo-se a sede do referido julgado para a Barroca, e creando-se aqui um officio de tabellionato.

É por isso que tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A séde do julgado de Silvares, na comarca do Fundão, é transferida para a Barroca, e toma a denominação da sua nova séde.

Art. 2.° É creado no referido julgado um officio de tabellionato.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 23 de janeiro de 1885.= Luiz Gonzaga dos Reis Torgal.

Enviado á commissão de legislação civil.

Propostas para renovação de iniciativa 1.º Renovo a iniciativa do projecto de lei que teve segunda leitura na sessão de 13 de maio de 1884, relativo ao general Placido de Abreu. = Avellar Machado, deputado pelo circulo 86.

Lida na mesa, foi admittida e enviada ás commissões de guerra e de fazenda.

O projecto a que se refere esta proposta é o seguinte:

Senhores. - O general de brigada Placido Antonio da Cunha e Abreu, achando-se em perigo de vida em novembro de 1881, requereu, pelo ministerio da guerra, a sua reforma, que lhe foi concedida na conformidade da lei por decreto de 16 do dito mez.

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Tendo, porém, a felicidade de se restaurar, requereu novamente, pelo dito ministerio, em 12 de dezembro do dito anno, o ser restituido á situação em que antes estivera; e a respeito do que até ao presente ainda não houve qualquer resolução:

Em vista do exposto e considerando:

1.° Que este official general soffreu as perseguições da usurpação desde 1828 até 1833, em que foi deportado para a praça de Monsanto, de onde emigrou para Hespanha, apresentando-se em Marvão, tendo antes passado por vinte e oito cadeias e por grandes perigos de vida;

2.° Que fez com distincção as campanhas da liberdade, tendo merecido dois graus na ordem da Torre e Espada no campo da batalha e exercido cargos importantes nos exercitos em operações;

3.° Que tambem fez com distincção o curso do corpo do estado maior, a que pertenceu, obtendo seis prémios durante a sua carreira scientifica e litteraria;

4.° Que tem continuado desde o facto da sua reforma até ao presente, na mesma commissão de actividade em que antes estava sem a minima alteração ou falta;

5.° Que da sua restituição ao quadro do estado maior general não resulta prejuizo algum para os seus camaradas, visto ficar fóra do quadro e na mesma situação em que estava;

6.° Finalmente, que tambem não importa augmento de despeza, mas antes economia, visto passar a receber mensalmente 90$000 réis como general de brigada, em vez de 120$000 réis, que tem como general de divisão;

Tenho a honra de propor-vos o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Precedendo exame de uma junta militar de saude é o governo auctorisado a readmittir no serviço effectivo do exercito, e no posto que tinha anteriormente á reforma, o general de divisão reformado, Placido Antonio da Cunha e Abreu.

Art. 2.° A antiguidade d'este official na escala da promoção será determinada pela data do decreto que o promoveu a general de brigada, não podendo comtudo em tempo algum preencher vacatura no quadro do generalato.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 13 de maio do 1884. = José Alves Pimenta de Avellar Machado, deputado da nação.

2.ª Renovo a iniciativa do projecto de lei por mim apresentado em sessão de 21 de maio de 1879, que tem por fim isentar da contribuição de registo os estabelecimentos comprehendidos no § 4.° do artigo 1.° do decreto de 31 de agosto de 1869.

Sala das sessões, em 23 de fevereiro de 1885. = J. J. Alves.

Lida na mesa, foi admittida e enviada às commissões de fazenda e legislação civil.

O projecto a que se refere esta proposta, é o seguinte:

Senhores. - «As sociedades humanas não subsistem senão com a condição de supprir, dentro dos limites necessarios, ás necessidades publicas. Todas têem a dar aos governos que as regem os meios de desempenhar os seus deveres; todas têem a prover ás despezas necessarias para o interesse da defeza do territorio nacional, e da manutenção da ordem interior, e em todas existe o imposto debaixo das fórmas apropriadas ao estado mais ou menos adiantado da civilisação.»

Assim começa algures um notavel economista um artigo sobre o imposto.

Todas as classes sociaes devem contribuir dentro da medida dos seus haveres para as despezas do estado; effectivamente em o nosso paiz tanto directa como indirectamente todos contribuem para essas despezas, e poucos são os actos da vida civil e economica em que o fisco não intervenha, ainda que não seja senão por meio do sêllo, para haver algumas pequenas parcellas em beneficio do cofre commum.

Esta generalisação do imposto póde e deve ter uma excepção, que aliás está consignada em certas leis tributarias. Essa excepção deve ser a isenção do imposto nos legados pios e de beneficencia deixados a instituições legalmente organisadas.

As leis tributarias tinham mantido a isenção do imposto n'esses legados. Circumstancias, talvez graves, em que se encontrou o thesouro portuguez, determinaram que se lançasse mão do recurso barbaro, de taxar os legados que os sentimentos religiosos ou caritativos destinam ás despezas do culto e da beneficencia.

Só porém em condições muito excepcionaes se devia manter essa imposição. O thesouro portuguez não está infelizmente em circumstancias prosperas, mas tambem não o assoberbam circumstancias aterradoras. Póde elle felizmente dispensar as migalhas, que pela legislação vigente se subtrahem ás parcellas destinadas a dar alimento e vestuario á infância e á decrepitude desvalida.

Quatorze por cento nesses legados produzem para o estado verbas relativamente mesquinhas em relação ás receitas geraes do estado, relativamente avultadas, porém, em relação aos recursos dos estabelecimentos de beneficencia, para os quaes muitas vezes a mais insignificante verba concorre para lhes desequilibrar as finanças.

Quantas e quantas rações, quantos objectos de vestuario, que tanto aproveitariam á infancia ou á velhice desvalida, são annualmente entregues ao fisco, a titulo de direitos de transmissão!

É tempo de suspender por uma vez a intervenção do fisco nos legados de beneficencia. E não se diga que seja esta excepção que vae abrir precedente, porque esse precedente já está estabelecido na legislação patria, e é o que isenta do imposto do sêllo.

Por todas estas considerações, submetto á vossa apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Ficam isentos da contribuição de registo os estabelecimentos a que se refere o n.° 4.° do artigo 1.° da carta de lei de 31 de agosto de 1869.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 21 de maio de 1879.= Joaquim José Alves, deputado por Lisboa.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da camara municipal da Gollegã, adherindo á representação em que a sociedade agricola de Santarem pede providencias com que seja combatida a crise por que está passando a agricultura cerealifera em Portugal.

Apresentada pelo sr. deputado Carlos Lobo d'Avila, enviada á commissão de agricultura, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

2.ª Da associação commercial de Santarem, pedindo que seja approvado o projecto de lei do sr. deputado Antonio Mendes Pedroso, creando algumas disciplinas para o lyceu de Santarwm.

Apresentada pelo sr. deputado Mendes Pedroso, enviado á commissão de instrucção primaria e secundaria, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

3.ª Da camara municipal da Chamusca, pedindo alguma providencia com que seja combatida a crise por que está passando a agricultura cerealifera em Portugal.

Apresentada pelo sr. deputado Jalles, enviada á commissão de agricultura, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

4.ª Dos professores de instrucção primaria do concelho de Chaves, pedindo augmento de vencimento.

Apresentada pelo sr. deputado E. J. Coelho, enviada á

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commissão de instrucção primaria e secundaria, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

5.ª Da mesa administrativa da irmandade do Santissimo da sé patriarchal de Lisboa, pedindo a posse da ermida da Caridade, sita nos limites d'esta freguezia.

Apresentada pelo sr. deputado Rodrigo Pequito e enviada á commissão de administração publica, ouvida a de fazenda.

6.ª Dos operarios do quadro do arsenal de marinha, pedindo augmento de vencimento.

Apresentado, pelo sr. deputado J. J. Alves e enviada á commissão de marinha, ouvida a de fazenda.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.° Requeiro que, pelo ministerio da guerra, seja enviada com toda a urgencia a esta camara copia do parecer ou pareceres technicos, que precederam a compra do palacio de Santa Clara para aquartelamento de tropas, e nota das despezas feitas ou a fazer para pôr o edificio nas devidas condições. = O deputado, Carlos Lobo d'Avila.

2.° Requeiro que sejam enviados com toda a urgencia a esta camara pelos diversos ministerios todos os documentos comprovativos das despezas extraordinarias verificadas nos serviços de saude publica, em virtude da auctorisação do decreto dictatorial de 3 de julho de 1884. = O deputado, Carlos Lobo d'Avila.

3.° Requeiro que, pelo ministerio dos negocios eccleciasticos, seja enviada com urgencia a esta camara uma nota indicativa dos concorrentes ao logar vago de escrivão do juizo apostolico do arcebispado de Braga, e bem assim nota das habilitações litterarias e serviços prestados á igreja ou ao estado por cada um dos pretendentes ao referido logar. - O deputado, Santos Viegas.

4.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam enviados com urgencia a esta camara os seguintes documentos:

I. Copia das instrucções mandadas pelo actual ministro da marinha ao governador geral de Angola a respeito da occupação eventual das duas margens do Baixo Zaire;

II. Copia da correspondencia que a proposito da alludida occupação tivesse sido trocada entre o governo da metropole e o governo geral da referida provincia ultramarina;

III. Copia de quaesquer documentos existentes no ministerio da marinha e ultramar relativos ao mesmo assumpto, desde a data em que o actual governador geral de Angola assumiu as suas funcções. = O deputado por Lisboa. = Z. Consiglieri Pedroso.

5.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, seja enviada a esta camara uma copia dos certificados do delegado da capitania do porto de Angra do Heroismo, na ilha da Graciosa, relativos ás viagens do paquete Açor da empreza insulana de navegação áquella ilha nos annos de 1883 e 1884. = O deputado por Lisboa, Z. Consiglieri Pedroso.

