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Nº33

SESSÃO DE 12 DE MARÇO DE 1902

Presidencia do Exa. Sr. Matheus Teixeira de Azevedo

Secretarios - os Exmos Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Joaquim Mendes Leal

SUMMARIO

Lida e approvada a acta, deu-se conhecimento de um officio do Ministerio da Guerra e teve segunda leitura um projecto de lei do Sr. Mario Monteiro.- O Sr. Ministro da Marinha (Teixeira de Sousa) lê um telegramma de Moçambique, participando o aprisionamento de 12 pangaios de negreiros, sendo libertados mais de 700 escravos. - O Sr. Vaz Ferreira realiza um aviso previo ao Sr. Ministro da Fazenda sobre emolumentos e salarios forenses.

Responde o Sr. Ministro da Fazenda (Mattozo Santos). - O Sr. Custodio Borja apresenta um projecto de lei, dispensando do tirocinio para contra-almirante o Sr. Hermenegildo Capello. - O Sr. Queiroz Ribeiro faz algumas perguntas ao Sr. Presidente do Conselho (Hintze Ribeiro), que responde. - O Sr. Magalhães Barros apresenta uma representação da Camara de Silves. - O Sr. Fuschini faz perguntas á mesa, respondendolhe o Sr. Presidente da Camara - Apresentam declarações, requerimentos, participações e avisos previos varios Srs. Deputados.

Na ordem do dia (continuação da discussão do Orçamento) falam: o Sr. Montenegro, que conclue o seu discurso; Matheus dos Santos e Pinto dos Santos. - Sendo a sessão prorogada a requerimento do Sr. Eusebio da Fonseca, é julgada a materia discutida o requerimento do Sr. João Faria. - Lidos os avisos previos do Sr. Fuschini, para ser consultado o Sr. Ministro da Fazenda sobre se os julga opportunos, declara este não concordar com a sua realização, votando a Camara que sejam adiados sine die.

Abertura da sessão - Ás 3 horas e 1 quarto da tarde.

Presentes 67 Senhores Deputados.

São os seguintes: - Abel Pereira de Andrade, Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Albino Maria de Carvalho Moreira, Alexandre José Sarsfield, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alipio Albano Camello, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio de Almeida Dias, Antonio Belard da Fonseca, Antonio Joaquim Ferreira Margarido, Antonio José Boavida, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Sérgio da Silva e Castro, Antonio de Sousa Pinto de Magalhães, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Augusto Cesar da Rocha Louza, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Belchior José Machado, Carlos Alberto Soares Cardoso, Carlos Augusto Ferreira, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Castro e Solla, Custodio Miguel de Borja, Domingos Eusebio da Fonseca, Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Fernando Mattozo Santos, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Roberto do Araujo de Magalhães Barros, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Matheus dos Santos, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, João Alfredo de Faria, João Joaquim André de Freitas, João Marcellino Arroyo, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Tavares, Joaquim Antonio de Sant´ Anna, Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos, José Adolpho de Mello e Sousa, José Antonio Ferro de Madureira Beça, José Caetano Rebello, José Joaquim Mendes Leal Caetano de Sousa e Lacerda, José da Cunha Lima, José Joaquim Dias Gallas, José Joaquim Mendes Leal, José Mathias Nunes, José de Mattos Sobral Cid, Julio Ernesto de Lima Duque, Julio Maria de Andrade e Sousa, Luciano Antonio Pereira da Silva, Manuel Joaquim Fratel, Marianno José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Marquez de Reriz, Matheus Augusto Ribeiro Sampaio, Matheus Teixeira de Azevedo e Rodolpho Augusto de Sequeira.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Affonso Xavier Lopes Vieira, Agostinho Lucio e Silva,Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alvaro de Sonsa Rego, Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca, Antonio Barbosa Mendonça,. Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes de Amaral, Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra, Antonio Rodrigues Nogueira, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Fuschini, Augusto Naves dos Santos Carneiro, Carlos de Almeida Pessanha, Conde de Penha Garcia, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico Ressano Garcia, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Ignacio José Franco, João Augusto Pereira, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, Joaquim Faustino de Poças Leitão, Joaquim Pereira Jardim, José Dias Ferreira, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria de Oliveira Simões, José Maria Pereira de Lima, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Augusto Petra Vianna, Lourenço Caldeira da Gania Lobo Cayolla, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz. José Dias, Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Homem de Mello da Camara, Ovidio de Alpoim de Cer-, queira Borges Cabral, Paulo de Barros Pinto Osorio, Rodrigo Affonso Pequito, Visconde de Reguengo (Jorge) e Visconde da Torre.

Não compareceram á sessão os Srs.: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto Botelho, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio Roque da Silveira, Antonio Tavares Festas, Augusto José da Cunha, Carlos Malheiro Dias, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Conde de Paçô-Vieira, Eduardo Burnày, Francisco José Patricio, Frederico dos Santos Martins, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Monteiro Vieira de Castro José Coelho da Motta Prego, José da Gama Lobo Lamare, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Libanio António Fia-

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

lho Gomes, Manuel de Sousa Avides, Marianno Cyrillo de Carvalho e Visconde de Mangualde.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Offlcio

Do Ministerio da Guerra, enviando o requerimento do tenente-coronel reformado da administração militar, Francisco Antonio das Mercês, pedido em officio d'esta Camara n.° 268, de 4 do corrente mês.

Para a secretaria,

Segunda leitura

Projecto de lei

Senhores. - As freguesias de Gaffete e Monto da Pedra, que actualmente e só modernamente pertencem á comarca do Portalegre, tendo sido desanexadas, juntamente com as restantes que compõem o concelho do Crato, da comarca do Niza, a que, desde antiquissimos tempos pertenciam, oppõem grandes inconvenientes e desvantagens, permanecendo na sua actual situação judiciaria.

Não somente teem, como a villa de Niza, sede da comarca d'este nome, antigas e profundas relações commerciaes, mas, o que é mais, distam d'ellas apenas 13 a 15 kilometros ao passo que ficam situadas a mais de 30 kilometros de distancia do Portalegre, que teem de percorrer por pessimos caminhos quasi intransitaveis em grande parte do anno, por se acharem em lamentavel estado e serem cortados por muitos ribeiros, que as aguas do inverno e primavera consideravelmente engrossam. Esta distancia e difficuldade de transito dão logar a que os habitantes das referidas freguesias, quando teem, o que ameudadas vezes succede, de ir tratar dos seus negocios judiciaes a Portalegre a desempenhar os respectivos deveres que as leis Ihes impõem, teem de gastar alem de muitas despesas e incommodo que teem de soffrer, pelo menos de 3 dias necessarios para a ida, regresso e desempenhar dos seus afazeres.

Fundado nestas razões e ainda em outras que omitte e constam de duas representações da Junta de Parochia e proprietarios das freguesias de Gaffete e Monte da Pedra, que mando para a mesa, tenho a honra do apresentar á vossa consideração o seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.° As freguesias de Gaffete e Monte da Pedra, pertencentes á comarca de Portalegre, são desannexadas n'esta comarca e incorporadas na de Niza.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 11 de março de 1902. = O Deputado, Mario Monteiro.

Foi admittido e enviado á commissao de legislação civil.

O Sr. Ministro da Marinha (Teixeira de Sousa): - Em uma das ultimas sessões, o illustre Deputado, o Sr. Antonio Centeno, interrogou-me sobre se era ou não verdade o que os jornaes estrangeiros diziam, com respeito á situação em que se encontravam as forças militares portuguesas ao norte da provincia de Moçambique.

Nesses jornaes affirmava-se que as nossas armas tinham soffrido um grande revés, na bahia de Namuri, perto de Angoche.

Ás affirmações desses jornaes oppus eu uma outra, absolutamente exacta, de que não só as nossas armas não tinham soffrido nenhum revés, mas que, pelo contrario, como de costume, se cobriram de gloria.

Affirmei eu então á Camara que a nossa divisão naval tinha queimado 2 pangaios e aprisionado 3, e que as forças de terra, idas de Lourenço Marques, tendo desembarcado, haviam destruido a povoação e aprisionado alguns regulos, e sujeitado outros á submissão, compromettendo-se a apresentar ás auctoridades portuguesas os negreiros.

Ninguem pôs em duvida a verdade da minha informação ; mas como o assumpto é importante, julgo da minha obrigação dever dar á Camara conhecimento do telegramma que acabo de receber, dizendo que as armas portuguesas se cobriram de gloria, e mais ainda que nós, portugueses, continuamos a dar ao mundo provas de que cumprimos os nossos deveres de humanidade e de civilização. (Vozes: - Muito bem).

O telegramma é o seguinte:

«Moçambique, 12, ás 11,1 m.

725 escravos libertados, 12 pangaios negreiros aprisionados. Ainda não se fez um tiro. S. Raphael entrou perto Simuco, pilotando navios da divisão naval. Porto magnifico, até agora unicamente explorado negreiros.

Conservar navios Simuco até completar aprisionamento negreiro. = Almeida Lima.

Vê V. Exa. que não pode ser mais grata a noticia que dou á Camara, pois devido á nossa acção, libertamos de uma vez 725 escravos.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Vaz Ferreira para realizar o seu aviso previo annunciado na sessão de 20 de janeiro, ao Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. Vaz Ferreira: - Cabendo-me a palavra depois do que acaba de communicar á Camara o Sr. Ministro da Marinha, faltaria a um dever de patriotismo se não interpretasse os sentimentos da Camara, congratulando-me com a noticia que S. Exa. nos deu (Apoiados), e que é mais uma honra e mais uma gloria para as armas portuguesas, em prol dos sentimentos humanitarios que ellas teem sempre defendido.

Dito isto, vou entrar na explanação do meu aviso previo.

Começarei por explicar que o dirigi ao Sr. Ministro da Fazenda, porque se tratava da cobrança de receitas do Estado, ainda que nellas estejam comprehendidas as dos emolumentos judiciaes que pertencem ao Estado, que teem tido arrecadados pelo Ministerio da Justiça e cuja cobrança ainda hoje se acha regulada por um diploma d'esse Ministerio.

É certo, porem, que essa cobrança se faz hoje por meio de estampilhas, parecendo assim que está sob a alçada da pasta da Fazenda e excluida da pasta da Justiça.

Dada esta explicação, vou entrar na materia e reproduzir as reclamações feitas ha dez annos, quer aos Ministros da Justiça, quer aos Ministros da Fazenda, quer á propria Camara, pelos funccionarios judiciaes encarregados d'este serviço, que lutam ha muito com as dificuldades praticas que a forma actual de arrecadar essas receitas lhes traz.

Desculpar-me-ha a Camara se for um pouco prolixo nas explicações que vou dar para que se comprehenda o assumpto.

Tenho a honra de ser official de justiça, e tenho tambem a vantagem de o ser. A honra por pertencer a uma classe que nesta Camara tem tido, e tem, representantes dignissimos, como o Sr. Conselheiro Motta Veiga e como o meu particular amigo Sr. Homem de Mello, tambem meu collega fora d'esta Camara, e como os antigos Deputados o Sr. Elmano da Cunha e o meu amigo, escrivão da mesma vara de que sou contador, o Sr. Domingos Tarroso a vantagem, porque, sendo funccionario publico ha treze annos, nunca recebi um ceitil dos cofres publicos.

Falando em nome da classe e pedindo para ella alguma cousa, permitia-me a Camara que aproveite o ensejo para

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agradecer ao Sr. Ministro da Justiça os beneficios que a esta classe fez beneficios só de ordem moral, e portanto mais para agradecer ainda, na sua reforma ultimamente publicada.

Nos processos judiciaes ha tres especies de receitas pertencentes ao Estado.

A primeira são os emolumentos que passaram para o Estado, em virtude do decreto n.° 4 de 29 de março de 1890, quer na sua totalidade, no referente aos processos crimes, quer por metade, nos relativos aos processos civeis. Foi uma especie de compensação do augmento de ordenados dado aos juizes o agentes do Ministerio Publico, para os igualar mais, em vista da diversidade dos rendimentos das comarcas.

A cobrança d'esta receita acha-se regulada por um decreto de 24 de setembro de 1892, assignado pelo Sr. Conselheiro Telles e Vasconcellos.

Alem d'esta ha a segunda especie de receita, a contribuição industrial, que incide nos emolumentos e salarios de todos os funccionarios judiciaes ; e ainda a terceira, o sêllo, quer o dos recibos dos funccionarios pelos seus proventos, quer o que deixou de ser pago nos processos por qualquer circumstancia.

Tanto os emolumentos, como a contribuição industrial e os sellos dos recibos são pagos por meio de estampilhas.

Essas estampilhas collocam-se nas folhas do processo, onde se acha feita a conta, depois da quantia contada a cada funccionario, e teem de ser inutilizadas por esse funccionario com a sua assignatura e a data.

A Camara comprehende quanto é moroso e penoso este trabalho de escolher estampilhas, collá-las e inutilizá-las.

Pois este trabalho fazem em cada processo seis, sete ou oito pessoas, conforme o numero de funccionarios que nelle interveem.

O que eu desejava, era que este systema de cobrança se substituisse pelo de guias, que não são uma innovação, porque se passam em quasi todos os processos, visto que em quasi todos elles ha intimações, e o sêllo das contra-fés é, segundo a lei do sêllo, dos que se pagam por meio do guia a final.

Podia nessa guia incluir-se conjuntamente tudo quanto é receita do Estado, embora diversificando a proveniencia d'estas, especificando por um lado o sêllo, por outro a contribuição industrial, e por outro emolumentos e salarios.

Isto é simplicissimo na pratica.

O contador que tem de fazer a conta do processo, abate ao juiz e ao Ministerio Publico os emolumentos que pertencem ao Estado; abate a todos os funccionarios a contribuição industrial e o sêllo do recibo, achando assim a quantia liquida que cada um deve receber.

Feito isto para todos os funccionarios, o contador abre uma conta ao Estado e diz: por emolumentos tanto, por contribuição industrial tanto, e por sêllo tanto; e o escrivão passa por estas tres verbas uma guia em duplicado. Essas guias são apresentadas na repartição de fazenda, e ahi passam logo recibo numa d'ellas, ficando com a outra para documentar a escripturação. Actualmente as guias para pagamento de sêllo, demoram-se muito nas repartições de fazenda, porque teem de escripturar-se antes de devolvidas com recibo ao apresentante. Por isso lembro a guia em duplicado, em que basta conferir a conformidade de ambas e passar o recibo, ficando a escripturação para depois.

Isto é tão facil e simples, que estou convencido de que o Sr. Ministro da Fazenda me ha de achar razão, porque este systema é uma melhoria para o serviço, e alem d'isso tem vantagens para o Estado. Desapparece uma despesa que é importante em relação á receita proveniente d'estas verbas; é a despesa feita com o fabrico das estampilhas e com a commissão de venda d'ellas. A receita por meio de guia, é absolutamente limpa e liquida. Diminue-se portanto a despesa, e o Estado ainda lucra, recebendo immediatamente o pagamento das custas não estando á espera que o funccionario passe o seu recibo, para então inutilizar as estampilhas que constituem a receita do Estado.

Alem d'isso, ha uma outra vantagem. Actualmente é impossivel, na escripturação do Thesouro, discriminar qual a receita proveniente de emolumentos judiciaes, por isso, que sendo cobrados por meio de estampilhas, ha de apparecer essa receita conglobada no producto da venda de estampilhas com sêllo e contribuicão industrial; emquanto que, desde o momento em que se faça a cobrança por meio de guias, e nellas as tres diversas proveniencias vão separadas, é facil fazer a escripturação absolutamente certa, c saber qual é o producto dos emolumentos e salarios judiciaes arrecadados pelo Estado.

É claro que, ao decretar-se esta medida, é preciso tomar umas certas cautelas e cuidados para se fiscalizar que não hajam desvios d'esta receita e que não se deem os factos que se diz terem-se dado, quando a cobrança dos emolumentos do Estado ora feita por meio de guias.

O systema que me parecia dever ser adoptado, é absosolutamente diverso d'aquelle que então se adoptava.

Então havia um livro onde os escrivães iam escripturando as varias quantias que entregavam ao juiz, e que, portanto, em igual parte pertenciam ao Estado, e ao fim da quinzena passavam uma guia unica para pagar na recebedoria todos os rendimentos do Estado que tinham em si durante a quinzena.

