475
DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
ver, que é esperar pelas votações d'esta casa, de fórma que se possam apresentar ao poder moderador, não, dizendo que tire ministerio á sorte, ou indicando-lhe o successor mais conveniente, mas dizendo que os representantes do paiz se manifestaram em tal ou tal sentido, ou deixando-o dizer aos presidentes das duas casas do parlamento. (Apoiados.)
Sr. presidentes, estes são os principios do systema parlamentar em todos os paizes livres. (Apoiados.)
Entre nós parece que são novidade, e não sei até se a muitos poderão parecer blasphemia.
Deixando porém estas divagações, eu venho reconhecer e affirmar perante a camara, a necessidade que nós temos de crear receita e de equilibrar o orçamento.
Eu venho reconhecer que o governo firmado n'uma verdadeira maioria parlamentar, não só tom o direito, mas tem a imperiosa obrigação de procurar quanto antes que o orçamento do estado não seja uma illusão, e que o saldo das diversas contas ou o fim dos exercicios não represente a necessidade impreterivel do um novo emprestimo consolidado, deixando logo outro a crear-se e a medrar pela divida fluctuante e pelo deficit, para se pedir tambem a sua conversão n'um periodo mais ou menos breve.
Sr. presidente, eu não partilho das idéas do sr. Luciano de Castro quando exige para a votação do imposto... quando exige a este governo, entenda-se bem (Riso), antes de pedir o imposto a apresentação de todas a reducções de despeza que seja possivel fazer-se.
Eu não tenho essa exigencia, e não a tenho porque ainda novo na vida publica tenho todavia a experiencia já dos diversos ministerios, e dos diversos systemas que normalmente podem ser experimentados e applicados a este paiz.
Eu não quero este systema, porque não quero concorrer para termos a cotação dos nossos titulos de divida publica a 28 ou a 29.
Eu não quero a continuação d'este systema, porque não quero emprestimos ou supprimentos com multas, commissões e juros, cujo preço o illustre deputado o sr. Luciano de Castro sabe melhor do que ninguem, por ter feito parte de uma situação que teve de pagar a multa em que tinha incorrido a situação anterior.
Se esta perspectiva, se este futuro póde agradar a alguem, eu digo que não me agrada a mim, que não quero concorrer para tal situação, e que com o meu voto hei de oppor-me terminantemente a que se inspirem ao paiz esperanças absolutamente irrealisaveis que representam um sacrificio carissimo e que não só impossibilitam por largo tempo o desenvolvimento de todos os progressos da civilisação, mas até precisara de bastante demora para cicatrizar as feridas que deixam.
Portanto, para mim é questão necessaria e urgente tratar de crear receita para que se salde o orçamento.
É indispensavel que se façam todas as economias que forem compativeis com os serviços publicos e com a boa administração, é indispensavel que se façam todas as reducções e todos os córtes de despezas inuteis e perfeitamente dispensaveis e desnecessarias; mas é indispensavel tambem que uma cousa acompanho a outra, isto é, que ao mesmo tempo se trate de procurar o equilibrio orçamental pelos dois meios que nos devem conduzir a esse resultado; tanto o corte de despezas inuteis como a creação de receitas novas.
Não nos desenganemos nós, porque nós já estamos desenganados; mas não pretendamos enganar o paiz não lhe pondo bem patente que o meio de saldar o orçamento ha de ser principalmente o imposto.
Nós temos obrigação de procurar quaes são os melhores impostos; nós temos de indagar quaes são os impostos que podem dar o resultado que precisamos obter, que é indispensavel e que todos desejâmos. Eu direi, que voto de preferencia a todos os impostos o imposto sobre o consumo.
Já disse isto; repito-o agora a v. ex.ª e á camara terminantemente, e direi a rasão do meu voto.
Voto o imposto sobre o consumo de preferencia a todos os impostos, porque para mim o imposto do consumo, alem de ser o mais suave na cobrança, é aquelle que vae recaír, que vae incidir sobre um maior numero de pessoas, e portanto aquelle que, pela divisão, se torna mais igual e menos sensivel.
Não me impressionam os receios do meu illustre amigo e collega o sr. Arrobas, que se assustou pela existencia do mendigo, que era obrigado a concorrer tambem para o equilibrio orçamental e para as despezas publicas.
Eu creio que estas declamações, a que nem poeticas posso chamar, são perfeitamente inuteis, e estes receios completamente infundados.
Não sei que outra definição se possa dar de mendigo, senão a de pessoa que vive á custa d'aquelles a cuja caridade recorre. Ora, se essa pessoa come á custa d’aquelles a quem recorre, é claro que o imposto não é pago por ella, é pago por quem lhe dá de comer.
Se ao imposto indirecto, e especialmente ao imposto de consumo estão habituados outros paizes, que não podem dispensar este imposto, muito menos o podemos dispensar nós, que, pela pratica de largos annos, estamos habituados a crear no paiz classes distinctas, mais ou menos privilegiadas, mas divididas e separadas entre si; situação esta em que os poderes publicos não têem pensado devidamente, mas que já vae produzindo as suas consequencias, e que se em tempo não attendermos a este mal, póde em breve dar resultados muito parecidos com as celebres castas da India.
V. ex.ª e a camara sabem perfeitamente que n'este paiz ha uma classe, e uma classe numerosa, que não contribue com cousa alguma, pelo imposto directo, para as despezas publicas.
Esta classe que vive á custa dos rendimentos do orçamento, refiro-me aos possuidores dos titulos da divida publica; (Apoiados.) essa classe, repito, que vive á custados rendimentos do orçamento do estado, que lhes paga religiosamente os juros (Apoiados.) não contribue com cousa alguma nem para a receita nem para a despeza publica, (Apoiados.) e todavia a sociedade portugueza garante a elles, como aos outros, a sua vida, a, sua fortuna, e emfim, todos os direitos de que gosam os cidadãos portuguezes. (Apoiados.)
Nós pagamos de juro da divida publica mais de réis 13.000:000$000 annuaes.
Todos os governos e todos os parlamentos encontrariam á mão um largo meio de receita, tributando os juros da divida publica (Apoiados.) na mesma proporção em que estão tributados os dividendos dos diversos bancos e companhias, (Apoiados.) e assim com um simples traço de penna o governo teria assumido uma receita, proximamente, de 1.800:000$000 réis. (Apoiados.)
Qual é a rasão porque nenhum governo nem nenhum parlamento lança mão d'esta medida? Será porque o capital invertido em emprestimos ao estado possa adquirir perante a sociedade um caracter novo e uma natureza especial que o isente de todos os impostos que pesam sobre todos os outros capitães tão legitimamente adquiridos e sustentados como aquelles?
Não é, de certo; e não é, porque nações mais adiantadas, nações roais cultas e nações igualmente respeitadoras do seu credito e da boa fé dos contratos, tendo dispensado esses titulos primeiramente de todos os impostos, recorreram depois ao meio de os tributar com grande vantagem não só para o estado, mas até para os proprios possuidores dos fundos publicos assim tributados. Porque será que se não lança mão entre nós deste recurso? Porque será que eu mesmo que o aconselho, que o lembro d'este logar, se estivesse actualmente no logar do ministro da fazenda, nem o lembraria, nem o proporia, e havia de recusal-o logo que m'o propozessem? Porque será isto?
Isto é unica e simplesmente porque os governos, preci-
Sessão de 26 do fevereiro de 1878