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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Referir-me-hei ainda a outras questões igualmente economicas.

Parece-me indispensavel que o governo attenda á organisação da propriedade em Portugal e ás leis de successão. A legislação actual a este respeito é obsoleta e absurda, (Apoiados.) injustificavel perante os principios de liberdade e os preceitos da sciencia.

Temos uma legislação que esmaga e embaraça todo o desenvolvimento da riqueza publica, e eu não conheço outras fontes de riqueza que não sejam a agricultura, o commercio e a industria. (Apoiados.)

As leis organicas de propriedade são absurdas e impossiveis, e folhem o desenvolvimento não só do valor, mas da fabricação e dos processos de boa cultura, o a creação dos productos, que constituem a principal riqueza do paiz. (Apoiados.)

As leis de successão com o systema de inventarios e de partilhas forçadas que inventámos e conservâmos, estabelecem quasi sempre, em seguida á morte do proprietario, ou do dono do estabelecimento commercial, industrial ou agricola, que deixa filhos, uma liquidação forçada, absurda e vexatoria, a que não resistiria o proprio banco do França ou o de Inglaterra.

É isto que mantemos e sustentâmos, liquidando ou reduzindo todas as fortunas particulares, e impedindo os meios legitimos de producção, obstando assim ao augmento e á creação de estabelecimentos, tanto industriaes como commerciaes, que na Inglaterra e na America do norte constituem a principal riqueza d'estes paizes e são a origem da sua grande importancia. (Apoiados.) É isso o que não queremos entre nós.

As disposições que tinhamos no nosso direito antigo, e que nos approximavam do fim a que podiamos e deviamos chegar, ou que pelo menos obstavam a grande parte d'estes inconvenientes, revogâmol-as com enthusiasmo igual ao prejuizo que voluntariamente procurâmos. (Apoiados.)

Não quero dar grande desenvolvimento a este ponto, e não imagine a camara que eu, referindo-me a estas disposições, sou por alguma fórma partidario ou enthusiasta dos vinculos ou dos antigos prazos. Não o sou.

O systema que sigo é o da America do norte, e as minhas idéas a este respeito constam dos registos parlamentares.

N’este paiz todos somos em theoria excessivamente liberaes, prodigiosamente descentralisadores; mas na pratica temos ainda o codigo commercial, o codigo administrativo, o outras bellezas que melhor é não referir n'este momento.

Não temos o credito predial e falta-nos o registo predial. Temos os dois nomes a fingir que temos as duas cousas, mas nenhuma d'ellas existe.

Do registo predial depressa me desenganei, depois de ser illudido por algum tempo, que se quiz apenas crear os logares e despachar os conservadores. Feito isto, poz-se perpetuo silencio sobre este negocio.

Temos empregados de registo predial, temos a apparencia de credito predial, mas procurâmos a realidade de qualquer d'estas instituições, e não a encontrâmos.

É o que temos cousa muito differente do que a theoria ensina, e do que existe nos paizes onde estas instituições desenvolvem a riqueza publica, e protegem uma das fontes mais importantes da riqueza nacional. (Apoiados.)

Assim vamos cada vez peior.

Podemos chegar a querer tributar, e não encontrar em que o imposto possa recaír, se não tratarmos desde já de attender ao desenvolvimento da riqueza.

Vou terminar as minhas observações.

Eu entendo que o imposto de consumo a que se refere a proposta que estamos discutindo, sempre que seja considerado ou applicado. como imposto geral do estado, nunca poderá dar o resultado que ha de dar quando seja considerado como imposto municipal.

O meu voto, o meu desejo seria deixar o imposto do consumo devidamente regulado por lei, devidamente fixados todos os casos a que tem de ser applicado, e cntregal-o unica e exclusivamente aos municipios, cobrando d'elles ou uma receita fixa e superior áquella que o estado recebe actualmente, ou por um systema de avença a parte proporcional que se combinasse.

De resto, como imposto geral, eu posso dizer á camara e digo-o ao governo, mas com grande magua minha porque reputo o sr. ministro da fazenda absolutamente innocente do projecto que se discute, digo-o principalmente á commissão de fazenda, os senhores estudam a historia, recebem a lição dos factos, apresentam esses factos, documentam essas lições, o que aproveitam? Exactamente o contrario da demonstração que os factos produzem.

O imposto de consumo administrado municipalmente rende muito mais de que administrado pelo estado.

É o que diz o relatorio da proposta do governo transacto. É o que os factos demonstram.

Que conclusão tiram d'aqui? Que o estado deve augmentar o imposto já grande administrado por elle, que produz menos do que um imposto pequenissimo da mesma natureza applicado pelos municipios.

A logica mudou. Se os municipios têem todos os meios o condições para applicar e cobrar este imposto sem vexames, ou com os menores vexames possiveis, se o imposto pequeno administrado pior elles rende mais que o imposto grande administrado pelo governo, a consequencia logica, necessaria, indispensavel parecia que era entregar o lançamento e a cobrança do imposto de consumo aos municipios, recebendo d'elles ou a quota determinada que se lhes applicasse, ou a parte proporciona! por que se avençassem, conforme o systema que parecesse preferivel.

Note v. ex.ª, sr. presidente, que este projecto veiu surprehender-me; eu não esperava tão cedo a sua discussão; por consequencia não estou, nem posso estar preparado com indicações praticas que poderiam lançar muita luz sobre este assumpto.

É certo que os municipios se queixam que desde que o estado principiou a cobrar o real de agua, não só não encontrou o rendimento que devia encontrar, mas concorreu muito para fazer diminuir o rendimento municipal que até ali existia, (Apoiados.) São estes os factos, e por mais que os illustres deputados leiam o meditem, por mais que traduzam e commentem a legislação franceza, desenganem-se, que temos que viver em Portugal com os habitos e costumes portuguezes, (Apoiados.) e que não lucrâmos nada em applicar a este paiz precipitadamente, traducções mais ou monos acertadas, peior ou melhor feitas, (Apoiados.) quasi sempre incompativeis com os habitos, com os costumes e com a vontade do paiz; e que á força não poderão ser-lhe impostas, só porque são traduzidas ou imitadas da legislação franceza.

Sr. presidente, todos nós que temos alguma pratica da vida local, especialmente nas provincias, sabemos que as camaras municipaes têem recursos proprios e meios suaves para conseguir o que o governo nunca póde conseguir sem lazer despezas enormes com empregados novos e sem levantar contra si resistencias no paiz.

Sr. presidente, terminando digo, que oppondo-me a este projecto creio fazer ao governo, mesmo contra sua vontade, o maior serviço politico que se lhe póde fazer; e se eu poder evitar a votação da lei como está redigida, tenho a consciencia de ter concorrido para um grande beneficio ao paiz.

Em todo o caso as minhas explicações foram dadas e a minha posição fica definida.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Presidente: — A grande deputação que deve assistir na quarta feira 27, ás duas horas da tarde na sé cathedral, a um solemne Te Deum pela exaltação do Summo

Sessão de 26 de fevereiro de 1878