6.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, com a devida urgencia, sejam enviados a esta camara:

I. Copia da syndicancia feita á actual camara municipal de Villa Flor, pelo official do governo civil, Joaquim Roballo Gomes; relatório do syndicante;

II. Relatorio do governo civil sobre os motivos que determinaram a syndicancia; copia de quaesquer officios enviados á camara syndicada;

III. Copia de quaesquer officios enviados ao governo sobre este assumpto; e quaes as providencias adoptadas depois da syndicancia. = Eduardo J. Coelho.

Mandou-se expedir.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Declaro a v. exa. e á camara que faltei a cinco sessões, porque grave doença de familia impediu a minha comparencia n'esta casa. = O deputado, Luiz Leite Pereira Jardim.

2.ª Declaro que o sr. deputado por Leiria, Adriano Xavier Lopes Vieira, tem faltado a algumas sessões d'esta camara por justificado motivo = Rocha Peixoto.

3.ª O deputado por Santarem, Antonio Mendes Pedroso, declara que por justos motivos não compareceu á sessão do 23 de fevereiro. = O deputado, Antonio Mendes Pedroso.

4.ª Participo a v. exa. que tenho faltado a algumas sessões por motivo justificado. = Rodrigo A. Pequito, deputado por Lisboa.

5.ª Tenho a honra de participar a v. exa. e á camara que faltei a algumas sessões por motivo justificado. = Cardoso Valente.

6.ª Declaro que por motivo justificado tenho faltado a algumas sessões. = Frederico Arouca.

7.ª Declaro que, por motivo justificado, não pude comparecer ás sessões de 20 e 21 do corrente mez. = O deputado, Alves Matheus.

8.ª Participo a v. exa. que fui encarregado pelo sr. conde da Praia da Victoria, deputado eleito pelo circulo de Angra do Heroismo, de communicar a v. exa. que elle não tem tomado parte nos trabalhos d'esta camara por motivo de doença, como comprova o documento que envio para a mesa. = Antonio Ennes.

DECLARAÇÕES DE VOTO

1.ª Declaro que, se estivesse presente na sessão de 21 de fevereiro, teria approvado a moção do sr. deputado Lencastre = Frederico Arouca.

2.ª Declaro que, se estivesse presente na sessão de 23 de fevereiro, teria votado a favor do projecto de resposta ao discurso da corôa. = O deputado, Antonio Mendes Pedroso.

3.ª Declaro que, se estivesse presente na sessão de hontem, teria approvado a resposta ao discurso da corôa. = Rodrigo A. Pequito, deputado por Lisboa.

4.ª Declaro que, se estivesse presente ao fim da sessão de hontem, teria approvado a resposta ao discurso da corôa. = O deputado, Santos Viegas.

O sr. Presidente: - Vae ler-se na mesa em segunda leitura, a proposta que hontem mandou para a mesa o sr. deputado Fuschini.

É o seguinte

Requerimento

Requeiro que sejam aggregados á commisão de inquerito sobre o sal o sr. deputado Barros Gomes, o sr. deputado Antonio Pinto do Magalhães e o sr. deputado Mariano de Carvalho.

Lisboa, 23 de fevereiro de 1885. = Fuschini.

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SESSÃO DE 24 DE FEVEREIRO DE 1885 517

O sr. Carrilho: - Por parte da commissão de inquerito parlamentar ao imposto do sal, participo a v. exa. que a mesma commissão em sessão de hontem, resolveu que lhe fossem aggregados alguns srs. deputados.

Em conformidade com a resolução da commissão, mando para a mesa uma proposta n'esse sentido.

É a seguinte

Proposta

Por parte da commissão de inquerito parlamentar ao imposto do sal, requeiro que sejam aggregados á mesma commissão os srs. deputados:

Antonio Pinto de Magalhães.
Henrique de Barros Gomes.
José Alves Pimenta de Avellar Machado.
José de Azevedo Castello Branco.
Marçal Pacheco.
Mariano de Carvalho.
Rodrigo Pequito.
Tito de Carvalho.

Sala das sessões, 24 de fevereiro de 1885. = A. Carrilho, secretario.

Foi approvado o requerimento, ficando por esta approvação prejudicada a proposta do sr. Fuschini.

O sr. Rodrigo Pequito: - Mando para a mesa uma justificação de faltas, uma declaração de voto e marido tambem a fim de que s. exa. lhe dê o destino conveniente, uma representação da mesa administrativa da irmandade do Santissimo Sacramento da Sé Patriarchal de Lisboa em que pede para que lhe seja conferida a posse de uma ermida de Caridade que existe nos limites d'aquella freguezia, a fim de que nas dependencias d'aquella ermida se possa fundar um estabelecimento de caridade.

O sr. Santos Viegas: - Mando para a mesa o seguinte requerimento.

(Leu.)

Igualmente mando para a mesa um projecto de lei que é o seguinte:

(Leu.)

Já na sessão de 1883 eu tive a honra de mandar para a mesa um projecto igual, a requerimento de uma corporação administrativa, a camara municipal de Celorico de Basto.

Escusado e referir agora as rasões que então expendi para advogar a opportunidade e vantagem de que o projecto seja convertido em lei.

Já que estou com a palavra permitta-me s. exa., e a camara, e visto estar tambem presente o sr. ministro da marinha, que lhe peça a meza de dar-me algumas explicações sobre um facto, que vi mencionado n'um jornal, ácerca do procedimento do governador de Angola; facto este, a que não posso deixar de dar perante o paiz a maxima importancia.

Diz esse jornal, que o governador de Angola recebêra qualquer requerimento, ou tivera uma conferencia com os missionarios allemães ou americanos, mas protestantes, que elles seguida, junto de um territorio de um soba qualquer, e que julgo ser o soba de Bailundo, o qual os não admittira, prestando inteira obediencia ás leis do reino, e de respeito ao chefe do estado por elle muito e acima de todos considerado.

Dirigindo-se estes missionarios protestantes para Angola, tiveram uma larga conferencia com o governador, em que pediam lhes desse carta de recommendação, que os habilitasse a entrar no territorio do mesmo soba. E a carta foi dada, a recommendação foi feita.

Este facto, como v. exa. e a camara vêem, é realmente importante. Julgo o até attentatorio ás leis portuguezas; porque estas mandam educar os povos seguindo os principios do catholicismo, que consegue que a civilisação progrida e seja estavel, o que se não dá com outro elemento religioso. A missão catholica, e só esta é para mim o auxiliador mais poderoso, e talvez indispensavel para que a metropole venha um dia a recuperar a grandeza de outr'ora.

Eu julgo sr. presidente, que ao governo assiste a rigorosa obrigação de providenciar quando disto tenha conhecimento, no sentido de que os missionarios portuguezes, ali residentes, tenham toda a protecção, e não sejam postos de parte, dando-se preferencia em territorio, que não é seu, a missionarios americanos, e faça desenvolver as missões religiosas catholicas, ganhando-se assim a affeição dos indigenas ao nome portuguez, o que ninguem melhor do que os missionarios podem conquistar. E se tanto é preciso para demonstrar esta proposição recorramos á historia. Lembremo-nos de Timor, e não esqueçamos Ceylão. N'estas paragens como em tantas outras foram os missionarios catholicos que tornaram estimado e respeitado o nome portuguez. Se olhos ambiciosos e soffregos não deixam de fixar-se nas nossas possessões ultramarinas, ganhemos e não perdamos o quase não ganha pela força de grandes armadas e valentes exércitos, que é o amor e confiança, que os indigenas depositaram em nós, elemento este importante e que o missionario exalta e alimenta. (Apoiados.)

Eu julgo, sr. presidente, que o governador deve olhar para as missões com especial solicitude que tem restricta obrigação de proteger qualquer individuo que se approxima do seu palacio e que lhe peça justiça, mas entre o facto de pedir justiça, e ser-lhe feita, e o de proteger com a sua auctoridade quem póde prejudicar-nos com suas insinuações amigas e fartos meios, ha sensivel differença, é grande a distancia de uma a outra cousa. Talvez se pense que para o elemento religioso-catholico já passou o tempo! Talvez se julgue, como alguém ousadamente affirma, que ao genero humano corre o dever de substituir esta fórma religiosa ou dispensar toda e qualquer! Triste pensamento, desgraçada propaganda. A religião, sr. presidente, não é objecto de moda (Apoiados.) é imprudencia grave abandonar uma verdade. Quem tal pensa, quem propaga similhante theoria, extirpe primeiro as paixões más dos homens. (Apoiados.) Estas doutrinas subversivas alluem os fundamentos da sociedade, e infeliz será esta, se a fé lhe não acudir acalmando a tempestade, que promette tomar proporções assustadoras. (Muitos apoiados.)

Perdoe-me a camara esta digressão. Como padre e como portuguez exponho os principios, de que estou profundamente convicto, porque entendo que realisados elles, virá o engrandecimento da nação e suas colonias pelos meios que ella empregou outrora para a civilisação dos povos da Africa, principios que são completamente differentes dos que hoje estes missionarios protestantes pregam.

Os povos d'aquellas paragens podem deixar-se mais arrastar pelo esplendor e immensos meios que os differentes governos dispensam aos seus missionarios, do que pela mais que modesta situação e desprestigio em que os governos portuguezes deixara os missionarios que ali conservamos, e que, com um zêlo e abnegação não vulgar, sacrificam tudo ao nome portuguez e em nome da cruz que tinham sido enviados para pregar a doutrina religiosa por os nossos avós ali arvoraram.

