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ORDEM DO DIA.

Eleição de Commissões.

O Sr. Presidente: — Segue-se a Eleição da Commissão de Marinha que é composta de 7 Membros, e todas as que agora se seguem, são tambem de 7 Membros. Podem os Srs. Deputados formar as suas listas.

Corrido o escrutinio, e tendo entrado na urna 95 listas das quaes 4 eram brancas e 3 inuteis, saíram eleitos com maioria absoluta

Os Srs. Barão de Lazarim com.........87 votos.

Silva Cordeiro...............78

Leão Cabreira................55

Pegado......................53

Arrobas.....................52

S. J. da Luz................48

O Sr. Presidente: — Vai proceder-se a novo escrutinio para a eleição de um Membro que falla para essa Commissão.

O Sr. Cunha Pessoa: — Sr. Presidente, como nós temos a metter na lista um só nome, que falla para a Commissão de Marinha, parece-me izempto de confusão, que ao mesmo tempo que se lança na urna uma lista com esse nome, se lançasse em outra urna uma lista contendo os nomes da Commissão immediata que é a Diplomatica (Apoiados).

O Sr. Presidente; — Se não ha observação nenhuma contra o que propõe o Sr. Cunha Pessoa, vou submetter a sua Proposta á votação (Apoiados)

Assim se resolveu

Corrido o escrutinio verificou-se terem entrado na urna da esquerda, para a eleição de um, Membro da Commissão de Marinha, 90 listas, das quaes 5 foram brancas, e. 1 inutil, sahindo eleito por ser o mais votada,

O Sr. Salvador França com......... 41 votos.

Corrido o escrutinio para a eleição da Commissão Diplomatica, entraram na urna da direita 90 listas, das quaes 11 eram brancas e 2 inuteis — maioria absoluta 46, sairam eleitos

Os Srs. Teixeira de Sampaio com.......71 votos.

Cunha.......................67

Conde da Louzã..............63

D. R. de Menezes.............63

Carlos Bento................61

Faustino da Gama............61

Visconde de Monção...........51

O Sr. Arrobas: — Sr. Presidente, como faltam só 2 Commissões a eleger, queira v. Ex.ª consultar a Camara, se approva que se elejam simultaneamente, como agora se acabou de fazer.

O Sr. Presidente: — Queiram os Srs. Deputados tomar os seus logares para se verificar se ha numero na Caza j (Pouza).

Não ha numero na Caza. A hora está a dar — a ordem do dia para a Sessão seguinte e a discussão da Resposta ao Discurso da Corôa, e depois eleição de Commissões. Está fechada a Sessão — Eram quatro horas da tarde.

O REDACTOR

José de Castro Freire de Macedo.

N.º 15.

SESSÃO DE 22 DE FEVEREIRO 1853

Presidencia do Sr. Silva Sanches

Chamada: — Presentes 81 Srs. Deputados. Abertura: — Ao meio dia. Acta: — Approvada.

O Sr. Presidente — Acha-se nos corredores o Sr. Deputado Cezar de Vasconcellos: os Srs. Conde da Louzã, e Costa e Silva lerão a bondade de o introduzir na Sala.

Introduzido logo prestou o Juramento, e tomou assento.

O Sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — No extracto da Sessão de Sabbado, publicado no Diario do Governo de hontem, vem um engano: dá-se como tendo faltado á Sessão desse mesmo dia, sem causa, o Sr. Secretario Tavares de Macedo, quando aliàs elle havia participado á Mesa, que não podia comparecer no principio da Sessão, mas que viria depois, se lhe fosse possivel.

CORRESPONDENCIA.

Officios. — 1. Do Ministerio da Guerra, enviando uma Proposta de Lei, a fim de ser auctorisado o Governo a garantir ao Tenente Coronel, que foi do Exercito Hespanhol, Manoel Alvares, o posto de Tenente Coronel reformado do exercito. —, A Commissão de Guerra.

2.º — Do mesmo Ministerio, enviando outra Proposta de Lei, auctorisando o Governo a restituir Antonio Manoel Nogueira ao posto de Alferes de Cavallaria do exercito.

A mesma Commissão.

3. — Do mesmo Ministerio, enviando igualmente uma Proposta, a fim de ser submettido á approvação da Camara o Decreto de 27 de Dezembro do anno passado, pelo qual se concedeu a D. Maria José de França Tovar da Costa, Condessa de Fonte Nova, a pensão annual e vitalicia de l:440$000 réis, em recompensa dos muito distinctos serviços de seu fallecido marido, o Tenente General, Conde do mesmo titulo; passando o Montepio, a que a referida Condessa tem direito, a ser repartido igualmente pelas suas duas filhas, D. Maria Ritta de Oliveira Pinto de França, e D. Maria de Oliveira Pinto de França.

A Commissão de Fazenda.

4. — Do Ministerio da Marinha, pedindo á Camara que se designe dia e hora, em que possa ler

sessão de 22 de fevereiro.

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logar Sessão Secreta, para lhe submetter tanto o Tractado, a que o Governo foi convidado a acceder, e foi assignado em Londres aos 8 de Maio de 1852, por parte dos Representantes da Austria, Gram-Bretanha, Prussia, Russia, Suecia e Dinamarca relativamente á Successão Eventual á totalidade dos Estados actualmente reunidos debaixo do Sceptro de S. M. Dinamarqueza, como á Convenção Postal ultimamente concluida entre Portugal e a Belgica; cumprindo assim o que se dispõe no Acto Addicional.

O Sr. Presidente: — Depois se tractará de designar hora e dia para ter logar a Sessão Secreta, e assim se communicará aos Srs. Ministros.

Declaração. — A Commissão Ecclesiastica constituiu-se e nomeou para seu Presidente o Sr. Cardoso Castello Branco, para Relator o Sr. Alves Martins, e para Secretario o Sr. Dias e Sousa. « — Inteirada.

SEGUNDAS LEITURAS.

Proposta. — ti Proponho que se nomeie uma Commissão Especial para rever a Carta de Lei de 22 de Junho de 1846, sobre Foraes; que esta Commissão seja de 5 Membros, sendo eleita pela Camara, — Pinto de Almeida.

O Sr. Cardoso Castello Branco: — Sr. Presidente, não me parece nem regularmente nem mesmo constitucional a maneira porque o illustre Deputado quer usar do seu direito de iniciativa. Eu não digo que a Lei de 22 de Junho de 1846 não tenha defeitos, lerá alguns; comtudo ella foi feita por pessoas muito competentes com o devido exame, e parece-me que não se póde pedir que se nomêe uma Commissão para examinar os seus defeitos sem allegar quaes elles são (Apoiados) Se o illustre Deputado intende que esta Lei tem defeitos, apresente o Projecto e diga — Esta Lei tem estes e aquelles defeitos, e deve ser emendada desta e daquella maneira — mas pedir que se nomêe uma Commissão para examinar os defeitos de uma Lei não me parece parlamentar, não me parece mesmo conforme ao que dispõe a Carta Constitucional. Se assim fosse, Senhores, era escusado haver iniciativa; qualquer Deputado podia dizer — Nomèe-se uma Commissão para esta ou aquella Lei — e eu seria o primeiro a propôr tambem que uma Commissão se nomeasse para examinar todas essas Leis que foram feitas depois de 1834. Isto, Sr. Presidente, tem grandes inconvenientes. Eu conheço que a Lei tem alguns defeitos, e tencionava apresentar um Projecto de Lei para evitar aquelles que me parece que ella tem, e outros mais lerá ella além daquelles que eu lhe descobri; mas nomear-se uma Commissão para examinar sem mais nem mais uma Lei, parece-me que não é conforme áquillo que dispõe a Carta Constitucional a respeito da iniciativa dos Deputados. Eu portanto rejeito a Proposta.

O Sr. Pinto d'Almeida: — Eu fiz uma Proposta para se nomear unia Commissão para rever a Lei de 22 de Junho de 1846, porque intendi que fazia um grande serviço, e que fazia um grande serviço por aquillo que acabo de ouvir: o illustre Depilado acaba mesmo de dizer que a Lei lm grandes defeitos. lista revisão que eu peço, é uma materia muito espinhosa, e um homem só não o julgo bastante para fazer remediar os defeitos da Lei, que o illustre Deputado por Lisboa reconhece que tem. Se fiz esta

Proposta, foi por ver já um precedente na Camara passada, supponho que na Sessão de 6 de Março de 1852, em que o meu nobre Amigo o Sr. João Feio Soares de Azevedo, e bem assim mais dois Srs. Deputados, o Sr. Alves Vicente, e outro de que me não lembra o nome, pediram que se nomeasse esta Commissão para rever a Lei. Julgo que com este precedente a Camara deveria decidir-se pela minha Proposta.

Eu cumpri com um dever, e cumpri com este dever, porque pertenço a um Districto aonde ha uma guerra viva entre os Senhorios e os Enfiteutas, aonde, Sr. Presidente, posso dizer a v. Ex. que os Enfiteutas são ordinariamente victimas desta guerra, porque tenho visto a maior parte delles ficarem até sem a camiza do corpo, pedindo-se a maior parte das vezes fóros que não deviam ser cobrados, e que foram extinctos pelo Decreto de 13 de Agosto de 1832, e pedindo-se fóros que elles muitas vezes não podem pagar; porque a producção que lhes dão as fazendas que elles lêem, não lhes dá em proporção para poderem pagar os fóros. Eu sei de um parzo que pagava dantes 150 alqueires de azeite, e sei que as pessoas que possuem este prazo, desde 1831 até hoje não tinham tido esses 150 alqueires de azeite que devem pagar, o prazo não lhos tinha dado. Qual será melhor nomear-se uma Commissão para evitar estes defeitos combinando a Lei com o Decreto de 13 de Agosto, ou deixar continuar as coisas neste estado? Vão processos ás Relações, processos identicos, divergindo tão sómente no nome do Enfiteuta, e muitas vezes nem mesmo divergindo no nome do Auctor, e ve-se por differentes Juizes julgar por differentes maneiras. Vê-se um Juiz dizer — As rações estão extinctas; — outros dizem; — As rações devem-se pagar; — uns dizem — Bens da Corôa são taes e taes bens; — e outros diversificarem.

Por consequencia eu cumpro com um dever. Para mim é indifferente que a Camara eleja ou não a Commissão, o que quiz foi dar uma satisfação ás pessoas que me elegeram, porque foi este um dos esforços que me pediram que fizesse para ver se cessavam os males que se seguiam da Lei. Vejo em Coimbra, aonde tenho advogado á falla de gente, que ahi a maior parte das vezes, na maior parte das audiencias do Juiz de Direito não se distribuem causas senão de fóros, e vejo que o resultado é sempre contrario aos Enfiteutas, é os Enfiteutas ficarem debaixo.

O Sr. Barão d'Almeirim: — Sr. Presidente, levanto-me unicamente para sustentar a opinião que acaba de emittir o Sr. José de Moraes, Auctor da Proposta; e levanto-me porque o Sr. José de Moraes se referiu simplesmente ao Circulo pelo qual foi eleito, mas as mesmas circumstancias que se dão para aquelle Circulo, dão-se em geral para todo o Paiz. O Circulo de Almeirim pelo qual fui Deputado, existe em identicas circumstancias, que reclamam muito seriamente com toda a brevidade possivel que o Parlamento se occupe deste objecto, porque é dos negocios mais transcendentes para o Paiz.

Esta Lei, Sr. Presidente, tem trazido no Paiz centenares, milhares mesmo de questões que ainda hoje existem, e que têem levado muitas familias que viviam em abundancia, a estarem hoje reduzidas á miseria e á fome, e isto por falla de clareza nas Leis que se lêem promulgado sobre este objecto. Em consequencia eu reforçando todas as razões apresentadas

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pelo illustre Orador que acabou de fallar, peço que v. Ex.ª ponha a sua Proposta á votação da Camara; e espero que a Camara compenetrando.se bem da necessidade que os povos lêem de ver este negocio plenamente esclarecido, approve que se nomeie esta Commissão especial. Isto não é de modo nenhum deixar de dar toda a consideração á Commissão de Legislação; a Commissão de Legislação é effectivamente composta de caracteres os mais aptos, os mais proprios para aquella Commissão; mas ha de ter muitos objectos de que se occupar, e este é um negocio que dá bastante que fazer a uma Commissão especial, e esta Commissão lerá bem servido, lerá bem merecido da Patria se em pouco tempo puder dar um resultado satisfactorio sobre este objecto.

Por consequencia intendo que a Proposta do Sr. Deputado José de Moraes Pinto de Almeida deve ser admittida por todas as circumstancias de conveniencia publica que eu acabo de ponderar, e mesmo porque a favor della ha já os precedentes não só da Camara passada, mas mesmo de outras Camaras anteriores em que se nomearam Commissões especiaes para tractarem deste objecto.

O Sr. Cunha Sotto-Maior. — Eu conheço a importancia do objecto, mas parece-me que este negocio mesmo pela sua gravidade e importancia exige a presença do Ministerio para se resolver. Nomêe-se muito embora a Commissão, não me opponho, mas antes disso o Ministerio deve estar presente para ser ouvido. A practica e a experiencia leiu mostrado que as Commissões não resolvem nada; e nomear a Commissão para não fazer; cousa nenhuma, é melhor não a nomear. Eu não me opponho á nomeação da Commissão, torno a dizer; mas se o Sr. Deputado quer conseguir algum resultado da sua Proposta, parece-me prudente, rasoavel que proponha o Adiamento da sua questão até que seja convidado o Ministerio para ouvir as explicações do Sr. Deputado; porque a fallar a verdade se esta Legislação sobre Foraes tem produzido inconvenientes, tambem tem produzido algumas vantagens, e é necessario saber se as vantagens compensam os inconvenientes. ]Ja duas partes interessadas — os lesados e os beneficiados: — vamos a ver se os beneficios a uns compensam os vexames a outros. E em tal situação é o (Governo quem póde subministrar os esclarecimentos á Camara debaixo deste ponto de vista.

Portanto proponho que o Governo seja ouvido antes de a Camara nomear a Commissão. Se v. Ex.ª quer que eu mande esta Proposta por escripto, mandal-a-hei; porém ella é tão simples que não será isso necessario.

O Sr. Pinto de Almeida. — Não posso concordar com o Adiamento que propõe o illustre Deputado, porque intendo que o Ministro da Fazenda nada tem com a nomeação da Commissão. O Sr. ministro da Fazenda o que poderia ler com este negocio era depois de nomeada a Commissão.... (O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Não fallei no Sr. Ministro da Fazenda, fallei no Ministerio) O Governo não tem nada com a nomeação da Commissão, depois de nomeada, e quando se tractar de fazer o Projecto ou a revisão do Decreto de 22 de Junho de 1816, então intendo que a Commissão ouça o Governo para irem de commum accordo e fazerem assim melhora reforma da Lei, mas no Adiamento não concordo.

Aproveito esta occasião para lêr o que se passou na Sessão de O de Março 1852. Foi isto (Leu)

O Sr. Tavares de Macedo: — Sr. Presidente, a nomeação de uma Commissão para rever e emendar uma Lei sem se dizer á mesma Commissão o que ha de fazer, e os pontos de que deve encarregar-se, parece-me inconveniente e inutil. E quando ha negocios de natureza daquelle de que se tracta que é importante, pois versa sobre a materia complicadissima de Fóros, a primeira necessidade é fazer um inquerito, por uma ou outra fórma, seja ella qual fôr; mas pelo qual se conheça quaes são os verdadeiros inconvenientes que apresenta a Legislação existente, quaes são os seus defeitos. Ora se se nomear uma Commissão como se propõe, que certeza temos nós de que esses individuos que a compuseram teem todos os acontecimentos especiaes e necessarios, apezar de serem muito habeis, para reformarem a Legislação que se pertende reformar?.. Diz-se — Reforme-se essa Legislação — mas reforme-se em que.'.. A primeira condição é apontar os defeitos — dizer — taes e taes. pontos precisam reformados, e taes e lues remedios é que se lhes devem applicar. Apontem-se pois os inconvenientes, e proponham-se os remedios (Apoiados) para emendar esses inconvenientes. (Apoiados) Nomear-se a Commissão é o mesmo que não fazer nada: a Commissão nada póde fazer. Por consequencia parece-me inconveniente e inutil a nomeação da Commissão. (Apoiados.)

O Sr. Pinto de Almeida: — As razões apontadas pelo nobre Deputado não provam nada. Disse o nobre Deputado — Que é necessario apontar primeiro os defeitos da Lei — Todo o mundo os conhece; e até um illustre Deputado o Sr. Cardoso Castello Branco que fallou contra a minha Proposta, confessou ha pouco que a Lei tinha defeitos; sendo para vêr se ella os leiu ou não que se nomeia a Commissão. Se a Commissão achar que a Lei de 22 de Junho de 1846, tem defeito, aponta-os e propõe as competentes emendas; e se achar que os não tem, continua a vigorar a Lei de 22 de Junho de 1846 tal como está; intendo pois que a Camara não deve escusar-se a nomear a Commissão para o fim que indiquei na minha Proposta.

O Sr. Presidente: — O Sr. Cunha Sotto-maior pediu que esta questão ficasse adiada para quando estivesse presente o Ministerio. Vou consultar a Camara sobre este pedido.

Não foi approvado.

E pondo logo á votação a

Proposta do Sr. Pinto de Almeida — foi rejeitada.

O Sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — O Sr. Custodio Gomes acaba de mandar para a Meza a seguinte declaração: Declaro que foi por doença que deixei de concorrer ás duas ultimas Sessões e á Solemnidade que hontem teve logar na Sé Patriarchal de Lisboa.»

Tambem a Meza acaba agora de receber um officio de Joaquim Pereira da Costa, Presidente da Direcção do Banco de Portugal acompanhando 100 exemplares impressos da Representação dirigida a esta Camara no dia 11 do corrente pela mesma Direcção. — Mandam-se distribuir.

Entrou o Ministerio.

Por um movimento espontaneo, a Camara interrompeu os trabalhos, e grande numero de Deputados de todos os lados da Camara, se dirige ao Sr.

VOL. II — FEVEREIRO — 1853.

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Duque de Saldanha, Presidente do Conselho de Ministros, felicitando-o pelas suas melhoras., Continuaram as segundas leituras.

Projecto. — A primeira o mais segura base da felicidade publica consiste incontestavelmente na publica moralidade; e não é menos incontestavel que os dois firmes poios da luminosa esfera são, por um lado, o. premio para a virtude, e a recompensa para os bons serviços; e pelo outro, — o castigo para o crime, e a correcção para os abusos. I

Existem em Portugal instituições e regras, boas, ou más, bem, ou mal observadas, mas existem, no que respeita a castigos e correcções; porém nenhuma ha, ou, pelo menos, nenhuma regularmente se segue, no que toca a premios e recompensas.