Não sei se havia ou não desvios; o que é certo, é que quando se publicou o decreto de 24 de setembro de 1892, a receita dos emolumentos cresceu extraordinariamente, approximando-se da quantia calculada, o que não tinha acontecido no interregno de 1890-1892, em que vigorou a portaria de 10 de agosto de 1890, que mandava fazer a cobrança por meio de guia quinzenal.

Como desejo, passa-se uma guia em cada processo; o duplicado d'essa guia com recibo, vae para o processo, e ha um meio simples de fiscalizar e tornar essa fiscalização permanente e constante: basta que se prescreva que o juiz do processo não possa pôr recibo de que lhe pertence em cada conta, sem que esteja junta a guia com recibo da Repartição de Fazenda.

Este systema dá até aos funccionarios responsaveis por estas quantias um maior desafogo, por isso que, desde que a fiscalização seja permanente e constante, não ha meio de ninguem se atrever a dizer que elles prevaricam, e a situação de alguem, que tem de lidar com dinheiro alheio, e de quem se não pode dizer que não é liso nas suas contas, é muito melhor que a d'aquelle que, sendo lisissimo tem, comtudo, livre a maledicencia para dizer qualquer cousa d'elle. Desde o momento em que a fiscalização é permanente, não se pode dizer que haja qualquer falta, porque, desde que houvesse, apparecia logo. Este systema é applicavel aos processos, mas pode ser applicavel tambem aos papeis concernentes aos processos e aos papeis avulsos mesmo. O bom criterio do Ministro que queira adoptar este systema, verá até onde elle deve chegar, e até onde elle é preferivel ao systema das estampilhas.

Casos ha, como o das certidões avulsas, em que me parece que o systema da estampilha é o mais rapido e facil. ^
A primeira das minhas perguntas ao Sr. Ministro da Fazenda, depois de feita esta exposição, é se S. Exa. está de acordo com os principios que exponho.

Para formular a segunda pergunta, tenho de dizer que este systema não é uma innovação, e que me parece, no meu modo de ver pessoal, que nem é precisa lei alguma para elle ser adoptado, pois pode S. Exa. decretá-lo. E não é precisa lei, pelo seguinte: Quanto á contribuição industrial, está ella regulada pelo artigo 31.° do respectivo regulamento de 16 de julho de 1897.

Ahi se diz que o pagamento se effectuará, «n.° 1.°, por

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meio de estampilhas... quanto aos emolumentos individualmente recebidos...»

E no numero seguinte diz-se:

«Por meio de guias quanto aos emolumentos arrecadados em cofres especiaes, ou pelos respectivos thesoureiros, para serem distribuidos pelos empregados das corporações ou repartições publicas...»

Ora o caso que se dá com o processo judicial não é, como se tem entendido, o do n.° 1.°, é o do n.° 2.° Quem recebe as custas é o escrivão, que se constitue assim thesoureiro do juizo. O escrivão recebe e distribue depois pelos diversos funccionarios. Portanto, basta applicar o n.°2.° do citado artigo para que este systema de pagamento por meio de guia, conforme desejo, seja legal.

A arrecadação dos emolumentos do Estado é regida pelo regulamento de 24 de setembro de 1892, mas esse mesmo regulamento é um decreto auctorizado pelo decreto, com força de lei, de 29 de março de 1890, que diz no § 11,º do artigo 1.º:

« Os emolumentos, que nos termos dos paragraphos antecedentes pertencem ao Estado, serão arrecadados pelos escrivães dos processos, sob a fiscalização immediata do Ministerio Publico, emquanto por outra forma não for regulado em decreto especial ».

Portanto, está o Governo auctorizado a regulá-lo por decreto especial de outra forma.

Quanto ao sêllo, está ainda na lembrança da Camara a disposição do artigo 19.° da actual lei do sêllo, que corresponde ao § unico do artigo 1.° do projecto approvado nesta casa do Parlamento, que diz que é o Governo auctorizado a restringir ou ampliar o uso das estampilhas.

Aqui, o caso é restringir o uso das estampilhas.

Portanto, a minha segunda pergunta ao Sr. Ministro da Fazenda, é se elle entende que pode decretar esta medida ou se precisa de uma lei que a isso o auctorize.

Assim, S. Exa. nas respostas que me fizer a honra de dar ás duas perguntas que lhe dirijo, terá logar de dizer-me o que pensa sobre este systema de cobrança das receitas do Estado nos processos forenses, que se me afigura ser de uma vantagem indiscutivel para o serviço judicial, e, que, melhorando este serviço, melhora tambem a fiscalização do imposto.

Expostas assim as considerações que eu desejava fazer a S. Exa., e como naturalmente não posso usar de novo da palavra, agradeço desde já a benevolencia da sua attenção e a resposta que S. Exa. se digne dar-me.

Tenho dito.

O Sr. Ministro da Fazenda (Mattozo Santos): - Sr. Presidente: começo por agradecer as referencias agradaveis que me fez o illustre Deputado que acaba de falar, e muito rapidamente vou responder ás duas perguntas que me foram feitas pelo Sr. Vaz Ferreira. Mas, permitia S. Exa. que eu inverta, em relação ás suas perguntas, a ordem da minha resposta. S. Exa. perguntou primeiro se eu estava de acordo na substituição que S. Exa. propõe para o pagamento, não só dos emolumentos mas tambem da contribuição industrial, que recaisse sobre elles, bem como do sêllo a que acaba do se referir, isto é, se eu estava de acordo em que o pagamento, por meio do estampilhas, seja substituido por meio de guias.

A segunda pergunta é se eu me julgava habilitado, por um simples decreto, a promulgar disposição em harmonia com as considerações que acaba de apresentar.

Começo pelo fim, pelas considerações apresentadas pelo illustre Deputado Sr. Vaz Ferreira, pelo que respeita á maneira por que foi decretada a forma de cobrança d'esta receita por meio de estampilha, pela disposição do regulamento nos seus n.º 1.° e 2.° do artigo 31.° da lei que rege hoje a contribuição industrial.

Por este processo, os documentos deviam ficar em poder do contador da fazenda, para verifficar se essas quantias tinham dado entrada nos cofres publicos.

Isto é simplesmente para provar quanto é differente a cobrança d'estas quantias, d'aquella a que se refere o n.° 1.° do artigo 1.°, com relação aos emolumentos da contribuição industrial e da forma por que se interpretou neste caso o que estou referindo. Não se collava nenhum documento, contava-se no proprio processo.

Por isso concordo com a interpretação dada pelo Sr. Vaz Ferreira a respeito do artigo 31.° sobre a, constriçuição industrial.

Independentemente d'isto, a Camara votou, no anno anterior, uma lei applicada ao imposto directo analoga é que existia sobre o imposto indirecto.

Estabelecia- se ali que o Governo podia para os actos fiscaes usar da formula que quisesse.

Por isso respondo á primeira pergunta do Sr. Vaz Ferreira que o Governo entende que é independente da Camara para reformar estava forma de cobrança, que não é senão um elemento fiscal do imposto que se reforma.

Quanto á segunda, «se concordava com o modo de ver de S. Exa. quanto á forma da substituição pela guia da estampilha», direi que estudada a questão como S. Exa. o fez, pela minha parle só posso dizer que concordo e não concordo. Concordo, se se tomarem todas as cautelas devidas para que se não repitam os factos que a lei de 24 de setembro de 1892 quis remediar. Não sei que factos são, só sei que essa lei deu um resultado um accrescimo nas receitas do Estado.

Essa cobrança é difficil, e até certo ponto pode trazer alguns inconvenientes quanto á classificação da receita.

A estampilha, sendo uma só, .não facilita averiguar a especie da receita. Só o contador é que pode verificar pela estatistica, a especie da receita.

Por esse motivo acho preferivel o systema da guia, porque ella diz toda a origem da receita, onde deve ser entregue, emfim, tudo.

A guia deve ser naturalmente em duplicado para ficar documento, para ficar prova e contra-prova, uma na mão de quem recebe e outra na mão de quem paga.

Mas ha nisto um ponto a respeito do qual eu peço ao illustre Deputado que não me obrigue a dar, desde já, uma resposta positiva sem estudar o assumpto mais detidamente: é o que se refere aos papeis que emanam dos processos, que são d'elles separados. Nisto temos dois pontos a considerar.

O sêllo proprio do documento, que é de estampilha, e o acto, ou operação judicial, a que corresponde um emolumento especial tambem.

Neste ponto vejo eu uma difficuldade: se se não obriga o escrivão a citar a verba respectiva no processo, não temos meio de saber se é real ou não. Evidentemente não temos meio de saber se é real ou não a guia. Parece-me, pois, que deve ser estudado este assumpto, e convem saber se na grande maioria dos casos é ou não preferivel a estampilha, porque neste caso temos no papel o vestigio de que elle saiu do processo.

Como varias hypotheses se podem apresentar eu preciso estudar, para ver qual dos processos se deve adoptar.

Se o resultado d'esse estudo for favoravel á estampilha, eu adopto esta para todos os casos; se não for, eu acceito o principio da guia, excluindo apenas só um ou outro documento, em que se applicasse a estampilha, mas sendo em pequeno numero, porque me parece que é inconveniente haver para a cobrança duas formas diversas, pela difficuldade da fiscalização.

Pelo que respeita propriamente ao que são emolumentos por peças de processo, nisso acho preferivel o systema da guia, comtanto que haja quem fiscalize e que faça im

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mediatamente a contagem; mas o que não se pode deixar é ao arbitrio do escrivão ler em seu poder muitos dias grandes quantias sem dar contas. Já é bastante gravoso exigir os preparos, e esta difficuldade faz com que se deixem de apresentar questões nos tribunaes, porque não teem as quantias sufficientes para isso. Alem d'isso é inconveniente deixar essas quantias ao escrivão com prejuizo do Estado, que não pode receber a parte que lhe pertence, por isso que o escrivão não dá contas a um nem dá contas a outro.

Parece-me ter respondido ás considerações feitas pelo illustre Deputado, mas, no entanto, se alguma cousa ha a que deixei de responder, S. Exa. dirá, e eu depois satisfarei como puder.

Tenho dito.

(S. Exa. não reviu as notas tachygraphicas).

O Sr Custodio Borja: - Em seu nome e no dos seus collegas Cunha Lima, Avelino Monteiro e Telles de Vasconcellos, manda para a mesa um projecto de lei que tem por fim auctorizar o Governo a dispensar do tirocinio de embarque, para ser promovido a contra-almirante, o capitão de mar e guerra, Sr. Hermenegildo Capello.

As razões justificativas d'este projecto encontram só expendidas no relatorio que o precede, e que não lê agora para não fatigar a camara; mas pede-lhe que o leia depois de impresso, para que assim reconheça não só que d'elle não resulta augmento algum de despesa, e não resulta, porque aquelle official recebe já hoje do Thesouro tudo quanto pode receber e que a lei de 1892 auctoriza, mas ao mesmo tempo que não se trata de um acto de favoritismo, mas sim de prestar homenagem a um benemerito da patria e de praticar um acto de verdadeira justiça, devida aos serviços de tão distincto official; homenagem e justiça que as duas casas do Parlamento nunca recusaram aos homens que, como Capello, trabalharam em proveito não só do pais, mas de toda a humanidade. (Muitos apoiados).

Capelle e Ivens nas suas explorações, na sua viagem da costa á contra-costa, praticaram actos verdadeiramente excepcionaes.

Já lá vão dezasete annos, quando ao regressarem d'essa viagem, primeiro Lisboa e depois o país inteiro, os aclamou com o mais vivo enthusiasmo e espontaneidade. E!Ie, orador, diz propositadamente - expontaneidade - porque esses briosos offciaes foram sempre modestos; não exploraram a popularidade, não se aproveitaram das circumstancias da occasião. (Apoiados).

Capello e Ivens só tiveram uma preoccupação, a do cumprimento do seu dever, a de honrar a sua patria, sem pensarem, sequer, na segunda parte da legenda que se lê na roda do leme dos nossos navios - a patria vos comtempla. - (Apoiados geraes).

Capello, internado em Africa, não pensava que se prejudicaria na sua carreira, não tendo o tempo de tirocinio de embarque sufficiente para a sua promoção.

Como Serpa Pinto, Victor Cordon, Cardoso, Anchieta, Ivens, a sua preoccupação consistia apenas em bem servir e honrar o seu país. (Apoiados).

Capello é hoje o unico sobrevivente d'essa brilhante pleiade de officiaes da nossa marinha do guerra, e a camara honrando-o, honra nelle a memoria de todos que se sacrificaram pelo engrandecimento da patria e pelo amor á sciencia e á civilização, contribuindo assim para não fazer esquecer lá fora a nossa gloriosa bandeira.

E já que falou d'essa pleiade de mortos illustres, seja-lhe permittido, visto que não pude usar da palavra em occasião apropriada, referir-se a um d'elles, em preito de veneração e tributo de saudade profunda que entende dever prestar á sua grandiosa memoria.

Não seria talvez pacifica a sua obra; mas nem por isso é menos digna de elogio.

Baptista de Andrade, o morto illustre a que se refere, foi um verdadeiro heroe. (Apoiados geraes).

Foi sob o seu commando a bordo da corveta Estephania, que elle, orador, em 1871, fez a sua primeira viagem como guarda-marinha, para a India, onde se dera uma revolta. Teve, então, occasião de apreciar o seu extraordinario valor, o seu heroismo.

No regresso da India a Lisboa fez elle a viagem sem nunca se servir da machina, sempre á vela, pelo Mar Vermelho, contra monsão, tendo apanhado um fortissimo temporal. Foi um acto de extraordinario arrojo, que só pode ser bem apreciado por quem conheça os perigos da navegação, no Mar Vermelho, em taes condições.

O orador, comparando os feitos de outros tempos, praticados por Baptista de Andrade, não menos civilizadores do que os de hoje, com aquelles de que o Sr. Ministro da Marinha, em uma das sessões anteriores e ainda hoje, deu conhecimento á Camara, congratula-se com o Governo e
tece alevantados elogios á armada nacional, a que se honra de pertencer. (Applausos geraes).

Não estranhe a Camara, accrescenta o orador, que a proposito do projecto que apresenta falo de Baptista do Andrade, porque entre esse projecto e o valente official ha intima connexão. Foi elle quem. lhe suggeriu a idéa.

Refere depois que, visitando-o, como de costume, nos principios de janeiro, encontrou o venerando almirante escrevendo cartões de felicitação a Castilho e Ferreira de Amaral, pela sua promoção ao generalato, e como nessa occasião significasse a sua estranheza por não ter sido ainda, promovido Hermenegildo Capello, observou-lhe elle, orador, que o não podia ser, por lhe faltar o tempo de tirocinio preciso, ao que o valente official respondeu: "Se eu lhe pudesse dar o que me sobra! Seria uma honra para o generalato da armada".

Estas palavras de Baptista de Andrade é que suggeriram, a elle, orador, a idéa de elaborar o projecto que hoje manda para a mesa, e confia que a Camara, louvando se nas palavras d'aquelle illustre extincto, o acceitará. (Apoiados).

Capello honrou a bandeira portuguesa; é uma gloria, não só de Portugal, mas da civilização universal.

O seu nome é d'aquelles que no estrangeiro se pronunciam com respeito e admiração entre os combatentes da grandiosa obra das expedições scientificas, e que fazem com que seja lembrado Portugal, tantas vezes esquecido, e recordadas as nossas antigas conquistas. (Vozes: - muito bem).

O projecto ficou para segunda leitura.

(O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as respectivas notas tachygraphicas).

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Leu com sentimento, nos jornaes, que continua a desenvolver-se no país a epidemia da meningite cerebro-espinal;.- mas mais ainda o contrista o saber que tambem já se manifestou em Villa Nova da Cerveira, terra onde conta muitas dedicações o que lhe é tão querida.

Chama para este facto a attenção do Sr. Ministro do Reino, esperando que S. Exa. não deixará de tomar todas as providencias que a importancia do caso reclama, não devendo hesitar, se tanto for preciso, em prohibir as feiras, reuniões nas igrejas, etc., visto estar provado que as grandes agglomerações são causa da propagação do mal.

