SESSÃO DE 22 DE FEVEREIRO DE 1886 489
No dia 27 de novembro ninguem poderia presumir que tal questão ía apparecer, e tão viva e apaixonada. Foi d'ella que a opposição se aproveitou para nos derrubar, impedindo todos os dias aqui, no parlamento, os esforços leaes e sinceros do governo para a resolver.
Todos nos lembrâmos que hontem, como ante-hontem, como todos os dias, os deputados de Braga pediam constantemente ao governo que resolvesse immediatamente aquelle conflicto.
Ora, toda a gente sabe, que o governo queria resolvel-o por um modo justo e pacifico, não esmagando Guimarães em prol de Braga, não sendo pelo mais forte contra o mais fraco, mas pondo acima de tudo a representação da vontade dos povos.
A opinião do governo transacto era mais conforme com os principios de justiça e até com os principios em outro tempo defendidos por alguns dos actuaes ministros. Essa questão não póde ser resolvida com o parlamento aberto, porque os nossos adversarios, acima de tudo, o que queriam era a posição que hoje occupam. (Apoiados.) Pois tenham-a muito embora. Vivam felizes e contentes, e oxalá que a opposição actual seja mais alevantada e patriotica, e nunca faça de uma lamentavel questão entre duas cidades do reino a sua arma de combate mais perigosa e envenenada. -(Muitos apoiados.)
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Sr. presidente, temos agora uma nova theoria constitucional, uma nova theoria governativa.
Essa nova theoria governativa é de que a questão entre Braga e Guimarães foi um acaso.
Pois eu tinha aprendido no estudo das sciencias mathematicas que o acaso é cousa que não existe, que no mundo dos phenomenos cosmicos, como no mundo dos phenomenos sociaes, tudo está sujeito a leis immutaveis e inalteraveis, e não obedece cousa nenhuma a qualquer divindade cega, que se chama acaso.
O acaso é a desculpa dos fracos e dos imprevidentes, dos que não souberam prevenir conflictos nem depois d'elles cumprir com os seus deveres. (Apoiados.)
O acaso! O acaso era o conflicto que nascia, que augmentava, sem que o governo tomasse providencias para pôr termo a essa situação!
Seria tambem por acaso que, se os deputados da opposição, usando do seu direito, como s. exa. hoje usa, pediam ao governo explicações claras, terminantes e positivas, o governo não as dava, antes tergiversava e fugia.
Com o mesmo direito com que hoje o illustre deputado fez a sua pergunta, faziamos igual interrogação; mas a differença era que nós perguntavamos e não achavamos quem respondesse, e o illustre deputado perguntou e teve quem lhe respondesse.
A sua pergunta teve resposta franca, clara, leal e definida do governo. (Apoiados.)
Os governos que não têem opinião formada, decisiva, sobre qualquer questão, esses governos é que cáem por acaso! (Vozes: - Muito bem.)
Não quero abusar da vantagem que involuntariamente o illustre deputado me deu, apesar do seu grandissimo talento, a que prestei homenagem n'aquelles logares e presto d'aqui.
Não quero; quando não, com quanto proveito não poderia aproveitar as comparações hypicas, e não fallaria das pistas, das metas, de quem as toca ou não toca, os premios de consolação.
Não entro n'esse caminho; não quero saber se o logar de deputado vale mais do que outro qualquer e tambem póde ser meta...
O sr. Franco Castello Branco: - Isso é para mim?
O Orador: - V. exa. julga de certo que o logar de deputado é honroso.
O sr. Franco Castello Branco: - Eu nunca protestei não acceitar.
O Orador: - Nunca protestou não acceitar o logar de deputado; fez muito bem em não protestar, porque senão havia de arrepender-se. (Apoiados.)
Todos sabem que eu protestei não acceitar logares que dependessem da acção do governo; nunca acceitei nenhum em proveito meu. (Apoiados.) Quanto ao mais, eu comprehendo a mágua do illustre deputado; é a um sentimento generoso e nobre a que s. exa. obedece levantando a sua voz; mas é essa mágua que lho faz esquecer que nós não estamos aqui a ameaçar ninguem, estamos para trabalhar pelo bem publico e para isso invocâmos a benevolencia da camara. Ameaçarmos Guimarães com regimentos é phantasia de imaginação exaltada. Nem por um momento só nos passou pela idéa comprar a cidade de Guimarães ou outra qualquer. A quem o pensar se dirigem as censuras do illustre deputado. Nem n'este logar nem n'aquelles nenhum de nós ousaria proferir uma phrase que trahisse similhante pensamento. Eu não sou filho do Guimarães; mal conheço aquella cidade, mas devo-lhe favores e consideração, e seria o ultimo dos meus collegas por cuja mente perpassaria a idéa de seduzir uma cidade d'aquellas. Esse pensamento villão não occorreu, nem podia occorrer aos meus collegas.
A questão é de honra e de brio. Será, mas as questões de brio e de honra resolvem-se por processos conhecidos, e não devem servir de pretexto á desordem da administração, nem á anarchia. Haja por Guimarães como por Braga todas as considerações devidas a duas cidades importantes e illustradas, mas não se sustente que a confusão e a desordem são meios de vingar affrontas, quando affrontas tenham existido. Pelos processos administrativos se resolvem as questões de administração; outros hão de empregar-se para decidir contestações de decoro.
Fallou o illustre deputado da cotação dos fundos.
Eu não sei por que preço estarão as inscripções quando eu saír d'aqui, mas sentiria a maior mágua se, tendo-as encontrado a 53, as deixasse em menos de 4õ. (Apoiados.)
O sr. José Borges de Faria: - Pedi a palavra, sr. presidente, logo ao principiar esta sessão, porque, sr. presidente, desejo ser coherente em todos os meus actos, tanto quanto posso e tanto quanto sei.
Tendo perguntado todos os dias, nos ultimos tempos, ao governo presidido pelo sr. Fontes qual era a sua opinião a respeito do conflicto levantado entre Braga e Guimarães, creio que daria provas de parcialidade se hoje não fizesse igual pergunta ao novo governo.
Foi esta uma das intenções com que pedi a palavra a v. exa. Não necessito, porém, fazer esta pergunta ao governo porque o nobre presidente do conselho de ministros, respondendo ao meu collega e amigo Franco Castello Branco, fez tão claras e categoricas declarações a favor da integridade do districto de Braga, que eu não tenho senão motivo para applaudir e elogiar quem inicia com actos de justiça, como este, os primeiros tempos do seu governo.
S. exa. pronunciára-se clara e terminantemente a favor da integridade do districto de Braga no governo, como o fizera quando opposição; foi coherente e fez justiça a Braga e praticou um acto que o nobilita. Nos conselhos da corôa não poda haver hesitações, não se admitte outra orientação que não seja a da justiça, e n'esta questão só Braga a tem.
Não quero irritar este incidente, mas como protesto a algumas phrases ditas pelo meu amigo Franco Castello Branco, illustrado deputado por Guimarães, mais uma vez em nome da cidade de Braga, que não só represento como presidente da camara municipal, mas como deputado, declaro que ella tem a mesma consideração pela cidade de Guimarães, que nunca teve a intenção de a offender ou insultar, e de que nunca quiz assumir a responsabilidade dos actos praticados no dia 26 por uma turba anonyma contra indi-