Temos accusadores, Tribunaes, e Juizes publicos para conhecer dos crimes e abusos, e faze-los devidamente castigar, e corregir; mas não temos nem Informadores certos, nem Tribunaes competentes, nem Juizes determinados para proporcionar premios á virtude, galardão, ou verdadeiro merito, e recompensa aos bons serviços, e ninguem se atreve com tudo a duvidar da igualdade da importancia de um e outro objecto.

Sempre que o Imperante, em nosso Paiz, se resolve por actos de clemencia a perdoar culpas, ou a modificar penas impostas por Juizes proprios, e em conformidade das Leis, a quaesquer miseraveis criminosos, não o practica, de ordinario, sem que proceda Proposta do Ministro competente, e Parecer ou Consulta do seu Conselho de Estado. E será, por ventura, menos util, menos magestoso, ou menos recommendavel o acto de galardoar o merito, premiar a virtude e recompensar os bons serviços?... Por certo que não. Logo como é que se seguem tantos, e Ião considerados passos para aquelle menos attendivel objecto, e nenhum determinado caminho para este?!...

Vejamos agora qual é a practica actualmente seguida em nosso Paiz no que se refere a este interessante objecto — premios e recompensas; e os gravissimos inconvenientes que de tão desregrada practica estão todos os dias resultando.

Qualquer ministro da Corôa, guiando-se por informações, que podem ser, e-hão de ter sido muitas vezes exaggeradas e falsas, ou mesmo por se desembaraçar de consideraveis e fastidiosos empenhos, e de importunas sollicitações, consegue um Titulo, uma Carta de Conselho, ou uma consideravel condecoração para pessoas, cujos meritos e serviços, se não são falsos e apparentes, ao menos nunca foram, como deviam ser, devidamente reconhecidos e avaliados: seguindo-se d'aqui, entre outros sensiveis desconcertos, o de se não guardar nenhuma justa proporção entre os meritos e serviços verdadeiros ou suppostos, e as recompensas e premios na dita fórma conferidos.

Além destes graves inconvenientes nascem ainda outros, não menos consideraveis, da II regular maneira quasi constantemente seguida em transmittir ao conhecimento do Publico a existencia das mercês Regias relativas a Um tão transcendente objecto. Verificam-se. taes merces por Decretos, que bem se podem chamar surdos, como alguns que em épocas remotas, e debaixo-de outra fórma de Governo, extraordinariamente se expediam. Por elles ficam sabendo as Secretarias de Estado e os interessados, que as pretendidas merces chegaram a verificar-se; mas o pobre. Publico, esse, não obstante ser obrigado a tributar respeitos, e dar determinados tractamentos aos agraciados, só sabe de sua nova elevação por alguma encommendada noticia dada em particulares Periodicos; por isso que nos Diarios do Governo, e mais Folhas Officiaes, como são as Ordens Geraes do exercito, apenas se publicavam as nomeações de Cavalheiro da Ordem de Aviz, por serem de méra tarifa, e dependerem de habilitações determinadas, guardando-se em tudo, o mais uma especie de misterioso segredo,

Ora, como os Redactores dos ditos particulares Periodicos empregam algumas vezes fantaziadas alcunhas com similhança de Titulos, para designar varios individuos; o Publico, habituado a suas ordinarias facecias, chega já a considerar, e confundir com graciosas alcunhas os verdadeiros Titulos, e outras distincções de nobresa, concedidas nestes proximos tempos; derivando-se d'aqui o quasi geral movimento de hilaridade, que de ordinario se nota quando alguem é designado por Titulo ou distincção honorifica, que na dita fórma lhe fosse modernamente conferida; e não menos o sensivel acanhamento que as pessoas de merito chegam a sentir, quando usam das que dignamente possuem, ou quando se resolvem a pretender as que tem verdadeiramente merecido.

De tudo isso remita ainda mais, o pouco apreço e -diminuia consideração que ao presente se tributa ás condecorações e Titulos de. nobresa; e sobre tudo a teimosa importancia de. muitos individuos, que, sem nenhuns serviços conhecidos, e com suppostos merecimentos, incansavelmente os sollicitam.

E indispensavel pois que o nosso illustrado Governo não perca de vista, que a unica moeda, isto é, o unico meio de que póde dispor para premiar a virtude,. galardoar o merito, e remunerar os bons serviços, consiste apenas nessas distincções, e Titulos ião imprudentemente barateados. Deve lembrar-se de que nos não resta senão aquelle valioso incentivo para despeitar a nobre emulação do merecimento, e animar os bons patriotas a practicar acções e feitos heroicos, proprios do elevado brio de um povo tão distincto e famigerado, como sempre foi o povo Portuguez. É indispensavel evitar, por todas as maneiras possiveis, que os verdadeiros titulos cheguem a confundir-se com ignobeis alcunhas; e que as condecorações e distinctivos de honra desçam até o baixo nivel de insignificantes adornos, ou femenís enfeites. E indispensavel finalmente que todas estas cousas tenham uma significação verdadeira, e um valor moral correspondente aos meritos e serviço de que forem recompensa, e que de alguma fórma os symbolizem e representem.

A Carta Constitucional da Monarchia, titulo 5.º, artigo 75.º, § 2.º, designa como attribuição do Poder Executivo, conceder titulos, honras, ordens militares, e distincções; mas declara que seja em recompensa de serviços feitos ao Estado. Como podem portanto existir taes distincções e recompensas, sem que existam e sejam conhecidos os correspondentes meritos e serviços?... A mesma Carta Constitucional titulo 3.º, artigo 145.º, § 12.º, promette recompensas proporcionadas ao merecimento de cada uni; e pelo § 26.º do mesmo artigo garante o direito adquirido a taes recompensas. De que servirá portanto tal garantia, e tal direito, se não tiverem consideração, nem valor as recompensas de que se tracta?!

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Logo, para de uma vez cessai em os gravissimos inconvenientes que ficam ponderados: para se dar a esta importante alavanca da publica moralidade um movimento uniforme, e um systema capaz de torna-la verdadeiramente util e apreciavel; e, em fim para de alguma fórma libertar os Ministros da Corôa de importunações e empenhos fastidiosos, ou sollicitações interesseiras, e fundadas em apparentes meritos: pareceu-me proprio submetter á alta sabedoria do Parlamento Nacional, e apresentar a esta muito esclarecida Camara, em falla de outras melhores, e mais bem coordenadas idéas, o seguinte Projecto de Lei: Artigo 1.º As mercês de titulos, honras, ordens militares, e distincções, em recompensa de serviços feitos ao Estado, a que se refere o § 2.º do artigo 75.º, titulo 5. da Carta Constitucional da Monarchia, nunca poderão verificar.se, sem que preceda exame e consulta do Conselho de Estado, ou do Conselho Ultramarino, no que respeita ao Ultramar, sobre Proposta do ministro e Secretario de Estado da Repartição a que corresponderem os serviços de que se tracta.

§ 1.º As ditas Propostas poderão, segundo convier, comprehender um, ou muitos individuos, mas serão sempre motivadas, e, se possivel fôr, documentadas, juntando-se-lhes, se existirem, quaesquer Requerimentos, em que tenham pedido as recompensas que se lhes destinarem, ou outras a que se julgarem com direito.

§ 2.º Nas mesmas Propostas se terá sempre muito em vista a doutrina e disposições do titulo 8.º, artigo 115.º, 12.º e 26 da dicta Carta Constitucional, a fim de que os bons serviços não sejam desattendidos, nem deixe de se guardar justa proporção entre os merecimentos e recompensas.

Art. 2.º São incluidas na generalidade do artigo antecedente não só as mercês relativas a serviços pessoaes, mas tambem as que houverem de conceder-se pelos de pais ou avós; ou seja como recompensa directa de; taes serviços, ou sómente para perpetuar, em alguma familia, a honrosa memoria de acções heróicas, e grandes feitos de seus antepassados.

§ unico. As Propostas relativas ao ultimo caso do presente artigo, dependerão sempre do Ministerio do Reino.

Art. 3.º Ficam exceptuadas, e independentes de todas as ditas formalidades, as mercês de titulos e condecorações destinadas a Principes, e outros Estrangeiros recommendaveis, com o fim de estreitar as boas relações de paz e amizade entre a nossa e as suas respeitaveis Nações; e bem assim as que a Corôa tem, e leve sempre a regalia de fazer a subditos Portuguezes em remuneração de serviços domesticos feitos á pessoa do imperante, ou a qualquer das de Sua Real Familia.

Art. 4 º As mercês de fóros de fidalgos da Casa Real continuarão nos casos ordinarios, a depender da Mordomia-Mór da mesma Real Casa, segundo as Leis e estylos até ao presente observados.

§ unico. Nos casos extraordinarios poderão os Ministros incluir em suas ditas Propostas os mesmos fóros de fidalgos, se assim os julgarem convenientes para justa recompensa e memoria de algum importante serviço feito ao Estado, ou para premio de alguma recommendavel virtude.

Art. 5.º Publicar-se-hão nos Diarios do Governo todas as merces que, na fórma da presente Lei,

houverem de fazer-se; e nas Ordens Geraes do exercito as que respeitarem a militares; transcrevendo-se nos mesmos Diarios e Ordens os correspondentes Decretos, ou resumos delles, em que circumstanciadamente se designem assim as mercês concedidas, comer os seus fundamentos, isto é, os serviços e meritos dos aggraciados.

§ 1.º As mercês puramente Regias, de que tracta o artigo 3, desta Lei, visto serem de constante regalia da Corôa, só serão publicadas em resumo, declarando simplesmente que o Imperante, querendo dar uma prova do Seu Real apreço ás pessoas dos-aggraciados, Houve por bem conceder-lhas.

§ 2.º Em quanto se não fizerem as repelidas publicações não lerá effeito nenhuma das indicadas mercês, nem poderão os interessados usar dos correspondentes titulos, condecorações, ou insignias.

Art. 6.º As condecorações, e titulos estrangeiros, acceitos por subditos Portuguezes, com indispensavel permissão do nosso Governo, entrarão na regra geral do artigo antecedente, e do § 2.º delle.

Art. 7.º Fica derogada toda a Legislação em contrario.

Sala das Sessões da Camara dos Deputados da Nação Portugueza, 16 de Fevereiro de 1853 = Frederico Ledo Cabreira, Deputado por Castello Branco = Hermenegildo Gomes da Palma, Deputado pelo Algarve = Antonio Ladisláo da Costa Camarote.

Foi admittido — Mandou-se imprimir no Diario d o Governo — E remetteu-se á Commissão de Legislação.

EXPEDIENTE A QUE SE DEU DESTINO PELA MEZA.

Requerimento: — 1.º Requeiro, que se peça ao Governo, pelo ministerio da Justiça, haja de informar a Commissão, com urgencia, se todas as comarcas do Reino tem Juizes de Direito proprietarios em effectivo serviço; e havendo alguma, ou algumas Comarcas que os não tenha, quaes estas são, e o motivo porque.

Requeiro, que igual informação se peça pelo ministerio de Ultramar, quanto ás Comarcas das Possessões Ultramarinas — Vellez Caldeira. Ao Governo.

2.º Requerimento: — Requeiro que pelo Ministerio da Marinha, se envie com urgencia, a esta Commissão, uma nota circumstanciada de toda a despeza que se tem feito com o fabrico da Não Vasco da Gama; feita de modo que se conheça claramente a despeza referida a cada uma das diversas especies de material empregado, e em que consiste esse material. Assim como que todas as mais partes da despeza sejam divididas e descriptas de modo que esta nota seja uma verdadeira parte do trabalho.

Que despeza avaliam os peritos que fará ainda a conclusão do seu fabrico, o em quanto tempo estará concluido, continuando elle com a intensidade de trabalho que agora existe.

Qual finalmente a opinião das estações competentes, sobre as vantagens e inconvenientes que apresenta aquelle Vaso de Guerra depois de fabricado, considerando tanto em absoluto como em relação ás necessidades de nossa Marinha de Guerra.

Qual é finalmente a duração que se lhe deve calcular até um outro fabrico ou condemnação. Arrobas. lo Governo.

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3.º Requerimento: — Requeiro que se peça ao Governo, que pelo Ministerio da Marinha envie com urgencia a esta Camara, uma nota de toda a despeza que se fez em 1851 a 1852 com o Arsenal da Marinha, distinguindo bem o que pertence a cada uma das devidas especies de material; bem como o que se refere a cada uma das diversas classes de pessoal, e mais despezas que se abonam naquella Repartição. Uma nota de todo o producto do Arsenal da Marinha durante os mesmos annos, especificando as differentes classes do material empregado, em valor, e em que foi empregado. Requeiro o mesmo a respeito da Cordoaria — Arrobas.

Ao Governo.

4.º Requerimento. — Requeiro que se peça ao Governo que pelo Ministerio da Marinha envie com urgencia a esta Camara uma relação nominal de todos os individuos empregados no Arsenal da Marinha e Cordoaria, com designação a respeito de cada um, do emprego que exerce, que vencimento se lhe abona, que tempo tem de serviço no Arsenal e a opinião da Junta de Saude sobre o seu estado de robustez para o desempenho das funcções que exerce, declarando em resultado quaes os que devem ser reformados — Arrobas.

Ao Governo.

O Sr. Justino de Freitas — Mando para a Mesa o seguinte:

Pareceu — A primeira Commissão de verificação de poderes foi presente o diploma do Sr. Francisco Rodrigues Ferreira Casado. Deputado eleito pelo circulo eleitoral da Feira. A commissão e de parecer que se acha legal o referido diploma, e que deve ser proclamado Deputado o mesmo Sr. Francisco Rodrigues Ferreira Ca-ado. Sala da Commissão ti em 22 de Fevereiro de 1853 — Frederico Guilherme da Silva Pereira — Justino Antonio de Freitas — José Maria do Casal Ribeiro — Francisco de Paula Castro e Lemos.

Foi logo approvado.

E em seguida proclamado Deputado o Sr. Ferreira Casado — foi introduzido na Sala com as formalidades do estilo, préstimo Juramento e tomou assento.

O Sr. F. J. Maya: — Peço ser inscripto para repetir a iniciativa de alguns projectos de Lei. — Ficou inscripto.

O Sr. Arrobas: — A Commissão de Marinha acha-se installada, e nomeou para seu Presidente o Sr. Barão de Lasarim, para Secretario o Sr. Salvador Pinto de França, e para Relator a mim. — Peço a v. Ex. me inscreva para apresentar um Projecto de Lei.

O Sr. Moraes Pinto: — Peço igualmente ser Inscripto para apresentar um Projecto de Lei

O Sr. Ottollini: — Peço a v. Ex. tenha a bondade de me inscrever para renovar a iniciativa de um Projecto de Lei.

Ficaram inscriptos.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Duque de Saldanha): — Passo a ler o Relatorio da Proposta relativa aos Actos da Dictadura. (Começou a ler.)

O Sr. Carlos Bento: — Eu vejo que S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho está bastante incommodado; e como os Srs. Ministros costumam ás vezes mandar os Relatorios para a Meza sem os lerem, parecia-me melhor que S. Ex.ª não continuasse a ler, e que o Relatorio fosse lido só na Meza. (Apoiados)

O Sr. Presidente do Conselho — É verdade que estou um pouco mais incommodado do que estava e creio que é por ler saído do quarto mais cedo do que devia, e ler apanhado algum ar. Parece-me que qualquer dos meus Collegas podia continuar na leitura do Relatorio. (Apoiados geraes)

O Sr. Ministro do Reino, Fonseca Magalhães, recebendo o Relatorio das mãos do Sr. Presidente do Conselho, continua a fazer a leitura delle, depois da qual o mandou para a Meza.

O Sr. Presidente: — Será remettido a uma Commissão.

O Sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Como S. Ex.ª acaba de annunciar que serão remettidos a uma Commissão os Actos contendo materia Legislativa que o Governo vem de mandar para a Meza, eu pedia a v. Ex.ª que em attenção á natureza e importancia do objecto, fosse nomeada uma Commissão especial para os examinar. (Apoiados)

O Sr. Mello e Carvalho: — Em Additamento á Proposta verbal que acaba de fazer o Sr. Ministro da Fazenda, proponho — que essa Commissão se limite unicamente a dar o seu Parecer acêrca do destino que se deve dar a cada. uma das medidas da Dictadura, que contendo materia Legislativa o Governo acaba de mandar para a Meza. A Commissão Especial deverá separar essa infinidade de Decretos segundo os diversos assumptos, objectos e fins de cada um delles, dando o seu Parecer sómente a qual das Commissões ordinarias desta Caza elles devem ser remettidos. Não é a primeira vez infelizmente que se apresenta á Camara Electiva grande quantidade de Decretos legislativos promulgado? em Dictaduras; mas nunca houve um tão volumoso feixe de Decretos sobre tão variados e importantes objectos, e promulgados todos em tempos regulares de ordem e tranquillidade publica. Esta tarefa não póde ser desempenhada por uma Commissão Especial, e humanamente impossivel que ella possa satisfazer conscienciosamente uma tão importante. laboriosa e delicada incumbencia por maior que seja a intelligencia, sabedoria, zelo, e mesmo forças dos Membros de que ella se compuzer. Como apreciar circunspecta e maduramente, em tempo limitado, tantas e Ião variadas medidas em que muito vai o bem ou o mal do Paiz? É impossivel, e é impossivel, por que excede as forças moraes e fizicas do homem. A divisão do trabalho não é só um principio de economia, é uma necessidade psychologica e physiologica. E necessario evitar precipitações em tudo; mas ainda muito mais em materias Legislativas, que affectam, sem excepção, a todos os membros da sociedade politica.

Esle trabalho, ainda que improbo, sómente poderá ser desempenhado por diversas Commissões, e não tem ellas pouco que fazer! O methodo do trabalho dividido que proponho <: preferivel ao exame em globo, e reduz esse montão de medidas ás suas proporções mais regulares. Tambem assim melhor se guardam e executam as prescripções constitucionaes que não se devem de maneira alguma preterir.

O Sr. Presidente: — Peço ao illustre Deputado que mande o seu Additamento para a Meza.

O Sr. Mello e Carvalho: — Sim, Senhor, não o

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tenho ainda formulado, o que vou fazer. Sr. Presidente, o Additamento que mando para a Meza e o seguinte:

Proposta — «Proponho em Additamento á Proposta do Sr. Ministro da Fazenda, que a Commissão Especial encarregada de examinar as diversas medidas Legislativas, tomadas pelo Governo na ausencia das Côrtes dê o seu Parecer limitando-se a declarai sómente a que Commissão pertence a apreciação e exame de cada uma das medidas, segundo a sua natureza, e diversos objectos a que respeitam.» — Mello e Carvalho.