A um outro assumpto deseja tambem referir-se: o asassinato de um pescador português da freguesia de Seixas, concelho de Caminha, pelos carabineiros hespanhoes. Tratando-se de uma questão internacional, não faz considerações para não criar dificuldades ao Governo; simplesmente o que pede ao Sr. Ministro dos Estrangeiros é que, pelo menos, trate de conseguir do Governo Hespanhol uma pensão para a mae do assassinado, que alem da perda do filho, perdeu tambem os meios de subsistencia que elle lhe fornecia.

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Como está no uso da palavra, o a pedido do Sr. Antonio Centeno, pede ao Sr. Ministro das Obras Publicas que faça com que os lavradores do Ribatejo possam obter a quantidade do trigo de que necessitam para as sementeiras.

(O discurso será publicado na integra quando S. Exa. o restituir).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): — A 3 assumptos se referiu o Sr. Queiroz Ribeiro: o 1.° acêrca dos casos de meningite cerebro-espinal occasionados em Villa Nova de Cerveira, districto do Vinnna do Castello. Sobre esse assumpto algumas informações posso dar a S. Exa., por isso que elle tem sido cuidadosamente tratado pela Inspecção Geral doa Serviços de Saude Publica, até mesmo para meu esclarecimento, para eu poder acompanhar a marcha da doença, a forma por que se tem manifestado e tanto quanto possivel as causas que a possam ter produzido ou contribuido para o seu desenvolvimento. Tenho mandado elaborar mappas estatisticos do numero do casos que se têem dado nos differentes districtos e localidades, do resultado que têem dado esses casos, o assim, posso dizer a S. Ex.a que durante durante as 5 primeiras semanas d'este anno, 4 de janeiro e na 1.ª de fevereiro, havia 3 districtos indemnes, 3 districtos em que não se tinha observado caso algum do meningite, o da Guarda, o de Beja e o de Vianna. Ultimamente, depois do dia 4 do fevereiro, tem havido mais casos, não só nos districtos que já haviam sido atacados, mau deram-se dois casos no districto de Vianna, creio que em Villa Nova da Cerveira.

Todavia, como esclarecimento, que interessa á Camara, quero dizer o seguinte: é que segundo as observações feitas acêrca d'esta doença e consoante as informações que tenho presentes, é que a grande frequencia de casos se deu até ao fim do mês de janeiro; depois d'isso pode dizer-se que o numero de casos occorridos diminuiu já 50 por cento.

O districto que se conserva mais atacado é o districto de Lisboa. No resto do país continua a não haver agrupamento de casos. Os casos manifestam-se separadamente, em pontos mais ou monos distantes o até — circumstancia notavel — não ha focos em que pela agglomeração de casos possa suppor-se a existencia de causas locaes, de insalubridade, que seja preciso directa e especialmente combater. Isto mostra quanto é especial e caracteristica a marcha e manifestação d'esta doença. Não se produz, não se tem produzido no pais em agrupamentos, em focos de infecção, como resultado de causas conhecidas, de insalubridade. Tem-se manifestado mais ou menos em todo o país, com excepção doa dois districtos a que ha pouco me referi, de Beja e Guarda, mas casos isolados dados em localidades distantes e sem que só possa reconhecer a connexão entre esses casos que nos leve á conclusão de que existe entre nós uma epidemia.

No tocante a providencias, todas que tem sido possivel adoptar-se, teem se adoptado, não só para Villa Nova de Cerveira, como para todo o rosto do país, no intuito e desejo não só do occorrer quanto possivel aos estragos causados por aquella doença, mas mais ainda, no interesse scientitico de definir e precisar os seus elementos e desenvolvimento.

O illustre Deputado referiu-se ainda a um outro caso. Esse então não diz respeito propriamente á minha pasta, mas sim á do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros. Sobre este assumpto posso dizer ao illustre Deputado que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros fez já aã convenientes reclamações ao Governo Hespanhol.

E por ultimo, quanto ao outro assumpto a que S. Exa. alludiu — o fornecimento do trigo molle que sirva para as sementeiras — tambem posso informar o illustre Deputado do que o Sr. Ministro das Obras Publicas já providenciou. O Mercado Central annunciou por um lado a manifestação
perante o proprio mercado do trigo que houvesse disponivel e por outro lado as apresentações de trigo que fosso necessario para as sementeiras, a fim de que, apurado que o trigo ainda existente não chega para as reclamações necessarias nesta epoca do anno, o Sr. Ministro das Obras Publicas, dentro de breves dias, providenciará para que haja trigo molle para que as sementeiras se possam fazer regularmente.

Creio ter satisfeito o illustre Deputado.

(S. Exa. não reviu as respectivas notas).

O Sr. Queiroz Ribeiro: — Agradeço a resposta do Sr. Presidente do Conselho e declaro-me plenamente satisfeito com ella.

O Sr. Magalhães Barros: — Manda para a mesa uma representação da Camara Municipal de Silves, em que esta corperação fazendo sentir a crise gravissima porque está passando a industria rolheira que tão prospera tornou aquella cidade, e outras regiões do país, pede á Camara dos Senhores Deputados a adopção de algumas providencias, que julga inadiaveis para salvar essa industria, levantando-a do abatimento e marasmo em que se acha e que ameaçam subvertê la de todo, se os poderes publicos lho não acudirem com mão previdente e valedora.

Não é agora occasião propria para salientar a justiça que assiste a esta numerosa classe de trabalhadores. Virá mais tarde.

Por hoje limita-se a pedir ao Sr. Presidente que dê á representação, que apresenta, o destino legal, e que se digne consultar a Camara sobre se auctoriza a sua publicação no Diario do Governo, a exemplo de outras em identicas circumstancias, visto se achar redigida em termos moderados e correctos.

Foi auctorizada a publicação e vae por extracto no fim da sessão.

(O discurso será publicado na integra, quando S. Exa. enviar as notas tachygraphicas).

O Sr. Augusto Fuschini: —V. Exa. diz-me, quando dá para a discussão os meus avisos previos, visto que já estão esgotados os anteriores aos meus?

O Sr. Presidente: — Quando chegar a sua altura.

O Sr. Augusto Fuschini: — V. Exa. faz favor de verificar, see já estão na altura?

O Sr. Presidente: — Vae passar-se á ordem do dia.

Os Srs. Deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa, podem fazê-lo.

O Sr. Frederico Ramirez: — Eu perguntas V. Exa. se já chegaram uns documentos que pedi ha dois meses e meio pelo Ministerio da Fazenda.

O Sr. Presidente: — Ainda não, vieram.

O Sr. Frederico Ramirez: — E já a quarta vez que peço ao Sr. Ministro da
Fazenda esses documentos.

O Sr. Oliveira Mattos: — Mando para a mesa uma representação dos aluirmos do curso de pharmacia, e peço a sua publicação no Diario do Governo.

Foi auctorizada a publicação.

Voe por extracto no fim da sessão.

O Sr. Ignacio Franco: — Mando para a mesa a seguinte

Declaração

Declaro que deitei na caixa do petições uni requerimento de Joaquim José Agostinho, contramestre da Cordoaria Nacional, pedindo que os seus vencimentos sejam equiparados aos dos seus collegas do Arsenal da Marinha.

Peço que o mesmo requerimento seja enviado á commissão de marinha. = Ignacio José Franco.

Para a acta.

O Sr. Visconde da Torre: — Mando para a mesa uma proposta de renovação do iniciativa do projecto de lei n.° 19-C de 1900, que tem por fim tornar applicavel a Francisco Gomes Carneiro, capitão do infantaria, a providencia estabelecida no § unico do artigo 5.° do decreto

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SESSÃO N.° 33 DE 12 DE MARÇO DE 1902 7

com força de lei de 6 de setembro de 1894 relativamente aos direitos de mercê.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Albino Moreira: — Apresento os seguintes

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministerio da Marinha e Ultramar, me sejam fornecidos os seguintes documentos:

Copia de toda a correspondencia trocada entre este Ministerio e o Governador Geral da provincia de Moçambique acerca da execução do decreto de 25 de abril de 1895;

Copia de todos os relatorios existentes no Ministerio da Marinha e Ultramar acerca de analyses officiaes de vinhos exportados para as provincias ultramarinas da Africa nos ultimos seis annos. = Albino Moreira.

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, me seja enviada uma nota especificada das mercadorias despachadas nas estações do caminho de ferro desde a Figueira da Foz á Pampilhosa e destino nos ultimos tres annos;

Uma nota da quantidade e proveniencia do vinho desembarcado na estação de Villa Nova de Gaia durante os ultimos tres annos;

Nota da quantidade e valor dos vinhos exportados pela barra do Porto nos ultimos quinze annos;

Nota do preço medio da aguardente de vinho das vendas effectuadas no Mercado Central de Productos Agricolas desde 14 de junho de 1901;

Nota de todas as infracções e nome dos infractores, penas applicadas, com relação a vinhos falsificados e applicação do decreto de 23 de dezembro de 1899. = Albino Moreira.

Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, me seja fornecida uma nota da quantidade de vinhos, exportados pelas alfandegas maritimas dos districtos de Lisboa e Faro, com destino a Villa Nova de Gaia, nos ultimos tres annos; nota do imposto de producçãopago pelas fabricas de alcool industrial dos Açores, durante o anno de 1901, e nota dos direitos de importação, pagos nas alfandegas do continente do reino, de alcool estrangeiro, durante o anno de 1900. = Albino Moreira.

Mandaram-se expedir.

O Sr. Frederico Ramirez: — Apresento o seguinte

Requerimento

Mais uma vez, e é a quarta, requeiro, pelo Ministerio da Fazenda, me sejam enviados os documentos, pedidos em 14 de janeiro, requisição que renovei em l de fevereiro e 5 de março; e que respeita á forma como se collectam as fabricas de conservas no nosso país.

Sala das sessões, 12 de março de 1902. = O Deputado, Frederico Ramirez.

Mandou-se expedir.

O Sr. Antonio José Boavida: — Mando para a mesa uma proposta de renovação de iniciativa do projecto de lei n.° 39, de 1899, que conta, para os effeitos da reforma, ao presbytero José Maria Ferreira, capellão da armada real, todo o tempo em que serviu na provincia de S. Thomé e Principe.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Andre de Freitas: — Mando para a mesa a seguinte

Declaração

Declaro que deitei na caixa das petições um requerimento, em que Antonio Joaquim Alves, servente do Ministerio das Obras Publicas, pede que, para os effeitos da sua aposentação, lhe seja contado o tempo de serviço, desde 25 do outubro de 1879, data em que entrou para o serviço de obras publicas. = André de Freitas.

Para a acta.

O Sr. João Paria: — Mando para a mesa, por parte da commissão de guerra, um parecer em que é attendido o requerimento do coronel, no quadro auxiliar,, José Luiz Gomes.

Mando tambem um outro parecer, que tem por fim considerar alferes do infantaria de 27 de novembro de 1867, para os effeitos de reforma, o coronel do quadro auxiliar, José Luiz Gomes.

A imprimir.

O Sr. Eusebio da Fonseca. — Apresento a seguinte

Participação

Participo a V. Exa. que mandei deitar na caixa dois requerimentos em que José Firmino de Carvalho e Manuel Antonio de Figueiredo, mestres das officinas da Cordoaria Nacional, pedem que os seus vencimentos sejam equiparados aos maximos dos mestres do Arsenal da Marinha.

Sala das sessões, 12 de março de 1902. = Eusebio da Fonseca.

Mando tambem para a mesa o seguinte

Aviso previo

Participo a V. Exa. que desejo interrogar o Sr. Ministro das Obras Publicas sobre as estradas do Algarve. = Eusebio da Fonseca.

Mandou-se expedir.

O Sr. Alexandre Cabral: — Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio do Reino, me seja enviada, com urgencia, uma nota especificada das escolas de ensino primario criadas no ultimo trimestre do anno de 1901, o nos meses de janeiro e fevereiro de 1902. = O Deputado, Alexandre Cabral.

Mandou-se expedir.

O Sr. Belchior Machado: — Mando para a mesa um projecto de lei que tem por fim manter aos officiaes do exercito que, antes do 7 de setembro de 1899, tinham optado pelo serviço do Ministerio das Obras Publicas, ao abrigo do disposto no artigo 227.° da carta de lei de 30 de outubro de 1884 e artigo 2.° do decreto com força de lei de 10 de janeiro de 1895, as condições-bases do seu contrato de opção que importam o pagamento dos seus vencimentos de reforma pelo Ministerio da Guerra e o pagamento da dedução de 2 por cento sobre o valor equivalente dos soldos militares das suas patentes para compensação de reformas militares emquanto não se reformarem.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Arthur Montenegro: — Sr. Presidente: continuo no meu passeio através do Orçamento.

Tinha ficado na sessão de hontem na Guarda Fiscal. Passo immediatamente ás repartições de fazenda dos districtos e concelhos, outra reforma do Sr. Ministro da Fazenda que só segue na ordem do Orçamento. Aqui neste capitulo tenho a dar uma boa noticia aos meus collegas.

O Sr. Ministro da Fazenda em 652:518$000 réis que se gastavam anteriormente, conseguiu pela sua reforma economizar 100$000 réis.

Não é verdadeiramente uma boa noticia, o que eu devia dizer á Camara, mas sim uma boa illusão que salta á primeira vista de quem lê, sem segundo exame, nos numeros que se encontram no relatorio d'este projecto.

Quem descer ao exame minucioso encontra que os 100)51000 réis desapparecem rapidamente, porque ha cor-

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vectivos a fazer, e esses correctivos isso summariamente os seguintes: a comparação entre a antiga despesa o a actual é ficticia, porque a antiga era orçamental o a actual é orçamental o real. Havia vagas que não estavam providas, de onde resultava que não se gastava toda a verba o hoje não ha vagas.

No segundo correctivo no computo da antiga despesa de 1901-1902 é que figuram 7 contos de réis como percentagem aos escrivães de fazenda pela facilidade do cobrança e sêllo. Ora agora, pela nova organização, teem a mais 0,25 os delegados do Thesouro, 2 por cento; entretanto a verba para pagar esta despesa figura no Orçamento por um modesto cifrão. O computo geral do total das quotas é completo, mas corno isto se foz! É considerado pelo maximo que podiam receber os funccionarios, mas como é constituida por uma percentagem sobre as contribuições geraes; o que exceder vão todo para a caixa das aposentações, porque esta reforma caracteriza-se por ser uma rapagem do todas as sobras.

Mas enfim toda esta reforma do fazenda teve uma philosophia e esta philosophia vem no artigo 47.°

Diz esto artigo o seguinte:

(Leu).

Assim é que eu gosto de ver!

É preciso ser todo o pessoal do fazenda na mão, para fazer todas as transferencias que aprouver ao Ministro.

Ha aqui tambem a notar uma verba sobro o titulo de inspecção geral dos proprios nacionaes, cujo chufo tem o ordenado do 2:180$000 réis, emquanto que o pobre director ganha l:480$ réis!

No orçamento esta verba não vem especialmente designada, vem englobada na verba geral para o fundo das quotas.

Não sei como S. Exa. pôde englobar esta verba, porque a verba que figura no Orçamento é de mais de réis 2:180$000, quando na regulamentarão das quotas ha uma disposição que diz:

(Leu).

Por consequencia do fundo geral das quotas não devia ter saido illegalmente a verba distinada ao director dos proprios nacionaes.

Como o tempo aporia e os Ministerios são sete o eu d'este Ministerio já, ma tenho occupado desenvolvidamente, por isso pagarei á analyse do outros.

No Ministerio do Reino, que não fica atrás do Ministerio da Fazenda por muito que elle se tenha adeantado (e eu lanho pena do não ver presente o Sr. Presidente do Conselho, não porque tinha de dizer a S. Exa. alguma cousa de desagradavel, mão porque quando discuto o merecimento da obra do um homem, prefiro vê-lo presente a não vê-lo; no Ministerio do Reino, repito, encontro muitas cousas que no tivesse vagar podia esmeuçar), mas encontro, para pagamento dos vencimentos dos auditores addidos, 600$000 réis.

Temos um quadro do auditores, que peço o favor do me dizerem era que disposição legal foi organizado?!

