494 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Mas então para que é o ministerio da agricultura? (Apoiados.)
Eu preferiria antes que se fizesse o inquerito agrícola, que se conhecessem os males da agricultura, e que depois se creasse o ministerio de agricultura, se por acaso as circumstancias do thesouro fossem compatíveis com essa creação.
Eu sinto, e não podia deixar de sentir, que a idéa da creação desse ministerio partisse do meu illustre amigo o sr. Emygdio Navarro.
Pois não é s. exa. um dos vultos mais importantes do partido progressista?
Não tem s. exa. affirmado a sua extraordinaria intelligencia, quer nas luctas da imprensa, quer nas luctas do parlamento? (Apoiados.)
Não é s. exa. um luctador infatigavel, um homem de trabalho?
Receia, porventura, das suas forças ou da sua intelligencia para gerir os negocios das duas repartições, e precisa declinar em outro ministro os negocios da agricultura?
Eu comprehendo que em circumstancías regulares, quando as forças do thesouro estivessem desafogadas, se creasse esse ministerio; mas o governo calculou já quanto está no orçamento para despezas de agricultura e quanto seria necessario descrever n'elle quando esse ministerio se creasse? (Apoiados.)
Porventura o governo já calculou os milhares de contos que será preciso gastar para dessalgar as terras do Ribatejo, para fazer os canaes de irrigação, para transformar a cultura cerealífera em abundantes pastagens, para submergir as vinhas, um dos processos indicados para combater a phyllaxera?
Tudo isto são largos emprehendimentos para que o thesouro não está preparado.
Mas entre os males, que affligem a agricultura, eu aponto ao governo alguns, que não dependem, de augmento de despeza para serem evitados; dependem de medidas legislativas. E visto que o partido regenerador, pela boca do sr. Pinheiro Chagas, aguarda com serenidade os actos do governo e os discutirá, e votará conforme a sua consciencia e os interesses do paiz, é possível que, se o partido progressista entendesse que a agricultura precisava de prompto remedio para algum dos seus males, é possível que, numa questão como esta, que não é partidaria, a camara estivesse ao lado do governo. (Apoiados.)
Mas, ao passo que o sr. presidente do conselho invocava a benevolencia da camara, não politicamente, mas no interesse do paiz, fallava tambem na creação do ministerio de agricultura como facto indispensável para poder governar. Isso é que eu contesto.
S. exa. sabe que a questão agrícola resume-se hoje principalmente em dois pontos importantes. O lavrador vê depreciar o seu género, porque o trigo vale menos 25 por cento do que valia ha quinze annos, ao passo que a farinha teve uma diminuição de 20 por cento e o pão de 10 por cento; e a desharmonia em que se encontra o preço do pão e do trigo constituo a desgraça do lavrador, sem proveito do consumidor, porque o consumidor não paga o pão pelo preço por que o deve pagar e o lavrador vende o trigo mais barato do que o devia vender. Este mal remedeia-se, ou por elevação dos direitos sobre o trigo estrangeiro, ou pela diminuição do direito sobre as farinhas. Portanto este mal remedeia-se com medidas legislativas que podem engrossar o rendimento do thesouro, modificando-se num ou noutro sentido a pauta.
O nosso paiz tem hoje uma região florescente, a região vitícola, as plantações succedem-se por todos os lados; ha uma crise de braços por toda a parte, porque as plantações são muitas.
A França tem procurado o nosso mercado para se abastecer de vinho em consequencia da falta que ha d'elle n'aquella nação, falta devida á phylloccera, que tem arruinado os seus vinhedos; mas no dia em que as circumstancias da França mudem, ella não ha de vir buscar aqui tanto vinho como agora; porque a França é incansavel na lucta.
Por consequencia, é preciso abrir novos mercados, e com uma verba que está no orçamento, ligeiramente augmentada, nós podemos estabelecer exposições que, tornando conhecidos os nossos vinhos, facilitem a abertura de novos mercados.
O nosso paiz produz vinhos brancos finíssimos, que não podem ir aos mercados estrangeiros, porque são muito elevados os direitos de exportação; diminuídos os direitos de exportação e diminuídos os direitos da importação da aguardente de cereaes, tanto bastava para melhorar esta industria, e não havia augmento de despeza, mas sim de receita. Para que é então necessario crear o ministerio de agricultura?
Outras providencias ha ainda a empregar, uma d'ellas diz respeito principalmente ao ministerio da guerra, e talvez a camara se admire de me dirigir directamente ao sr. ministro da guerra.
Consta-me que os fornecimentos das padarias militares eram feitos com trigo nacional e estrangeiro, e que ultimamamente, attendendo-se á barateza dos generos, se têem feito só com trigos estrangeiros.
Porque não põe o sr. ministro da guerra desde já em execução, como fez a França, uma providencia para que os fornecimentos da padaria para o exercito sejam feitos com generos nacionaes?
Aqui está um modo de remediar muitos males da agricultura, fazendo subir o preço do cereal.
Eu não quero prolongar, o debate. As minhas observações eram tendentes a demonstrar que as declarações do sr. presidente do conselho me alegraram ao principio mas entristeceram-me depois, porque vi que o programma do ministerio era immediatamente falseado pela declaração do augmento da despeza, que eu julgo desnecessario, em vista das difficuldades do thesouro.
Faça-se um inquerito agrícola e depois de feito, se as circumstancias do paiz o permittirem, crie-se um ministerio de agricultura.
Faça-se o inquerito, mas antes de o fazer tome o governo as medidas indispensaveis para remediar os males que affligem a agricultura e para os quaes não ha augmento de despeza.
Tenho dito.
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Responderei em poucas palavras ás observações do illustre deputado; mas, antes de dar algumas explicações sobre a maneira como o governo considera a questão agricola, convém dizer que a s. exa. parece ver uma contradição onde ella não existe.
O sr. presidente do conselho disse que era tal o interesse do governo pelos progressos agrícolas, commerciaes e industriaes do reino, que julgava muito util separar a agricultura, o commercio e a industria das obras publicas, para com estes elementos crear um novo ministério; mas não disse que era isso a primeira e a mais inadiavel necessidade da situação presente.
O illustre deputado não ouviu bem, faço esta justiça á sua lealdade, e tem sempre imaginado que o governo o que julga indispensavel fazer sem demora é crear um ministerio da agricultura, commercio e industria. Não. O governo está sinceramente empenhado em crear este ministerio, que julga utilíssimo para o paiz; mas ha de escolher para isso o momento opportuno, assim como na questão das reformas políticas; e ha de fazel-o quando d'ahi não resulte transtorno para o thesouro.
O illustre deputado chamou a attenção do governo para a questão agricola. Não ha para mim questão mais grave do que essa. Nasci entre lavradores, entre elles me creei e até quiz a sorte que eu quasi sempre tenha sido eleito por