(Continuando.) Espero que a Camara, que é prudente e circunspecta, dará a esta minha Proposta o valor que ella per si mesma significa.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Eu, Sr. Presidente, pedi a v. Ex. a palavra, e a dizer a verdade não sei mesmo para que a pedi. Talvez fosse por me lembrar, que no anno passado tambem houve uma Commissão Especial encarregada de examinar os Actos da Dictadura, que nos apresentou um Parecer em quatro linhas, e o trouxe aqui á Camara para nós o approvarmos cegamente. A Commissão d'então apresentou um Parecer ácerca, de 50 Leis em quatro linhas e unicamente para dizer n Camara = Agora approvai este montão de Leis. = E o mesmo que ha de acontecer com a nova Commissão Especial. Mas isto de certo é escarnecer de todas as condições do Systema Parlamentar e do Systema Representativo — Eu proporia que não houvesse Commissão, porque sei que a Commissão que se nomear hade saír da maioria da Camara a maioria approva necessariamente os Actos da Dictadura; logo a Commissão tambem os approvará, e a Camara fará de chancella..

Sr. Presidente, para se mostrar que se anda neste negocio com franqueza e sinceridade, devia a Commissão ser composta do seguinte modo: — lançar os nomes de todos os Srs. Deputados n'uma urna e tirar á sorte tantos nomes quantos fossem os Membros que deviam formar essa Commissão Especial. — De outro modo a escolha é camararia, e essa Commissão escolhida camariamente torna o negocio, por assim dizer, de compadres; nem ha de dar um Parecer para rejeitar -os Actos da Dictadura. E se o desse, se a Commissão é por consequencia a Camara rejeitasse essas medidas, a dissolução da Camara era certa e infallivel. (Vozes: — Ora, ora!) Eu fiz esta mesma profecia a respeito da Camara transacta, e ella realisou-se. Não podeis escarnecer do profeta em quanto não passar o tempo que elle marca para se realisar a sua profecia — Se esta Camara tivera lembrança infeliz de rejeitar as medidas da Dictadura, uma só que seja, ha de ser dissolvida como o foi aquella que não quiz approvar o Decreto de 3 de Dezembro de 1851. — Portanto vós, Maioria, haveis de approvar os Actos da Dictadura. Se locardes nessa area da salvação do paiz, sereis mandados para vossas casas. — E eu que acredito na possibilidade do Systema Representativo, não quero que a Camara sirva segamente de chancellaria a todos os Actos do Governo

Novamente digo que se quizerdes dar um signal de sinceridade no vosso proceder a respeito deste negocio, a Commissão Especial deve ser formada lançando todos os nomes dos Srs. Deputados n'uma urna, e tirar á sorte os que devem composta: não formar essa Commissão Especial segundo os arranjos feitos nos corredores da Camara, ou nas reuniões da Maioria, mas que fosse a expressão generica da Camara e não a indicação do Governo.

O Sr. Nogueira Soares: — Levanto-me pára sustentar a Proposta feita pelo Sr. Ministro da Fazenda. Intendo que é necessario uma Commissão especial para examinar os Decretos da Dictadura, que não podem ser avaliados como os outros Projectos de Lei; nós havemos de avaliar os Decretos da Dictadura conforme a razão politica que os dictou, e não podemos entrar em detalhes de cada uma dessas Leis. Esses Decretos formam um grande livro; são talvez mais de 100 Decretos que abrangem assumptos os mais importantes, que podem existir em um Paiz; podemos nós discuti-los todos como.se discutem os diversos Projectos de Lei que aqui se apresentam? Não podemos, e já na Sessão passada nós seguimos o caminho contrario, isto é, fez-se o mesmo que agora se propôz; nomeou-se uma Commissão como o illustre Ministro agora propôz que se nomeie. Repito, esta questão não se póde avaliar senão em grande, Senão pela razão politica, e pela situação em que foram tomadas essas medidas. Voto pois contra a Proposta do Sr. Mello e Carvalho, e approvo a nomeação da Commissão especial como pio-põe o Sr. Ministro da Fazenda..: —

O Sr. Mello e Carvalho: — Ninguem sustentaria melhor a Proposta, que acabo de fazer, do que o illustre Deputado e meu Patricio que acaba de fallar (Apoiados); e admiro como uma intelligencia tão reconhecida fosse nesta occasião menos severa nas suas conclusões logicas. Ponderei que a infinidade de medidas Legislativas, (e na verdade são immensas) a complicação; dos seus objectos, a sua importancia, tudo pedia e imperiosamente exigia que para bem se poderem apreciar, e haver um perfeito conhecimento de causa, e poder formar-se um juizo consciencioso sobre cada uma dellas, convinha que repartindo.se esses trabalhos pelas diversas Commissões, a que pela sua natureza devem ir, essas Commissões dessem o seu Parecer, pertencendo á Commissão especial sómente examinar, e distribuir essas medidas pelas differentes Commissões segundo a diversidade dos seus objectos, pertencendo a estas dar em separado os seus Pareceres, como regularmente se practica em todas as Propostas apresentadas, pelo Governo.

E assim que entendo poder esta Camara occupar-se destes importantissimos assumptos com mais seguro conhecimento de causa; é assim que elle deve ser visto e tractado, e não de alto como se disse! O que significará apreciar de alto?! Apreciar de alto será substituir a desordem, a confusão, o cahos ao methodo, á clareza, á luz com que todas estas importantissimas questões devem ser examinadas, avaliadas e bem ponderadas? Será a precipitação? Não; o acerto não se acha na confusão, a precipitação tambem e sua inimiga irreconciliavel. (Apoiados) Acaso poderão ser apreciadas de alto medidas da importancia das que se contem nesse volume dos Actos da Dictadura em que se compromettem tantos interesses, em que até vai tanto á dignidade Nacional, ao nosso credito publico, em que se affectam contractos, em que até por ultimo se offende o Governo Representativo ou Parlamentar. Pois são as medidas da mais alta importancia objectos para serem apreciada

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dos de alto! (Apoiados). A Camara decida couto intender; pela minha parte não darei, não-concorrerei com o meu voto para approvar similhantes medidas, sem um previo e pausado -exame, conforme minhas debeis forças o permittirem, ou dar a minha approvação ao Parecer d'uma Commissão competente segundo a especialidade da materia que for sujeita ao seu exame, convencido de que o seu exame tem sido feito com imparcialidade. (Apoiados). — Por consequencia, sustento a minha Proposta e estou certo de que toda ia Camara estará convencida, como eu, de que se não póde fazer juizo seguro sobre qualquer materia senão quando ella tem sido examinada competentemente. (Apoiados)

O Sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Sr. Presidente, o illustre Deputado e meu amigo que me precedeu, mostrou sinceramente os bons desejos que o animam de que todos os Actos — promulgados pelo Governo no exercicio dos Poderes extraordinarios, que assumiu, sejam discutidos devidamente por esta Camara. Este desejo faz lhe honra, e de certo teria sido abraçado pois Camara em toda a sua plenitude se fosse possivel, se coubesse rios limites do tempo; mas naturalmente nem em toda a Sessão Legislativa, por muito que se prorogue, era possivel examinar devidamente todos esses Actos, artigo por artigo, para assim a Camara poder dar sobre cada um o seu voto consciencioso. E por ventura-deixa a Camara de ler completa liberdade para rejeitar ou revogar no todo ou em parte esses Actos do (Governo? De certo que não.

Por consequencia o escrupulo do illustre Deputado não póde ter fundamento nenhum plausivel; pois se fica livre a cada um dos Membros do Parlamento propôr e sustentar a revogação, alteração, ou modificação década um desses actos, é claro que deve desapparecer o motivo que parece intimidar o illustre Deputado de que a Camara apreciando essas medidas em globo dê um Parecer inconsideradamente, e sem conhecimento de causa. O que é indispensavel e que a Camara quanto antes dê o seu voto sobre esses Actos, rejeitando-os ou approvando-os, de modo que possamos saír do estado duvidoso em que por ora nos achamos a respeito delles.

O Additamento do illustre Deputado parece-me que devia concluir pela rejeição da minha Proposta, ou ser considerado antes como Substituição do que como Additamento. O illustre Deputado quer que a Commissão Especial seja encarregada de examinar os Actos da Dictadura, unicamente para discriminar a que Commissões pertence cada um delles, e remetter-lhos; isto é: S. Ex. quer reduziras funcções desta Commissão Especial ás funcções da Commissão de Petições da Camara. Ora sendo assim para que nos havemos dar ao incommodo de nomear uma Commissão Especial, quando temos a de Petições a quem isso podia ser incumbido? Era melhor que a Meza mandasse os Actos da Dictadura á Commissão de Petições. (O Sr. Mello e Carvalho — É isso mesmo) Pois bem; mas o illustre Deputado que censurou a Logica do meu amigo o Sr. Nogueira Soares, podia ser mais logico, podia mandar a Proposta para a Meza e dizer: — Seja a Meza que dirija as diversas medidas ás Commissões competentes

O illustre Deputado ha de permittir-me lhe diga que se precipitou um pouco no desejo que tem de examinar devidamente cada um dos Actos da Dictadura, pronunciando já o seu juizo em algum pontos importantes, quando asseverou:« — que se ferio a Representação Nacional, que se destruiu o credito publico, que se quebraram contractos etc etc. — E são estes factos tão importantes, que o illustre Deputado, de certo um dos mais conspicuos da Camara, não devia, sustentando a necessidade de um maduro e especial exame sobre cada um, vir por incidente classifica los do modo porque os classificou... (O Sr. Mello -e Carvalho: — Se v. Ex.ª me dá licença eu precisava dar uma explicação) Pois não, toda.

O Sr. Mello e Carvalho: — O que eu disse foi que -eram objectos de gravissima importancia, porque nelles vai a propria dignidade nacional, o credito publico, a permanencia dos contractos etc. etc, e que por consequencia, attendendo á gravidade de todos estes objectos era necessario que fossem examinados pelas respectivas Commissões: isto não é interpor juizo. Ora, que tambem o Governo assumiu Poderes extraordinarios não ha duvida nenhuma; e por isso eu pedi que fossem essas medidas ás diversas e competentes Commissões para ellas com melhor conhecimento de causa examinarem e apreciarem esses objectos e darem sobre elles a sua opinião. Foi isto que eu disse, e não interpuz juizo algum.

O Orador_ (Continuando;: — Bem; eu desisto do meu argumento, em vista da explicação do illustre Deputado. Mas se S. Ex.ª levado do desejo de dar o seu voto consciencioso, receia que a Commissão Especial não seja composta de todos os homens conspicuos e competentes, na opinião, para devidamente poderem examinar todos esses Actos, tem um meio de obviar ao inconveniente: nomêe para a Commissão'os que v. Ex.ª intende estarem nesse caso; inscreva na sua lista os nomes desses Cavalheiros escolhidos, e deite-a na urna. Mas ha mais: o illustre Deputado, quando a questão vier á Camara tem toda a liberdade para discutir e fazer bem patente a sua opinião a respeito de cada um desses Actos. (Apoiados)

Pois o illustre-Deputado com uma latitude tão ampla; que póde escolher para esta Commissão Especial os caracteres que julgar mais conspicuos, que póde depois discutir na Camara tanto quanto quizer todos os Actos da Dictadura, póde recear que a discussão o não habilite a dar um voto com pleno conhecimento de causa? Não póde de certo. E eu estou intimamente convencido de que o illustre Deputado não acredita que o Governo queira outra cousa. O Governo não quer mais nem menos do que o Sr. Deputado e a Camara; isto é: quer que a questão se decida com perfeito conhecimento de causa. (Apoiados)

Mas, Sr. Presidente, esta questão já é velha, por que desgraçadamente não é esta a primeira vez que tem vindo ao Parlamento medidas de Dictaduras, e sempre tem sido assim tractada; tendo cada um dos Membros da Camara direito para depois propôr a revogação completa não só de uma ou outra medida, mas de todas juntas.

Diz o illustre Deputado — que não quer dar um voto sem consciencia; que quer ler conhecimento de causa em todas as materias que se contém neste volume — Parece-me que é. quasi impossivel; apesar de toda a intelligencia do illustre Deputado, que é vastissima, parece-me quasi impossivel poder fazer um exame consciencioso sobre todos esses Actos, e dar

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sobre cada um delles o seu voto com perfeito conhecimento, de causa (O Sr. Corrêa Caldeira: — É verdade) E verdade, mas por isso mesmo que é verdade, é que é impossivel progredir assim a discussão, é que é impossivel dividirem-se os objectos, como pede o illustre Deputado, porque, desse modo prolongariamos a discussão até ás Calendas gregas; o que não póde ser.

O Sr. Cunha quiz desconhecer a Lei das maiorias e minorias; disse — que era uma questão de pundonor — e não sei que mais. Pois eu observo ao illustre Deputado, que quando tive a honra de. ser, com elle, minoria nesta Casa, era a maioria que impunha a Lei á. minoria, e nos sujeitávamo-nos. O que cumpre ás minorias e discutir e combater, mas depois sujeitarem-se: ás decisões da maioria., O illustre Deputado suppõe que a maioria tem idea de approvar os Actos da Dictadura, sabe mais do que eu... (O Sr. Cunha Solio-Maior: — Tem, tem, e v. Ex.ª bem o sabe) Não sei tal, mas se tem essa idéa muito o estimo, e agradeço ao illustre Deputado tão boa nova. E então digo, se a maioria tem idéa de approvar os Actos da Dictadura, o que eu não sei, tanto os ha de approvar indo elles a uma Commissão Especial para os examinar e dar o seu Parecer, como indo a muitas Commissões; é a mesma cousa, (Apoiados) porque a maioria é sempre maioria, tem uma opinião, e se é a que diz o illustre Deputado, approvados estão os Actos da Dictadura. Mas o Governo, que não sabe que é a opinião da maioria da Camara, deseja consultal-a, deseja saber qual ella é, e por isso trazendo aqui os seus Actos, propõe, seguindo os precedentes estabelecidos, que se nomêe uma Commissão Especial para os examinar. —

Não ha de ser pois o Governo que ponha pêas á discussão; nem sei porque se não ha de fazer hoje o mesmo que sempre se tem feito sobre casos desta natureza. Ainda no anno passado, sendo o illustre Deputado Membro da Camara, houve uma Commissão Especial: essa Commissão deu o seu Parecer: — foi aqui discutido, e discutido amplamente, durando essa discussão, nada menos de 523 dias. (Apoiados) Já se vê por tanto, que o Governo, que é hoje o mesmo que era então, não deseja coarctar a liberdade aos illustres Deputados para poderem discutir até á saciedade. E além disso, a Camara é que ha de decidir na sua sabedoria o modo, por que a discussão deve correr.

Por consequencia intendo que a minha Proposta não tolheu a liberdade da discussão; deixando livre a cada um dos illustres Deputados o direito.de propôr modificações, alterações, e até completamente a rejeição de todos os Actos da Dictadura, está no caso de merecer a approvação da Camara.\ (Apoiados)

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. Presidente, do que ouvi ao Sr. Ministro da Fazenda, e do que ouvi ao Sr. Nogueira Soares, concluo eu, que esta Commissão é, por assim dizer, um epigramma lançado á Camara; um epigramma perfeitamente. Achava mais logico que o Governo viesse aqui pedir um Bill de Indemnidade e não uma Commissão. Que ha de-fazer a Commissão? A Commissão approva, e o Sr. Ministro da Fazenda tem a certeza disso... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Não tenho.) Pois, Senhores, que nos disse o Sr. Nogueira Soares? «A Commissão não póde descer a detalhes; a Commissão ha de examinar a questão em globo em alto — to Sr. Ministro da Fazenda disse — «A maioria se tem de approvar, approva sempre. «Então que mais querem? Para que havemos de estar a gastar tempo, e além de gastar tempo, enxovalhar a nossa dignidade como homens? Ora o Sr. Ministro da Fazenda apesar da lucidez do seu espirito, apesar da cordura do seu caracter, sempre que falla, compromette o Systema Representativo; (O Sr. Ministro da Fazenda: — Cos demónios] — Riso) porque S. Ex.ª a respeito dos Actos da Dictadura, fallando supponhamos do Decreto de 30 de Agosto diz — ha de ser cumprido infallivelmente; — fallando a respeitada roda do sal disse — decida a Camara e que quizer, mas a roda do sal está abolida; — agora fallando da maioria diz — a maioria approva!...

O Sr. Ministro da Fazenda: — O nobre Deputado dá-me licença?.....

O Orador: — Ora pelo-amor de Deos as palavras tem uma significação...

O Sr. Ministro da Fazenda; — Então não dá licença?... <

O Orador: — Eu não dou licença nem deixo de a dar, porque conheço tanto a humildade da minha pessoa que quando alguem me pede licença, eu fico espantado. (Riso)

O Sr. Ministro da Fazenda: — Com a mestria humildado do illustre Deputado, se v. Ex. permitte, direi, que não pronunciei similhante expressão, e protesto contra ella. Não disse — que a maioria approva; — disse muito positivamente — não sei se a maioria approva; o Governo ignora-o; — (Apoiados) e isto é -exactamente o contrario do que disse o Sr. Deputado.,

O Orador: — Pois eu faço uma profecia, e sei mais que o Sr. Ministro da Fazenda; eu-digo que a maioria approva; (O Sr. Ministro da Fazenda: — Estimo muito) eu é que por considerações politicas, por prestar homenagem ao Systema Representativo e por indicações de honra, reprovo (O Sr; Ministro da Fazenda: — Está no seu direito); não posso approvar; era necessario que abdicasse todos os foros da minha intelligencia e a dignidade que Deos poz no meu coração, para eu approvar sem exame nem reflexão um montão de Leis economicas, administrativas, militares, Leis que contendem com o credito, com a agricultura e com todas as condições da Sociedade; era preciso ser eu um homem com tão poucos sentimentos, com tão pouca vergonha... (Fozes ~ Ordem! Ordem!) haveis de ouvir tudo.... (Uma voz: — Podemos não querer ouvir — Rumor) Quereis esmagar-nos com a vossa força? Isso não é generosidade. O Sr. Ministro da Fazenda disse ha pouno “ já fui minoria e calava-me« — pois eu não me calo; não sou Deputado para estar calado, acceito todos os encargos da minha situação e não recuo, para mim não ha perigo, expondo sempre a minha opinião. -Era um proceder mais franco, direi mesmo mais nobre e mais leal da parte do Ministerio, sobre tudo quando delle faz parte um Cavalheiro que pela sua pouca idade, por ser novo nos negocios publicos não deve estar ainda corrompido, dizer — O Governo intendeu que devia adoptar taes medidas; pelas quaes o Sr. Duque de Saldanha no Relatorio que ha pouco leu o Sr. Ministro do Reino diz — que que o paiz não podia esperar, e que nós não podiamos ficar atraz das outras nações, — e pedir um Bill

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de indemnidade per ter tomado essas medidas para o paiz andar para diante na maneira de ver dos Srs. Ministros. Um Bill de Indemnidade era o que os Srs. Ministros deviam pedir, e talvez que eu lh'o desse, porque sympathiso com as resoluções rasgadas; mas vir pedir uma Commissão, vir cançar a Camara com a esterilidade de uma Commissão, é esgotar pouco a pouco o cálix da amargura sobre essa pequena minoria que aqui está, é levar o escarneo além da affronta e do vituperio. E depois pedirei ao lado esquerdo e ao centro da Camara, que olhem para aqui, nós somos tres homens e não devem excitar as iras e os odios de uma maioria immensa, tres homens; nós minoria temos direito a_ ser bem tractados, vós haveis desculpar-nos qualquer excesso que façamos, por que esse excesso é a repugnancia que temos a uma resignação constante. Eu aqui sou Deputado; lá fora sou Antonio da Cunha. Aqui como Deputado digo verdades n'um intuito politico que podem satisfazer ao meu partido e ás considerações politicas a que estou ligado, mas quando fallo como Deputado não insulto; e por consequencia quando eu expender uma opinião boa ou má, acertada ou errada, os Senhores não devem ver em mim o homem, mas sim o Deputado; e se por desgraça minha, o que não está nem na indole do meu caracter, nem nos principios da minha educação, eu soltar alguma expressão que offenda os illustres Deputados, que eu estimo e aprecio muito, lá fora hão de achar não o Deputado, mas o homem, porque eu não sei recuar, não sei commetter a cobardia da retractação. Por consequencia fique-se intendendo, que se acaso injurio, respondo lá fóra pelas injurias; mas aqui dentro haveis de responder ás minhas opiniões, haveis de por de parte os insultos, os vituperios e os chascos, porque eu para aqui trago opiniões e não insultos; trago razões e não algarismos, podeis esmagar-me com algarismos, mas eu hei-de confundir-vos com a razão.