Temos um quadro do juizes de direito que custa réis 45 contos. Vamos ter um quadro de agentes do Ministerio Publico que não sei quanto custara.

Mas, emfim, esses logares onerosos ou não onerosos, tem disposições regulamentares, mas estos auditores é que não teem; todavia encontramos uma verba para os auditores administrativos!

Agora, vamos ao serviço de incendios:

Pela organização vigente custa mais 8 contos do réis do que custava, mia o que é mais notavel é que esto augmento é todo absorvido com o pessoal!

Os empregados passaram do 221 a 287, e assim temos muitos bombeiros o poucas bombas no Orçamento.

Mas a despesa passou do 2G para 30 contos de réis!

Nas Guardas Fiscaes continuara os esbanjamentos, mas como estes são tradicionaes dispenso-me de falar nelles.

A policia do investigação continua a absorver todos os annos mais e mais nas verbas do Orçamento.

A famosa collocação da policia preventiva, no palacio da Estrella, custa já pela ronda da capa 1:000$000 réis, mas como no serviço d'esta policia tem do se empregar os carros cellulares, temos mais l conto do réis; são portanto, ao todo, 2:600$000 réis.

A policia preventiva augmentou successivantente.

Quer dizer: despesa com a policia preventiva tem tido um augmento, de 1898 para cá, do 20:480$000 réis. De 1898 para cá tem havido tambem um augmento com o conselho superior de hygiene. Esto caso é notavel, mas prefiro deixá-lo para quando o Sr. Presidente do Conselho voltar á sala. Se eu estiver ainda no uso da palavra referir-lhe-hei o conto d'esse caso.

No ensino sanitario, o regulamento de 24 de dezembro, eleva do 600$000 a 720$000 réis o vencimento de um chimico chefe, que a lei não auctoriza, e deve acrescentar á despesa com o Insttiuto 200$000 róis, que é a gratificação de professor que pertence á Escola Medica do Lisboa a quem pretence fiscalizar o serviço sanitario. Criaram-se dois cursos, o curso do hygiene e o curso de engenheiro sanitario, nomearam-se os professores, o sabe V. Exa. quanto teem estes cursos para material?

l:360$000 réis!

Passo agora ao Instituto Bateriologico. V. Exa. sabe que o anno passado foi votada uma lei auctorizando a reorganização dos serviços de saude o beneficencia, por consequencia temos uma auctorização especial para as reformas d'este serviço com o quadro prefixo numa lei; o quadro é o seguinte:

Esto é o quadro que vem fixo na lei de auctorização.

V. Exa. vê que eu hoje, como hontem, tenho o cuidado de citar leis e artigos. Pois o quadro regulamentar do 1901 tem a mais os seguintes funccionarios:

(Leu).

Isto alem do pessoal permittido na lei de 11 de junho, o que é absolutamente illegal.

Mas como se isto não fosso bastante, é preciso que V. Exa. saiba, que ha 4 medicos addidos, ao passo que ha 4 enfermeiros addidos do lazareto, que pela reforma d'esse serviço, pelo mesmo decreto de dezembro de 1901, foram collocados addidos. Pois no mesmo diploma, supprimem-se funccionarios numa repartição, e acerescentam-se noutra!

No posto de desinfecção, em Lisboa, ha o augmento de despesa do 740$000 réis, absolutamente contra a lei, porque a auctorização especial de 1901 diz o seguinte:

(Leu).

A auctorização era só para remodelar os serviços, e o Governo remodelou os serviços, augmentando as despesas! (Apoiados).

No posto de Villar Formoso tambem se augmentaram as despesas, mas no Lazareto do Lisboa e na estação de saude, foi um completo Natal!

(Leu).

Augmento total 3 contos de réis! Veja V. Exa. como é edificante!

E a reforma dos delegados do saude augmentou 20 contos de réis!...

Agora ha verbas significativas.

(Leu).

Temos os serviços de saude do Porto, que augmentaram do 4 para 15 contos do réis!

Agora uma nota caracteristica.

O districto do Coimbra devia ter um delegado de entufo, mas não era bastante, não sei se para a hygiene da cidade, se para a hygieno eleitoral. Alem do um delegado, foi nomeado um delegado auxiliar; mas emquanto o delegado tem 240$000 réis, o auxiliar tem 400$000 réis, isto é, recebe o dobro!

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Em Angra e ao Funchal succede o seguinte:

(Leu).

Nomeou-se um guarda-mor novo, com o ordenado de 800$000 réis, mas o antigo conserva-se com 700$000 réis.

Mas com relação á estação da saude do Porto, ha uma nota curiosissima: supprime-se a estação do Porto e criou, se uma estação em Leixões!...

Maneira pratica de fazer isto: pessoal da estação do Porto addido.

Depois nomeia-se novo pessoal para Leixões!

Visto que já está presente o Sr. Presidente do Conselho, vou agora referir-me ao Conselho Superior de Hygiene Publica.

Este Conselho é formado do seguinte modo.

(Leu).

São cinco os vogaes d'esse Conselho.

Quando o Governo apresentou a proposta, criando este Conselho, eu apresentei nessa occasião uma proposta, dizendo o seguinte.

(Leu).

Eu propunha que os vogaes substitutos entrassem tambem no Conselho, o que me parecia justo, mas a commissão rejeitou a proposta e escrevia no parecer o seguinte:

(Leu).

Como julga a Camara que o Governo usou d'esta competencia?

Usou, publicando o regulamento do Conselho de Saude, onde se diz o que vou ler á Camara:

(Leu).

No Orçamento estão marcados dez vogaes. Com que auctorização foram nomeados? (Apoiados).

O Sr. Presidente: — Correu a hora regimental. Tem apenas mais um quarto de hora para concluir o seu discurso.

O Orador: — Agradeço a V. Exa.

Chamei a attenção da Camara para este ponto, porque me pareceu particularmente grave.

Isto é a completa inobservancia de uma disposição taxativa, que se achava na lei! Não se lhe pode dar outra interpretação.

Não podia alterar a lei por uma disposição regulamentar. (Apoiados)

O Governo não. pediu auctorização para este facto.

Alterou a lei, que diz taxativamente o que vou ler.

(Leu).

Diga a Camara por que criterio, por que lei foi o Governo auctorizado a inscrever neste Orçamento dez vogaes!

Eu, pela proposta que fiz e a que me referi ha pouco, sou insuspeito.

Um outro ponto grave, e a que não me quis referir sem estar presente o Sr. Presidente do Conselho, é o que se refere aos serviços de beneficencia, que passaram para o Ministerio do Reino.

Já ganhámos duas grandes cousas com essa passagem: uma d’ellas é não termos o orçamento dos asylos municipaes que d'antes existia e que desappareceu por completo; outra consta do Diario do Governo, e é a primeira manifestação da acção do Estado sobre beneficencia.

É a auctorização que o Governo dá para a realização de um emprestimo de 100 contos de réis, para a construcção de um asylo.

Ora isto é perfeitamente illegal, e é preciso que se saiba e que se diga para que quem o contrate saiba que elle não vale absolutamente de nada.

Esse emprestimo representa para o Estado um encargo de 6 contos de réis, o que quer dizer, que ainda neste ponto se augmenta a despesa porque a Camara Municipal apenas gastava 4 contos de réis com as rendas de casa dos seus asylos.

(Leu).

Pergunto eu ao Sr. Hintze: em que lei é que o Sr. Presidente do Conselho se funda para auctorizar o Provedor do Asylo Municipal a contrahir um emprestimo de réis 100 contos? Se elle representa a Camara Municipal, quero que me digam onde está o pedido da Camara Municipal para esse emprestimo e onde está a consulta aos 40 maiores contribuintes; se o Asylo Municipal não é encargo da Camara, mas do Governo, quero saber qual é a lei que permitte ao Governo contratar esse emprestimo, porque não se pode comprehender que o Governo esteja tomando encargos, porque o Asylo si por ao não representa entidade juridica, com faculdades de contratar, em assumpto d'esta ordem.

Isto é portanto absolutamente illegal. Eu desafio quem quer que seja a que me indique a lei em que o Governo se fundou para conceder esta auctorização.

Das considerações que fiz acerca do Ministerio do Reino, onde apontei dois factos graves que não podiam ficar no esquecimento, quaes são: o emprestimo de 100 contos de réis para o Asylo Municipal, e a organização dos serviços de saude.

Passo ao Ministerio da Marinha, onde encontro o seguinte:

(Leu).

Eu pergunto a V. Exa. se isto é administração?

Não falta dinheiro para se pagar aos commissarios do Governo, não falta dinheiro para se mandarem embaixadores á China, não falta dinheiro para se augmentar o numero dos vogaes do Conselho de Saude, não falta dinheiro para contratar emprestimos para installação de asylos, não falta dinheiro para metter 8 officiaes a mais na Direcção Geral do Ultramar, não falta dinheiro ainda para nomear um official superior do exercito e outro da armada, para a alfandega, não falta dinheiro para cousa nenhuma d'estas; só falta dinheiro para a reparação dos nossos navios de guerraII...

Pergunto a V. Exa. se é administração gastar á larga em tudo e não considerar uma verba que fatalmente ha de gastar-se?!

Neste ponto a acção da commissão é que é supinamente curiosa.

Como sabe mais de cousas de marinha do que o proprio Ministro, e era necessario encobrir o augmento de despesa de 64 contos de réis, accusou uma receita equivalente, mas que é puramente ficticia.

Foi aos subsidios de embarque e tirou-lhe 20 contos de réis, que tinham sido augmentados pelo Sr. Ministro da Marinha, e que, por consequencia, sendo precisos em janeiro deixaram de o ser em março.

Como ainda não chegava, foi, tambem á verba de colonização e aos subsidios ás companhias africanas e obteve o resto.

Isto apresenta habilidade, mas o que não evita é que o dinheiro continue a sair dos cofres do Estado.

A despeito de todos os regulamentos de contabilidade decretados para o ultramar e de todas as inspecções geraes de fazenda, não é possivel encontrar um só documento por onde se possa calcular o deficit do orçamento das provincias ultramarinas. O que se encontra é o seguinte:

(Leu).

Com todos succede o mesmo. No triennio, a despesa é sempre inferiormente calculada; mas não sei se ella está bem ou mal lançada, o que sei é que o Sr. Ministro da Marinha já começa a rectificar.

Declarou S. Exa. que o orçamento ultramarino se devia fechar com saldo, mas no Orçamento do Estado, pede já 400 e tantos contos.

Sei que a hora que me está destinada pelo Regimento está a ser attingida, e eu sinto sinto poder continuar neste passeio através de todos os Ministerios, porque em todos haviamos de encontrar cousas, não digo interessantes,

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porque o não são, mas instructivas, como as d'estes dois! Ministerios.

Em todo o caso, aqui tem V. Exa. quaes as consequencias das aucturizações que a Camara deu ao Governo o anuo passado, e o computo approximado das economias que delias nos advirão.

Pergunto a V. Exa., muito serenamente, se ha direito de arruinar assim o pais? (Apoiados). Ha direito de desbaratarem assim os dinheiros publicos? (Apoiados).

Sr. Presidente: as notaveis economias tiveram esta conclusão, e com esta conclusão, tiveram tambem a conclusão natural, de enfraquecer completamente o Governo. Fraco, como noa tem apparecido em todas as questões, fraco nos appareceu na questão primordial dos credores, negando-se a tratar com elles e acabando por tratar; fraco na questão do Banco de Portugal; fraco, na questão da Sé de Lamego; fraco, ata nos actos de administração que se podem considerar insignificantes, como succedeu com a Guarda Fiscal; fraco sempre.

Mas as consequencias para o pais, de economias d'este genero, são do ter-nos trazido á fallencia em que estamos o do que não nos quer deixar sair com os seus esbanjamentos d'esta ordem.

Não censuro, por isso, o Governo, accuso-o, e por isso mandei para a mesa a minha moção.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado).

(S. Exa. não reviu)

Sr. Matheus dos Santos: — Sr. Presidente: desejo ser sereno, o que procurarei conseguir na minha resposta ao illustre parlamentar a quem tenho a honra de responder.

S. Exa. o Sr. Montenegro é um cavalheiro a quem admiro pela sua intelligencia, pelas qualidades do seu caracter, um estudioso, o que facilmente se reconhece pela maneira como orientou o seu discurso. O illustre Deputado começando as suas investigações pelas verbas de receita, percorrendo-as uma a uma, e seguindo o mesmo processo quanto ás verbas de despesa, mostrou um estudo acurado, e nas observações que lhes fez uma profunda meditação, o mais do que tudo um conhecimento pouco vulgar das leis da Fazenda Publica. Apesar d'isto, é certo que o discurso de S. Exa. foi pronunciado sobre a especialidade e não sobre a generalidade do Orçamento, cuja discussão for dada para ordem do dia. No entretanto eu sempre esperei que S. Exa., ao formular a sua moção, em que accusa o Governo de ter augmentado as despesas publicas em mais de 2:000 contos de réis, acabasse por demonstrar a sua these pela synthese dos detalhes geraes que fez das verbas do Orçamento, servindo só para isso dos contratos especiaes, da divida fluctuante ou de todas aquellas fontes e origens onde se vão buscar os meios necessarios para satisfazer os encargos do Estado, isto á, dos diversos expedientes a que os Governos costumam recorrer para alcançar dinheiro paru o Thesouro, mas o orador não se quis dar a este trabalho, como tambem não quis, pela analyse de cada uma das verbas do Orçamento, já criticando a maneira como cada uma das receitas tinha sido computada, já commentando a maneira por que a despesa estava descripta, dar a prova, resultante do seu respectivo confronto, se que havia um deficit de 2:005 contos de réis, como affirma na sua moção. E S. Exa., Sr. Presidente, não procedeu por esta forma porque da analyse das ditas verbas, com cuja critica poderia ou não concordar, o mesmo concordando, dado que fossem verdadeiras as conclusões a que chegou, como mais tarde demonstrarei que o não foram, não podo conseguir a demonstração a que se propusera da existencia de um deficit d» 2:005 contos de réis.

Sr. Presidente: o illustre Deputado em logar de vencer esta dificuldade preferiu accusar o Governo por ter abusado das auctorizações parlamentares, por ter introduzido despesas não auctorizadas no Orçamento, o que a meu ver não demonstrou cabalmente, como lhe competia, para d'ahi concluir que o Governo não tinha direito de desbaratar assim a Fazenda Publica e levá-la á fallencia. Sr. Presidente: eu disse no principio do meu discurso que desejava ser sereno, sê-lo-hei, como digo agora que não desejava fazer parallelos, porque dos parallelos que vou fazer eu demonstrarei á Camara, sem offensa para ninguem, mas com toda a evidencia de uma convicção profunda, de quem tem estudado aturadamente a marcha dos Governos ha alguns annos a esta parte, e principalmente os actos dos estadistas que estão sentados naquelles logares, de que elles longe de levarem a administração da Fazenda Publica a uma fallencia, pelo contrario teem promovido o engrandecimento economico e financeiro do pais. Sr. Presidente: nos parallelos que vou fazer a breve trecho citarei factos, mas sem chamar á responsabilidade d'elles nenhum homem publico, porque se ha alguem que possa ter respeito pelos homens publicos sou eu.

Em geral, os homens que vão aos Conselhos da Coroa conquistam essa honra pelo seu talento, pelas suas aptidões, pelo amor que teem a consignar na historia da patria um nome glorioso.

Se elles não alcançam esse nome é porque as circumstanciaa, o imperio dos factos, não deixam realizar aquillo que elles tinham na mente.

Por consequencia a responsabilidade não é dos Governos, mas da fatalidade dos acontecimentos. Tenho tratado de perto com muitos estadistas, principalmente com os que teem sobraçado a pasta da Fazenda, e tenho visto que todo o seu cuidado, todo o seu ideal, está em praticar actos de boa administração, sairem triumphantes das dificuldades em que se encontram, e, se o não conseguem, é porque de todo o não podem, e não por quererem fazer favores aos corrilhos politicos, como sem razão alguma é accusado pela opposição o Governo que se senta naquellas cadeiras. (Apoiados).