N'isto não irrogo censura a ninguem, e muito menos ao sr. ministro da marinha, que, no sentido de levar os funccionarios do ultramar pelo verdadeiro caminho da civilisação é, se não o primeiro, um dos mais illustrados e enthusiastas apostolos, mas julgo que os portuguezes que se encontrem em taes condições n'aquella parte do mundo devem ser protegidos o mais possivel, a despeito de todas as considerações que outros nos mereçam.

São muitos os meios que os missionarios americanos, ingleses e de outras nações da Europa têem á sua disposições, mas o que elles não têem inquestionavelmente, como já disse e repito, é tanta justiça e tanto direito para chamarem ao seu grémio os povos d'aquellas paragens como temos nós, os catholicos, a quem o engrandecimento e a

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civilisação d'aquelles territorios foi legado pelos nossos antepassados.

Se o governo não tem á sua disposição os meios necessarios para fazer face ás despezas extraordinarias que seria necessario fazer ali, ao menos dê aos nossos missionarios o que é indispensavel para fazerem face, em condições vantajosas para a pátria, á conquista que outros pretendem fazer.

Digo isto porque desgraçadamente é certo que os nossos missionarios em Africa têem em atrazo os vencimentos relativos á maior parte do tempo que ali tem servido.

Chamo a attenção do sr. ministro da marinha para estes factos.

Estou convencido de que s. exa. ha de empenhar todos os seus esforços para que as nossas missões em Africa tenham o desenvolvimento que todos desejam; mas, repito a phrase: considero que o missionario é um auxiliar mais poderoso e mais indispensavel do que as faustosas expedições de outro caracter que não seja o caracter religioso.

Tenho concluido, esperando usar novamente da palavra, se entender que devo responder ás considerações feitas pelo nobre ministro, a quem me dirigi.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - Primeiro que tudo permitta-me v. exa. e permitta-me a camara que eu narre os factos taes quaes se passaram e taes quaes chegaram ao meu conhecimento.

Os missionarios que estavam em Bailundo não eram allemães, mas americanos; eram membros de uma instituição americana que tinha o caracter religioso, e principalmente civilisador.

Estabeleceram-se ha muito tempo no districto de Benguella, em Bailundo, onde viveram não perturbando a paz publica, não se intromettendo em questões politicas e tratando unicamente de fazer propaganda religiosa.

E quanto á propaganda religiosa sabe o illustre deputado de certo que elles bem poucas probabilidades tinham de destruir entre os negros a influencia suprema da religião catholica.

Ha cerca de oito mezes, por motivos que ignoro, o soba de Bailundo não só exigiu que elles se retirassem, mas expulsou-os violentamente e expoliou-os dos seus bens.

Chegando a Benguella queixaram-se á auctoridade portugueza, e um d'elles, partindo para a Europa, não só se queixou ao governo do seu paiz, mas em algumas cartas publicadas num jornal inglez dizia que de uma possessão portugueza tinham sido expulsos violentamente e espoliados dos seus haveres.

O governo portuguez não podia consentir que com justiça se dissesse que em territorio de Portugal elles não encontravam a hospitalidade e a protecção que encontram os missionarios em territorios de outros, paizes, seja qual for a religião a que pertençam, e por isso deram-se instrucções ao governador de Angola para que não permittisse que tal facto se realisasse.

Antes mesmo d'essas instrucções terem chegado, já o governador tinha mandado proceder a um inquerito.

E segundo parece, ultimamente os missionarios voltaram para Bailundo com recommendação do governador a fim de lhes serem restituidos os bens de que foram despojados, e podessem encontrar as garantias a que têem direito n'um territorio onde tremula a bandeira de um paiz civilisado.

O illustre deputado sabe perfeitamente, e n'este ponto agradeço a justiça, e até o louvor exagerado que s. exa. me deu, sabe que uma das cousas em que tenho mais desejo é em desenvolver as missões catholicas no ultramar; e s. exa. sabe perfeitamente que no intervallo das sessões promulguei um decreto pelo qual dei vantagens mais elevadas aos missionarios das provincias ultramarinas e procurei reorganisar os estatutos do collegio de Sernache de fórma que podésse habilitar os nossos missionarios a poder luctar com espirito evangelico no campo da sciencia e dos conhecimentos uteis, com os estrangeiros, isto com o pensamento dominante de chamar os indigenas a uma religião toda de amor e caridade.

Mas é corto que nós não podemos, de forma alguma, seguir no seculo XIX as velhas tradições do seculo XVI, que nos dispensaram tantas glorias com tantas crueldades: hoje a bandeira de Portugal, bandeira essencialmente catholica, deve ser essencialmente tolerante, e não podemos perguntar aos missionarios, que vão á Africa com pensamento civilisador, a religião a que pertencem, nem qual é o lemma que escrevem na sua bandeira.

O sr. Lobo d'Avila: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação da camara municipal da Gollegã, em que pede um direito protector sobre os cereaes; e peço a v. exa. que consulte a camara, sobre se permitte que ella seja impressa no Diario do governo.

Consinta já agora v. exa. que eu faça sobre este assumpto algumas reflexões brevissimas.

V. exa. comprehende que neste momento não ha de ser meu intuito tratar desenvolvidamente da questão a que se refere a representação da camara da Gollegã. É ella muito difficil e muito complexa para ser assim discutida, sem os devidos elementos. O que é certo, e v. exa. sabe-o, como o sabe a camara e o governo, é que ha uma classe importante no paiz que soffre, e que os poderes publicos têem obrigação de attender com justas medidas ás necessidades das differentes classes.

Devem, portanto, occupar-se de uma crise tão grave como a que está atravessando a classe agricola, e devem tomar as providencias que forem consentaneas com os interesses d'essa classe e em harmonia com os interesses geraes. (Apoiados.)

Eu ouvi hontem, com a attenção que me merece sempre, o meu illustre collega e amigo o sr. Fuschini, e devo dizer a v. exa. e á camara que as ponderações de s. exa., apesar de serem rasoaveis até certo ponto, provaram-me mais uma vez como o espirito doutrinario, o espirito da escola, exagerando-se, origina um parti-pris, vicia os processos de logica, forma preconceitos absurdos, que arrastam a conclusões manifestamente erroneas até um homem de tanto talento como o sr. Fuschini.

Entre as considerações que s. exa. apresentou, o facto que roais me impressionou e que é para mim capital n'esta quentão, foi s. exa. confessar que tendo baixado o preço do trigo e baixado muito, o preço do pão só tem tido pequenas variantes.

O sr. Fuschini: - Eu peço a s. exa. que complete agora o meu raciocinio.

O Orador: - Não preciso de completar o raciocinio do illustre deputado: n'este enunciado está elle completo e perfeito.

O facto importante é este: o preço do pão subsiste apesar de diminuir o preço do trigo, o que prova que a depreciação do genero, que tanto prejudica o lavrador, não utilisa ao consumidor. Vae unicamente augmentar o lucro já excessivo do intermediario. (Apoiados.)

Foi por isso, sr. presidente, que hontem me quiz parecer que o meu amigo o sr. Fuschini estava pondo, involuntariamente de certo, o socialismo sentimental, (Riso.) de que e tão desvelado cultor, ao serviço de umas entidades poderosas, cujos lucros exagerados não devem ser muito sympathicos ás classes pobres.

Devo declarar que não partilho inteiramente as idéas expostas na representação que mandei para a mesa, porque um simples direito protector lançado sobre o trigo afigura-se-me que não modificará só por si os lucros excessivos que tira o intermediario, nem minorara a crise em que se debate o agricultor.

A questão é muito complexa, como já disse, e reclama um conjuncto de medidas, que reciprocamente se relacionem e completem.

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E por isso que eu peço ao governo, que n'esta occasião vejo representado pelo sr. ministro da marinha e ultramar, que medite n'esta grave questão e, que apresente ao parlamento as medidas que entender mais convenientes para occorrer a uma crise que affecta a uma das classes mais importantes do nosso paiz, qual é a classe dos lavradores, não só os poderosos conforme parecia deprehender-se das palavras do sr. Fuschini, mas dos pequenos lavradores, assim como a classe dos trabalhadores do campo, uma classe numerosissima, que não é menos respeitavel do que a classe dos trabalhadores da cidade e que tem a sua sorte vinculada â situação dos proprietarios ruraes. (Apoiados.)

Não me alongo em mais considerações sobre o assumpto, mas chamo para elle toda a attenção do governo e da camara.

Mando para a mesa dois requerimentos, cuja urgencia v. exa. e a camara reconhecerão pela sua simples leitura.

(Leu.)

Decidiu-se que a representação fosse publicada no Diario do governo.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Mando para a mesa os seguintes requerimentos.

(Leu.)

Já que estou com a palavra pedia a v. exa. a fineza de me informar se porventura já estão sobre a mesa os esclarecimentos que eu pedi, creio que na sessão de 18 de janeiro, e que se referem a dividas, á fazenda publica, de direitos de mercê, e emolumentos e titulos nobiliarchicos e condecorações.

Pedi estes esclarecimentos com urgencia, e disse por essa occasião que elles me eram indispensaveis para poder tomar parte na discussão que brevemente ia realisar-se.

O sr. Primeiro Secretario (Mouta e Vasconcellos): - O pedido do illustre deputado foi expedido para o ministerio do reino em officio de 23 de janeiro e ainda não foi satisfeito.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Sinto que, tendo eu pedido a urgencia na remessa cVesses esclarecimentos, elles ainda não tenham chegado á camara; e peço a v. exa. que inste pela remessa d'elles, reservando-me para fazer algumas considerações quando estiverem em meu poder.

Peço tambem a v. exa. o favor de me dizer seja foram remettidos, pelo ministerio competente, os esclarecimentos que pedi ha bastantes dias relativamente á exportação do milho pelo Fayal.

O sr. Primeiro Secretario (Mouta e Vasconcellos): - O pedido do sr. deputado foi expedido em officio de 28 de janeiro e ainda não veiu resposta d'esse officio.