Portanto vou mandar para a Meza uma Proposta que o Governo póde acceitar, mas que eu sei que não acceita. E já vejo que é máo ser ministerial, porque eu hoje na melhor fé propuz que a Proposta do Sr. Pinto de Almeida fosse discutida quando estivessem presentes os Srs. Ministros, isto é, fui ministerial, a primeira vez que o fui, e logo rejeitado o meu intuito; agora apresento uma Proposta; naturalmente hade ser rejeitada; melhor, mas eu hei-de defendel-a palmo a palmo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Carlos Bento.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Se v. Ex.ª me dá licença... Eu tenho muito gosto em ouvir o Sr. Carlos Bento, mas póde ser que a minha Proposta poupe no Sr. Deputado toda e qualquer explicação...

O Sr. Presidente: — Então queira mandal-a para a Meza.

P, a seguinte. s

Proposta. — «Proponho que o Governo peça um Bill de Indemnidade pela Dictadura que assumiu.» — Cunha Sotto-Maior.

O Sr. Carlos Bento: — O Governo propoz que fosse nomeada uma Commissão Especial para examinar os Actos da Dictadura, para que desse o seu Parecer sobre os mesmos Actos; e lamentou-se com razão que circumstancias extraordinarias tenham obrigado a sanccionar uma especie de Jurisprudencia excepcional.

Sr. Presidente, eu tambem intendo que todo o Governo que se julgou obrigado pelo imperio das circumstancias em que se acha, e pelo dever, a trazer á Camara uma serie de medidas importantes, não póde submette-las cada uma de per si, em cada uma das suas partes, a uma discussão similhante áquella que tem logar sempre que se tracta de um só Projecto ou de uma medida isoladamente. Mas, Sr. Presidente, convém que quanto possivel se consiga o que se practicou em casos similhantes: bastantes vezes se tem proposto nesta Camara a approvação de Actos Dictatoriaes, tendo-se intendido que se deve dar ao Governo um Bill de Indemnidade em consequencia do abuso de Poder por circumstancias extraordinarias; mas o que eu tenho visto sempre, e o que não póde desconhecer-se, é que a discussão quanto á marcha politica da Administração deixa de prevalecer, e toma o primeiro logar a questão de Fazenda, sendo a questão de Fazenda no nosso Paiz sempre a mais importante de todas, aquella atraz da qual muitas vezes se tem marchado para fins pouco defensaveis. O que aconteceu na Sessão passada quando se tractou de julgar os Actos da Dictadura? Não foi a questão financeira que absorveu a questão politica? Não foi o Decreto de 3 de Dezembro que tomou o passo aos outros Actos da Dictadura de 1851?.. O que se segue daqui, o que isto prova é que foi necessario separar de alguma maneira estas duas questões. E por ventura não haveria precedentes na historia do Parlamento? Pois o que aconteceu em 184-8, sendo-Presidente da Administração o nobre Duque de Saldanha, que eu tive a maior satisfação em ver hoje nesta Casa depois da sua enfermidade? Havia uma Lei importante sobre Fazenda, a da organisação do Banco, de 19 de Novembro de 1846; e essa Lei foi separada dos Actos da Dictadura, dando-se por isso uma discussão politica e economica.

Sr. Presidente, parece-me que se conciliam as opiniões fazendo nós agora o mesmo a respeito das medidas de Fazenda que se comprehendem nos Decretos da Dictadura; e a conciliação é uma necessidade neste momento que se faz sentir na Politica da Administração, em todos os seus Actos. Nesta Camara não se está resolvendo todos os dias que se remettam certos negocios a uma Commissão para dar sobre elles um Parecer ouvindo outra Commissão? Isto não é novo; observa se todos os dias; está nas formulas; está nos precedentes. (Então que difficuldade ha em que vão a uma Commissão Especial todos os Actos da Dictadura, que esta tenha de dar o seu Parecer sobre a parte politica dessas Leis, e que a Commissão de Fazenda seja ouvida sobre os Actos da Dictadura na parte que diz respeito á questão de Fazenda? Parece-me que esta circumstancia é conciliatoria, porque faz approvar a idéa apresentada pelo Sr. Ministro da Fazenda, sem compromettimento do que podem ter de racional as duvidas do illustre Deputado. E neste sentido mando para a Meza a seguinte:

Proposta: — «Proponho que os Actos da Dictadura sejam examinados por uma Commissão Especial, sendo ouvida a Commissão de Fazenda. — Carlos Bento.

O Sr. Nogueira Soares: — Sr. Presidente, quando nós vemos um illustre Orador daquelle lado da Camara fallar da maneira que fallou sobre os Actos da Dictadura a respeito da qual havemos de nomear

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uma Commissão Especial, parece que é esta a primeira Dictadura que tem havido neste Paiz. E comtudo não é esta a primeira Dictadura, porque outras houve, para as quaes se nomearam tambem Commissões Especiaes. E não se diga que esta é mais importante que as outras, porque todas as outras, ao menos algumas dellas, foram tambem muito importantes. Nós tivemos a Dictadura em 1834, que reformou todo o nosso systema politico, economico, e administrativo; que derribou o antigo regimen, e o substituiu pelo que agora nos rege, e comtudo os Actos dessa Dictadura não foram examinados em detalhe, e foram approvados pelo assenso do Paiz. Em 1836 houve uma outra Dictadura que tambem fez profundas alterações no nosso systema financeiro, em administração publica propriamente dicta, em administração de justiça, tocou em todos os ramos do Governo do Estado, e em toda a Legislação. E os Actos dessa Dictadura foram tambem examinados por uma Commissão Especial que sobre elles deu o seu parecer, e foram approvados em globo no Parlamento. Em 1842 houve outra Dictadura a respeito da qual se fez o mesmo. Em 1814 houve outra em que se procedeu do mesmo modo, e comtudo esta Dictadura era talvez muito mais importante do que aquella de que se tracta, posso invocar o testimunho dos nobres Deputados que se sentam daquelle lado. (o direito) Essa Dictadura não só locou com os interesses financeiros e economicos, mas com a segurança dos Cidadãos, e com as garantias dos Tribunaes. Alguns dos Decretos, que se publicaram nesta época atacavam a independencia do Poder Judicial, punham em risco a imparcialidade dos Juizes, e não obstante isso sendo examinados por uma Commissão Especial foram approvados os Actos dessa Dictadura como o tinham sido os das antecedentes. A que vem pois os escrupulos dos illustres Cavalheiros, quando não queremos hoje senão seguir os precedentes da Casa? Será porque então estavam da parte do Governo que promulgou essas medidas, e hoje estão em situação opposta?

O nobre Deputado o Sr. Carlos Bento apresentou uma opinião nova: quer que os Actos da Dictadura sejam examinados por uma Commissão Especial, mas quer que se separem delles os que dizem respeito á questão financeira, e que esses sejam mandados á Commissão de Fazenda.

O Orador: — O meu illustre amigo que acaba de sentar-se, não quer como o Sr. Mello e Carvalho que os actos da Dictadura todos vão á Commissão Especial: quer que destes actos se separem sómente os que dizem respeito á questão de Fazenda para serem examinados tambem depois da Commissão ter dado o seu parecer. Ao ouvir isto parece-me que o illustre Deputado considera a questão de Fazenda como questão incidente, quando é certo que essa questão tem sido sempre reconhecida como a parte mais importante da questão politica; hade haver e não pode deixar de haver uma discussão sobre ella (Apoiado) não pode por forma nenhuma separar-se dos outros actos da Dictadura, havemos de tractal-a juntamente com as outras, e avalial-a debaixo do ponto de vista politico.

Por isso eu concluirei que se approve a primeira Proposta, que se nomêe uma Commissão Especial encarregada de examinar os actos da Dictadura, e que esta Commissão venha aqui apresentar o seu parecer sobre elles.

O Sr. Correa Caldeira: — Sr. Presidente, a Bíblia diz que cada dia tem a sua malicia, e não posso ajuntar ao texto = cada um tem a sua theoria = Ha individuos, Sr. Presidente, para quem as opiniões sobre os pontos mais importantes seja da sciencia politica, seja de administração, seja sobre questões administrativas, seja sobre questões economicas, mudam de natureza; e de solução por uma só causa, por uma só consideração — é o tempo em que é a pessoa por quem foram apresentadas. O seu juizo a respeito dellas é uma especie de calendario de festas moveis. O anno passado tractando-se desta mesma questão, os actos da Dictadura, tractando-se de saber se para este Paiz hade ficar perpetuamente em principio e como regra que o Governo em vez de vir ao Parlamento dizer z = z proponha = venha ao Poder Legislativo dizer — resolvi — ouvi dizer do lado esquerdo da Camara pela voz eloquente do Sr. Deputado Passos Manoel que muito sinto não ver presente, e tambem pela do Orador que me precedeu, ouvi, repito, defender a Dictadura passada pelas seguintes razões: — Não se pode por em duvida a legitimidade da Dictadura, porque nasceu da necessidade imperiosa em que o Governo se viu collocado: o Governo foi filho de uma revolução, e por isso não se lhe pode negar o direito de adoptar todas medidas necessarias para se poder sustentar a situação politica a que preside, e que representa. As Dictaduras contra que nós (Esquerda) clamamos e clamaremos sempre, são as que os Ministros assumem sem nenhuma necessidade urgente de alta conveniencia publica, quando nenhum perigo accommette o Estado, quando nem ha uma nova politica a inaugurar, a sustentar, nem o credito, nem as instituições soffrem um grande abalo: — quando emfim os Ministros se tornam superiores á Lei só para desconsiderarem o Systema Representativo, e para opporem a sua vontade e os seus caprichos, d opinião, á vontade do Paiz. Contra estas Dictaduras levantamos nós a, voz, mas contra esta Dictadura nascida de uma nova ordem de cousas, nascida do movimento de Abril de 1851, indispensavel para o desenvolvimento, e consolidação della, não temos que dizer reconhecemos que foi legitima, que foi necessaria. —.

Ainda se fortaleceu o argumento com a comparação e os exemplos, invocaram-se as Dictaduras de 1833 e 1836, para comparar com ellas a de 1851, e se concluir que esta era tão legitima como aquellas — citaram-se as de 1844 1846 como perigosa, ruinosas e liberticidas, para sobre estas desgraçadas Dictaduras se accumularem todos os peccados passados, presentes e futuros; para que ellas servissem de expiação áquella que se defendia.

Porém, Sr. Presidente, mudaram-se as cousas em 1853!!! Já em circumstancias ordinarias se póde tambem assumir a Dictadura com grande proveito é até cuido que legitimamente! Agora já.se não tracta de saber se esse Uso foi conforme com a Constituição do Estado, com as necessidades publicas, com o bem do Paiz, com os direitos e garantias dos Cidadãos, e com todos os principios que regulam ou devem regular todos os Governos e todos os Legisladores, porque o illustre Deputado sabe muito bem que acima das Leis escriptas ha a justiça universal e a moral publica, com as quaes, e com a Lei Fundamental

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do Estado o, Corpo Legislativo é obrigado a conformar-se!! Agora não! O Poder Legislativo ha de olhar de alto, ou tractar por alto a Dictadura, e o seu uso?!! Admiravel, pasmoso progresso, e coherencia. Pois se puder demonstrar-se que no complexo dos Decretos que o Governo mandou para a Meza ha algum, ou alguns que rasgam artigo por artigo a Lei Fundamental do Estado; que dilaceram um por um os seus mais importantes, e mais inviolaveis preceitos; que ha Decretos, que destroem uma por uma as suas mais valiosas e importantes garantias; que expõe o nome do velho Portugal no pelourinho da irrisão, do escarneo, da indignação dos povos não só civilisados, mas ale semi-barbaros; então, digo, poderá esperar-se, puderei eu esperar que o lado esquerdo da Camara que o anno passado ainda professava as doutrinas que resumidamente indiquei, approve semelhantes medidas, e que a Commissão da maioria, a quem fôr commettido o exame desses actos, depois de os examinar devidamente, os approve tambem! Eu não posso pensar que os illustres Deputados se despenhem em tão flagrante contradicção; e nesta parte o meu amigo o Sr. Deputado Cunha, me dará licença para dissentir da sua opinião. Não julgo por ora possivel que a maioria commetta erro tão grave!

O Sr. Presidente: — Mas permitta v. Ex. lhe diga que a questão versa unicamente sobre se se deve ou não nomear uma Commissão Especial.

O Orador: — Mas tendo V. Ex.ª dado tanta largura aos Oradores que me precederam, não sei porque motivo me não quer concedera mim o mesmo favor! Eu vou seguindo o meu caminho para provar como disse o meu amigo o Sr. Cunha, que é um perfeito escarneo encarregar o exame dos Actos da Dictadura a uma só Commissão, porque não ha Commissão possivel que no curto espaço de tempo que lhe ha de forçosamente ser dado, possa exprimir o seu voto sobre tantos, e tão diversos Decretos; porque não ha ninguem omnisciente, e porque nestes actos ha Decretos importantes sobre Fazenda, sobre Caminhos de Ferro, sobre Instrucção Publica, ou sobre Administração, ha um Codigo Penal, e ha mil questões importantes a examinar e resolver. Pois um Codigo Penal sómente e uma cousa que se examine de repente? Se pelo estudo, e exame das suas disposições se encontrar que nesse Codigo ha violação de direitos e garantias estabelecidas na Carta, ha de dar-se um voto de approvação? E como se ha de verificar que essa violação existe ou não existe, se elle não fôr competente e devidamente examinado? Ha Decretos com providencias importantes a respeito das Provincias Ultramarinas, e ha de a mesma Commissão julgar tambem destes Decretos?

Disse o Sr. Nogueira Soares, meu antigo amigo, cujo talento e saber sempre folgo de reconhecer, e cujas opiniões cada dia são para mim novas novidades, que os Actos desta Dictadura são muito menos importantes do que os das Dicladuras.de 1844 e de 1856, porque nos de 1844 havia um Decreto que tocava com a independencia do Poder Judicial, e esse Decreto bastou para se qualificar de perigosissima aquella Dicta Jura! Este pasmoso principio não seria produzido pelo, illustre Deputado se quizesse reflectir que entre os Actos da Dictadura presente ha alguns, ha Decretos que rasgaram contractos solemnes, que violaram não um, mas muitos artigos da Constituição, do listado!! Tanto receio de um lado, tão cega confiança do outro! Tão grande respeito a um artigo da Carta, tanto despreso por outro!! Pois para o illustre Deputado a Carla consiste só no modo porque o illustre Deputado intende a independencia, e a organisação do Poder Judicial e em mais nada? Acata a independencia do Poder Judicial como -forte garantia dos direitos dos Cidadãos «a violação expressa, manifesta desses direitos é cousa indifferente? Sr. Presidente! A natureza deste debate e o imprevisto delle, faz com que haja na expressão das minhas palavras um desalinho que eu não não queria que ellas tivessem: e o calor, a paixão com que eu fallo todas as vezes que intendo ler a razão por minha parte (e eu não fallo sem essa convicção) concorre para este desalinho.

Mas, Sr. Presidente, eu tambem não posso deixar de notar por esta occasião que o Sr. Ministro da Fazenda estranhasse que o meu illustre amigo, o Sr. Deputado Mello e Carvalho por incidente desse a sua opinião a respeito de parte dos Decretos da Dictadura! Por ventura não lerá o illustre Deputado todo o direito para o fazer? Não sei porque S. Ex.ª achasse isto irregular! Não sei em que fundamento, em que ordem de idéas S. Ex.ª achou que isto fosse digno de censura.

Pela minha parte declaro desde já que abraço, e faço meu o juizo que sobre alguns dos Decretos da Dictadura enunciou o meu illustre amigo, o Sr. Mello e Carvalho, sem pedir licença para assim proceder ao Sr. Ministro da Fazenda (O Sr. ministro da Fazenda: — Tenho muito gosto em o ouvir) O Orador: — Obrigado.

Sr. Presidente, terminarei mandando para a Meza uma Proposta, que pelo menos modifica a respeito dos diplomas, Decretos, ou como se lhes queira chamar, nella citados, a Proposta do Sr. Ministro da Fazenda entre os differentes Decretos que entram nesse volume; os de 30 de Agosto, 11 de Outubro, 18 e 22 de Dezembro de 1852 importantissimos sobre Fazenda, e o Codigo Penal importantissimo sobre Legislação, conviria que fossem examinados á parte! Mando para a Meza a Proposta que assim o declara, e assim pede que se resolva. (Leu)

O Sr. Francisco J. Maya: — Sr. Presidente, esta questão tem divagado do seu ponto principal. Acha-se na Meza uma Proposta do Governo, e eu cingindo-me ao ponto da discussão direi, que no artigo 46.º da Carla vem marcado o caminho que hão de ler, as Propostas do Governo — que é irem a uma Commissão para as examinar antes de serem discutidas. — Fundado neste principio constitucional assim como nos precedentes desta Camara, propoz o Sr. Ministro da Fazenda que a Proposta do Governo fosse remettida a uma Commissão Especial; e uma Commissão Especial quer dizer — composta de Membros que possam examinar os objectos-que lhe são mandados: estando na attribuição dos Deputados escolher os Membros dessa Commissão com a capacidade necessaria para examinar os Actos do Governo. Eu supponho que se attingirá esse fim nomeando-se 9 ou 12 Membros para essa Commissão, e que reunam em si as qualidades necessarias para desempenhar esta missão. E este o meio de conseguir mais promptamente um resultado vantajoso, e com economia de tempo. E isto sem attenção á questão de maiorias e de minorias, que é escusado tractar, por isso que é das condições essenciaes do Systema Re-

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presentativo as minorias sujeitarem-se aos votos das maiorias.