Direi ainda que a posição de qualquer orador que tem de criticar os actos do Governo, é sempre uma posição facil, como facil é destruir um monumento, uma obra prima que se operou durante seculos. Mas sair dos embaraços e um momento, tirar da occorrencia dos factos a orientação de uma boa administração politica, acompanhar as exigencias da civilização moderna, educar um povo, caminhar firme e directamente na senda do progresso, ahi é que estão as grandes dificuldades, ahi é que está a obra genial do estadista, ahi é que se affirmam aquelles que prendem o seu nome á historia, já sob o ponto de vista da finança, já sob o ponto de vista da economia do pais, emfim, sob o ponto de vista das relações internacionaes que muitas vezes conduzem á prosperidade, á gloria uma nação, outras e não raras vezes á ruina e á desgraça.

A arte de governar é a arte mais difficil que pode existir sobre a terra. Não ha monumento mais assombroso, quer se diga Pyramides do Egypto, mosteiro rendilhado da Batalha, quer se diga Alhambra, maravilhoso symbolo da civilização arabe na Hespanha, continuada ato á India, que exceda, seja superior a cupula d'este edificio social, enorme, chamado governação publica. (Apoiados).

O que é a governação publica? É a arte de governar os povos, conduzi-los á prosperidade, ao bem, e a realização d'este ideal é uma das mais difficeis conquistas na vida das nações, por isso que entram em jogo variadissimas vontades, variadissimaa aspirações, immensos interessas, e conduzir todos estes elementos a um fim unico, o bem do país, é uma das maiores e mais arriscadas empresas que existem. (Apoiados), Por consequencia, quando estes homens sobem ao poder elles bom merecem de todos, porque trabalham a favor, a bem do país. (Apoiados).

Sr. Presidente: o Sr. Conselheiro Hintze Ribeiro, que alli está sentado, que preside ao Governo da unção, e eu não me voa dirigir a S. Exa. por subserviencia, porque

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sou suficientemente independente para fazer elogios a quem os não mereça, reune em si, pela integridade do seu caracter, pela sua intelligencia, pelo seu saber, pela sua iniciativa, pela sua actividade, pelos seus constantes triumphos parlamentares, sendo em toda a parte justamente considerado, um orador do primeira grandeza, as qualidades inherentes aos grandes homens. (Apoiados). O seu nome, meus senhores, ha de ficar gravado nas paginas da historia patria, como um dos seus grandes vultos. (Apoiados).

O Sr. Conselheiro Hintze Ribeiro é um estadista que tem sacrificado a sua saude, empregado o seu talento, a sua actividade em bem servir dia a dia a sua, a nossa querida patria, e por isso é o orgulho do seu partido. S. Exa., defendendo os actos do Governo, a que presido, eleva-se, impõe-se pela auctoridade dos seus actos, tornando-se digno da consideração e respeito, não só dos seus amigos como do pais e do mundo inteiro. (Apoiados).

E affirmo isto sem receio, embora me pareça haver algum reparo, porque tenho a certeza de que se outras nações da Europa teem nomes que se podem repetir com orgulho em toda a parte, Portugal tambem tem nomes gloriosos que podem ser repetidos lá fora. Grandes homens teem-nos todos os partidos, tem-nos o partido progressista, tem-nos o partido regenerador. E deante de mim tenho homens de um e outro partido, que quando me estendem a mão, sinto-me como lisonjeado, porque os considero uma gloria nacional. Estão aqui alguns em pó, em frente de mim, o leader da minoria progressista, que é uma gloria d'esse partido (Apoiados); está alli um outro, o Sr. Conselheiro Ressano Garcia, cuja actividade, talento, intelligencia e qualidades de trabalho são tambem o orgulho do seu partido. (Apoiados).

Mas, para que citar mais nomes, se o partido progressista tem aqui, nos seus generaes, nos seus chefes, nos seus soldados, glorias de hoje e glorias de ámanhã.

Ao meu partido nada digo; alguns dos seus soldados, para não falar em nomes já aureolados, se teem manifestado com tal valor e firmeza do argumentação, que eu lhes vaticino que em breve serão o orgulho do partido regenerador, a que me honro ha muito de pertencer. E, posto isto, entro detidamente no assumpto, o que passo a fazer, precedendo de algumas considerações os factos que for mencionando, com a esperança de que a Camara não me leve a mal qualquer palavra menos cabida, por isso que não tenho o intuito de ferir partidos ou individualidades. As minhas considerações, repito, boas ou más, não terão caracter pessoal.

O illustre Deputado, Sr. Presidente, na sua moção censura o Governo, porque elle malbarateia a Fazenda Publica, pretendendo em suas razões provar que esta em breve cairá em fallencia, como se os homens que constituem o Governo tivessem d'isso culpa ou fossem réus de alguma falta commettida, que intencionalmente tivesse prejudicado os interesses da nação. Mas, Sr. Presidente, S. Exa. fazendo essas censuras, não demonstrou, como aliás era seu dever, que o Governo tinha effectivamente gasto muito e indevidamente, e que por este motivo a Fazenda Publica estava proxima de uma fallencia, é, portanto, não demonstrou que o país não devia fazer acordo algum com os credores externos, pela impossibilidade de o não poder cumprir, e ainda pela insuficiencia de meios para remodelar a divida publica interna, hão obstante o illustre orador ter insistido, sem resultado, que o deficit da Fazenda Publica era de tal ordem, que não permittia novos encargos. Mas, Sr. Presidente, o illustre orador vendo que o deficit era pequeno, tratou de arranjar, não disse bem, de formular um deficit grande, que servindo de base ás suas accusações lhe desse ensejo de ser ouvido por toda a Camara e nesta classe o peso das suas invectivas contra os actos do Ministerio.

Antes, porem, de seguir passo a passo em minha resposta aos argumentos produzidos por S. Exa., direi, como esclarecimento, que tive o cuidado do verificar uma a nina as verbas dos mappas de despesa para os exercicios de 1900-1901. Fiz mais, comparei as despesas auctorizadas com as despesas ordenadas, julgando que procedendo assim fazia um estudo a serio o verdadeiro, como em boa verdade m'o aconselhara o discurso do Sr. Conselheiro Espregueira, meu illustre amigo, que muito prezo pelas provas de estima que me dou durante a sua estada no Ministerio da Fazenda, onde sempre teve para comungo a maxima attenção. Por estas razões, pois, sinto-me com auctoridade para que possa dizer ao partido progressista, a que S. Exa. pertence, que fazendo o exame das verbas auctorizadas e ordenadas, fiz um exame como o devia ter feito; mas partindo d'ahi para o Orçamento, que está em discussão, o que VI? Vi que as receitas da ultima cobrança excederam as receitas que este Orçamento prevê para o futuro exercicio de 1902-1903, cêrca de 670 contos de réis, o que quer dizer que S. Exa. não tem razão no que afirma, e que a differença dos calculos que fez sobre as verbas do Orçamento que percorreu e de outras incorrecções que se esforçou por encontrar, e das que não teve occasião do fazer ver á Camara os seus defeitos, é tão insignificante, que por mais que S. Exa. tenha dito, os 670 contos de réis são de sobra para corrigir qualquer deficiencia, tanto mais quando é certo que houve toda a cautela com a organização das differentes verbas do Orçamento, o isto sem contar com o natural incremento dos redditos publicos, proveniente da elasticidade das receitas num pais onde o desenvolvimento da economia nacional se nota á simples vista.

Em abono d'este facto não é preciso ir buscar numeros pelos quaes se demonstro que se fez a liquidação da balança commercial sem grandes sacrificios metallicas, para o que quasi só bastou a reexportação colonial, a compra de coupons, rendimentos de capitães externos, gozados no pais, o a de papel sobre Londres, cuja divisa só conservou durante o anno findo favoravel a praça; não é preciso ir buscar numeros para demonstrar á Camara a verdade d’estas minhas afirmações; que o diga a vida normal do pais, o augmento das fortunas particulares. Ora um país que liquida por este modo a sua situação internacional, que afirma assim a sua fortuna, não é rico, é riquissimo.

Eu não sou um homem muito velho, nasci em 1850, não occulto a idade, e desde 1863 para cá, o que vi fazer?

O Aterro, a Avenida, os bairros do Campo da Ourique, Alcantara, Andrade e outros; vi fazer tantas obras c melhoramentos que Lisboa está transformada! Isto é pobreza? Não. É riqueza. É dinheiro vindo do Brasil? Em geral, não!

Indagando a proveniencia do dinheiro que deu logar á construcção dos predios que se levantam na Avenida, apura-se que onde ha 10 predios portugueses apparece 1 feito com dinheiro vindo do Brasil. Isto não indica riqueza propria, não alargará a materia collectavel? Eis outro ponto importante para o augmento dos rendimentos publicos: o alargamento da materia collectavel, sem necessidade do augmento de novas contribuições. A proposito, é urgente, é preciso que a propriedade pague o que deve pagar, que umas não paguem petos outras, que entrem todas nas matrizes, porque algumas não estão já, e não se diga que se augmentaram as receitas da contribuição predial em mais 100 contos de réis do que devia ser, quando é certo que a propriedade devia, sem gravame para o contribuinte, pagar mais de 200 ou 300 contos do réis sobre a verba orçada só houvesse melhor fiscalização do que aquella que ato aqui só tem feito.

Se eu, por qualquer acaso da fortuna, occupasse o logar de Ministro da Fazenda, a primeira cousa a que me

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dispunha seria a do não fazer leia, porque estou firmemente convencido que a sua instabilidade mais prejudica do que benyficia a Fazenda Publica, e que mais valo governar com as leis existentes, fazendo-as cumprir, do que correr o risco de innovações. Por consequencia, quando se diz que o país vae para a bancarrota, eu supponho que não vae, mas sim vão para ura estado do prosperidade, porque não tem sido outra cousa o caminhar nestes ultimos annos.

Áparte: - Que me diz á divida fluctuante?

O Orador: — Lá vamos á divida fluctuante.

Outro áparte; - O peor do responder é o deficit.

O Orador: - É mais facil do que parece. Desculpo-mo o illustre Deputado Sr. Oliveira Mattos, cujo talento e auctoridade muito respeito, que eu não siga a ordem dos ápartes que me fizeram, na certeza do que não deixarei o seu seu resposta.

Vamos á questão do deficit. Para responder á censura que o Sr. Montenegro fez ao Governo acêrca da administração da Fazenda publica, tenho do fazer um parallelo que S. Exa. não quis fazer, para d'este modo encontrar um deficit maior do que está no Orçamento e cuja responsabilidade pertence ás gerencias passadas pela importancia de 1:557 contos de réis.
Desgraçadamente o partido progressista quando esteve ao poder, o que andou por 3 annos o mesas, encontrou grandes despesas a liquidar, vendo-se na necessidade de fazer outras muito maiores, que as necessidades publicas reclamaram, o que tudo importou, na media de um deficit annual de 28 580/3,307 ou cêrca de 8:492 contos de réis !

Compensando, porem, as despesas pagas por conta de gerencias anteriores, esse deficit foi de 23760/3,307 = 6:997 contos de réis.

E querem saber o que fez o partido progressista para saldar o deficit dos 8:492 contos de réis?

Vendou 22:816 de contos de réis de inseripções que, reputadas á cotado media de 39,30 por conto, equivalem a 8.966:688$000

Obtevo da divida fluctuante 14.064:695$791

Alcançou do outros recursos:

Lucro na amoedarão de prata 1.373:000$000

Pagamento feito pelo syndicato portuense 1.139:658$536

Em conta do Banco de Portugal, por contratos 5.818:658$536

Total 28.850:042$327

Abatendo de gerencias anteriores 5.080:333$109

Fica um saldo de 23.769:709$218

Ou uma media annual, em relação a 3,397 annos, do 7:576 contos do réis de deficit. Durante esta situação houve compra o revenda do prata o farinhas, cujas differenças se envolvem nos resultados expostos.

E é deante d'este quadro, d’este inventario, que ainda não diz tudo, por isso que se deixarmos do mencionar 1:557 contos do réis que os regeneradores tiveram de satisfazer, que o illustre Deputado, pela comparação do actual deficit do 889 contos de réis com o de 6:994 contos de réis do tempo do seu partido, lança mão de todos os seus recursos para ver se consegue avolumar aquelle approximando o d’este! sem o que as suas censuras ao Governo não terão valor, o se me pede, como quem exige a resolução de uma grande difficuldade, que eu faça a sua demonstração um faço da nota da divida fluctuante, como se houvesse nisso a menor duvida e eu não tivera aqui o sen verdadeiro inventario!

Quereis a prova? E facil: basta ler a nota da divida fluctuante, fazendo-lhe as correcções devidas, para que todas as duvidas desappareçam. Emfim, correspondo ao pedido do Sr. Oliveira Mattos. Por este caminho não dou ao meu discurso a direcção que tencionava, mas porque desejo responder ás interrogações que me fazem, elle irá modificando-se conforme as circumstancias que d'ellas derivem.

Uma voz: — E os fundos externos?

O Orador: — Lá chegaremos, mas vamos devagarinho. Veremos a tempo se o Governo alguma cousa pode fazer.

Mas, Sr. Presidente, vamos ao assumpto.

E note V. Exa., vou fazer opposição ao meu partido: acceitar os algarismos da divida fluctuante tal como a opposição os apresenta com o seu deicit excedente a réis 10:000 contos, mas seja-me permittido descontar-lhe as verbas que lhe não pertencem, o então veremos que não é possivel elevar por essa conta o deficit a uma cifra superior a 789:800$0000 réis por anno!

E não ha ninguem, Sr. Presidente, deante d'estes algarismos, por mais exigente que seja, que grite com razão contra o Orçamento, que possa dizer, com justiça, que este Governo não tem feito uma administração honesta! (Apoiados).

(Interrupção do Sr. Francisco Machado).

Eu sou muito seu amigo, e desejo os seus apartes; quantos mais apartes me fazem, mais animo me dão para satisfazer a S. Exa.

Ora vamos lá.

O partido regenerador entrou para o poder em 25 do junho de 1900, e do então até 31 de dezembro de 1901 a Fazenda Publica houve em contos de réis:

Pela divida fluctuante:

a) De 25 de junho de 1900, em que esta divida estava em 47:909 contos de réis, a 30 de junho de 1901, em que ficou em 51:964 contos de contos de réis 4:065

b) De 30 de junho de 1901 a 31 de dezembro de 1901, em que a divida se registava por 58:381 réis 6:417

c) Por saldo de contratos, em conta do Banco de Portugal 8

Total 10:490

Então V. Exa., Srs. Ministros, administram tão mal a Fazenda Publica que apresentam um deficit de 10:490 contos de réis?

Sr. Presidente: é preciso ser justo, o déficit não é d'esta importancia, mas de 789:800$000 réis, numeros redondos, pelo que respeita á responsabilidade do partido regenerador; e neste momento, e para esta demonstração, seja-me licito transformar os meus argumentos em defesa do Governo.

O deficit accusado é com effeito de 10:490 contos de réis, mas na sua maior parte proveniente de gerencias anteriores ao actual Governo, pelo que se tem a deduzir d'esses algarismos as seguintes e importantes verbas:

a) Pela divida publica fundada, buscando os dados officiaes mais proximos dos limites do periodo que estou estudando:
Dezembro de 1900, titulos na circulação 650:041$000

30 de setembro de 1901, idem 650:001$000

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40, que á cotação de 39,30 por cento valem 15:720$000

b)Operação — Conta — Indemnização de Berne, contrato de 29 de maio de 1900 4.266:000$000

c)Saldo em cofre, gerencia de 1900 – 1901 3.465:752$442

d)Por conta de anteriores gerencias e adeantamentos 1.557:757$971 9.305:230$413
Comparando os 10:490 contos de réis com os 9:305 contos de réis, temos, em numeros redondos, a differença de 1.184:700$000 réis, pertencentes a gerencia do actual Governo, desde 25 de junho de 1900 a 31 de dezembro de 1901, O que dá em media um deficit annual de réis 789:800$000.

Podia ficar por aqui, mas não fico, porque preciso fazer justiça a todos.

Tenho por uma verdade, que todos os homens que militam no partido progressista não querem levar o pais á ruina; todos elles são, como a Camara sabe, honestos, dignos e serios, e não digo isto como phrase de effeito.

S. Exa. teem manifestado serem muito intelligentes, terem muito timbre e desejarem acertar, e por isso não teem senão uma aspiração, que é governar bem.