O sr. Jalles: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal da Chamusca, pedindo um augmento de direito sobre a importação de cereaes.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

Inutil será n'este momento fazer largas considerações depois do que tão proficientemente acaba de dizer o meu talentoso amigo o sr. Carlos Lobo d'Avila.

Não foram menos judiciosas as considerações feitas na sessão de hontem pelo sr. Fuschini sobre este assumpto com a elevação de vistas e de idéas que caracterisa o seu esclarecido espirito, comtudo parece-me que s. exa., a quem principalmente preoccupa a sorte das classes pobres pelo receio do augmento do preço do pão, derivado da elevação dos direitos sobre a importação do trigo, concordará commigo que por medidas harmonicas se poderá favorecer não só a classe dos productores, mas a dos consumidores; com a manutenção do statu quo, porém, só lucram os intermediarios, que se estão locupletando com grave detrimento da nação, visto que todos somos consumidores, e portanto devem os interesses geraes ser principalmente acatados.

Deve merecer tambem especial cuidado a sorte dos cultivadores de trigo, proprietarios e rendeiros, que estão vendo o seu trabalho deprimido e o valor venal das terras a diminuir consideravelmente.

Em muitos districtos do nosso paiz quasi que é exclusiva a cultura de cereaes, sendo, pois, immediata a perda dos seus importantes valores agricolas.

Estude-se, pois, a questão, as causas e os motivos que deram origem á crise, porque d'esse estudo podem resultar leis salutares, que honrem os parlamentos que as decretam.

Mais vale tratar d'estas questões sociaes, do que de questões de mera politica partidaria, que, se agradam ás personalidades, nada valem em face dos interesses do paiz.

Pedindo a v. exa. que consulte a camara sobre a publicação d'esta representação, julgo ter interpretado bem os intuitos d'aquelle corpo administrativo que, compenetrando-se do mal estar dos seus municipes, vem apresentar aos poderes publicos os seus queixumes.

O concelho da Chamusca, um dos mais ricos do districto de Santarem, soffre com a crise actual, por isso a vereação que preside aos seus distinos, cumprindo o seu dever, pede providencias que extingam ou modifiquem o mal. Não são declamações de interesses offendidos, é um corpo administrativo que vem pedir justiça.

A representação está muito bem elaborada, merecendo, pela seriedade dos seus argumentos, a attenção dos que se dedicam ao estudo d'estes assumptos sociaes e economicos.

Decidiu-se que a representação fosse publicada no Diario do governo.

O sr. Francisco Beirão: - Ha de v. exa. lembrar-se de que na sessão de sabbado, depois do meu amigo e antigo condiscipulo o sr. deputado Pereira Leite ter feito um requerimento para se julgar encerrada a discussão ácerca do incidente levantado n'esta camara pelo sr. Emygdio Navarro, eu pedi a palavra sobre o modo de propor, tendo unicamente em vista que a camara não votasse o requerimento de s. exa. senão sem prejuizo da inscripção que se achava feita, inscripção que comprehendia apenas o meu nome. E n'essa occasião disse eu que o meu intuito era dirigir ao governo, e especialmente ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, uma simples pergunta.

A camara não attendeu ao meu requerimento e julgou sufficientemente discutida a materia; estava no seu direito em tomar aquella resolução, direito que me cumpre acatar e respeitar.

A mim, porém, corria-me então, como hoje, o dever de justificar u meu procedimento, mostrando á camara que o meu intuito não era protelar aquella discussão, nem até entrar n'ella, mas fazer uma simples pergunta, e por isso no fim da sessão pedi a v. exa. que prevenisse o sr. ministro dos negocios estrangeiros de que carecia da presença do s. exa. para esse fim, e desde logo para seu inteiro conhecimento formulei a pergunta.

Compareci hontem na camara, e inscrevi-me antes da ordem do dia; a palavra porém não me chegou, sendo tambem n'este dia, que infelizmente o sr. ministro dos negócios estrangeiros não se dignou comparecer na camara.

Hoje chega-me a palavra, mas ainda infelizmente s. exa. não se acha presente.

Não lamento nem sinto este facto pela minha obscura personalidade, não só porque ella de pouco vale, mas porque conheço bastante o sr. Barbosa du Bocage para saber que s. exa. não era capaz de faltar a uma consideração pessoal para com qualquer individuo; mas lamento-o e sinto-o como membro do parlamento e como representante da nação. (Apoiados.)

Tomo nota d'esta omissão e permitta-me v. exa. lastimar, que os srs. ministros não compareçam no parlamento

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todas as vezes que um deputado os convida para lhes dar explicações sobre qualquer assumpto de interesse publico.

Repito, sinto que o sr. ministro dos negocios estrangeiros não esteja presente, mas como vejo o governo representado na pessoa do sr. ministro da marinha, dirijo-me a e. exa., e com a devida lealdade pergunto-lhe primeiro que tudo se s. exa. se considera sufficientemente habilitado para responder á pergunta que eu dirigi ao seu collega dos negocios estrangeiros, porque como este negocio respeita especialmente á administração d'esta pasta, é possivel que o sr. ministro da marinha não esteja habilitado a responder-me precisamente; entretanto se s. exa. me disser que está habilitado eu não terei duvida em formular mais desenvolvidamente as minhas perguntas.

Pergunto, em primeiro Jogar, se é verdadeiro o facto de se haver já reconhecido a associação internacional africana.

O reconhecimento de um novo estado ou de um novo governo e em geral um simples acto do poder executivo, que não me parece sujeito a qualquer sygillo diplomatico. Portanto, creio que se póde responder a esta pergunta sem quebra das devidas reservas, que não quero por modo algum offender.

E se é verdadeiro o facto, pergunto mais a s. exa., caso n'esta parte especial o sr. ministro esteja completamente habilitado para informar, quaes os termos em que se fez este reconhecimento.

Espero as respostas de s. exa.; e peço desde já a v. exa. que, caso o sr. ministro se julgar habilitado a responder-me cabalmente, consulte a camara sobre se permitte que eu use novamente da palavra a fim de formular mais largamente quaesquer duvidas que possa ter, declarando porém desde já que apesar d'isso tomarei muito pouco tempo á camara.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - Sr. presidente, o illustre deputado fez completa justiça ao meu collega o sr. ministro dos negocios estrangeiros, o sr. Bocage, dizendo que sabia bem que era incapaz de faltar á consideração devida a s. exa. e á consideração devida á camara.

Não estava elle na camara no fim da sessão em que o illustre deputado fez, segundo parece, esse requerimento, e é natural que só tarde tivesse tido conhecimento d'elle e é de certo por motivos superiores á sua vontade que deixou de comparecer hontem na camara, e não compareceu até agora no parlamento. É natural que venha ainda hoje, mas se não vier, ainda hoje communicarei ao meu collega os desejos manifestados pelo illustre deputado, e s. exa. virá satisfazer esse desejo, respondendo á pergunta formulado por s. exa. e e explicando os motivos por que não pode vir mais cedo.

Sr. presidente, esse assumpto diz respeito exclusivamente ao ministerio dos negocios estrangeiros e, como a camara sabe, o governo já declarou o reconhecimento da associação internacional nas condições estipuladas com as tres potencias intermediarias: foi decidido já, mas se já se assignou o tratado ou não, não estou habilitado a responder, e só o meu collega poderá dizer. Repito, communicarei ao meu collega a insistencia do illustre deputado e elle virá responder cathegoricamente á pergunta e explicar o motivo por que não póde vir mais cedo.

Consultada a camara, permittiu que se concedesse novamente a palavra ao sr. Beirão.

O sr. Francisco Beirão: - Das palavras, que o sr. ministro dos negocios da marinha e ultramar acaba de proferir, o que posso colligir é que s. exa. se referiu unicamente á primeira parte da minha pergunta: isto é, com respeito ao reconhecimento da associação internacional africana. Mas ahi está exactamente a minha duvida. Os reconhecimentos de novos estados ou de novos governos são, como v. exa. e a camara sabem, da restricta competencia do poder executivo; e o poder legislador não intervem, era geral, em taes actos. Ora a associação internacional africana é uma entidade completamente nova; é desconhecida no direito publico internacional europeu, e por isso a minha pergunta é saber como, e em que termos, se reconhece, esta entidade. Importa esse reconhecimento o de futuros direitos de soberania. Se assim é como esses direitos hão de ser exercidos, em grande parte, em territórios a que Portugal se julga com direitos incontestaveis, o exercicio d'essa soberania, n'essa parte, depende da ratificação do tratado pela qual a nação ceda d'esses direitos. Mas essa ratificação só póde verificar-se depois do approvada a respectiva convenção pelo parlamento.

Ainda não sei como o governo procedera a esse reconhecimento, e portanto a minha pergunta é se esse reconhecimento foi feito como um acto isolado e exclusivo do poder executivo, ou se ficou dependente da approvação do tratado e por isso sujeito á approvação do parlamento. (Apoiados.)

Creio que pondo á camara as minhas duvidas não comprometto de modo algum a liberdade de acção do poder executivo, nem prejudico quaesquer negociações por ventura pendentes.

O sr. ministro dos negocios estrangeiros podia vir á camara desfazer as duvidas levantadas no meu espirito, porque estará de certo habilitado para isso; o que era tanto mais urgente quanto essas duvidas podem não ser simplesmente minhas e individuaes, mas têem se tambem levantado no espirito de outros, e até na opinião publica.

V. exa. vê, pois, quanta rasão eu tinha na pergunta que fiz.

Com respeito a esta segunda parte da minha instancia, o sr. ministro da marinha disse, ao que me pareceu, não ter um conhecimento tão especial das negociações que podesse informar completamente a camara de como e em que termos se tinha feito o reconhecimento: mas como s. exa. delicadamente se offereceu para fazer sciente o seu collega dos negocios estrangeiros das minhas instancias, esperarei que o ministro respectivo venha declarar á camara quaes os termos em que o reconhecimento foi feito.