Sr. Presidente, ainda que a questão dos Actos da Dictadura não é só politica, porque e preciso examinar se os Actos publicados pelo Governo influiram ou não para o bem do Paiz, o exame que fizer a Commissão fica sujeito á discussão da Camara, e nessa occasião cada um tem direito de expender amplamente as suas opiniões, de approvar aquellas medidas que lhe parecerem boas, e de rejeitar as que lhe parecerem más.

Concluo, declarando que não acho proprio que por incidente se ataquem Os Decretos da Dictadura; e por essa razão não respondo agora ás censuras que se lhes tem feito, reservando-me para o fazer, quando chegar a discussão dessas mesmas medidas.

O Sr. Corrêa Caldeira (Sobre a ordem): — Desejava eu, Sr. Presidente, que, na conformidade do Regimento, considerando-se admittidas pela Camara todas as Propostas mandadas para a Mesa se classifiquem como Additamentos ou Substituições á Pro posta do Sr. Ministro da Fazenda, «que a minha, como a mais restrictiva de todas seja classificada de Emenda, e assim sabermos a ordem da votação. Peço perdão por lembrar a v. Ex. uma coisa que é da sua immediata attribuição.

O Sr. Presidente: — Não perguntei á Camara se admittia á discussão a Proposta do Sr. Ministro dá Fazenda, porque quando S. Ex. a annunciou a Camara, pareceu annuir a ella; e pelos mesmo à principios deixei de perguntar se admittia á discussão as outras, que tem immediata connexão com aquella. Quando se tratasse de votar, tencionava classificar cada uma dellas pela fórma seguinte. — A do Sr. Mello e Carvalho considerou-a elle mesmo Additamento; a do Sr Carlos Belito tambem como Additamento; a do Sr. Cunha Como Substituição. — (O Sr. Cunha: — Completa Substituição); e esta do Sr. Corrêa Caldeira, sendo effectivamente restrictiva, póde considerar-se como Emenda.

O Sr. José Estevão: — Tenho pouco a dizer. Sinto que se haja desflorado a questão dos actos da Dictadura; e lastimo se desperdicem argumentos que certamente os Srs. Deputados hão-de repelir nos seus discursos magistraes, quando se tractar dá questão politica, e que não tem cabimento algum neste insignificante incidente. Pára mim, Sr. Presidente, todos os methodos são bons, magnificos; e qualquer que se adopte, servem-me todos. Em tempo competente eu hei exprimir as minhas idéas sobre este assumpto; nem creio que os illustres Deputados da direita nos quererão privar de expendermos as nossas opiniões acêrca não só da questão politica, senão do merecimento de cada uma das Leis da Dictadura, segundo as idéas mais ou menos desenvolvidas que tenhamos a respeito dellas. Com tudo sé, por exemplo, os Srs. Deputados querem saber a minha opinião, eu digo-a já, digo-a francamente porque não tenho duvida alguma nisso. Mas o assumpto para que eu principalmente me levantei, foi para responder á alluzão um pouco disparatada que o Sr. Antonio da Cunha dirigiu, não á minha pessoa, mas á maioria da Commissão.

Sr. Presidente, todos os Governos precisam no Systema Parlamentar de uma maioria. E não é desdoiro ser da maioria: isso era uma antigualha que acabou, porque como algumas maiorias foram impopulares, por prestarem o seu apoio, tambem a Governos impopulares, fugia-se então de ler esse nome. Pela minha parte não pertenço á maioria actual', mas qualquer Governo ha de ser apoiado por alguma maioria, a fim de que o acompanhe no seu pensamento politico.

Sr. Presidente, o Sr. Cunha com o seu zêlo e amor tão provado pelo Systema Representativo, abbrevia muito a simplicidade delle. Na opinião do illustre Deputado, não havia mais que abrir-se o Parlamento, e ver se o Governo tem maioria ou não; chama-se um Tabellião de Notas perante a Meza para lavrar um auto de que ha maioria, o Governo vai para caza, e nós tambem. Por exemplo: ha duas questões, a saber: primeira se o Sr. Cunha é homem Cavalheiro, capaz de se desaffrontar, isso sabemos nós; a segunda questão é se as Leis da Dictadura merecem ou não ser consideradas: em se decidindo estas duas questões, separamo-nos; e quando se puzer em duvida a honra e probidade do Sr. Cunha tornamos a reunir.

O Sr. Cunha: — Isso não é questão para aqui.

O Orador: — O Sr: Cunha como homem, e como Deputado, cumpre os seus deveres, porque nas relações particulares é excellente pessoa, e na Tribuna tem exaltado os seus merecimentos para captar os votos do paiz. Mas as suas qualidades pessoaes, essas ficam lá fóra; o seu tracto é mais ameno fóra do Parlamento. Eu já fui maioria, aspiro a sel-o; e tambem fui minoria, e tão pequena que se reduzia á minha unica pessoa. Como Deputado consegui fazer-me sempre escutar na Tribuna, e não fui daquelles que tractassem melhor as maiorias, mas nunca disse (se bem me lembro) a respeito das votações que se faziam na Camara — não seria um homem de tão pouca vergonha que votasse desta ou daquella maneira — O Sr. Cunha só por descuido proferiu essas palavras diante de Cavalheiros, e principalmente....

O Sr. Cunha: — O illustre Deputado na Sessão passada disse que estava fazendo uma Proposta desaforada.

Orador: — Desaforada, é muito menos. Não vamos a um questão grammatical, que é ridicula; á qual posto eu não pretenda esquivar-me, intendo que não é para aqui. E impossivel que o Sr. Cunha separado da sua cadeira de Deputado, e fazendo revista como faz todos os dias dos seus actos, não reconheça que este é um dia negro nos seus fastos.

Sr. Presidente, eu intendo que esta questão está invertida. E ve-se da pretenção, que eu acho inepta, (não os Srs. Deputados que a sustentam) de que, progredindo ainda a discussão V. Ex. faça classificar já por todos os principios mais rigorosos as Propostas que tem na Meza. Mas a questão está invertida. O que querem? Querem que se separe a questão politica do merecimento dos actos da Dictadura?... Quando esse assumpto vier á discussão, cada um tem o direito de examinar o outro acto, chamar sobre elle a attenção da Calmara e debátel-o. Assim aconteceu com o Decreto de 3 de Dezembro na Sessão passada, que vindo comprehendido com os outros no Parecer da Commissão, foi sobre elle que se estabeleceu o debate principal.

Atacou-se a Dictadura, e disse-se que o Governo dissolvera a Camara para a reassumir. Sr. Presidente, eu não sei se o Governo dissolveu a Camara como

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Intuito de ser Dictador; o que sei é que alguns que hoje censuram o Governo pela dissolução da Camara, aconselharam-na, e insinuaram-na, e esses não são hoje os mais competentes para culparem o Governo por esse acto. Mas diz-se — o Governo com as suas medidas abalou o credito.

Oh Sr. Presidente, ha mais de dez annos consecutivos que vejo os Ministros apresentarem medidas importantes para robustecer o credito publico, e no fim de cada esforço apparecer uma tremenda bancarota. Peço perdão de todas estas frazes, mas....

O Sr. Presidente: — Não posso deixar de advertir que a questão é sobre o destino que se deve dar aos Actos da Dictadura.

O Orador: — Tem muita razão, e ninguem avalia mais a delicadeza de v. Ex.ª; sou seu amigo e por isso v. Ex.ª censura em mim os vicios dos outros Senhores. Era bom que elles correspondessem a essa delicadeza de v. Ex.ª

A questão, Sr. Presidente, e se os. Actos da Dictadura hão de ír a uma Commissão: isso ninguem contesta. Agora se hão de ser ouvidas outras Commissões, pela minha parte declaro que vão a todas quantas quizerem. E como se fallou do Codigo Penal, direi — que antes quero o Codigo Penal publicado pela Dictadura, do que a Ordenação do Livro 5.

O Sr. Cazal Ribeiro: — Sr. Presidente, ao vêr como a questão tem progredido, pareceria que realmente se entrou na apreciação dos Actos da Dictadura, e não que se tracta de uma questão simples e meramente regimental..

Eu, S. Presidente, não sou da Opposição, nem do Ministerio, se fosse da, Opposição systematica e acintosa (que comprehendo que póde ser tambem uma posição politica) não tinha duvida em o confessar franca e abertamente como o Sr. Cunha. Mas já que o não sou, permitta-se-me que não me decida por essas considerações de hostilidade systematica, e sómente me decida pela razão fundada nos precedentes.

Sr. Presidente, a immensidade das Emendas que têem chovido sobre a Meza, o modo porque ellas têem sido sustentadas, mostra que não póde deixar de ser approvada a primeira Proposta, a do Sr. Ministro da Fazenda, que é a unica que resolve a questão curialmente.

Os Srs. Carlos Bento, e Corrêa Caldeira apresentando e fundamentando as suas Propostas recuam diante das consequencias. Pois que dizem elles — as Leis de Fazenda devem ser remettidas a uma Commissão diversa, porque são de alta importancia — outro fundado no mesmo principio pede que este se applique ao Codigo Penal, e não sei a quantos outros Decretos da Dictadura. Pois, os illustres Deputados só acham importancia nos tres Decretos de 3 de Dezembro, de 30 de Agosto, e de 18 de Dezembro, no Codigo Penal, e em mais um ou dois Decretos? Se tudo quanto joga com grandes interesses deve ser remettido a Commissões diversas da Commissão Especial, porque restringem tanto a applicação do seu principio?

Ora, Sr. Presidente, importantissimos são outros muitos ainda, importantissimos são uma immensidade de objectos sobre que versam muitos dos Decretos da Dictadura. Então recuam os Srs. Deputados diante do seu principio? Ou não reconhecem a importancia destes Decretos que tambem são importantissimos, mas de que não fallam? Por ventura a Lei que estabeleceu a contribuição de Repartição, por ventura a Lei que reformou a Pauta das Alfandegas, por ventura a Lei que deu uma nova fórma á Alfandega do Terreiro e á das Sete Casas, e que estabeleceu o imposto de consumo sobre bases diversas, não são tambem Leis importantissimas? Não serão tambem interessantissimos estes assumptos? (Apoiados) Ora bem; pois então quem unicamente pela questão da importancia chega a querer fazer uma excepção á regra de que devem ser submettidos ao exame da Commissão Especial os Actos da Dictadura, devia levar o seu principio mais longe, devia ir aonde chegou o Sr. Mello e Carvalho; a Proposta do Sr. Mello e Carvalho é consequente, as outras não são consequentes com as mesmas razões com que os Srs. Deputados as fundamentam.

Mas, Sr. Presidente, eu notei mais. não pude deixar de notar (e foi por isso que pedi a palavra) que fosse o nobre Deputado o Sr. Carlos Bento quem se levantasse para propôr que se separassem do conjuncto dos actos da Dictadura as medidas de Fazenda para ser sobre ellas especialmente ouvida a Commissão.de Fazenda. É uma opinião que eu respeito, mas é uma opinião que, permitta-me o meu amigo -lhe diga, me parece muito pouco conforme com a opinião emittida o anno passado nesta Camara pelo mesmo Sr. Deputado. Quando na Sessão Legislativa anterior se tractou nesta Casa os Actos da Dictadura — e muitos Senhores que me ouvem pertenciam tambem a essa Camara — veio aqui a Commissão de Fazenda pedir á Camara que se suspendesse a resolução definitiva sobre uma parte do Decreto de 3 de Dezembro, a que era relativa á capitalisação, para quando se tractasse a questão de Fazenda; e o Sr. Deputado por Vianna foi um daquelles que altamente impugnaram a Proposta da Commissão de Fazenda. Então disseram-me que a Commissão de Fazenda vinha intrometter-se n'um debate que não era seu, que se tractava da questão politica, da questão da Dictadura, que a pretenção da Commissão de Fazenda era irregular, incurial e exorbitante. Disse-se da parte da Commissão — mas depois será tarde. Não importa (respondiam) vamos á questão politica.»

Ora, Sr. Presidente, não comprehendo a razão porque se veiu agora pedir muito mais do que então se pedia. Então era a Commissão de Fazenda que vinha já apresentar definidamente a sua opinião sobre este ponto; que vinha dizer — este ponto que é de summa importancia, pede a Commissão ao Parlamento que sobreesteja na decisão delle. Agora é opinião do Sr. Deputado que as medidas de Fazenda involvem pontos gravissimos e importantissimos. Mas sem que essas medidas de Fazenda tenham sido examinadas em uma Commissão qualquer, só porque o Sr. Deputado lhes dá essa importancia — importancia que eu lhes não nego, importancia que ellas têem ellectiva mente — ha de a Camara resolver, ha de fazer uma excepção ao principio, ha de decidir que essas medidas sejam submettidas ao exame de uma Commissão Especial! Quer o illustre Deputado para si o direito que negeva á Commissão de Fazenda? Eu não posso combinar esta doutrina nem com os precedentes adoptados pela Camara, nem com as precedentes opiniões não só dos Srs. Deputados auctores da Proposta, mas de muitos Senhores que se sentam daquelle lado (o direito) que me combateram com essas mesmas razões que acabo de referir;

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e isto, Sr. Presidente, quando a Commissão pedia que se suspendesse a execução de um acto, que consummado elle seria irrevogavel pela força natural das cousas? E agora não se allega nem póde allegar-se tal motivo. Agora querem esses illustres Cavalheiros uma fórma de exame especial e diverso para os Decretos de exame, fórma de exame que nada tem com a sua execução, que em nada a impede, em nada Mas, Sr. Presidente, ao mesmo passo que se inculca a importancia das medidas de Fazenda, e se pede o exame separado, emittem-se já juizos seguros e definidos; diz-se que uma Commissão só não póde fazer um exame serio de Decretos tão importantes como aquelles que se comprehendem nas medidas da Dictadura, que hoje foram apresentadas; mas os Srs. Deputados que mais sustentam esta idéa, parece do modo porque têem entrado na discussão, que deveriam prescindir da nomeação da Commissão, porque já ouvi analysar a questão de Fazenda, já ouvi tractar a questão de Fazenda debaixo dó ponto de vista dos terriveis effeitos que taes medidas tinham produzido no credito, já ouvi até citar a opinião dos povos barbaros acêrca dos nossos Decretos da Dictadura. Estamos tão adiantados, é tão desnecessaria qualquer Commissão para examinar esses Decretos, que não só temos já o nosso juizo formado, até sabemos, o que pensam delles os povos de Marrocos e de Tunes! A opinião está esclarecida e estabelecida sobre esses tão fulminados Decretos de Fazenda; está mesmo fortemente corroborada pela citação de Ião illustres auctoridades.

Mas, como disse, Sr. Presidente, eu não posso de modo nenhum concordar nas Propostas do Sr. Carlos Bento, e Corrêa Caldeira. A questão ou se hade decidir pela Proposta do Sr. Mello e Carvalho, ou simples e puramente pela Proposta do Sr. Ministro da Fazenda, o que não exclue que essa Commissão Especial consulte todas as Commissões que intender que deve consultar, porque isso é uma pratica seguida sempre e auctorisada por todos os precedentes do Parlamento. Se qualquer Commissão intende que precisa consultar a Commissão de Fazenda sobre negocios de Fazenda, ou se precisa de consultar sobre outros pontos a de Instrucção Publica, a de Administração etc, vem á Camara e pede que a Commissão tal, ou tal, de cujo auxilio precisa, seja ouvida sobre esse ponto, e a Camara concede; não sei mesmo até se é necessario vir-se pedir esta auctorisação á Camara; mas em todo o caso é uma cousa que a pratica auctorisa e que se não póde negar.

Ora eu dou a razão porque não posso combinar na idéa da Proposta do Sr. Mello e Carvalho. E porque me parece que essa Proposta exclue a discussão politica, e eu, não intendendo que esta questão é unicamente uma questão politica, intendo comtudo que na discussão dos Actos da Dictadura ha o ponto de vista politico; e esse ponto de vista é importantissimo. Se os Actos da Dictadura fossem divididos por tantas Commissões quantos os objectos sobre que elles versam, eram considerados como simples Projectos de Lei commettidos ao exame dessas Commissões, e qual dellas é que vinha dar á Camara o seu Parecer sobre o Acto politico, sobre o facto da Dictadura em si? Qual dellas vinha emittir o seu Parecer sobre as razões que poderia haver para dar ou negar o Bill de Indemnidade cujo pedido vai necessariamente involvido nesta discussão? Não vejo que

nenhuma dessas Commissões tendo de examinar os Decretos da Dictadura não como factos illegalmente consummados, não como factos anti- constitucionalmente consummados, mas sim como simples Projectos de Lei, não vejo, digo, qual é a que devia vir dar o seu Parecer sobre o ponto politico. Sr. Presidente, declaro pela minha parte que não posso tambem combinar em que a discussão dos Actos da Dictadura verse simplesmente sobre se elles considerados no seu conjuncto trouxeram um estado melhor ou peior: esse é um dos pontos de vista, mas não o unico da discussão. Se os Actos da Dictadura se considerassem como simples Projectos Ministeriaes, ainda se podiam mais ou menos encarar pelo peior ou melhor estado que trouxeram; mas aqui ha tambem o ponto de vista Constitucional, do abuso de Poder, e é exactamente esse sobre o qual eu tenho mais duvidas na approvação da actual Dictadura. É exactamente sobre esse ponto que eu desejo que se levante uma discussão séria e grave, como o assumpto sobre o qual versa.

Concluo votando pela Proposta do Sr. Ministro da Fazenda; porque intendo que ella é a unica em conformidade dos precedentes, e que resolve a questão do modo porque póde ser resolvida. (Apoiados)

O Sr. Alves Martins: — Sr. Presidente, a Proposta do Sr. Ministro da Fazenda, que é para que se nomeie uma Commissão Especial para examinar e dar o seu Parecer sobre os Actos da Dictadura, é o que está em discussão conjunctamente com outra do Sr. Mello e Carvalho. — Ora eu intendo que toda esta questão é de essencia e de fórma: na questão de essencia a Camara toda está conforme, isto é, a nomeação da Commissão; a da fórma — é se a Commissão hade ouvir-esta ou aquella outra Commissão.