Nestas circumstancias, eu tinha de comparar as duas gerencias? para o que devia acceitar os dados apresentados pelo Sr. Mattozo Santos, mas como gosto de trabalhar só com os meus numeros e não com os dos outros, fui ao Ministerio da Fazenda para saber quaes eram as responsabilidades anteriores a esta gerencia e verifiquei o que acima referi, dando em resultado o deficit que mencionei.

O meu partido está no governo ha pouco mais de anuo e meio, e sendo a situação da Fazenda a que acabo de descrever, aqui tem a Camara como o Governo está atirando o país para o abysmo de uma fallencia!

Estas palavras, Sr. Presidente, por utilidade de todos, nunca deviam ter sido pronunciadas nesta Camara.

Pela minha parte direi que quem tem um Orçamento assim organizado, quem trabalha d'esta maneira, quem procura resolver questões tão graves não merece apreciações, palavras de censura.

Não tenho pretenção de me sentar naquellas cadeiras do poder, mas só, por fatalidade dos acontecimentos, ali fosse chamado, tentaria duas cousas: a remodelação da divida fluctuante e a da divida fundada, uma e outra em divida amortizavel.

O Sr. Oliveira Mattos: — Governaria melhor do que aquelles que lá estão. Faria mais economias.

O Orador: — Não acceito esses elogios, porque os homens que se sentam naquellas cadeiras são estadistas, cujas faculdades de talento, cujo saber e principios reve Iara tanta elevação que eu, ao pé d'elles, quando me comparo, pouco ou nada sou.

Um deficit tão pequeno, como o actual, não é um deficit que meta receios, porque nada só parece com o subido deficit que o Sr., Montenegro se esforçou por demonstrar á Camara que existia.

Portanto, Sr. Presidente; o novo país, chegado a este momento, deve querer duas cousas: equilibrar as suas receitas com as despesas, e não ser perturbado pelos credores externos e internos.

Quanto á possibilidade do um acordo com os credores externos, direi que, se for possivel realizá-lo sob bases dignas e firmes, e se esse acordo puder servir para se resolverem os problemas da nossa Fazenda Publica, sem que eu saiba por ora qual deva ser, o que portanto não discutuo, venha de onde vier a sua proposta,porque não se ha de acceitar,se elle é uma affirmação do nosso credito, uma questão acional?

Repito: não conheço as bases, as clausulas do convenio; hei de conhecê-las quando forem do dominio publico, e então discuti-las-hei como cidadão e como Deputado, se for chamado a esse terreno.

Com relação á divida fluctuante, não sei quaes as intenções do Governo; não procuro descortiná-las; não entro no seu gabinete a espreitar os actos da sua vida; só tenho nisso a responsabilidade do partido; mas, Sr. Presidente, não tenho duvida absolutamente alguma de affirmar, aqui, a minha opinião, fundada na leitura de livros e documentos publicados acêrca do estado, da situação d'essa divida, e até, sendo preciso, do que eu tentaria fazer para livrar o Thesouro das contingencias do mercado.

A respeito, tambem, dos encargos do Estado, e da maneira de resolvê-los, não vou perguntar ao Governo se tem ou não pensado nisso; o que eu queria, era que, quando se tratasse de assumptos financeiros dentro do Parlamento sobre esta ou aquella verba do Orçamento, o debate corresse á altura que merecem ser tratadas as questões que interessam e dizem respeito á marcha geral dos negocios publicos.

Sinto-o bem? Sinto-o mal? Não sei; é uma questão do temperamento. Piei do, porem, morrer agarrado a estas idéas.

Agora, continuando na serie de respostas, que devo e me merecem as accusações que resultam do erudito discurso do Sr. Montenegro, sendo uma d'estas que o pais economicamente não tem caminhado muito, permitta-me Sr. Presidente, que eu em resposta á maneira por que o illustre Deputado apreciou a situação economica, e sem grandes detalhes, porque isso levaria muito tempo, o que não vale a pena, lho apresente uns números, e que d'esses numeros eu tire as illações que nelles se encontrem. Antes, porem, e como esclarecimento, cumpre-me declarar que para proceder com consciencia de um homem que estuda, e não quis vir ao Parlamento para dizer palavras mas apresentar factos, dizer cousas que não sejam verdadeiras ou possam ser contestadas, tive o cuidado de fazer um quadro do movimento commercial registado nas alfandegas cora respeito á importação e exportação das diversas mercadorias, compensando esse movimento não só com a reexportação colonial como com a differença entre a importação e a exportação metallica.

Falando sobre este assumpto direi que os partidos pouco ou nada teem com os factos economicos que vou apresentar, embora possam ter a responsabilidade de muitos outros, porquanto a legislação quasi tem sido sempre a mesma. Assim, para melhor comprehensão dividirei em tres periodos a gerencia dos negocios publicos desde 22 de fevereiro de 1893 a 31 de dezembro de 1901.

Primeiro periodo: 22 de fevereiro de 1893 a 7 de fevereiro de 1897, em que esteve o Ministerio regenerador no poder. presidido pelo Sr. Conselheiro Hintze Ribeiro;

Segundo periodo: 7 de fevereiro de 1897 a 25 de junho de 1900, em que governou o partido progressista;

Terceiro periodo: 25 a junho de 1900 a 31 de dezembro de 1901, cuja responsabilidade é do actual Governo.

Durante estes tres periodos, e formulando o quadro conforme as indicações anteriores, houve em media e por anno, feitas as correcções correspondentes ao tempo em que esteve cada um dos partidos no poder, o seguinte movimento commercial de importação e exportação pelas alfandegas, por onde se prova á evidencia que o pais se tem desenvolvido economicamente,

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Medias annuaes

(Contos de réis)

Diversas mercadorias com exclusão do ouro e prata em barra e moeda Importação Exportação Excesso da importação sobre a exportão Compensação Reexportação colonial Differenças Excesso da exportação sobre a imporatação metallica Differenças que se tiveram de liquidar com papel sobre Londres
[ver tabela na imagem]

Por estes algarismos conclue-se que de periodo augmentou o movimento das imporatações e exportações das diversas mercadorias; que o excesso da importação sobre a exportação foi maior, como maior foi a reexportação colonial, e que os recursos do papel sobre Londres, para equilibrar as differenças da balança commercial, não faltaram, não sendo por isso necessario fazerem-se grandes sacrificios de exportação metallica, a qual começando no perimeiro periodo por 3:918,7 contos de réis, desceu no segundo a 776,2 contos de réis e se elevou no terceiro somente a 1:126,04 contos de réis, apesar do enorme pedido á praça de 20:229 contos de réis de papel sobre Londres, cuja importancia excede em 6:988,2 contos de réis a somma dos dois periodos anteriores para se liquidar a situação nacional.

Foi nomsegundo periodo que se realizou, por assim dizer o equilibrio economico, que se chegou quasi ao apogeu sem grande necessidade de metal para se pagar ao estrangeiro o saldo da balança commercial, e ninguem se admire d’isto, porque foi um phenomeno proveniente do desenvolvimento do commercio colonial, do desenvolvimento da industria fabril, que substituiu os productos que vinham de fora para o nosso uso interno e para serem enviados para as colonias.

Nesta altura tudo se preparava para sobre a base de um equilibrio economico estavel, seguro, permanente, se assentar a solução do nosso problema financeiro e como consequencia remoderar a divida publica consolidada e a divida fluctuante emcondições a não podrem vir a perturbar a economia nacional.

Infelizmente, porem, quando estavamos nesta esperança com esta grande aspiração, veiu a crise do commercio de Africa influir na nossa economia interna e externa, pondo em risco o capital de muitas fabricas e afastando para longe a solução de muitos problemas financeiros.

Vamos ao terceiro periodo, em que se deu um facto fridsantissimo, que se não encontra vulgarmente na historia das nações, a não ser na da Inglaterra. Para mostrar a sua importancia basta ter lido de M. PaulLeroy Beaulieu: A colonização entre os povos modernos; mas, mesmo ahi, não se encontram os factos tão extraordinarios de manifestação de recursos em occasiões de crise e especialmente como o que entre nós se deu. Refiro-me ao desvio da balança commercial de 21:353,3 contos de réis, que para se equilibrar teve de se despender apenas de 1:126,01 contos de réis em metal e o restante em papel sobre Londres. Que significa isto?

(Pausa).

Ninguem ousará responder-me? Essa liquidação foi, na sua maior parte, devida ao estado do cambio do Brazil, que trouxe aqui rios de dinheiro. E digo que foi na sua maior parte, porque já antes, no periodo progressista, para se pagar a differença de 10:459,9 contos de réis de balança commercial, se dispusera de 9:683,7 contos de réis de papel sobre Londres e de 776,2 contos de réis em metal, e no primeiro perioodo regenerador de 3:018,7 contos de réis em metal, e de 3:553 contos de réis de papel sobre Londres.

Taes são, cm media, as singulares movimentações annuaes da balança commercial durante os tres citados periodos. Ora estes factos, principalmente os do ultimo periodo, não extraordinarios, espantosos, e devem-ne sem duvida a um punhado do homens que vão d'aqui ao Brasil, onde durante annos, pelo sou trabalho, enriquecem e voltam depois á patria com novos elementos do vida. E esta a verdade, é esta a explicação que, aliás, encontrei muito bem exposta num livro que em tempos li, de Stuart Mill, salvo urro, no qual dando conta da critica que muitos faziam das sommas gastas pela Inglaterra com a sua colonia dos Estados Unidos, elle lhes respondia que, se o dinheiro tinha ido a rodos para lá, o ponto de não se poder calcular a sua importancia, cada libra se transformara em milhões d’ellas, em beneficio da mãe patria. Pela mesma razão o Brasil e seja o tributario maior do Portugal. No peito de cada português que para lá emigra palpita um coração cheio de amor, do saudade pela patria, porque é longe d'ella que mais se sente, avoluma a saudade pela mau, pelos irmãos, pelos filhos, por tudo, emfim, que nos é caro. E e essa saudade, as lagrimas que derramara pela terra que o viu nascer, que, quando rico, o faz voltar á patria, de onde saiu pobre, para com a sua fortuita a auxiliar no movimento ascensional de vitalidade e grandeza. Mas, Sr. Presidente, tem-se feito nesta Camara uma outra accusação, que o Governo não merece: a de que elle, peta sua má administração, nos precipita no abysmo. Refiro-me a uma cordilheira de cifras accumuladas desde o segundo semestre do 1800 n 31 de dezembro do 1901, por despesas da nação, que se eleva a um algarismo não inferior a 88:445 contos de réis, e cuja responsabilidade sendo de todos os partidos que transitaram pelo poder durante esse periodo, se pede agora a responsabilidade a esto Governo!

E verdade que essa accusação, embora injusta, não parece muito tenebrosa deado que nessa cordilheira ha montanhas com vulcões em evolução, que dão gloria e dão luz, que nos repetem e ensinam que uma d’ellas representa 3:155,4 contos do réis do um emprestimo para navios do guerra, que levam a nossa marinha através os mares, os nossos soldados, que alcaçaram a victoria do Chaimite; tem vulcões em evolução, repito, que representam 5:575 contos de réis, que foram pedidos para despegas de expedições, que filmavam na Europa o nome de Portugal, nome combalido antes e respeitado hoje. Essa cordilheira immensa, esse Himalaya do cifras, sr. Presidente, não deve hoje assustar ninguem: o seu encargo entra ha muito nas despesas geraes da nação e pela divida fluctuante não se paga mais de 1:530 contos do réis, como está confessado no Orçamento Geral do Estado para 1902-1903. E já que se tem falado tanto nessa cordilheira do cifras, é preciso que saibamos o que estas são o como se geraram. Os recursos extraordinarios que desde o segundo semestre de 1890 se pediram ao país são grandes, são enormes, são para aterrar, dizem, « d'ahi parte, dos oradores da opposição formulam argumentos contra o Governo, accusando-o do fazer má administração, do esbanjador da Fazenda Publica, parecendo assim que elle foi o unico responsavel d'essa cordilheira de cifras; que é a elle que se deve tudo o que

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sobrecarrega o Thesouro! Não se deve a elle nem carrega sobre o Thesouro. Essas cifras estão consolidadas e os seus encargos, sob a forma de garantia do juros a caminhos de forro, que fecundam e dão riqueza publica; em emprestimos para navios de guerra, que firmam o nosso nome e o nosso dominio colonial; em contratos, muitos d'elles de natureza reproductiva; em estabelecimentos publicos necessarios ao ensino e á hygiene, o tudo isto limitado a uma simples annuidade, sem exigencias de capital, com excepção da divida fluctuante! E quereis saber a proveniência d'essa cordilheira de cifras? É como segue:

Mappa dos recursos extraordinarios desde o 2.° semestre de 1890

Annos Operações Importancias
[ver tabela na imagem]

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[ver tabela na imagem]

Este algarismo de 88:445,3 contos de réis, que representa o que se tem pedido para satisfazer encargos da nação durante onze annos e meio, dá em media por anno um deficit de 7:690 contos de réis.

O dito algarismo, cuja significação parece á primeira vista horrorosa, e que tem vindo á tela da discussão, pedindo-se a responsabilidade a um Governo que o não contrahiu na sua maior parte, nasceu apenas da necessidade do só pagarem melhoramentos para beneficio e engrandecimento da nação (Apoiados), como sejam as despesas feitas com os navios de guerra, expedições, desenvolvimento da viação, e isto para não falar era garantias de juro e outras despesas com os caminhos de ferro de Mormugão e Ambaca, e mil outras cousas que é prolixo estar a enumerar. (Apoiados).

O defecit de 7:690 contos de réis é como se não existisse, porque os capitães que lhe dizem respeito foram descriptos, entraram no Orçamento em occasião opportuna, e, repito-o mais uma vez, com os seus encargos certos, ordinarios, determinados, ficando de fora apenas, na parte jurou por diversas transacções de thesouraria, os encargos da divida fluctuaante, por uma quantia não excedente a 1:530 contos do réis! (Apoiados).

Portanto, isto não chega a ser argumento, é uma cousa que se diz para armar ao effeito e para, por cima d'esse effeito, jogar palavras mais violentas contra o partido a que pertenço. Mas, Sr. Presidente, que tem o meu partido com isto? Estas despesas não são de todos os Governos, não voem desde o segundo semestre de 1890, e, porventura, são esbanjamentos ou satisfação de necessidades publicas? (Apoiados).

E depois ha mais. Uma das causas fundamentaes da nossa soi disanl afflição, das difficuldades em que se vêem os nossos Ministros da Fazenda, porque é principalmente á porta d'elles que vão bater-lhes os outros Ministros quando lhes falta dinheiro para os serviços a seu cargo, é a questão do agio.
(Apoiados). Se não houvesse agio, havia saldo no Orçamento, não teriamos o deficit accusado no Orçamento, mas um superavit não inferior a réis 1:500 contos de réis. V. Exa. Sr. Presidente, sabe qual é o remedio? Vou indicá-lo, note-se que não é com a presumpção do que possa conseguir resultado, porque nesse caso tinha feito a minha fortuna, pois vendia o elixir. É com a persuasão do que esse facto ha de vir a realizar-se, embora uni pouco fora da minha previsão, por isso que não sou vidente.

Mas a verdade é esta. O agio do ouro tem custado á Fazenda Publica, nos anãos abaixo mencionados, as seguintes importancias em numeros redondos:

Annos Réis

1893 2.013:000$000

1894 1.881:000$000

1895 2.084:000$000

1896 3.900:000$000

1897 3.838:000$000

1898 3.866:000$000

1899 8.786:000$000

1900 3.173:000$000

1901 3.173:000$000

Explicando estes algarismos, convém fazer as seguintes observações:

Quando em maio de 1891 rebentou a crise, o stock metallico no pais era mais do que muita gente suppunha. (Apoiados). Atrevo-me a dizer que excedia 80:000 contos de réis, e commigo estão muitos auctores de nomeada. (Apoiados).