O sr. ministro da marinha fará por certo, como disse, esta communicação ao seu collega dos negocios estrangeiros e s. exa. responderá se assim o julgar, como aliás me parece conveniente.

O sr. Simões Ferreira: - A camara sabe que em fins de outubro, ou principios de novembro, o governo, pelos ministerios dos negocios ecclesiasticos e de justiça e da marinha, dirigiu umas portarias de censura, ou como as quizerem classificar, relativamente ao procedimento de alguns bispos que deram curso á bulia Humanum genus que não tinha o beneplacito regio.

Os sacerdotes censurados foram os srs. bispo da Guarda, e arcebispo de Goa, e mais tarde o sr. bispo de Angra.

Sei que o sr. bispo da Guarda respondeu á portaria com um officio que foi impresso, não direi por ordem, mas de certo com auctorisação, do sr. bispo, e correu todo o paiz.

A respeito do sr. arcebispo de Goa, não ha documento que nos dê a conhecer se foi tomada em consideração a censura do governo; entretanto, no jornal o Correio da India, chegado no ultimo paquete, vem uma noticia em que se diz que o prelado do Oriente devolvera ao governo a censura que lhe foi feita na portaria.

Como está presente o sr. ministro da marinha e ultramar, desejo que s. exa. me informe se é ou não verdadeiro o facto do sr. arcebispo de Goa ter dirigido algum officio ao governo devolvendo-lhe a censura feita na portaria.

Espero a resposta do sr. ministro e peço a v. exa. que me reserve a palavra para, em vista do que s. exa. disser, eu fazer as considerações que julgar conveniente.

O sr. Ministro cia Marinha (Pinheiro Chagas):- Tenho a dizer ao sr. deputado que o sr. arcebispo de Goa respondeu á portaria, pedindo simplesmente licença

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para fazer algumas considerações em sua defeza e annunciando que brevemente faria a sua exposição.

Que me conste, essa exposição ainda não chegou ao conhecimento do governo.

O sr. Presidente: - Não posso dar a palavra ao sr. Simões Ferreira sem alterar a ordem da inscripção, e para o poder fazer preciso consultar a camara.

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camara, tem a palavra o sr. deputado.

O sr. Simões Ferreira: - Em vista da resposta do sr. ministro da marinha, de que o sr. arcebispo apenas pediu licença para fazer algumas considerações em sua defeza, eu, acceitando a declaração do governo, limito hoje aqui as minhas ponderações e aguardo a justificação do sr. arcebispo de Goa.

O sr. J. J. Alves: - Mando para a mesa o requerimento que a esta camara dirigem os operarios do quadro do arsenal da marinha, pedindo augmento nos seus salarios.

Appenso a este requerimento vae o mappa dos operarios do quadro effectivo do mesmo arsenal com os salarios que actualmente percebem; e embora estes jornaes sejam inferiores aos dos operarios dos estabelecimentos particulares, elles não pretendem ser igualados, porque gosam do beneficio do trabalho effectivo; pedem apenas que elles lhes sejam melhorados como se julgar de justiça.

Pela minha parte entendo que esta pretensão deve ser deferida tanto mais favoravelmente, quanto é certo que, tendo o parlamento votado para esta classe em 1878 réis 6:000$000 para o indicado um, ella pouco ou nada lucrou, porque a distribuição, segundo se affirma, não foi feita com a igualdade precisa.

Espero, pois, que as commissões que têem de apreciar esta questão, de accordo com o sr. ministro da marinha, a resolvam por forma que se faça aos requerentes a justiça que merecem.

O sr. Eduardo Coelho: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação dos professores de instrucção primaria do concelho de Chaves, pedindo se lhes melhore a sua situação.

A representação está escripta em termos dignos, e, portanto, peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que ella seja publicada no Diario do governo.

Não me alongo agora em considerações ácerca da justiça que assiste aos pretendentes, e opportunamente tratarei d'este assumpto com o desenvolvimento que me merece. Não posso, porém, deixar de dizer desde já que, apesar dos novos methodos de ensino tão apregoados, e apesar de regulamentos, mais ou menos espectaculosos, o serviço de instrucção primaria continua cada vez peior, verdadeiramente tumultuario e cahotico.

A educação de um povo, que se rege por instituições liberaes, é de todas a primeira questão. Não se comprehendem franquias liberaes sem discernimento no povo, porque só com discernimento é que póde ser verdadeiramente responsavel. O alargamento do suffragio, sem instrucção, é um perigo grande, porque as massas inconscientes são o instrumento da peior das tyrannias. Isto, que é de intuição theorica, demonstra-se na pratica sem esforço. Os povos que mais prosperam são os povos mais adiantados na instrucção, principalmente no que nós chamamos instrucção elementar e primaria. Mas n'esses povos o professor de instrucção primaria tem um logar eminente na categoria social; é o primeiro, se não dos primeiros, na consideração e na remuneração dos seus serviços. É que os povos praticos, que olham o progresso como uma realidade e uma aspiração sincera, não desconhecem que todas as reformas são inuteis sem pessoal adequado para as comprehender e executar. O bom professor suppre a deficiencia dos methodos de ensino; o mau professor nem sequer comprehende os bons methodos de ensino. E por isso que é preciso começar pelo principio; dar larga e justa remuneração aos professores de instrucção primaria, não só para lhes tornar effectiva toda a responsabilidade, mas para chamar a este augusto sacerdocio pessoas com habilitações e dignas.

Por ora limito-me ao exposto.

Mando tambem um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo relativamente á syndicancia que foi feita á camara municipal de Villa Flor, onde, segundo as minhas informações, se commetteram as maiores irregularidadcs. Não posso, porém, segundo os meus habitos e principios, accusar sem provas, e por isso peço esclarecimentos ao governo. Logo que cheguem, entrarei no assumpto com a severidade que elle reclama.

Pedia tambem a v. exa. a fineza de me dizer se os documentos que pedi nas sessões de 7, 19 e 23 de janeiro ultimo já estão na mesa. Apenas recebi os documentos relativos á dissolução da misericordia de Chaves, mas os que requeri pelos ministerios da justiça e da fazenda ainda me não foram entregues.

Desejava por isso que v. exa. me informasse a este respeito.

O sr. Secretario (Monta e Vasconcellos): - Os esclarecimentos pedidos pelo ministerio do reino, em sessão de 7 de janeiro, e que se referem ao alvará pelo qual foi dissolvida a misericordia de Chaves, já vieram; os que pediu pelo ministerio da justiça, em sessão de 19, não vieram ainda, assim como não veiu ainda resposta ao requerimento feito em sessão de 29, e que se refere aos esclarecimentos pedidos pelo ministerio da fazenda.

O sr. Eduardo Coelho: - N'esse caso peço que se renove o pedido, porque tenho urgencia de interpellar o governo sobre assumptos, a que os documentos se referem, e não posso deixar de lamentar que as minhas requisições não tenham ainda sido satisfeitas.

O sr. Presidente: - Vae fazer-se nova requisição. Vou agora consultar a camara se permitte que a representação apresentada pelo sr. Eduardo Coelho seja publicada no Diario do governo.

Assim se resolveu.

O sr. Mendes Pedroso: - Mando para a mesa uma justificação de faltas e uma declaração de voto.

Mando tambem uma representação da associação commercial do districto de Santarem, pedindo que o lyceu d'aquella cidade seja acrescentado com o curso complementar dos lyceus.

Não leio a representação por ser extensa, mas roqueiro que v. exa. consulte a camara se permitte que ella seja publicada no Diario do governo.

Sr. presidente, não me parece que haja motivo para que o lyceu de Santarem não tenha o curso complementar. Santarem tem o seminario onde existem algumas cadeiras que não são cursadas no seu lyceu, e que o deviam ser; alem d'isso faltam no lyceu de Santarem as cadeiras de inglez e de allemão, que são muito importantes e necessarias para o commercio.

Tem-se observado que depois de ali haver o curso geral dos lyceus, a frequencia de alumnos tem diminuido, quando até então era consideravel, porquanto a média de alumnos que frequentava o lyceu de 1800 a 1880 era de 223 e depois baixou a 90.

Isto é importante para a cidade, e a falta de um curso complementar n'aquelle lyceu faz com que as pessoas que desejam educar os filhos os mandem educar longe, ou os não eduquem porque não podem fazer maiores despezas.

Não se póde dizer que Santarem não tem o curso complementar dos lyceus por estar proximo de Lisboa, onde existe um lyceu central. Ora Santarem não está mais proximo da capital do que Braga está do Porto, e Braga tem tambem um seminario como existe em Vizeu, e alem d'isso a população de Santarem é superior á do districto de Evora, onde existe um lyceu com o curso complementar.

A lei de 14 de julho de 1880 diz que as juntas geraes

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dos districtos subsidiarão os professores que forem necessarios para regerem os cursos complementares, mas o districto de Santarem tem feito gastos tão importantes com a viação publica, com o estabelecimento de uma quinta districtal, com a edificação de uma cadeia penitenciaria e com a construcção de casas para as repartições districtaes que lhe foi necessario contrahir emprestimos superiores a 600:000$000 réis, e lança já hoje uma percentagem, sobre as contribuições geraes do estado, de 30 por cento, e não póde por isso aggravar mais o contribuinte.

Como complemento á representação que apresento, mando para a mesa o seguinte projecto de lei:

(Leu.)

Foi auctorisada a publicação da representação no Diario do governo.

O projecto de lei ficou para segunda leitura.