A Commissão Especial-que se nomear, hade saír do seio da Camara — a Camara hade ter por isso confiança nessa Commissão, ella fica livre para dar o seu voto ou parecer como intender; ella procurará, se quizer, ouvir esta ou aquella Commissão: dizer-se-lhe já qual hade ouvir, parece-me isso prescripção de mais. Por consequencia vamos a votar, e deixemos o que se tem dito para outra occasião, por isso mesmo que não é agora o logar proprio para se lhe responder e tratai de taes assumptos — ha de haver muito tempo para isso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Corrêa Caldeira.

O Sr. Corrêa Caldeira; — Cedo da palavra. (Vozes: — Votos, votos).

O Sr. Presidente: — Tem a palavra ò Sr. Carlos Bento.

O Sr. Carlos Bento. — Eu tambem cederia da palavra; porém fui tachado de contradictorio, e falla de logica por um Sr. Deputado, e por isso não posso deixar de dizer algumas palavras como explicação á Camara e ao Sr. Deputado, e mostrar que não ha da minha parte essa contradicção, essa falta de logica que leve a bondade de me attribuir.

Sr. Presidente, o illustre Deputado que avançou esta proposição, deve reflectir numa coisa — e é que estes argumentos das contradicções valem pouco, e não provam nada. — O illustre Deputado se continuar por muito tempo na sua carreira Parlamentar e publica, hade ser contradictorio por muitas vezes, sob pena de não ter aprendido nada, de não ler aprendido na experiencia: a experiencia é que traz a ex

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plicação dos contradicções humanas — Ha mais: eu posso ser contradictorio, tenho sido contradictorio, porque mudei de opinião, porque tenho progredido (uivo sei se sou progressista, mas sei que sou progressivo) — A occasião citada pelo illustre Deputado a respeito de contradicção minha, não foi favoravel ao seu argumento, o illustre Deputado não foi feliz na citação chronologica e historica das minhas contradicções. Podia ser contradictorio, tenho direito para ser contradictorio; a historia está cheia de contradicções nas maiores illustrações, e nem por isso essas illustrações ficaram desauctorisadas nem infamadas, — o argumento das contradicções não e bom para atacar uma proposição qualquer. — Pois eu não podia deixar de ter razão na occasião em que fiz uma dada Proposta, ou apresentei uma certa proposição, e tel-a agora no que apresento... u É facil combater estas cousas assim. O illustre Deputado devendo empregar mais cabedal de intelligencia para combater a minha Proposta, contentou-se em dizer-me — Vós fostes contradictorio, logo a vossa Proposta não vale nada. — Ora eu posso ser o mais contradictorio de todos os homens, e a minha Proposta ser a melhor — Mas o que é certo, é que quem foi contradictorio, foi o illustre Deputado: as nossas posições inverteram-se tanto a seu, como a meu respeito — E apesar da contradicção do illustre Deputado isso não prova contra elle, contra o seu talento, contra o seu caracter, e contra os seus bons desejos. — As contradicções só são deshonrosas quando é deshonroso o motivo que as dicta, (Apoiados) Mas pela Logica do illustre Deputado são condemnadas todas as Propostas por mais justas o razoaveis que ellas sejam, logo que parlam d'um homem que tem caído em alguma contradicção. E a consequencia d'isto é que temos de adoptar mais um artigo para o Codigo Penal — vem a ser — Toda a Proposta de um homem que alguma vez tem sido contradictorio, não se approva!...

Porém eu não fui, nem sou contradictorio, sou eminentemente logico, tenho as mesmas idéas. Quem me pareceu contradictorio foi o illustre Deputado quando sustentou n'outra occasião idéas contrarias ás minhas. E respeito eu por isso menos o talento do illustre Deputado?... Eu tenho principios furos. não mudei delles. Eis a explicação de uma contradicção apparente. Eu não mudei nem uma só das minhas idéas. Assim é verdade que muitas vezes parecem contradictorios aquelles que são mais coherentes.

Sr. Presidente, o illustre Deputado disse, que nesta questão estava de accôrdo com os precedentes. Mas o illustre Deputado não se fez cargo de combater o precedente que eu citei, ninguem fallou do precedente que eu citei, precedente de uma Camara que era ministerial, que não podia ser tachado de desordeiro e de anarchico, e de falta de confiança no Governo, de que não intendia o principio politico da confiança nos actos do Ministerio, fallo da Camara de 1848, e era então n Administração presidida pelo nobre Duque de Saldanha, Essa Camara separou as medidas de Fazenda: a questão da organisação do Banco de Portugal foi examinada, discutida, e approvada separadamente dos demais Actos da Dictadura; mas não bastou isto aos Srs. Deputados, corra-se uma esponja sobre a Historia Parlamentar, e não se faça caso de certos precedentes, ainda que

justos e convenientes elles fossem. E note-se que a Historia Parlamentar existe para alguma cousa, e não é só com relação a certos actos, é a respeito de todos. — Ha pois um precedente sobre este ponto, e não contraria elle o pensamento do Ministerio. — Propõe se uma Commissão Especial, e addiciona-se-lhe a disposição de que seja ouvida a Commissão de Fazenda. Já se practicou isto em outra Camara.

Diz se — A Commissão se quizer ouvir, ella ouvirá. — É certo, mas eu peço perdão para advertir, que. muitas vezes se estabelece esta condição para que as Commissões, ou queiram, ou não, ouçam outras Commissões; e para dar a certeza de que serão infallivelmente ouvidas. Preencher esta circumstancia quer significar que a Camara intende necessario que uma Commissão que nomeia, ouça outra Commissão, que ella tambem nomeou. Pois pergunto eu: a Camara não nomeou a Commissão de Fazenda?... Pois a Camara não tem confiança nessa Commissão composta de caracteres que intendem perfeitamente destes assumptos de Fazenda? Que dâvida póde ter em que essa Commissão seja ouvida acêrca dos assumptos de Fazenda, que estão involvidos em algumas medidas da Dictadura? Pois a Camara não deve até exigir que. essa Commissão veja medidas ião importantes e difficeis? A questão Politica póde ser importante, a questão Financeira é difficil... aprecie a Camara esta distincção que se dá neste caso. Qual é a rasão porque o illustre Deputado na Sessão passada queria que se separasse a questão de Fazenda da questão Politica? Era porque algumas Leis de Fazenda ainda não tinham chegado a executar-se completamente. O mesmo agora acontece em alguns pontos.

Insisto portanto na minha Proposta, porque reputo indispensavel que a Commissão de Fazenda seja ouvida E com quanto não desconheça, que a questão Politica póde ser, e é muito importante, na minha opinião a questão financeira é igualmente importante, e além disso muito mais difficil de apreciar. Já se vê que sou infelicissimo na posição em que estou, mas persuado-me que tenho rasão. É orgulho, mas este orgulho, Sr. Presidente, deve ser admittido, visto que a solidão não póde ser adoçada por outro companheiro senão o orgulho.

Tenho exposto a minha opinião; e peço perdão á Camara, se as minhas idéas contrariam as suas; mas declaro que ainda não ouvi uma rasão, que me fizesse mudar da opinião em que estou.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Sr. Presidente, eu não tinha tenção de dizer mais nem uma palavra sobre esta discussão. E de certo leria levado avante esta minha intenção, se me não persuadisse que era possivel passar pela mente do illustre Deputado, ou de algum outro dos meus Collegas nesta Casa, a idéa de que o Governo queria collocar a questão de Fazenda detraz da questão Politica, e salvar-se com ella. Pareceu-me no momento, que vi transpirar das palavras do nobre Deputado este pensamento, que póde não ser seu, mas que talvez podia inferir-se das suas opiniões.

Sr. Presidente, o Governo não desconhece que a parto mais importante, mais valiosa e mais digna de ser apreciada, e considerada no Parlamento, é sem duvida a questão de Fazenda, como está comprehendida nesses Actos da Dictadura que foram mandados para a Meza; questão que os nobres De

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pulados tem não só o direito, mas a obrigação de examinar, e a respeito da qual o Governo não recua diante de nenhum dos terrenos em que a queiram collocar; e, quando se chegar a este debate, eu mostrarei á Camara, — que nenhuma das doutrinas consignadas nos Decretos se acha alli sem a mais seria e reflectida apreciação, por parte do Governo, dos motivos que o levaram, à sua promulgação. O Governo póde ter-se enganado em tantas medidas que adoptou; mas não quer que se considere a Proposta, que eu mandei para a Mesa, como trazida á Camara para collocar a questão de Fazenda atraz de um reducto — o da questão Politica.

Sr. Presidente, não me pertence a mim fazer a analyse das considerações apresentadas pelo nobre Deputado; mas parece-me que, no pouco que ouvi, o nobre Deputado fez a apologia da contradicção. Eu não acho isso uma belleza: a contradicção explica uma de duas cousas, ou que o contradictorio não tinha rasão então, ou que a não tem agora; e nenhuma das duas cousas é agradavel para mim. Mas, havendo eu de sempre confessar os meus defeitos e o meu erro, digo que nem o Governo nem eu estamos agora em contradicção. O nobre Deputado approvou comigo, o anno passado, que houvesse uma Commissão Especial para examinar todos os Actos da Dictadura; mas a experiencia aconselhou-o (note-se bem, desde então para cá que não houve Parlamento nenhum) que devia-haver agora uma Commissão de Fazenda para examinar as medidas financeiras, embora existisse uma Commissão Especial para examinar os Decretos da Dictadura: mas quem nega ao nobre Deputado o direito de nomear para compôr essa Commissão Especi.il os Membros mais conspicuos da Camara, da Commissão de Fazenda? Que duvida póde haver nisso? Pois a Camara não tem tido tempo para saber, se a Commissão de Fazenda, que; foi eleita para examinar a questão da Fazenda publica nó estado normal das cousas, deve ser a Commissão Especial que ha de ser nomeada para examinar e dar o seu parecer sobre estes actos especialissimos, promulgados em circumstancias especialissimas e que deve entrar na apreciação desses actos pelo seu merecimento e sentimento que os inspirou.

O nobre Deputado não vê aqui senão a questão de Fazenda; o Governo viu mais alguma cousa; o Governo viu a questão de cada um dos Actos da Dictadura; o Governo quer ser julgado, quer esse Bill de Indemnidade, de que se falla, mas não o pede na Proposta que mandou para a Mesa, porque não quer fugir á responsabilidade dos seus Actos; o Governo acceita essa responsabilidade, e não recua nem um passo diante da sua situação, e dos seus deveres. Não se persuada o nobre Deputado que eu quero collocar a questão de Fazenda atraz da questão Politica; aceitamos o combate em todos os terrenos.

Eu não tenho querido dizer uma palavra sobre o merecimento dessas medidas, com quanto tenha ouvido dizer que ellas destruiram o credito publico, que quebraram os contractos, e que não respeitaram a propriedade, e não sei que mais; nesta cadeira tenho ouvido tudo, e tenho-me conservado silencioso; mas quando chegar a occasião mostrarei á Camara os bons fundamentos que o Governo teve para proceder assim; mostrarei, que esses contractos

Violados, esse credito destruido completamente, essa propriedade usurpada, não são mais do que uma pura invenção dos espiritos, que o seu desejo de ver as cousas de um certo modo desvaira muitas vezes: os espiritos mais atilados desvairam-se; assim como os homens mais distinctos, deixam apoz si um rasgo de contradicções, tambem deixam alguns desvarios, se intende, desvarios em bom sentido. Portanto nomeie a Camara a Commissão, ouça, se quizer, a Commissão de Fazenda, ou quantas quizer, mas nomeie-a, e acabemos com isto.

Eu, Sr. Presidente, gosto de collocar as questões no terreno da verdade; não tenho de certo a eloquencia dos illustres Deputados, mas domina-me sempre a paixão da verdade, que é uma grande eloquencia: e a verdade é, que quando a Camara elegeu a Commissão de Fazenda, não pensou que havia de ser ella que tivesse de examinar os Actos da Dictadura. (Apoiados) A Camara sabia que uma collecção dos Actos da Dictadura havia de ser examinada, mas a Camara estava bem persuadida que havia de nomear uma Commissão Especial para os examinar: (Apoiados) Então para que é querer inverter agora a ordem natural das cousas? Pois por ventura não comprehendem os illustres Deputados, que a missão da Commissão de Fazenda é muito differente da que tem de ser imposta á Commissão que deve examinar e dar o seu parecer sobre a Proposta do Governo a respeito dos Decretos da Dictadura? Pois a Commissão de Fazenda nomeada para examinar a questão de Fazenda no estado normal, póde ser competente para examinar os Actos da Dictadura em geral? «

Sr. Presidente, repito, o que me fez pedir a palavra agora, foi o pensar que alguem intendia que o Governo queria acobertar a questão de Fazenda com a questão Politica.. Realmente faz pena tanto tempo gasto em questionar-se uma Commissão Especial, se iodas as Commissões, ou se a Commissão de Fazenda ha de ser a que examine os Actos da Dictadura! (Apoiados)

Eu não disse que a maioria ha de approvar; não desconheço tanto os principios, as regras, e as boas practicas do Systema Representativo, que me atrevesse a proferir similhante blasfemia diante dos Representantes do Povo; o que disse foi, que se a Camara tem tenção de approvar esses Actos, dêem-lhe a direcção que quizerem, sejam elles examinados por uma Commissão Especial de Fazenda, ou por quantas Commissões quizerem, a Camara approva-o do mesmo modo... (Apoiados) Confesso que gostei de ver descarregar a electricidade daquelle lado da Camara sobre a questão, porque assim já falta menos para dizer. (O Sr. Correia Caldeira: — Ainda falta muito) Bem sei que ainda ha muito, mas já ha menos isto; bem sei que ha muito, mas esteja o illustre Deputado descançado de que ha de achar nestas Cadeiras quem responda a tudo que se apresentar; esteja certo de que o Governo não ha de deixar sem resposta nenhum dos argumentos que forem apresentados pelos seus adversarios politicos.

Concluo, Sr. Presidente, dizendo, — que o Governo seguindo as practicas aqui estabelecidas, apesar de haver o precedente de 1843, que é verdade que ha, mas seguindo a practica mais constante, propoz a nomeação da Commissão Especial, porque deseja quanto antes sair deste estado anomalo; quer ser

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julgado, mas quer ser julgado depressa, está prompto a Responder por aquillo que lhe cumpre, e que é do seu rigoroso dever, mas o seu mais vehemente desejo é sair quanto antes da posição em que está.

O Sr. Mello e Carvalho (Sobre a ordem): — Entre os Srs. Deputados que pediram a palavra, eu tambem a pedi. Tenho esperado silencioso, e vejo agora que v. Ex. me não inscreveu, naturalmente por intender, que quando eu pedi licença para dar uma explicação, interrompendo o Sr. Ministro da Fazenda, V. Ex.ª contou essa explicação como tendo eu fallado segunda vez.

O Sr. Presidente: — Perdoe-me o Sr. Deputado, mas não é assim.

O Orador: — Perdoe V. Ex.ª, eu acabo já: e desejo só declarar, que naquillo que disse não quiz por modo algum attribuir ao Sr. Ministro a idéa de que S. Ex. queria ou procurava acobertar a questão de Fazenda com a questão Politica. Dicto Isto, desisto de toda a palavra.

O Sr. Presidente: — Quando v. Ex.. pediu a palavra depois de fallar o Sr. Ministro da Fazenda, eu não o increvi, pela mesma razão que não inscrevo agora o Sr. Carlos Bento, que tambem pediu a palavra, isto é, por ter fallado já duas vezes (O Sr. Carlos Bento: — Sou Auctor de uma Proposta). Bem sei que é Auctor de uma Proposta. mas se eu entrar a inscrever os Auctores de todas as Emendas, Substituições, e Additamentos que se apresentarem, então são interminaveis as discussões, e nunca assim se intendeu o Regimento (Apoiados). Isto mesmo fiz eu tambem ao Sr. Antonio da Cunha, e ao Sr. Nogueira Soares; e tanto o Sr. Mello e Carvalho fallou duas vezes, que da segunda vez começou por dizer, respondendo ao Sr. Nogueira Soares, que ninguem melhor do que o Sr. Deputado, Nogueira Soares, tinha sustentado a sua questão.. (Apoiados).

E pondo-se logo á votação a

Proposta do Sr. Ministro da Fazenda — foi approvada.

Additamento do Sr. Mello e Carvalho — rejeitado.

Dito do Sr. Carlos Bento — rejeitado. Dito do Sr. Corrêa Caldeira em duas partes.

1. a Parle — rejeitada.

2. Parle — idem.

O Sr. Presidente: — Resta decidir de quantos Membros ha de ser composta a Com missa) especial: nenhuma das Propostas o indica. O Sr. ministro da Fazenda que foi Auctor da Proposta approvada, poderá dizer de quantos Membros se deve compôr esta Commissão.

O Sr. ministro da Fazenda: — Eu não queria tomar a iniciativa neste caso, mas a minha opinião era que fosse de 13 Membros. (Apoiados)

O Sr. Nogueira Soares: — Proponho que seja de 13 Membros como lembra o Sr. Ministro da Fazenda, era exactamente o que eu tinha tenção de propôr.

E pondo-se logo á votação.

Se a Commissão especial havia de ser composta de 13 membros? — Decidiu-se affirmativamente.

O Sr. Vellez Caldeira: — Pedi a palavra para declarar á Camara, que o motivo por que não assisti ao principio da Sessão, foi por ter ido ao Supremo Tribunal de Justiça. Apesar de estar convencido de que é impossivel satisfazer aos trabalhos da Camara, e ír ao Tribunal, com tudo fui lá hoje; mas

não encontrei na minha Secção nenhum dos Membros empregados nas Camaras: sendo-me portanto impossivel satisfazer aos desejos do Ministerio, e aos meus tambem de-ajudar os trabalhos daquelle Tribunal, e elles caminharem regularmente.

O Sr. José Estevão: — O Sr. Ferreira Pinto Bastos, encarregou, me de participar á Camara, que não podia assistir á Sessão de hoje por motivo de molestia.

ORDEM DO DIA.

Discussão do Projecto de Resposta ao Discurso da Corôa.

E o seguinte

Projecto n.º 4. — Senhora! A Camara dos Deputados, fiel interprete dos sentimentos de amor e gratidão, que a Vossa Magestade consagram todos os Portuguezes, lamenta que um incommodo de saude — felizmente de pequena gravidade — a privasse da honra e da satisfação de ver a v. Magestade no seio da Representação Nacional.

A Camara ouviu com o mais profundo respeito as palavras, que o presidente do Conselho dos Ministros lhe dirigiu no Regio Nome de Vossa Magestade, e, agradecendo como lhe cumpre, a nobre confiança que Vossa Magestade Se Dignou depositar nos Representantes da Nação, procurará, pela sua parte, corresponder-lhe, contribuindo quanto couber nas suas forças para o maior beneficio possivel da Nação Portugueza, que tanto o merece

A Camara reconhece, que o Decreto de 30 de Setembro foi consequencia necessaria do outro Decreto de 24 de Julho proximo passado era mister desenvolver os principios constitucionaes de novo consignados no art. 4.º do Acto Addicional.