E que havia 80:000 contos de róis em ouro no país, é facil a demonstração. V. Exa., Sr. Presidente, comprehende que tendo ido em ouro para o estrangeiro, durante os tres primeiros annos em seguida á crise, uma cifra superior a 40:000 contos de réis, e que o vasio deixado na circulação não se tendo feito sentir do repente, o que se evidencia pelo premio diminuto que ao principio se pagou pela libra, que não passou de 100 a 200 réis, que o stock metallico era muito grande, como aliás o demonstra, entre outros factores, as exigencias do nosso meio circulante antes e depois da crise de 1891 e o balanço das nossas importações sobre as exportações metallicas desde 1851 para cá. No decorrer dos annos o agio da libra foi subindo, chegando a attingir 90 por cento, para depois descer a cêrca de 31 por conto em que está actualmente! Estas oscillações de valor, quanto ao agio da libra, provam que sendo as necessidades dos serviços publicos numa serie de annos pouco mais ou menos sempre as mesmas, as circumstancias economicas e financeiras do pais teem melhorado, sem que da alta ou baixa do agio seja responsavel o partido progressista ou o partido regenerador.

Taes são os factos de que os Governos pouca culpa teem, taes as consequencias que d'elles tiramos e das quaes o pais vae aproveitando.

Se eu, alguem, fosse Ministro da Fazenda ao dar-se o equilibrio dos cambios por uma forma estavel e permanente, poderia decretar a convertibilidade das notas, podia pagar integralmente aos credores, podia fazer cousas mirabolantes, e nesse dia seria tido como ura grande homem, e, todavia, o effeito teria sido simplesmente a consequencia do facto importante que acabei de expor.

Eu disse uma vez ao Sr. Conselheiro Ressano Garcia, cujo talento admiro, falando-lhe no seu gabinete de Ministro sobre a nossa situação financeira, que um homem é grande, não porque tenha mais talento do que outro, mas porque do embate de duas forças resulta o triumpho de uma d'ellas, pertencendo as palmas da victoria não ao

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maior talento, aos seus cabos de guerra, mas ao seu commandante. Semelhante á phalange que pôde atravessar impavida uma ponte debaixo das balas do inimigo, sem que o seu commandante fosse ferido, assim o Ministro da Fazenda, no dia em que se dê o equilibrio cambial, como acima fica dito, será proclamado, sem que tenha concorrido para isso, Napoleão o heroe de Arcole das nossas finanças!

Já vê V. Exa., Sr. Presidente, que faço justiça a todos, sendo certo que o equilibrio dos cambios depende necessaria e absolutamente da solução do nosso problema economico, base essencial e unica da solução do nosso problema financeiro. É este o remedio do equilibrio dos cambios, que se tem de estudar e desenvolver.

Pelos numeros que vão de 1893 a 1890, e constam do quadro, o Estado gastou muito menos no agio do ouro do que d'esta data a 1899, baixando esse encargo nos dois últimos annos cêrca de 600 contos de réis por anno. A causa d'isto foram os cambios favoraveis do Brasil, que antes haviam estado muito retrahidos e baixos, corno se demonstra facilmente pela estatistica e pela affluencia do papel sobre Londres, pois que podendo este registar-se, no primeiro periodo por 3:558 contos de réis, no segundo por 9:683 contos de réis, no terceiro as necessidades andaram por 20:229 contos de réis, que se adquiriram por menor preço do que nos dois periodos anteriores, não obstante a enorme differença do pedido d'este papel á praça. Com o beneficio dos cambios utilizaram em geral o país e particularmente o Thesouro

Eu não dou os parabens ao Sr. Ministro da Fazenda, nem ao Sr. Ministro das Obras Publicas, nem ao da Guerra, apesar de terem pago por mais baixo preço os seus debitos no estrangeiro, mas dou-os ao país, que tem um deficit muito menor que deveria ter se não fosse esse facto. Sr. Presidente: os verdadeiros milagres da administração publica são os que enumerei. Para defender a administração do Sr. Ministro da Fazenda eu podia affirmar que S. Exa. fez esta ou aquella economia, mas S. Exa. não precisa que eu accrescente cousa alguma á confissão dos seus actos, e, portanto, á sua gloria.

Quanto ao orçamento das receitas outra é a historia.

As receitas não teem augmentado porque o que nellas figura a mais provém principalmente do que se tirou pelas leis de salvação publica aos credores internos e externos, aos funccionarios publicos e ao contribuinte. Tenho a grande desgraça de ser um pouco lido, lembrando-me por vezes, nas horas de amargura, de ir ter com o meu amigo o Sr. Conselheiro Neves Carneiro a recordar as suas lições de philosophia, que me faziam mergulhar o espirito nas regiões nebulosas da Allemanha, bem mais agradaveis para a minha, mocidade do que a leitura dos livros de sciencia positivista, onde tenho aprendido doutrinas pouco suaves para a alma na dureza e inflexibilidade das suas leis. Por este caminho o meu sentimento se foi desvanecendo; que amarga é a vida! Lembro-me com saudade do passado, que ao presente só me restam as lições da experiencia, e alguma cousa que esta me deixou. Nunca fui negociante, e teria muita honra em o ser. Não sou burocrata, e tenho pena, porque é uma posição que invejo, pois, em geral, não ha homem nenhum no país que, tendo nome, não!, pertença a esta collectividade. Não sou advogado, sou um homem que anda lançado ao acaso, por esse mundo fora, que anda hoje aqui, ámanhã acolá. Mas, Sr. Presidente, no meio d'estes desgostos da minha vida se alguma cousa tenho aprendido foi a contabilidade, e a contabilidade diz que uma verba que é lançada a debito e a credito se annulla. Foi o que succedeu com as verbas provenientes das leis de salvação publica, que se compensam de modo que as differenças entre as receitas e as despesas são verdadeiras e as suas reciprocas progressões exactas.

Ouvi dizer, quando se criticou o orçamento do Ministerio do Reino, e não sei se terei tempo de lá chegar, que aquelle Ministerio augmentou muito as suas despesas, e para se justificar isto citam-se duas verbas, a da inspecção do serviço de incendios o a de beneficencia publica, que pertenciam á Camara Municipal, não se lembrando que ellas são compensadas pelo Ministerio da Fazenda, que as deixara de entregar á Camara Municipal para as dar ao Ministerio do Reino. Mas, insiste-se, estas despesas augmentaram com a sua transferencia para o Ministerio do Reino, ao que responderei que não podia deixar de ser assim desde que a cidade de Lisboa em 10 annos se tem desenvolvido muito. Os serviços da extincção de incendios e de beneficência publica não digo que se duplicaram; não obstante direi que augmentaram extraordinariamente com o desenvolvimento da cidade. V. Exa., Sr. Presidente, que sabe melhor do que eu o quanto isto é verdadeiro, comprehende que se não podem acompanhar as exigencias da civilização sem se fazerem as despesas competentes com os serviços que lhe são indispensaveis.

V. Exa., que sois homens de partido e homens de Governo, sabeis perfeitamente que não se deixa de governar bem, porque se augmentou uma verba no Orçamento que as necessidades impunham.

Em geral, os serviços criam-se porque são necessarios. Sei que ha serviços que não são necessarios, porque as necessidades da civilização já os não reclamam e que, por se terem transformado ou caído em desuso, pedem outros que melhor os substitua; mas tambem sei que temos serviços que são um primor e podem rivalizar com iguaes instituições do estrangeiro, como, verbo gratia, o Instituto Bacteriologico.

Agora, passando aos direitos de mercê, cuja verba de receita o illustre Deputado achou por demais elevada no Orçamento que se está discutindo, direi que lhe responda o Sr. Conselheiro Espregueira, que ali está sentado. Dirigindo-me por esto modo a S. Exa., quero dar-lhe os parabéns por um trabalho que hontem vi sobre a liquidação de direitos de mercê, e que por S. Exa. foi iniciado pouco antes de sair do Ministerio.
Tencionava apresentar uma copia do respectivo mappa, mas faltou-me o tempo para isso.

O Sr. Presidente: — Terminou a hora que o Regimento concedeu a V. Exa. Tem mais um quarto de hora para concluir o seu discurso.

O Orador: — Muito obrigado a V. Exa.

Esse mappa, Sr. Presidente, representa um trabalho que admirei e do qual tirei apontamentos e por estes fiz calculos e tirei conclusões, que respondem ao orador que me precedeu.
É assim que eu sempre faço justiça a todos.

Para que havemos de estar constantemente a dizer mal dos nossos homens publicos? O mappa do Sr. Espregueira acêrca dos direitos de mercê por graças retribuidas ou honorificas está muito bem organizado, é de primeira ordem. O serviço resultante dos direitos de mercê principiou a desenvolver-se em 1900. Por este motivo o calculo para o Orçamento não podia ser feito senão pela ultima receita, dando-se de mais a mais a circumstancia de que, antes da organização da repartição respectiva, essa receita era de 12 a 15 contos de réis por mês, quando agora regula entre 60 a 70 contos de réis. No dito mappa as liquidações de direitos de mercê, emolumentos e sellos do diplomas e conhecimentos de quitações, effectuadas no mês de janeiro de 1902 elevaram-se a 845:697$948 réis, dos quaes deduzindo para o orçamento 313:100$000 réis, ainda ficam 532:597$948 réis, sendo para notar que no mês de janeiro se receberam d'essas liquidações, a prompto pagamento, por mercês honorificas 4:255$881 réis, e por mercês lucrativas 762$745 réis ou um total de réis 5:018$626 o que perfaz dentro de um anno cêrca de 60 contos do réis alem das prestações a receber. Quereria, como disse, trazer aqui a copia do mappa mas não pôde, para o dar de presente ao Sr. Montenegro, a fim de mos-

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trar mais uma vez a S. Exa. que não tinha razão do ser a sua accusação, e que não regateio louvores a um trabalho quis deve a sua origem a um amigo seu e homem importante do seu partido. Mas não fico por aqui. O illustre orador, Sr. Presidente, tratando da auctorização concedida ao Governo para reorganizar os serviços dependentes do Ministerio da Fazenda, na parto que diz respeito á extincção do commando da Guarda Fiscal e á da 2.ª Repartição da Administração Geral das Alfandegas o Contribuições Indirectas, que foi incorporada na Inspecção Geral dos Impostos, disse que esta reforma custara ao Estado 102 contos de réis a mais por anno do que a antiga organização.

Quando ouvi isto, e apesar de saber pelos documentos officiaes que só havia supprimido uma das repartições que compunham a Administração Geral das Alfandegas cora economia para a nação, fiquei perplexo e ato o meu distincto amigo o Sr. Conselheiro Arrojo mo disso que tivesse cautela, tirasse apontamentos o fosse ouvir o orador do perto. Assim fiz, tomando o conselho do Sr. Conselheiro Arroyo, um dos mais notaveis oradores d’esta casa, que quando e ouço me parece estar escutando o grande Castellar. Ninguem como S. Exa. apresenta uma idéa, pinta uma situação. O augmento da despesa em 102 contos de réis, que o Sr. Montenegro procurou justificar, foi para mim novidade tamanha que fiquei assombrado o mo fez sair da Camara, porta fora, cabisbaixo o na duvida do vir a dar uma resposta satisfatoria. Neste estado do espirito dizia ou na minha ingenuidade: pois ou tenho um partido, que faz isto?!

Havia economias importantes a fazer e eu pertenço a um partido que não fez essas economias?! Afinal do contas o que ouvi a S. Exa. é de espantar! Passemos á historia da reforma e ás suas consequencias, e então veremos quem tem razão.

A Administração Geral das Alfandegas era constituida por tres repartições, uma das quaes, como anteriormente disse, foi extincção passando os serviços a seu cargo para a Inspecção Geral dos Impostos. Esses serviços são:

A administração dos impostos: do pescado, real do agua, da fabricação do velas, de oleos o da manteiga artificial, da producção do alcooes, do transito, tabacos, phosphoros o isca, do sêllo, do imposto dos direitos de mercê e dos emolumentos e solio das secretarias do Estado, finalmente, da fiscalização do todos os rendimento do Estado de qualquer natureza, com excepção dos aduaneiros.

Estes rendimentos orçam por 20:000 contos do réis.

A Guarda Fiscal gastava antes da reforma, sem incluir os constantes suprimentos, que no anno
findo só elevaram a 83 contos de réis 1.163:868$199

Com a reforma a despesa será de 856:517$080

o que dá um saldo de 307:351$419

Este saldo teve a seguinte applicação:

Tara a caixa das reformas 12:000$000

Para o alargamento do quadro da policia 60:000$000

Para o augmento do quadro do serviço da alfandega 3:470$675

Para a organização do Corpo do Fiscalização do Impostos 209:953$560 285.424$235

Economia effectiva para o Thesouro 21:927$184

Em consequencia d'esta reforma deu-se portanto uma economia de 307:351$419 réis, em vez de um augmento de despesa do 102 contos do réis, como affirmou o Sr. MOntenegro V. Exa. cabe, Sr. Presidente, como a cidade se tem desenvolvido o as reclamações constantes por falta de policia a que o Thosouro não tem podido attender; por isso foram-se buscar áquella economia 60 contos do réis para o alargamento do quadro da policia. Alem d'isso, o serviço da alfandega carecia de algumas ampliações no sou pessoal, pelo que se dotou o alargamento do quadro com mais 3:470$5675 réis. Eu tambem sei alguma cousa d'isto.

Ha seis annos que estou na alfandega, não a ganhar dinheiro, mas representando a «Camara do Commercio», no Contencioso Fiscal, onde por vezes se fala em serviços estranhos á especialidade, vindo d'ahi eu conhecer as faltas de pessoal e entender que eram necessarias essas ampliações. (Apoiados).

O mesmo se fez quanto á organização do Corpo de Fiscalização do Impostos, applicando só para este serviço 209:953$5560 réis e 12 contos de réis para a caixa das reformas, que tanto se tem combalido, mas que tão util é pelo fim a que se destina, resultando de tudo isto uma economia real e effectiva não inferior a 21 contos de réis. Em vista d'isto quem tem razão?!

O orçamento não está certo, não c um documento verdadeiro?

Eu vou dizer a V. Exa. o seguinte:

Tive o cuidado do ir procurar o Sr. Conselheiro Perestrello, digno Director Geral da Thesouraria do Ministerio da Fazenda, a fim de me esclarecer sobro alguns assumptos a que o Sr. Montenegro só referiu e falando-lhe da accusação do illustre Deputado, pedi-lhe que me dissesse se as verbas orçamentaes eram verdadeiras, e no caso de o não serem, o que havia a tal respeito.

Proposta do Sr. Perestrello:

«Quem lho responder, precisa estar de ponto quinze dias! Entretanto o que podo affirmar ao Sr. Montenegro, é que as receitas estão calculadas conformo os preceitos e as despesas com a verdade dos factos, e se assim não é, então não sei o que se devo pensar!...»

Quanto a mim, não quero outra auctoridade. A accusação do illustre Deputado ahi fica a resposta. Com isto não quero dizer que fique resolvido em absoluto que o Orçamento está bem ou mal calculado, visto que é um documento de provisão, porem, o que sei, o que vejo, é que o país é elastico nas suas receitas e que esta lei deriva do desenvolvimento da sua vida economica, o que vejo é que o seu credito é cada vez maior.

Como está, pois, feito o Orçamento?

Com toda a exactidão, que é possivel.

Esta é que é a verdadeira conclusão, ou a logica não é nada.

Mas, Sr. Presidente, estas discussões teem sido magnificas para o meu partido, porque o teem avigorado e dado toda a força, pois tem sido pela acção parlamentar que os seus soldados, só teem affirmado o adquirido novos elementos de vida. É no parlamento, no meio da luta, que melhor se manifesta a intelligencia, o valor intellectual, a verdade; é nelle que se vê o muito que ha a esperar dos oradores que teem falado. Podo um e outro lado da Camara ser accusado do fazer política partidaria, mas o que nenhum de V. Exa. será capaz num momento de perigo, de difficuldades, é o de deixar de ser patriota, de pensar que é filho da mesma terra, que possue a mesma historia, que é herdeiro dos que estiveram em Aljubarrota, dos que descobriram o caminho para a India. (Apoiados).

Sim, S. Exas. são incapazes de não se unirem uns aos outros o de salvar era commum o pais,, ir para deante.

Isto é que é a verdade. (Apoiados). É esta a minha convicção, e o que estou dizendo não é mais do que fazer justiça a quem a merece. "Numa questão d'esta ordem não ha progressistas nem regeneradores, ha só portugueses. (Apoiados).