O sr. Antonio Centeno: - Aproveito a occasião de estar presente o sr. ministro da marinha para fazer algumas considerações relativas a uns documentos que pedi na ultima sessão que houve antes do carnaval.

Referem-se esses documentos a uns factos occorridos na provincia de S. Thomé e Principe, factos que originaram um conflicto havido entre o governador e o curador de serviçaes e colonos n'aquella provincia, sendo este suspenso e preso por aquelle.

Eu podia entrar desde já na apreciação dos direitos que se arrogou o governador d'aquella provincia para effectuar tal suspensão, apreciando depois muito acremente a maneira vexatória e illegal como elle procedeu em todo aquelle conflicto.

Não o quero porém fazer, porque temo que, apesar de ser esta uma questão de direito em que a bastante e unica prova era a prova legal que realisaria citando leis, não o quero fazer, digo, porque não posso apresentar accusações do facto para cuja prova não estou habilitado por emquanto, pois me faltam os documentos pedidos.

Não quero que o sr. ministro da marinha, não tendo dó do modesto deputado que falla pela primeira vez n'esta assembléa, o fulmine na sua estreia, dizendo lhe que vindo aqui levantar accusações contra empregados tão altamente collocados não as prove immediatamente.

Receiando que isto succeda não discuto propriamente o facto; mas o que posso dizer, porque é publico, conhecido por todos e certamente tambem pelo illustre ministro, é que em novembro de 1884 o governador de S. Thomé e Principe suspendeu o curador de serviçaes e colonos sem este ser ouvido, sem forma alguma de processo, sem respeito algum pelas leis, e obedecendo unicamente áquillo que na realidade é sua vontade, se não talvez seu interesse, segundo dizem.

O sr. Santos Viegas: - No procedimento do governador de S. Thomé e Principe podia haver erro, mas não interesse.

O Orador: - Por emquanto não faço accusações, mas desde que é voz publica que houve interesse da parte do governador em suspender aquelle funccionario, entendo ser isso o bastante para que a questão seja tratada no parlamento e tratada como cumpre á moralidade dos poderes publicos.

O sr. Santos Viegas: - Discute-se, prova se, mas não se insinua.

O Orador: - Eu posso apresentar a s. exa. e á camara alguns jornaes, tanto da metropole como do ultramar, nos quaes se diz que houve um interesse pessoal da parte do governador de S. Thomé em perseguir o funccionario que depois suspendeu.

Quando me forem enviados os documentos que pedi com relação a este assumpto, então mostrarei se houve ou não interesse da parte do governador, se são ou não fundadas as accusações que lhe dirigem.

Por agora limito-me a dizer que o governador de S. Thomé e Principe suspendeu o curador de serviçaes e colonos e prendeu-o pelo facto de querer protestar no uso dos seus direitos, contra o que entendia ser uma prepotencia da auctoridade.

Mas como ía dizendo, o que é facto averiguado, e que o sr. ministro da marinha sabe tão bem como eu, é que o governador de S. Thomé suspendeu o curador dos serviçaes e colonos.

Isto é incontestavel; tambem o é que foi pessoalmente realisar a sua prisão, pelo facto d'elle desejar protestar contra essa suspensão no uso do seu direito, de um modo pacifico, por meio de um documento lavrado diante de testemunhas.

Esta garantia parece-me ser concedida a todos os cidadãos e muito principalmente a um funccionario collocado em alta posição, como a d'aquelle. Nada d'isso porém lhe foi concedido!

Ainda o outro dia o nosso illustre collega o sr. Elvino de Brito, fallando n'esta camara ácerca da administração colonial, com a competencia e auctoridade que todos lhe reconhecem, pelo seu muito talento e pelo aturado estudo que tem destes assumptos ultramarinos, disse que a administração colonial estava num estado perfeitamente cahotico, que a auctoridade era por alguns governadores exercida despoticamente sem respeito pelas leis, até com manifesto desprezo d'ellas, collocando acima de tudo a sua vontade que julgam soberana.

O sr. ministro concordou com s. exa., porque disse depois em resposta que a nossa administração colonial ora um perfeito cahos e que, para a fazer sair de tal estado, era necessario uma vontade energicamente dedicada a esse assumpto, citando até s. exa. como uma das primeiras necessidades para o conseguimento desse desideratum, a reorganisação da fazenda colonial.

Permitta-me, porém, s. exa. que ao lado d'essa necessidade colloque tambem, como igualmente urgente, a de um escrupuloso cuidado na escolha de funccionarios probos e dignos. (Apoiados.)

E era esta a opinião de s. exa. quando era opposição, quando pela primeira vez se apresentou n'esta camara sobraçando a pasta da marinha e ultramar, e foi a opinião ainda de s. exa. quando o outro dia fallou n'esta casa.

Tenho portanto a honra de ver que está de accordo commigo sobre este ponto.

Não me atrevo a negar a conveniencia, e a necessidade até, do artigo 15.° do acto addicional á carta; sei perfeitamente que um governo ultramarino não está nas circumstancias normaes em que está um outro qualquer governo da metrópole, um governo do ultramar acha-se em condições extraordinarias, em circumstancias excepcionaes, (Apoiados.) e deve por esse facto ter tambem uma auctoridade mais lata e uns certos poderes mais desenvolvidos para proceder em circumstancias extraordinarias, mas é justamente por esse facto, que as suas responsabilidades tambem devem ser maiores. (Apoiados.)

Aquelles governadores não estão, como os da metropole, sujeitos á acção immediata do ministro do reino, e devem por consequencia prestar ao ministro da marinha e ao parlamento contas strictas de todo o seu procedimento.

Acho muito boa esta disposição e bem diria de todos aquelles governadores que dictatorialmente praticassem actos bons e proveitosos para o paiz, obedecendo a intuitos verdadeiramente patrio ticos.

Voltando, porém, ao assumpto temos que em novembro de 1884 na provincia de S. Thomé, como s. exa. sabe, em virtude do questões, em que agora não entro, mas que estava habilitado para discutir, o governador de S. Thomé, com ou sem rasão, e tambem não quero agora discutir esse ponto, suspendeu o curador dos serviçaes e colonos da mesma provincia.

Foi-lhe notificada essa suspensão, e quando elle no exercicio das suas funcções exigia apenas, que lhe permittissem lavrar um protesto em seu nome contra o que jul-

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gava ser uma arbitrariedade da auctoridade, governo, foi elle proprio governador, que entrou na sua, repartição de grande fardamento, com todas as insignias do seu commando e de auctoridade superior, e realisou a sua prisão, como um reles beleguim.

Esta é a verdade!

Este facto, proprio do carnaval, faria rir apenas se não envolvesse uma questão seria. Por isso nós não podemos deixar de lhe ligar bastante importancia, porque atraz d'esses actos do governador vemos um ataque á constituição, á lei fundamental do nosso paiz; vemos uma negação de principios da divisão de poderes; vemos a offensa da auctoridade, da integridade e da independencia que deve assistir a todo o magistrado judicial.

Porém, para o heroico governador de S. Thomé e Principe, a carta constitucional é uma inutilidade; o principio de divisão de poderes é uma ficção e a independencia da magistratura é uma chimera. A sua auctoridade superior é que manda e que deve preponderar.

O sr. Santos Viegas: - É um heroe. O Orador: - Effectivamente é um heroe o governador que investido dos seus poderes, e dispondo de toda a força, manda prender um homem que estava só na sua repartição cumprindo com as suas obrigações. Isto é um acto heroico que muito honra aquelle governador.

É uma pagina brilhante para a historia das nossas colonias a prisão de um magistrado feita pelo governador, que levava toda a força atraz de si.

Portanto, succedendo em novembro do anno passado este facto, que não condemno nem aprecio agora, porque não estou habilitado para isso com documentos officiaes, preciso saber o que o sr. ministro da marinha tem feito ou tenciona fazer a este respeito.

Ponho mesmo de principio que o governador fez bem; que tinha mesmo rasão para suspender o curador dos serviçaes e dos colonos; que obrou em virtude dos seus direitos; mas o que é facto é que o curador julgou-se offendido e recorreu para o governo.

Desejo que se proceda como cumpre em tal caso dando-se uma satisfação condigna a quem a merecer, e castigando-se quem mal procedeu, seja o curador ou o governador.

Fallando aqui sem procuração do curador, nem do governador que não conheço, nem se quer de vista, desejo apenas que se faça justiça.

Se por acaso o facto da licença concedida por s. exa. ao curador significa um principio de reparação, applaudo-o, mas quero que esta siga e seja completa; mas se acaso significa apenas um principio de arranjo então condemno-o, porque se esta é a maneira usada para sanar conflictos entre auctoridades no ultramar encontro-a pouco regular.

Julgo ser de necessidade e conveniencia que estes factos se aclarem, (Apoiados.) que se faça luz n'estes assumptos, que quasi sempre tão ás escuras ficam.

É necessario que se veja aquillo que se deve ver n'este negocio.

O sr. ministro da marinha sabe o que os jornaes têem dito; que o governador, pouco depois de nomeado, se constituiu em divida para com o banco ultramarino.

Consta de escripturas lavradas em tabelliães, que elle se constituiu em sociedade com uma casa para um arranjo de serviçaes e colonos, e que se constituiu tambem em sociedade com um carpinteiro para se fundar um estabelecimento agricola e colonial. Todos estes factos são irregulares e illegaes.

Repito, é necessario que os factos se aclarem e que o sr. ministro da marinha e ultramar, em cujo talento e em cuja dignidade altamente confio, dê á camara e ao paiz uma satisfação condigna, fazendo castigar quem tiver delintuido. (Apoiados.)