A Camara examinará com cuidado, e apreciará com imparcialidade os motivos, que levaram os Ministros de Vossa Magestade a assumir Poderes extraordinarios. A organisação da Fazenda Publica, o melhoramento da administração da justiça, o vigoroso fomento da agricultura, das artes e do commercio, no Reino e nas Provincias Ultramarinas, são sem duvida as nossos primeiras necessidades. A Camara estimará muito poder convencer-se de que ellas foram sabia e convenientemente attendidas pelos Ministros de Vossa Magestade.

Senhora: um caminho de ferro que nos ponha em contacto immediato com o resto da Europa, facilitando ao mesmo tempo o commercio interno d'algumas das nossas Provincias, será sem duvida para a Nação o começo de uma nova era de prosperidade, e para Vossa Magestade um dos mais bellos monumentos do Seu glorioso Reinado. A Camara concorrerá, pois, quanto della depende, para que tão util como grandiosa empreza se realise o mais breve possivel; e verá com prazer que os Ministros de Vossa Magestade, nos passos que para esse fim têem dado, seguiram as boas practicas que affiançam a moralidade da administração, e a fiel gerencia dos fundos publicos.

A Camara deplora com Vossa Magestade a calamidade, que afflige os habitantes da Ilha da Madeira: louva a sollicitude com que o Governo de Vossa Magestade lhes acudiu com os soccorros possiveis, posto que ainda insufficientes; e approvará com satisfação providencias, que remedêem tamanho infortunio.

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A Camara congratula-se com Vossa Magestade; por que a nossa justiça sobre a reclamação do. Estados Unidos relativa á indemnisação pela perda do navio General Armstrong fosse reconhecida pelo Presidente da Republica Franceza.

A Camara folga de que as nossas relações com as Potencias Estrangeiras continuem, como tanto é para desejar, na melhor intelligencia e harmonia; e se apraz em reconhecer o acerto com que Vossa Magestade houve por bem de fazer acreditar um Ministro Portuguez junto ao Governo de Sua Magestade o Imperador dos Francezes.

A Camara examinará com o maior escrupulo os Orçamentos da Receita e Despeza, que os Ministros de Vossa Magestade lhe apresentarem; e procurará combinar a indispensavel economia com as necessidades do serviço publico.

E por fim, Senhora, a Camara dos Deputados julga do seu dever assegurar a Vossa Magestade, que ha de cooperar sincera e efficazmente com o Seu Governo em tudo quanto possa concorrer para o augmento da prosperidade publica, para a consolidação do Throno e da Dynastia de Vossa Magestade, das instituições liberaes, e da sincera união da Familia Portugueza.

Sala da Commissão, em 4 de Fevereiro de 1853. — Julio Gomes Ja Silva Sanches, Presidente. — José Alaria Baldy. — Justino Antonio de Freitas. — Basilio Alberto de Sousa Pinto. — Rodrigo Nogueira Soares Fieira. — Frederico Guilherme da Silva Pereira. — José /Maria do Casal Ribeiro.

O Sr. Mello e Carvalho: — Sr. Presidente, nas modernas sociedades em que a melhor possivel combinação dos elementos sociaes tem estado em discussão, em que tantos problemas sociaes, politicos e economicos tem sido agitados, em que os principios governamentaes tem passado pelas provas da experiencia, em que tudo o que respeita á organisação das sociedades, está sujeito aos calculos da meditação e da reflexão, não será facil qualificar como justos os factos, que a razão desapaixonada e imparcial reprova, e a consciencia publica condemna.

Cada seculo, cada paiz, cada situação tem sempre tido suas condições proprias. No meio da confusão de idéas, de interesses, de paixões e de caprichos; no meio de tantas blasfemias e de heresias religiosas ou politicas, que tão profundamente perturbam as sociedades, as innovações irreflectidas e precipitadas resentem-se da sua origem, e são um verdadeiro flagelo para os povos que se deixam seduzir por vãs theorias. Depois de longas e dolorosas perigrinações feita? pelos vastos dominios das ficções, em busca do bello ideal politico, a experiencia não attesta senão a existencia de ruinas.

Ha um certo numero de ideas e de principios de moral social e de justiça, que nunca se podem impunemente preterir: são elles os unicos elementos de toda a boa organisação politica, e que este nome merece. Não é demolindo o que existe que póde haver aperfeiçoamento nem progresso, é sim melhorando progressivamente.

A melhor organisação social será sempre aquella que se vai fortificando pelo tempo, pela educação dos povos, pelos habitos, pelas respeitaveis tradições; finalmente pela sciencia e pela experiencia.

Não se tenha em pouca conta o passado, que na vida das sociedades leiu grande importancia; porque elle é a explicação do presente, e o futuro será deste a sua deducção logica. Se desejamos legar a nossos filhos um prospero futuro, é necessario que formemos o presente com justas instituições; que respeitemos as Leis da moral e da justiça, que appliquemos os seus principios com tanta certesa e inflexibilidade, como as mathematicas se applicam aos movimentos do céu e da terra.

O tempo das monarchias absolutas, que tiveram sua necessidade, sua grandeza, sua utilidade, e até sua popularidade, passou; porque o Poder absoluto, não tendo limites, é a negação das garantias das liberdades publicas e individuaes, é a negação da protecção á propriedade, é a negação.de qualquer apoio á resistencia legal. Eis a principal razão por que a moderna civilisação as condemna como absurdas e insensatas. O grande prestigio de que se acompanhavam, ou que era o seu principal fundamento, já não existe; o principio do seu poder, deduzido do direito divino, depois de grandes combates, foi vencido pelo principio da soberania dos povos, principio filosofico, mas de que se tem feito grande abuso.

Invocando-se muitas vezes este principio, não se tem feito senão destruir existencias sem crear outras, ír buscar a auctoridade onde ella não está constituida regularmente, tomando seu ponto de apoio no vacuo, no incerto e precario.

A soberania dos povos está subordinada ás Leis da moral, da justiça, e das necessidades da vida social, do reciproco respeito que uns devem para com outros; não tem essa omnipotencia que certa escola lhe quer attribuir. Da soberania nacional não se vai necessariamente ao Governo republicano democratico; a Monarchia Constitucional não é com ella incompativel. De todos os problemas, nenhum ha que falle mais ao coração dos povos, como aquelle da fórma pela qual serão governados; mas nenhuma fórma de Governo é actualmente reconhecida como mais favoravel á vontade, á opinião, á utilidade publica, aos desenvolvimentos moraes e físicos como é o Governo Monarchico-Constitucional-Representativo. Na verdade, todo o progresso verdadeiro deve estar nas idéas, nos costumes, nos desejos geraes, antes de passar para as instituições, Pertender impôr a uma Nação fórmas sociaes ou politicas, que não lhe convém, que lhe são antipáticas, é provocar reacções, que cêdo ou tarde se formulam em força que as dissolvem.

Nas instituições humanas não ha bondade absoluta; a bondade está em relação com a possibilidade da applicação, no seu accôrdo com os habitos e necessidades dos povos, com suas propensões, e respeito ás tradições gloriosas. Todo o progresso nas instituições liberaes deve partir do estado actual, não para destruir, mas para melhorar, para fazer caminhar a sociedade para o seu aperfeiçoamento, mas sem constranger este natural movimento em toda a sua liberdade. O verdadeiro progresso social não consiste na realisação destas sociedades imaginarias, edificadas pela esquadria e pelo compasso, reduzidas ás dimensões das fantasias de improvisados organisadores, que pertendem edificar sobre-as ruinas e dissolução da sociedade existente.

E necessario estar em guarda tanto contra o pantheismo ethereo, como contra o pantheismo demagógico; é necessario não deixar seduzir os espiritos de vã pertenções, desprende-los de formulas que não representam senão a confusão, a desordem o anarchia.

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A Europa civilisada póde dizer-se que esteve dividida em duas zonas, a dos Governos Representativos Monarchicos, e a das Republicas Democratas: ambos os partidos se arranjaram em batalha, mas a victoria coube aos Governos Parlamentares; as Lei da intelligencia ainda esta vez deram o triunfo a quem elle pertencia.

Se me propozesse demonstrar a impossibilidade dos Governos Republicanos no estado actual das sociedades modernas, não me seria necessario recorrer á historia das antigas Republicas da Grecia e de Roma, nem ainda ás da Italia na idade media; bastar-me-ia apresentar um resumidissimo bosquejo dos infaustos acontecimentos que tiveram logar na Europa central em 1848.

Quando rompeu esta tremenda tempestade revolucionaria, quantas victimas não foram sacrificadas á furia demagógica nessas saturnaes de anarchia, nessas orgias de uma guerra) fratrecida? Não foi por todos visto, Thronos lançados por terra, Corôas pisa» das, não se perdoando a tiara do proprio Chefe do Catholicismo, Reis humilhados, Dynastias abatidas? Uma confusão de idéas, de principios subversivos das sociedades; repetidos acommettimentos ás suas primeiras bases, á Religião, á propriedade, á familia, íam precipitando os Estados n'um abysmo de horrores; no extremo de agonia a que chegaram, muitos delles teriam desapparecido, se a Providencia lhes não acudisse. Generaes, Representantes do Povo, foram cruelmente assassinados, não escapando um Ministro fiel ao seu Soberano, que junto a elle foi victima do punhal dos sicarios.

O Sr. José Estevão: — Peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Para fallar pró ou contra?

O Sr. José Estevão: — Contra o Sr. Deputado, contra o que o Sr. Deputado está dizendo.

O Orador: — Sr. Presidente, o que significa pedir-se palavra contra um Deputado que está fallando? Aqui pede-se a palavra pró ou contra o que está em discussão, e não contra um Deputado que está orando. Se o Sr. Deputado tem a meu respeito algum resentimento, ainda que não merecido, e lá fóra, e não na Tribuna, que os casos de honra se decidem. Representante do Povo, não soffro a mais leve offensa, e rejeito com energia e desprezo essa dictadura injuriosa, que o Sr Deputado pertende impôr aos seus Collegas, que deve tractar com respeito e consideração.

O Sr. José Estevão: — Peço a palavra; peço a v. Ex.ª que me diga até que ponto e neste caso livre 0 direito da provocação, e até onde chega a sua auctoridade?

O Sr; Presidente: — A minha auctoridade chega até á decencia; mas peço licença para dizer ao Sr. Deputado, que houve alguma razão para resentimento, porque o Sr. Deputado podia pedir a palavra sem fazer referencia a ninguem, e permitta-me S. S. que lhe diga que houve da sua parte inconveniencia, assim como da parte do outro Sr. Deputado, usando de uma expressão menos propria neste logar.

O Sr. José Estevão! — Peço a v. Ex. que me dê a palavra para uma explicação, e v. Ex.ª ha-de dar-m'a, porque é do meu direito defender-mo; e não saio desta Casa em quanto m'n não dér.

O Sr. Presidente: — Eu exijo Ordem; o Presidente esta aqui para fazer cumprir a Lei da Casa, e esta não permitte perturbações: o illustre Deputado está Inscripto; se a Camara quer decidir que se lhe dê a palavra fóra da ordem, póde faze-lo, mas por mim j não lhe posso dar a palavra.

O Sr. José Estevão: — V. Ex.ª tem-me inscripto para o fim da Sessão?

O Sr. Presidente: — Não posso conceder-lhe a palavra, porque a não tem.

O Sr. José Estevão: — Pergunto se me dá a palavra hoje no fim da Sessão?

O Sr. Presidente: — Hei-de dar-lh'a no fim da Sessão, se a Camara assim o resolver; não posso fazer

a favor do Sr. José Estevão o que não fizer a favor dos outros Senhores; o Sr. Deputado está inscripto sobre a materia, usará da palavra quando lhe competir.

O Sr. José Estevão (Com vehemencia): — Eu peço ia palavra para uma explicação; e se v. Ex.ª m'a nega, o insulto é pequeno, mas a resolução é grande (Vozes: — No fim da Sessão).

O Sr. Presidente: — Pois no fim da Sessão consultarei a Camara se lhe concede a palavra para uma explicação.

O Orador: — Continuando no meu discurso,: estas idéas subversivas...

O Sr. Presidente: — Peço ao Sr. Deputado que dê este incidente por acabado.

O Orador.' — Para mim está acabado, vou proseguir no fio das minhas idéas, porque o incidente nada me aterrou.

Eslava eu dizendo, que um ministro illustre por tantos titulos tinha sido victima do punhal dos sicarios, junto ao seu proprio Soberano: e permitta-me agora a Camara que eu, por esta occasião, pague um bem merecido tributo de respeito e consideração a este distincto Escriptor, em cujas obras tenho tambem aprendido. Lamento com toda a effusão do meu coração, que um caracter illustre pelo seu saber, tivesse um tão trágico fim.

Nas Republicas Democratas raras vezes apparecerá uma idéa fixa, um pensamento organisador, porque prevalecem as vozes das turbas aos trabalhos de intelligencia.

O que produziram tantas Assembléas improvisadas em 1848, na Italia e na Allemanha? Que fructo se colheu dessa-Assembléa de Francfort e de Erfurt, não obstante estarem nella homens os mais eminentes em saber? Todos aspiravam a um futuro bello, mas fluctuavam á mercê dos partidos, das opiniões confusas, e dos caprichos. I

Os democratas radicaes querem que a Republica seja idolatrada, mas empregam a violencia, sacrificam a propria liberdade, negam todo e qualquer apoio á resistencia legal aos seus excessos. De todas as fórmas de Governo, a mais exclusiva é a democratica, que, promettendo muita liberdade, castiga severamente aos que della usarem em sentido contrario ás paixões dominantes.

As Republicas Democratas não tem senão uma curta existencia; ordinariamente não são senão um éco efémero de doutrinas dissolventes. Aquella parte da Europa, que ha pouco foi affectada desta agitação febril demagógica, apresentou apenas um campo de batalha, um desprezo de todos os principios que servem á organisação social, até uma banca-rota moral de tantos caracteres, que bem uteis poderiam ser senão se tivessem deixado seduzir por theorias abstractas, que nunca se poderão levar á realidade.

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Os costumes e as idéas do mundo moderno não comporiam outra alternativa, senão escolher entre o Poder absoluto, mas que não promette duração, porque lhe faltam todos os elementos em que se póde apoiar, e o Poder temperado pela concorrencia das Camaras Legislativas, o que constitue o Governo Representativo ou Parlamentar; unico meio de impedir tanto o excesso do Poder, como a anarchia da licença, mantendo-se a divisão dos Poderes, e combinando-se a sua harmonia. Os espiritos, fatigados ou pelo peso do absolutismo, ou pela inconstancia da democracia, descançam nos Governos Parlamentares.

Que Governo ha possivel, que não dê garantias á liberdade, á propriedade, á familia? De todos os despotismos, o mais intoleravel é o que se exerce em nome da liberdade: elle corrompe a opinião das massas, e opprime as intelligencias.

O unico meio de entrar na realidade, e evitar estereis abstracções, é estudar os factos com paciencia, é governar os homens cora moralidade e justiça. Pois o que é um Governo senão o Poder Publico encarregado de dirigir as sociedades, segundo as idéas da moral e da justiça?

Quasi por toda a parte o Governo Parlamentar é reclamado como uma necessidade da vida social. Depois de uma prolongada fluctuação, em que tem estado as condições sociaes, este facto não é um accidente, ou uma infundada pertenção: tem suas razões no passado politico, motivos no presente, e dá esperanças para o futuro.

Que outra fórma de Governo abre um mais vasto estadio a todas as forças, a todas as industrias, a todas as idéas? Que outra fórma de Governo poderá fazer prevalecer o sentimento do justo, da tolerancia e da moderação? Que outra fórma de Governo poderá facilitar mais que se conheçam os homens distado, os Politicos, finalmente todas as maiores intelligencias? Não está ahi a Tribuna, não está ahi a Liberdade de imprensa!

Quaes serão os melhoramentos e aperfeiçoamentos, quaes serão as necessidades da vida social, que não possam completamente realisar-se e satisfazer-se pelo Governo Parlamentar?

Sendo, como é, o Governo Representativo a unica fórma possivel da liberdade politica, prestando-se a todo o progressivo desenvolvimento do espirito humano, a que fim, com que razão recorrer a uma Dictadura?

Se entre os elementos sociaes houver desharmonia, e a divisão dos Poderes fôr invadida, o resultado será o enfraquecimento da Constituição, e a ruina da sociedade Todos os Governos tem condições da sua existencia, ás quaes não se póde faltar, sem grave risco de compromettimento. Importa á honra, ao interesse de todos que as situações sejam bem definidas, e nada tanto se oppõe e contraria este estado de segurança e estabilidade, como as Dictaduras; porque trazem sempre comsigo o receio e a desconfiança geral na estabilidade das Leis, dos contractos, e da propria segurança individual.

Uma Dictadura, debaixo de qualquer relação que seja considerada, attesta sempre, ou grande enfermidade no corpo politico, a que é preciso applicar-lhe este violento remedio, ou que a Constituição do Estado é tão fraca, que a ambição de um individuo, ou os interesses de um partido ou de uma facção, a fazem suspender: em qualquer das hypotheses, a situação é desfavoravel, tanto á sociedade, como aos! particulares. Se a Republica Romana, muitas vezes em circumstancias criticas, recorreu ás Dictaduras, e contou virtuosos Dictadores, que se contentaram com a gloria de ter salvado a sua patria, é certo tambem que a repetição destas Dictaduras temporarias trouxe nas Dictaduras perpetuas de Sylla e de Cezar, e estas o imperio dos Tiberio?, dos Neros e dos Caligulas. Tal é a logica dos factos! Tal é a lei da continuidade dos acontecimentos!

Como prefiro obedecer antes ás Leis da minha Patria, e satisfazer as inspirações da minha consciencia, do que inclinar-me perante o Poder que não considero legitimo, occupar-me-hei da Dictadura que no anno do Senhor de 1852, o Governo assumiu sem legitimo e justificado fundamento, nem ainda pretexto que a desculpasse.

Tenho como juizo seguro, que Dictadura e Absolutismo são dois aspectos da mesma idéa; e por esta occasião direi tambem, que não entro nas intenções dos Srs. Ministros sobre este facto, aliás inconstitucional e illegal; respeito sempre as boas intenções, ainda que a respeito dellas disse Lord Byron: — «De boas intenções, está o inferno cheio, porque não ha erro, não ha vicio, não ha crime commettidos pelos homens constituidos em auctoridade, que não sejam desculpados com as boas intenções.,. lia um facto acontecido nesta nossa terra, acontecido em Abril de 1851: proclamou-se então a reforma da Carta Constitucional da Monarchia.