Quanto ás aggressões do S. Exa. ao partido regenerador, não teem razão de ser.

O meu partido, Sr. Presidente, tem pela administração publica se não mais tanto zelo como a opposição o pode Sor. Estendo-lhe d'aqui a minha mão, com a convicção do

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que s. Exas. não teem mais amor á patria do que outro qualquer de nós. Por consequencia, digo, animem-se uns aos outros que é um grande mal não ter animo, como é um grande infortunio para um pais perder a moralidade, cair no desalento. Tenham animo e crenças, porque a administração do pais não está tão mal como lhes parece. A vontade de todos ha de fazer resurgir o nosso pais como nação bem governada. Dificuldades como as nossas, outras nações as teem atravessado, e nem por isso os seus homens publicos teem desanimado.

Nesta convicção estou, pois, do que os Srs. Deputados da opposição não tendo com que fundamentem as suas continuadas aggressões contra o partido regenerador, não teem razão para dizer que elle administra mal, esbanjou a Fazenda Publica.

Sr. Presidente: a opposição pode não ter as mesmas idéas de administração, mas o que nunca deve perder de vista, é que o pais vão conquistando um melhor estado financeiro, e que sob este aspecto o sen bom nome ainda ha de ser pronunciado com orgulho entre as nações civilizadas do mundo.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem, muito bom.

(O orador foi muito cumprimentado).

O Sr. Eusebio da Fonseca: — Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. se digne consultar a Camara sobre se consente que a sessão seja prorogada até só votar o capitulo em discussão. = Eusebio da Fonseca.

Foi approvado.

O Sr. Pinto dos Santos: — Comprehende-se a difficuldade que deve ter, tomando a palavra, nesta altura da sessão; resumirá, porem, tanto quanto possivel, o que tem a dizer.

Em primeiro logar, seja-lhe permittido dirigir as suas felicitações ao orador precedente, com cuja amizade se honra, e que já dou mais de uma prova publica dos elevados sentimentos, que distinguem o seu caracter; mas, pela defesa que S. Exa. fez do Governo, ficou convencido de que este é indefensavel, pois que S. Exa. não pôde sustentar as duas affirmações que fez e que são as seguintes: 1.°, que o Governo tem feito uma obra genial; 2.°, que o deficit é ainda menor do que o calculado pelo Sr. Ministro da Fazenda.

Estas duas expressões bastariam para tirar ao discurso do S. Exa. todo o seu effeito.

Considerar genial a obra do Governo!! Considerar que o deficit é inferior a 700 contos de réis!!

Se elle, orador, não fosse velho parlamentar, ainda poderia, acreditar no que S. Exa. disse; sendo-o, porem, tem o direito de dizer que o Orçamento não é um documento serio, sendo por asso, que nem sequer se deu ao trabalho de o ler.

Deu se, em tempos, ao trabalho do estudar o Orçamento; encontrou-lhe, depois, taes arterias, taes veias, algumas que conduziam a cousas tão extraordinarias, incomprehensiveis, que entendeu que o melhor era nem, sequer, lê-lo.

A este proposito, lê o orador alguns trechos de um livro do Sr. Anselmo de Andrade, cujo testemunho reputa insuspeito, por já ter sido Ministro da Fazenda, e que, a seu ver, vêem corroborar aquella sua opinião sobre o Orçamento. Accrescenta que, se lhe fosse licito, proporia o seguinte: que, se o Governo entende que o deficit não podo ser superior a 2:000 ou 3:000 contos de réis, e provando-se que é, sejam confiscados os bens dos actuaes Ministros o estes accusados de reincidentes.

Não apresenta esta proposta a serio, porque, certamente, ella não seria viavel; mas não pode deixar de dizer que tudo quanto se vê na administração publica produz uma profunda impressão de tristesa.

Tivemos, em 1891, uma crise lamentavel, que trouxe a necessidade de impor sacrificios aos funccionarios publicos, de deixar do pagar aos credores externos e internos; e depois do tudo isto, as despesas publicas, em vez de diminuirem, num periodo certo, estavam, não só superiores, mas augmentavam, em proporções cada vez maiores.

Causa, pois, profunda tristeza o ver que nem ao menos as provações de 1891 nos aproveitaram, para d'ahi tirarmos uma lição condigna.

Chegámos a tal ponto, que um illustre membro da maioria já fez a apotheose do deficit, mostrando que as nações modernas não podem viver sem deficit, como consequência necessaria da civilização.

Os deficits dos outros países, porem, não teem comparação com os nossos. O deficit do nosso pais representa, tambem, um deficit de moralidade; não representa senão um periodo de esbanjamentos, e do pouco cuidado ha administração dos negocios publicos.

A par d'isto, o que faz a nação? A nação está, evidentemente, trabalhada por crises diversas: a vinicola, a algodoeira, a corticeira, a operaria. Não é ainda bastante para que se possa protestar, mas é bastante, já, para que devamos attender-lhes, a fim de evitarmos que um movimento qualquer popular, nos colloque em más condições.

As finanças publicas atravessam um periodo difficil. Ainda que a riqueza publica se desenvolva, sem necessidade do auxilio do Governo, ainda assim, elle, orador, considera que o pais atravessa uma época difficil, e que o deficit ha de ser extraordinario. O Governo, porem, pensa de forma differente, e assim é justo fazer-lhe a seguinte exigencia:

Ninguem ignora que, em 1892, quando o Sr. José Dias Ferreira lançou impostos pesadissimos, alguns recairam sobre os funccionarios publicos, a quem foram feitas deducções extraordinarias nos seus vencimentos.

Sendo funccionario publico, não se intimida elle, orador, de vir á Camara representar essa classe, dizendo aquillo que pensa e perguntando porque não se elimina essa disposição da lei de 1892. Hoje que o Sr. Ministro da Fazenda, se apresenta como querendo matar o minotauro, é de justiça que se attenda aos que foram prejudicados nos seus interesses e direitos. Os credores, tantos externos como internos, já hoje reclamam o que lhes pertence; portanto elle, orador, vem, tambem em nome dos funccionarios publicos, pedir que lhes seja dado o que lhes pertence.

Alem d'isso, é necessario pôr cobro á numerosa e quotidiana nomeação de empregados publicos, evitando que continuem passeando, por toda a parto, esses parasitas que nada fazem, mas que são retribuidos.

O Governo tem muito que fazer; a questão é querer. Diminua, por exemplo, as despesas publicas, cerceando todos os serviços inuteis, remodelando as pautas das alfandegas, com relação a muitas industrias, que teem protecção e nada produzem; reformando o imposto de consumo, para que certos generos não paguem imposto tão pesado, e remodelando tambem a instrucção primaria, para dar-lhe um caracter mais pratico, e do mesmo modo a instrucção secundaria. De tudo isto depende a prosperidade do país.

Em face de tudo quanto acaba de expor, é bom que não se tenha o sorriso de Voltaire, e não se diga: mentez, mentez toujours! Se isso se fizer, as responsabilidades hão do ser tremendas.

Oxalá que o Governo, em frente das enormes responsabilidades que tem sobre si, na crise dolorosa que atravessamos, não pratique, na resolução do futuro convenio, um acto de tal ordem que nos envergonhe; porque não haverá, então, braços do Hercules, que possam levantá-lo

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20 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

da situação ora que ficará collocado, e em que ha de me recer a, condenação do todo o país.

(O discurso será publicado da integra quando o orador o restituir).

O Sr. João Faria: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeira a V. Exa. se digne consultar a Camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida. = João Faria.

Foi approvado.

O Sr. Fuschini: - Peço a V. Exa. o obsequio do inundar ler a inscripção.

O Sr. Presidente: — Só V. Exa. está inscripto.

Foi approvado o capitulo 2.° do Orçamento Geral do Estado.

O Sr. Presidente: - Chamo a attenção da Camara.

Pela ordem da inscripção dos avisos previos, seguia-se ámanhã um do Sr. Deputado Fuschini. A materia, porem, d’esso aviso o do outros é semelhante a um assumpto já aqui tratado, e cobre o qual o Governo julgou inopportuna a discussão.

Por esse motivo, vou mandar ler esses avisos previos, e em seguida consultar o Governo sobre se julga opportuna a discussão d'elles.

O Sr. Faschini: — Peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Agora não lhe posso dar a palavra.

O Sr. Fuschini: — Antes da discussão, dê-me V. Exa. a palavra.

O Sr. Presidente: — Não ha discussão.

O Sr. Fuschini: — V. Exa. não pode alterar o Regimento d'esta casa.

O Sr. Presidente: — A forma para alterar o Regimento está no proprio Regimento.

Leram-se no mesa os avisos premios do Sr. Fuschini.

Avisos previos

Em 25 de janeiro, ao Sr. Ministro da Fazenda, para perguntar se o Sr. Ministro ou o Sr. Director Geral da Contabilidade Publica, Pereira Carrilho, agente privativo do mesmo Ministro no estrangeiro, como se deprehende da resposta a este respeito dada na Camara dos Pares por S. Exa. o Sr. Presidente do Conselho ao digno Par Dantas Baracho, ofereceram ou admittiram o principio da consignação especial dos rendimentos das alfandegas nacionaes para a divida externa, em completa contradicção com as dignas e justas declarações officiaes feitas, e mais do uma voz repetidas, pelo illustre chefe do Governo, o Sr. Hintze Ribeiro.

Em 25 de janeiro, ao Sr. Presidente do Conselho. — Devendo prolongar-se, ainda por bastantes dias, a convalescença do Sr. Ministro das Obras Publicas, felizmente em via de franco restabelecimento, e considerando eu muito urgente o importantissimo o assumpto do meu aviso previo — sobre a arbitragem nas reclamações da empresa constructora do porto do Lisboa — apresentado na sessão de 8 de janeiro corrente, e o primeiro que devia ter sido realizado, rogo a V. Exa., Sr. Presidente da Camara, a fineza do solicitar do Exmo. Sr. Presidente do Conselho a honra de acceitar o meu referido aviso previo; e sendo assim de marcar dia proximo para a respectiva realização.

Em 28 de janeiro, ao Sr. Ministro da Fazenda: — Affirmam alguns jornaes financeiros estrangeiros que, entre o representante do Governo Português e o comité allemão, se chegou a urna solução provisoria sobre a divida externa, collocada na Allemanha, nas seguintes bases:

1.ª Reducção da taxa do juro primitivo, dos titulos de 4,5 por conto a 2,25 por conto, isto é, a metade.

2.ª Reducção de 25 por cento no respectivo capital nominal.

3.ª Amortização por sorteio e reembolso como até aqui, ao par.

4.ª Consignação dos rendimentos das alfandegas.

Nestas condições, exercendo os impreteriveis deveres de representante da nação, desejo fazer as seguintes perguntas ao Sr. Ministro da Fazenda:

1.ª Quem é actualmente o representante de Portugal, perante os comités?

2.ª O futuro juro dos titulos determina-se, applicando a taxa reduzida 2,25 por cento ao valor nominal primitivo ou ao reduzido?

3.ª Na amortização por sorteio o reembolso a par é como até aqui, pelo primitivo valor nominal ou pelo valor reduzido?

4.ª Foi de facto concedida a consignação dos rendimentos das alfandegas, e ainda a declaração de titulos previlegiados de 1.º grau aos titulos existentes da divida externa?

5.ª Pensa S. Exa. que o Thesouro Publico e as condições economicas do país comportam a elevação do encargos por estas concessões, feitas á divida na Allemanha, que teem de ser applicadas á divida em França e em Inglaterra?

Em 30 de janeiro, ao Sr. Ministra da Fazenda: — Não me tendo a Camara concedido licença para usar da palavra com urgencia sobre o seguinte assumpto, rogo a V. Exa., Sr. Presidente, a fineza de communicar a S. Exa. o Ministro da Fazenda este aviso previo:

Constando que o agente privativo do Sr. Ministro da Fazenda em discussões com os comités estrangeiros, acêrca da divida externa, se não offereceu, tambem não repelliu, que o principio da consignação dos rendimentos das alfandegas, comprehendesse as do todas ou de algumas colonias portuguesas;

Considerando que, sendo o principio da consignação das alfandegas inadmissivel sob todos os aspectos, a applicação d'este principio ás alfandegas coloniaes envolve ainda gravissimos inconvenientes e serios perigos de outra natureza;

Considerando, finalmente, que o Sr. Ministro da Fazenda se obstina em manter-se silencioso, reservando-se apenas para dar explicações quando os factos estiverem consummados, e nada mais restar do que tomar-lhe a responsabilidade politica dos seus actos, por que as leis portuguesas não permittem tomar contas aos funccionarios da ordem de S. Exa., e quando o permittissem, a pena poderia castigar o delicto mas não salvaria o pais das consequencias dos actos praticados:

Peço a V. Exa., Sr. Presidente, que me conceda licença para expor ao pais e á Camara as minhas opiniões sobre este assumpto, o que é dever meu, como representante da nação e não pôde envolver o menor inconveniente de ordem externa, visto serem opiniões individuaes de um cidadão, que não tem a menor ingerencia, salvo a sua acção de Deputado, sobre a administração publica.

O Sr. Fuschini: — Peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Não dou a palavra a V. Exa.

A razão por que mandei ler os avisos prévios do Sr. Fuschini, foi para consultar o Governo se julga ou não opportuna a discussão d'elles.

O Sr. Ministro da Fazenda (Mattozo Santos): — Sr. Presidente, não tenho senão que repetir, mais uma vez, a declaração que já tive a honra de fazer nesta casa do Parlamento.

O Governo julga, por agora, inconveniente e inopportuna, qualquer discussão referente a credores ou portadores da divida externa portuguesa. (Apoiados).

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SESSÃO N.° 33 DE 12 DE MAEÇO DE 1902 21

O Sr. Fuschini: — Peço a, palavra para discutir a resposta do Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. Presidente: — Não posso dar a palavra a V. Exa.

A mesa, em vista da resposta do Governo, adia sine die a discussão d'estes avisos previos.

O Sr. Fuschini: — V. Exa. não me dá a palavra?

Isso é uma violencia!

O Sr. Presidente: — V. Exa. pôde appellar para a Camara, a quem eu submetterei a sua reclamação.

O Sr. Fuschini: — Peço a palavra para explicações.

O Sr. Presidente: — Não ha agora explicações.

O Sr. Fuschini:— Deixo consignada nos annaes parlamentares esta violencia, feita a proposito do convenio com os credores externos.

O Sr. Presidente: — Mais uma vez digo, que fica adiada, sine die, a discussão d'estes avisos previos.

Ámanhã ha sessão de manhã.

A ordem do dia é a mesma que vinha dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram 6 horas e 60 minutos da tarde.

Documentos mandados para a mesa nesta sessão Representações

De diversas associações de classe de differentes industrias, pedindo que as pautas alfandegarias sejam alteradas de maneira a garantir o desenvolvimento da industria nacional.

Apresentada pelo Sr. Presidente da Camara, Matheus Teixeira de Azevedo, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do Governo.

Da Camara Municipal do concelho de Silves, districto administrativo de Faro, pedindo a prohibição da saida de qualquer cortiça, que não seja cozida, raspada e recortada; prohibição da saida de todas as cortiças enguiadas, bem como dos pedaços que não attinjam 20 centimetros em quadrado; realização de tratados de commercio, tendentes ao desenvolvimento da industria rolheira.

Apresentada pelo Sr. Deputado Magalhães Barras, enviada á commissão de agricultura e mandada publicar no Diario do Governo.

Da União Velocipedica Portuguesa, contra a pesada tributação a que está sujeita a velocipedia em Portugal.

Apresentada pelo Sr. Deputado Vellado da Fonseca, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do Governo.

Dos alumnos do curso irregular de pharmacia, pedindo sejam feitas varias alterações nas disposições transitorias da ultima proposta de lei que reorganiza o ensino de pharmacia.

Apresentada pelo Sr. Deputado Oliveira Mattos e enviada ás commissões se ensino superior e especial, de saude e de fazenda e mandada publicar no Diario do Governo.

Justificação de faltas

Declaro que tenho faltado ás sessões da Camara, por motivo de doença. = Rodrigo A. Pequito.

Para a acta.

O redactor = Barbosa Colen.

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