Tenho dito.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - Se não fosse uma pergunta que o illustre deputado me dirigiu no meio do seu discurso, quasi não pediria a palavra senão unicamente para felicitar s. exa. pela sua estreia calorosa e brilhante, mesmo porque s. exa. não fez mais que apresentar o proposito de uma futura interpellação. A proposito foi tambem dizendo uma serie de cousas, declarando que não queria discutir a Interpellação e por consequencia não tenho que discutir aquillo que s. exa. declarou que não discutia.

O sr. Antonio Centeno: - Por agora.

O Orador: - Pois por agora é que não discuto. Estou prompto para responder quando s. exa. quizer, mas não agora em vista da declaração de s. exa.

Mas o illustre deputado, apesar da sua declaração, veiu fazer accusações e insinuações pessoaes.

u lamento que s. exa. que é um homem novo e que tem todos os nobres sentimentos da mocidade, um talento brilhante que corresponde a uma alma elevada, viesse fazer insinuações.

O sr. Antonio Centeno: - Apontar factos, revelados em escripturas, não é fazer insinuações. (Apoiados.)

O Orador: - Mas apresente essas provas.

O illustre deputado devia ter obedecido á voz da sua consciencia que lhe disse no começo do seu discurso que não devia entrar no assumpto sem trazer as provas com, que documentasse a sua accusação. Devia moderar um pouco as suas iras e esperar que os factos se possam discutir á luz dos argumentos para fazer desassombradamente a sua critica, não fazendo antes d'isso accusações a um homem cujo caracter probo e respeitavel conhece perfeitamente a maior parte dos membros d'esta camara que foram aqui seus collegas. (Apoiados.)

Ninguem póde de certo affirmar sem provas positivas é solemnes que aquelle cavalheiro não é digno e respeitavel, e que não merece a consideração dos homens de bem. (Apoiados.)

Os documentos serão remettidos o mais rapidamente possivel ao illustre deputado, porque vou dar ordem a que elles se anteponham á alluvião de documentos que têem de ser remettidos á camara.

Em quanto ao meu procedimento relativamente á suspensão do curador dos serviçaes e colonos, tenho a dizer ao illustre deputado que este facto envolve assumptos que eu julguei não poder decidir sem ouvir primeiro o sr. procurador geral da corôa, a quem está affecto este negocio, e que brevemente enviará o seu parecer.

Não fui eu que concedi a licença, foi a junta de saude, que o deu por doente, e eu não fiz mais do que confirmar uma licença que nenhum ministro deixou ainda de confirmar.

Por ultimo, tomarei a respeito do procedimento do governador de S. Thomé e Principe a decisão que julgar mais conforme com as regras da justiça, e responderei por elle perante a camara, como aquelle governador ha de responder perante mim pelos actos que praticar no exercicio das suas funcções.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas do que disse n'esta sessão, respondendo ás differentes perguntas que lhe fizeram.)

O sr. Presidente: - Vou consultar a camara sobre se quer que, alterando-se a inscripção, eu dê a palavra agora ao sr. Antonio Centeno.

Consultada a camara, resolveu affirmativamente.

O sr. Antonio Centeno: - Ao sr. ministro da marinha devo eu uma explicação primeiro que tudo.

Eu disse que não entrava propriamente na apreciação dos factos occorridos entre o governador de S. Thomé e Principe e o curador geral dos serviçaes e colonos, porque não tinha os documentos em que me podesse basear para produzir as accusações que entendo que devo fazer com relação a esses factos.

Emquanto aos factos, d'onde eu posso talvez concluir

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qual foi a origem do conflicto entre o governador de S. Thomé e Principe e o curador dos serviçaes e colonos, elles estão provados por escripturas publicadas n'um jornal que tem bastante publicidade, escripturas que foram tiradas por meio de certidões e que não foram contestadas por ninguem.

Por consequencia, não fiz insinuações algumas.

Sem querer irrogar a menor censura ao sr. ministro da marinha, devo dizer que me parece que, desde que se fez allegação por parte do curador dos serviçaes e colonos de que havia factos particulares, factos que nada tinham com a administração dos negocios da provincia, que davam causa ao conflicto, s. exa. devia mandar verificar os factos citados.

Esses factos são: poucos dias depois do governador chegar á provincia, tendo já uma escriptura anterior com um carpinteiro sobre propriedades que íam explorar, a sociedade contrata com uma outra o engajamento do serviçaes e colonos para as suas roças; ha cscriptura de divida com o banco ultramarino, facto prohibido peia lei, porque esse banco, em virtude dos privilégios de que disfructa, deve soffrer a inspecção directa do delegado do governo, que em cada provincia é o governador.

As insinuações que fiz foram as referencias a estos factos. Estes factos, que aliás não têem nada para a quentão principal, estão provados em escripturas já publicadas, e foi fundado nessas escripturas que me referi a elles.

E, desde que havia allegação destes factos, s. exa. o sr. ministro do marinha devia ter mandado indagar se elles eram verdadeiros.

Emquanto ao facto da licença, permitta-me o sr. ministro da marinha que lhe observe que tem responsabilidade na sua concessão, pois se ella foi dada pela junta de saude foi sanccionada por s. exa.

O sr. Urbano de Castro: - Podéra!...

O Orador: - Poderá?!... Pois o sr. ministro tendo conhecimento...

O sr. Urbano de Castro: - Eu vou ajunta; e ajunta dá me licença, o ministro tem o direito de dizer que não?

O Orador: - No caso que apresento devia dizer que não.

E o facto é simples.

O curador dos serviçaes S. Thorné e Principe.

e colonos foi suspenso em

Em S. Thomé e Principe podia esperar o resultado do seu conflicto com o governador da provincia.

Não esperou ali. A junta disse que para bem da sua saude não devia continuar em S. Thomé, e elle veiu para o continente.

Não se tratava, pois, de licença para estar ausente do serviço, mas sim o conceder-se-lhe a permissão de esperar fóra da provincia o resultado do seu conflicto com o governador.

Chegou, porém, ao continente e o sr. ministro manda ao curador suspenso abonar-se o vencimento por inteiro, permittindo-se o estar ausente de um serviço que esto não tem, porque está suspenso!

De maneira que um funccionario está suspenso, bem ou mal mas está suspenso, e diz se que tem licença para estar ausente do serviço dando-se-lhe o vencimento por inteiro!....

Veja a camara que castigo este!

S. exa., o sr. ministro da marinha, sabendo que este individuo estava suspenso, não devia sanccionar uma licença em que se permitta elle estivesse ausente do serviço publico, porque me parece que isso era desnecessario; e sobretudo nunca devia consentir que lhe fossem concedidos os seus vencimentos por inteiro.

Resta-me agradecer ao sr. ministro da marinha as palavras amaveis que me dirigiu e de que eu não sou merecidor; manifestando a minha admiração pelo seu muitissimo talento, eu asseguro a s. exa. que procurarei conciliar sempre o que julgar ser a minha obrigação com respeito devido ás pessoas que se acham em posição elevada como s. exa.

O sr. Presidente: - O sr. Santos Viegas pediu a palavra com respeito ao assumpto de que se occupou o sr. Antonio Centeno; mas eu não lha posso dar sem consultar a camara.

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Santos Viegas.

O sr. Santos Viegas: - Agradeço a manifestação da camara, mas francamente julgava-me com direito a ella, não para entrar no incidente, porque não pedi a palavra sobre elle, senão mais tarde, mas para dirigir ao sr. ministro da marinha os meus agradecimentos pela maneira por que elle se dignou responder áquillo que eu lhe havia perguntado, e rogar mais uma vez a s. exa. que não deixasse de realisar as suas noblissimas intenções com respeito ás missões; no ultramar, o que trabalhe por executar aquelle magnifico regulamento para o seminario instituto de Macau, que s. exa. teve a bondade de referendar depois de lhe ser remettido pela commissão das missões no ultramar de que tive e tenho a honra de fazer parte, pois que d'elle advirão aos missionarios conhecimentos, pelo que diz respeito á parte religiosa e conhecimentos sobre cousas uteis.

Eu desejo que o meu paiz seja tolerante, porque é liberal; mas o que eu não posso admittir é que a auctoridade d'este mesmo paiz, dando justiça e protecção a todos, deixe de a dar aos seus conterrâneos e irmãos pela crença e pela gloria do paiz.

Sobre o incidente pedi tambem a palavra levado pela idéa que veiu ao meu espirito ao ouvir proferir pelo sr. deputado Antonio Centeno a palavra - arranjo -.

Não sei que haja arranjo pela forma por que o governador de S. Thomé procedeu ácerca do curador dos serviçaes e colonos na provincia de S. Thomé: não sei que haja arranjo, nem sei tambem que essa palavra ácerca de um governador possa ser dignamente proferida n'um parlamento sem que as provas se apresentem.

O sr. Antonio Centeno: - As provas aqui estão.

(Mostra uns jornaes.)

O Orador: - S. exa. temas provas; mas essas provas não me convencem (Susurro.) essas provas não me convencem, repito; porque, não me convencem provas dos jornaes. (Apoiados.) Perante os tribunaes é que, se accusam os governadores; perante os tribunaes é que se dão provas, e dos tribunaes é que saem as sentenças e se executam depois: e nada mais. (Apoiados.)

Uma voz: - O parlamento é um tribunal.

O Orador: - O parlamento é um tribunal, diz bem o sr. deputado, mas não é um tribunal onde venham apresentar se accusações de jornaes onde entram as paixões partidarias. (Susurro.)

O sr. Antonio Centeno: - São documentos publicos, não artigos politicos.

O Orador: - Sr. presidente, estou sereno, não me perturbam os apartes; não me incommodam, porque eu sei avaliar o que é a paixão partidaria. Sei avaliar muitissimo bem es enthusiasmos da mocidade, e o que é a camaradagem, como aquella que me parece ter o illustre deputado em relação ao curador suspenso. Estes ápartes são como ondas impetuosas e imponentes, que se desfazem em espuma quando impellidas contra os rochedos.