O Chefe do Estado, na abertura do Parlamento em 1851, disse que, reconhecida a necessidade da revisão da Lei Fundamental do Estado, estavam os Ministros encarregados de apresentar a Proposta de um Acto Addicional á Carta Constitucional da Monarchia, a fim de serem reformados aquelles artigos, que a experiencia tinha mostrado ser indispensavel corregir e aperfeiçoar, para melhor garantia da liberdade, da Monarchia Representativa, e dos inalteraveis principios em que a mesma Carta a quiz estabelecer e constituir.

Seguiu-se depois a apresentação da Proposta do Acto Addicional; e no Relatorio que o precede se disse, que durante dez annos, desde 1836 a 1816, o principio da reforma, sem já mais ser negado por nenhum partido, foi todavia um motivo constante de discordia, de calamidades, e de guerras civis, cujos mutuos aggravos se deviam esquecer, sem perder da memoria as suas causas um só momento, para evitar que renascessem. Que se melhore e reforme, no que for indispensavel sómente, o pacto antigo, que desde o principio de nossa existencia social ternos com a Monarchia legitima; e que, melhorado pela outhorga da Carta, se ia agora revalidar pela acceitação do Acto Addicional. Ahi se disse mais, e peço a attenção da Camara, reforme-se sim, mas não se rasgue jámais aquelle pacto sagrado. Outras quaesquer instituições, por mais elaboradas que sejam, por mais completas que pareçam, ou por mais conformes a principios abstractos que seduzem na theoria, e mallogram na practica, não podem dar á liberdade, ao progresso da civilisação, e menos ainda á independencia nacional, a protecção, e a estabilidade que, hoje mais do que nunca, lhes são necessarias.

Depois de tudo isto, e de ter sido convertida em Lei a Proposta dos Srs. Ministros, quem esperaria que elles, poucos dias depois da promulgação do Acto

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Addicional, assumissem a Dictadura, quando todo o Paiz estava na mais completa tranquillidade!

Seria porque nem a Carla nem o Acto Addicional, por elles proprios elaborado, satisfaz ás necessidades da nossa vida social? A resposta está no que elles mesmos asseveraram.

Tambem todos nós vimos e presenciamos que, estabelecida a discordancia sobre objecto de finanças entre a Camara e o Governo, foi aquella dissolvida; e sendo certo que a dissolução da Camara electiva importa um recurso para o Paiz, não é por certo bem escolhida a occasião para se assumir uma Dictadura, para adoptar e querer fazer passar como Leis, medidas que tanto affectam os interesses desse mesmo Paiz, para o qual se recorreu por uma nova eleição, e a respeito das quaes elle mesmo já se havia pronunciado pelos seus Procuradores.

Como tenho por principio incontestavel, que não se podem julgar as acções dos homens, senão fazendo-lhes applicação das regras da moral, da justiça e da politica, procurei, mas não encontrei motivo sufficiente que, ou em abstracto, ou em concreto, justifique a Dictadura de 1852; ella não se fundou nem em razão, nem em direito, nem em necessidade social. Por uma e mais vezes me interroguei: Será esta Dictadura nina Dictadura monarchica? Não, porque ninguem contestou os direitos inseparaveis da Corôa; será ella democratica? Não, porque ninguem violou as liberdades publicas, a não ser, a seu modo, a propria Dictadura; será uma Dictadura logica, filha dos factos? Bem illogica me parece ella; ‘será uma Dictadura de victoria? Não houve guerra nem conquista; será ella semi-absolutista e semi-democratica, arrogando-se o Governo fazer Leis, e deixando ás Camaras a faculdade de as approvar? A resposta porém está no que aconteceu á Camara passada... Ainda continuei a interrogar-me, e tendo alguns Relatorios que precedem a alguns dos Decretos, inclinei-me a crer que ella era uma Dictadura utopista; que aquelles Relatorios tinham sido elaborados na Içaria; mas passando á parte dispositiva, suppuz que taes Decretos eram vindos de Constantinopla.

Considerando pois esta Dictadura debaixo de diversas relações, não só não lhe encontrei fundamento, mas nem ainda nome, que se ajustasse pelo seu fim.

Note-se comtudo, que esta Dictadura, quanto ás medidas financeiras, em cujo exame não entro agora, por não julgar occasião propria, pertende estabelecer a omnipotencia fiscal a respeito da propriedade, e que tende a renovar o antigo direito eminente; combato uma similhante Dictadura, pelo vicio do seu principio, no firme proposito de rejeitar as suas consequencias; combato-a, porque encerra uma politica que compromette e contraria as instituições, as liberdades publicas, e até a propria dignidade nacional; combato-a, porque não reconheço politica fóra do direito; combato-a, porque viola contractos, cuja execução é um principio de sociabilidade, e um dever de moralidade e de justiça.

A politica não é só uma sciencia de applicação, é tambem uma sciencia de applicação; a theoria deve marchar a par da practica; não se deve sacrificar a realidade ao idealismo. Melhoramentos, que offendem tantos e tão sagrados direitos de muitas pessoas do de todas as classes, generos, condições e idades, que inutilisam trabalhos, fadigas, riscos, economias, e frugalidade de uma vida inteira, não merecem tal nome, são violencias, são extorsões, são males gravissimos, que nenhum Estado, nenhuma sociedade politica, que este nome mereça, deva tolerar. Taes chamados melhoramentos contrariam todos os principios moraes sociaes, confundem todas as idéas, transtornam todos os elementos de ordem e de segurança. Desde que a boa politica fez prevalecer o principio da soberania do povo, sanccionando-se a emancipação do individuo; desde que se reconheceu que elle não deve estar exposto á vontade e capricho de um déspota, tambem não deve estar sujeito á força bruta, ou áquelle que della dispõe. Hoje são bem conhecidos os limites dos direitos da universalidade, e os dos individuos; tanto áquella como a estes, o direito protege com igualdade Se queremos melhoramentos, se queremos que o nosso Paiz floreça em agricultura, commercio, industria, artes e sciencias, guardemos e observemos os sentimentos de honra, e de religião, respeitemos os direitos de todos: não invoquemos para tudo esse sofisma do bem do maior numero pira destruir existencias, e offender a liberdade, a segurança, e a justiça universal. Admittida uma tal theoria, como imaginar uma sombra de resistencia legal a um Poder, que-póde arrogar-se unia Dictadura, e soltar-se dos limites em que deve circumscrever-se? O remedio então só poderá vir do excesso do mal, mas precipitando a sociedade no abysmo das revoluções.

Quando se lançam os olhos pelo mundo civilisado, descobre-se logo o grande pensamento, a grande idéa que preside á ordem social, principio moderador das vontades, das paixões e dos caprichos humanos. O direito governa o mundo moral, assim como a attenção governa o mundo fysico: individuos, familias, corporações, Governos, Estados, agitam-se em orbitas diversas, mas, todos regidos pelo mesmo regulador: o direito. E quem mais o deve respeitar do que os proprios Governos? Não é bom sabido, que o seu exemplo pelo despreso das Leis, é o que mais poderosamente corrompe as massas? A vida moral é o dever, e o dever é o respeito ao direito: não póde haver desharmonia entre a politica como direito practico, e a moral como theoria: entre a moral e a politica não póde dar-se opposição. O que será a politica separada da verdade moral, da verdade filosófica, e da verdade religiosa? Conforme-se a politica com a moral, e não a moral com a politica, como pertende certa escola, que nunca foi, nem jámais será a minha. As reflexões que faço, são unicamente dictadas por um vivo sentimento da verdade e da justiça; e se recorro aos principios, não é por ostentação, mas para que se não supponha que combato a Dictadura sem convicção.

Não é, por certo, bem constituida a sociedade, em que é necessario pedir aos homens o que se deve obter da justiça das Leis. As Dictaduras são o arbitrio, não são systema governamental, seu caracter é a incerteza e instabilidade, é a falta de garantias da liberdade, ordem e segurança.

Não faltará talvez quem diga, que esta Dictadura teve por fim desenvolver os principios constitucionaes, e promover os melhoramentos materiaes. Ainda quando os factos não provassem o contrario, bastaria considerar, — que é sempre errado calculo pertender ir adiante da Lei Fundamental do Estado; é argui-la de inefficaz, e impotente para fazer o bem. E só das Leis e do direito que os Governos recebem a sua au-

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ctoridade. Talvez haverá tambem quem affirme, que a Dictadura teve por fim melhor segurar a situação: mas que situação será esta? Quem a creou? Quem a dirige? A todas estas perguntas respondem os factos, responde a opinião sensata do Paiz, a consciencia publica, as queixas dos por ella opprimidos.

Os principios politicos podem, é certo, variar segundo os tempos, os logares, as necessidades e os interesses dos povos; mas isto não importa o arbitrio dos Governos, sujeitando á sua vontade, aos seus caprichos a Constituição do Estado, e as Leis. Os Governos tem rigorosa obrigação de respeitar e executar os contractos politicos. Se os Governos devem fazer punir os que se levantam contra as Leis, unicas garantias da ordem, segurança, liberdade, propriedade, honra e vida, como arrogar-se o poder de as infringir? Serão admissiveis Leis de duas faces? Será assim que se garante a liberdade do homem no dominio politico? Em tudo e necessario uma Lei, uma regra, que presidam ao movimento e ao desenvolvimento das cousas e dos seres: no mundo físico e no mundo moral, tudo cahiria na anarchia, no cahos sem a obediencia e sujeição a estas Leis e a estas regras. Em Politica, a fórma do Governo anda ligada da maneira a mais intima com a sociabilidade dos povos; e ella a sua maior força, a sua melhor direcção. A multidão, que não se reduz á unidade, é confusão; a unidade que não é multidão, e tyrannia; mas esta unidade não se póde obter senão pelas Leis da razão e da justiça, que devem reger as sociedades, impedindo-se assim conjunctamente a tyrannia e a confusão. Se o absolutismo de um, de muitos, ou de poucos mata até a propria intelligencia, nada cria; esse apregoado liberalismo demagógico tambem consume todas as existencias.

Já disse, e outra vez o repito, que tenho como melhor garantia possivel da liberdade politica a fórma representativa: é debaixo desta égide, que aquelles mesmos que a julgaram ha pouco morta e enterrada, para mais não se levantar, encontraram asylo e protecção. Argúem-Lhe defeitos, mas qual a fórma que os não tem? Devemos comtudo franca e sinceramente confessar que os seus maiores defeitos são antes devidos a má vontade, ás paixões e interesses dos homens, do que á qualidade do systema; e de todos os males com que é combatido, nenhum lhe é mais pernicioso do que o de uma Dictadura, que não se justifica pela necessidade imperiosa da salvação publica, e conservação das instituições.

Deverei agora lembrar, que o estado social de um povo não se transforma repentinamente, mas sim por modificações vagarosas e successivas; assim como que não se deve dar completo credito nos calculos e trabalhos do espirito, quando estes são isolados e não rectificados pelos sentimentos do coração. Não poucas vezes grandes e illustres caracteres se tem perdido nos espaços illimitados da intelligencia, por lerem mutilado do homem o coração; sendo certo, que sómente a reciproca concorrencia do espirito e do coração é a que subministra á razão os meios de que o homem póde e deve usar na direcção da sua vida, segundo as Leis da natureza. _

De quantos males não tem sido victimas os povos, por se não attender, por se desprezar os sentimentos, e para assim me explicar, a intelligencia do coração? Não se deixem, pois os que governam, seduzir pelo desejo da gloria de innovar, e de fazer melhoramentos, que nunca se realisarão, em quanto forem offensivos das Leis eternas, pelas quaes os homens na integridade da sua natureza se regem.

Sr. Presidente, sou prevenido, de que é dada a hora, e é forçoso que acabe...

Mando pois para a Meza uma Emenda á primeira parte do § 4.º da Resposta em dicussão, e é a seguinte. (Leu)

Ahi vai correr o seu destino essa Proposta: qual elle ha-de ser já o prevejo; mas, vencedor ou vencido, pouco me importa; a victoria pertence não á maioria da Camara, mas ao senso commum.

O Sr. Presidente: — Amanhã se dará conta á Camara da Proposta do Sr. Deputado: agora vou consultal-a ácerca do pedido do Sr. José Estevão, para lhe ser permittido, antes de fechar á Sessão, dar uma explicação.

Decidiu-se affirmativamente.

O Sr. José Estevão: — Quasi que estou envergonhado e arrependido da minha colera, mas não posso deixar passar este incidente sem reivindicar os meus direitos como Deputado e rogar a v. Ex.ª que tendo um poder soberano na minha amizade pessoal, não queira uzar delle para me negar direitos de que não posso prescindir nas relações publicas de Deputado da Nação Portugueza. Como Presidente da camara ninguem louva mais nem admira a imparcialidade de v. Ex do que eu; mas é preciso para ser imparcial não ser á custa dos seus amigos. Todos os lados da Camara tem o mesmo direito á justiça e attenção de v. Ex.ª, e eu julgo que v. Ex.ª não me reconheceu bem esse direito da maneira porque me tractou no incidente desagradavel que houve nesta Camara, e que não tem nada de pequeno e insignificante senão na origem delle.

Sr. Presidente, eu ouvi ao illustre Deputado áquem não sei o nome, mas de quem sou respeitador pelas suas cans, contar as historias dos últimos acontecimentos europeos com tal paixão, com tal azedume e acrimonia que me pareceu estranho nos seus annos e na sua pessoa; notei algumas frazes do seu discurso que me pareceram absolutamente injustas e muito pouco generosas, e pedi a palavra: V. Ex. perguntou me se era a favor ou contra o discurso da Corôa; esta interpellação era util e necessaria, estava na ordem; eu respondi = peço a palavra contra isto — quer dizer, o meu espirito de verdade não consentiu que sofismasse a intenção de v. Ex.ª, e abertamente declarei que não pedia a palavra nem a favor nem contra a Resposta ao discurso do Throno; nem realmente o Sr. Deputado nesta digressão fallava na materia, e eu pedi a palavra contra isto, para refutar o que estava dizendo o Sr. Deputado. Não sei se a fraze foi correcta e urbana, mas pareceu-me que outras menos correctas e menos urbanas tem sido proferidas nesta Casa sem estranheza; porém o Sr. Deputado levantou-se e depois de me dirigir toda a especie de injuria, deu-me palmatoadas, e tractou-me como uma creança. E v. Ex.ª concedeu mais prerogativas ás cans do Sr. Deputado (que eu tambem respeito, mas que não considero tanto como as de meu Pai,) do que devia ser, principalmente observando a humildade, com que ouvi a diatribe do Sr. Deputado, o qual se devia abster de injuriar um homem que sem grande ridiculo não devia acceitar um desafio com uma pessoa de tantos annos.

Sr. Presidente, se me querem fazer responsavel pe-

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los meus gestos, e pela mobilidade da minha fisionomia; se v. Ex.ª não se dispõe a interpor a sua auctoridade paternal quando me vir affrontado, ou se se lembrar de a applicar a todos excepto a mim; se intende que deve sustentar a sua imparcialidade á custa da minha honra o dos meus nervos, então sacrifico a minha procuração á amizade que tenho a v. Ex.ª, e retiro-me do Parlamento, porque não está no meti poder soffrer com resignação e força d'alma injurias como aquellas que me dirigiu o Sr. Deputado, cujo nome ignoro; nem nunca se viu n'um homem de tal idade e posição um pugillato de palavras, como as que me dirigiu. O Sr. Mello e Carvalho: — 'Peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Agora eu como o principal accusado: a Camara hade-me permittir que me defenda. (Apoiados)

Sinto muito que o Sr. Deputado pensasse que pertendo sustentar imparcialidade á sua custa; quero sustentar a imparcialidade que este logar reclama para desempenhar os meus deveres não á custa do Sr. Deputado, liem de nenhum Outro. (Apoiados) Se o Sr. Deputado julgou que eu me reputei offendido corri a resposta que me deu, hade-me permittir lhe diga que se enganou. É verdade que a não achei conforme porque o illustre Deputado devia responder — É pro ou contra — e foi por isso que lhe dirigi uma nova pergunta; mas depois da nova resposta do Sr. Deputado, inscrevi-o como intendi que devia fazel-o

Quem se julgou offendido com a resposta do Sr. Deputado foi O Sr. Mello e Carvalho ao qual, voltando-se para o Sr. Deputado, eu adverti que fallasse para a Meza, como o meio de evitar o progresso do que estava dizendo, e disse-lhe aquillo que intendi melhor, por S. Ex. estar usando de expressões improprias do Parlamento: e elle promptamente declarou que as retirava. Mas como podia eu obstar a que o Orador, que se considerava offendido, retribuisse essas offensas se por ventura o eram? O que peço acreditem é que eu não quero ser imparcial, á custa de ninguem. Mas o que desejo é que cada um faça pela sua parte por não dar motivo a scenas desagradaveis; porque tenho notado immensas vezes, cada dia a experiencia neste logar mais me ensina, que se cada um não cumprir religiosamente não direi já os preceitos do Regimento, mas da dignidade Parlamentar, é impossivel a quem quer que seja, a toda a Camara, quanto mais ao Presidente, mante-los como elles devem ser mantidos. (Apoiados).

Vou consultar a Camara igualmente sobre se permitte que tambem falle para explicação o Sr. Mello e Carvalho.

Decidiu-se affirmativamente.

O Sr. Mello e Carvalho: — Sr. Presidente, eu querendo mostrar que as Dictaduras successivas são prejudiciaes, fiz um retrospecto para as Monarchias absolutas, cujo restabelecimento considero impossivel, e tambem disse, que se estas eram impossiveis, não menos eram impossiveis as Republicas democraticas: que ambas estas formas, na actualidade da civilisação eram impossiveis porque não offereciam garantias á vida social. Fiz menção de certos factos que são do dominio da Historia, e referindo-me a elles, como podia eu fazer injuria a quem quer que fosse? Não fiz injuria, e se pronunciei o nome do Sr. José Estevão Coelho-de Magalhães quando pedi u a palavra quando eu fallava, e porque estava perfeitamente certo de que não tinha soltado uma só expressão pela qual alguem se pudesse offender.

Portanto declaro que não usei de uma só expressão que fosse offensiva nem da dignidade da Camara, nem da dignidade de nenhum Sr. Deputado, não sei que a usasse, não sei que expressão fosse essa, ninguem ma notou; mas se eu a disse-.se, se eu a pronunciasse, declaro desde já segundo os principios da minha educação, da minha idade, e da minha posição, que eu a retirava.

Consequentemente não tendo eu em nada fallado á dignidade da Camara, e á minha propria, nenhuma explicação posso dar.

O Sr. Presidente: — A ordem do dia para amanhã, é a mesma que vinha hoje. Está levantada a Sessão. — Eram Mais de quatro horas da tarde.

O 1.º REDACTOR

J. B. GASTÃO

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