Não desejo alongar o debate; o digo mais, não desejava entrar n'elle, porque me parece que o que se disse do governador são cousas de tal modo offensivas da sua dignadade, sua honra e do seu pundonor, que não podem vir affirmar-se aqui sem procuração d'elle, como s. exa. aqui com muita graça, (Riso.) em face da maneira aliás digna como elle tem procedido em S. Thomé, e ainda antes em outra provincia onde tambem procedeu com a dignidade propria de cavalheiro e de homens que sabe sos-

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SESSÃO DE 24 DE FEVEREIRO DE 1885 525

tentar em toda a parte o nome portuguez, e que tem recebido do estrangeiro o maior louvor pelos serviços que lhe tem prestado. (Apoiados.)

Sou amigo dedicado, como irmão, do actual governador o sr. Custodio Miguel de Borja. Tenho por elle o maior affecto, devo-lhe finezas que se não podem esquecer, e por isso lamento que um deputado, que é moço, mas a quem não falta illustração e nobreza de sentimentos, venha aqui perante o paiz accusar sem provas um magistrado, que um seu correligionario, que com elle serviu, classificou de distincto.

As palavras aqui proferidas ouve-as toda a nação, e a influencia, que ellas exercem, é larga e é profunda.

N'isto vae a rasão, que me servirá de desculpa para entrar n'este debate.

Não se desprestigia aspira uma auctoridade, que tem serviços importantes, prestados ao seu paiz, em nome d'elle. Quem analysando esses serviços, pondo de parte as paixões, examinar os documentos, que lhe conferiram condecorações, que lhe ornam o peito, que é honrado e digno, verá a verdade das minhas asserções.

Desculpe a camara. Sou sempre por elle, que injustamente vejo aggredido, por elle, que durante tres annos se sentou commigo n'estas cadeiras, merecendo sempre consideração e estima do todos os que aqui tinham logar. (Apoiados.)

Tenho concluido.

Vozes: - Muito bem.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vae passar-se á primeira parte da ordem do dia.

Os srs. deputados que tiverem papeis a mandarem para a mesa podem fazel-o.

Vae entrar em discussão o parecer relativo á eleição ao circulo de Chaves.

Leu-se na incisa o parecer.

É o seguinte:

PARECER N.° 2

Senhores. - Á vossa primeira commissão de verificação de poderes foi presente o processo eleitoral do circulo n.° 16 (Chaves).

O numero real dos votantes foi de 4:829, sendo votados os cidadãos:

Eduardo José Coelho .... 2:638 votos
João Gualberto da Fonseca .... 2:168 votos
Padre José Joaquim de Sousa Freitas .... 11 votos
Augusto Manuel Alves da Veiga .... 9 votos
Antonio Augusto da Costa Simões .... 1 »
José Joaquim Alves Matheus .... 1 votos
Sérgio Martins Calvão .... 1 votos

Na assembléa de Moreiras, a auctoridade, ou antes o delegado d'ella. protestou no dia 30 de junho com o fundamento nas irregularidades dos trabalhos, falta de verdade da acta da eleição e crime commettido pelo presidente da mesa eleitoral; e assim:

Que os trabalhos foram irregulares por não se ter dado cumprimento ao disposto nos artigos 62.°, 67.º e 69.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, pois que a votação deixou de se fazer peias freguesias mais distantes, por não se ter affixado o edital do numero de listas entradas na urna, não se esperar as duas horas depois da ultima chamada geral, fazendo-se mesmo dentro das duas horas de espera a contagem das listas, e finalmente por ter começado o escrutinio das mesmas ainda no referido tempo que havia sido marcado para espera.

Que o crime praticado peio presidente da mesa eleitoral de Moreiras consiste em ter, antes da hora legal (nove da manhã) entrado na igreja e exigir, na sua qualidade do presidente, que o commandante da força lhe entregasse a uma que se achava fechada com um cadeado, da qual elle tinha a unica chave, isto sem se achar reunida a mesa, de modo que comparecendo a competente auctoridade ás oito horas e quarenta minutos da manhã na igreja, já encontrou a uma aberta e espalhados os papeis que n'ella haviam sido encerrados, podendo ser viciados, como já tinha sido falseada a verdade do acto anterior, como da acta do dia 30 se verifica, visto na do dia 29 se declarar que os trabalhos eleitoraes n'aquella assembléa de Moreiras haviam terminado, quando elles, pelo contrario, continuaram no referido dia 30.

N'esta mesma assembléa, quatro cidadãos protestaram, allegando os factos acima mencionados, e acrescentando que peia mesa não se deu cumprimento ao § unico do referido artigo 67.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, pois que em seguida á contagem das listas se principiou o escrutinio, sem se haver publicado qual o numero de listas entradas na urna, e que um dos escrutinadores foi rasgando as listas em seguida á leitura que d'ellas fazia, não as restituindo ao presidente da assembléa, segundo o disposto no artigo 69.° do citado decreto.

O que tudo visto; e

Considerando que as irregularidades apontadas não foram acompanhadas de documentos que provem a verdade da sua existencia, e não podendo ser consideradas como verdadeiras pelo simples facto de se allegarem, sobretudo quando essas alienações se acham em contraposição com o que consta da acta da assembléa, onde se diz que taes irregularidades tiveram logar, pois que, sendo essa acta um documento legal não póde ser invalidado senão pelos meios que a lei prescreve, o que na especie sujeita se não verifica:

Considerando que o facto attribuido no protesto ao presidente da mesa eleitoral da assembléa de Moreiras, e que ahi se classifica de crime, não teve para o effeito da validade da eleição a importancia que no mesmo protesto se lhe attribue, visto não se provar, nem mesmo se allegar, que as solemnidades mais substanciaes d'essa eleição fossem ahi viciadas, nem que a contagem dos votos e seu apuramento deixasse de ser feito com a devida regularidade e exactidão, aliás os protestantes e os amigos do candidato que obteve minoria de voto; não deixariam passar desapercebidas taes omissões e vieios, que pela sua importancia eram sufficientes para annullar a votação d'esta assembléa: e Considerando que esta irregularidade ainda que constitua uma infracção, não influindo no resultado da eleição, não constitue por isso nullidade nos precisos termos do artigo 14.° § 4.º da lei de 21 de maio ultimo, e mais:

Considerando que o cidadão Eduardo José Coelho obteve n'esta assembléa de Moreiras 305 votos e o cidadão João Gualberto da Fonseca 383 e, annullada esta votação a ambos os candidatos, ainda o cidadão Eduardo José Coelho fica com a maioria de 548 votos:

É por isso a vossa primeira commissão de verificação de poderes de parecer que a eleição deve ser approvada e proclamado deputado o cidadão mais votado, Eduardo José Coelho, que apresentou o seu diploma na fórma legal.

Sala da commissão, 12 de janeiro de 1885. = Luiz de Lencastre = Moraes Carvalho = J. A. Neves = Pereira Leite, relator.

O sr. Pereira Leite: - Peço a v. exa. que depois de votado este parecer o mande á commissão de poderes a fim de se declarar vago o circulo.

Foi approvado sem discussão o parecer.

O sr. Presidente: - O parecer vão ser enviado á commissão de verificação de poderes para se declarar vago o circulo.

Não proclamo deputado o eleito, porque já tem assento

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526 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SEGUNDA PAETE DA ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Elvino de Brito para verificar a sua interpellação ao sr. ministro da marinha e ultramar.

O sr. Elvino de Brito: - Começou por se admirar que o sr. ministro da marinha viesse hoje declarar que ía dar ordens para serem immediatamente enviados á camara os documentos pedidos pelo sr. A. Centeno, quando elle, orador, para realisar as suas interpellações solicitara alguns documentos, os quaes até agora não foram remettidos á camara, vende-se forçado a verificar essa interpellação sem ter os documentos que pediu.

Disse que em questões de administração colonial não fazia politica, e antes de entrar no assumpto da sua interpellação precisava arredar algumas accusações que lhe fizera o sr. ministro da marinha numa das ultimas sessões quando respondera ao que elle havia dito por occasião de tratar de alguns negocios relativos ao ultramar, passando em seguida a fazer differentes considerações a esse respeito.

Havia-o maguado muito o ter o sr. ministro supposto que seria capaz de dirigir insinuações ao caracter e á honestidade de s. exa.; nunca o fizera nem faria, e antes tinha em muita conta a sua respeitabilidade.

Passou em seguida a verificar a sua interpellação.

Parecia-lhe que o sr. ministro fazia um grande serviço á India mandando executar o codigo publicado pelo ex-ministro da marinha, o sr. Julio de Vilhena, com as modificações que foram indicadas por uma commissao composta de cavalheiros muito respeitaveis d'aquelle estado.

Entendia que uma das cercas, para que o sr. ministro devia chamar a sua attenção, era para o estado em que está á instrucção publica em Goa, e a este respeito pouco ou nada s. exa. tem feito.

Disse que quanto á. questão financeira das provincias ultramarinas, apesar das receitas terem tido um grande acréscimo, o augmento das despezas tem sido na importancia de 255:000$000 réis, augmento cuja responsabilidade pertence ao actual sr. ministro.

Desejou saber os motivos por que o sr. ministro não apresentou o orçamento de 18b3 para 1884, a que era obrigado pelas leis em vigor, e parecia-lhe que s. exa. não se podia defender d'esta accusação que lhe fazia.

Passou em seguida a fazer ainda outras considerações, e chamou a attenção do sr. ministro para muitos outros pontos da administração colonial, que na sua opinião carecem de providencias promptas.

(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - A ordem do dia para amanha é a mesma que estava já dada.

Está levantada a sessão.

Eram sais horas da tarde.

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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