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N.º 34

SESSÃO DE 11 DE AGOSTO DE 1897

Presidencia do exmo. sr. Eduardo José Coelho

Secretarios - os exmos.

Joaquim Paes de Abranches
Manuel Telles de Vasconcellos

SUMMARIO

Lida e approvada a acta têem segunda leitura os projectos de lei do srs. Carlos Ferreira e João Pinto apresentados na sessão anterior. - O sr. Fialho Gomes apresenta um parecer sobre a proposta 8-B. - O sr. conde de Paçô apresenta uma representação e bem assim os srs. Campos Henrique e Lopes de Carvalho. - O sr. Jacinto Candido refere-se a attentados praticados na ilha Terceira, respondendo-lhe o sr. ministro da guerra. - O sr. ministro da fazenda responde tambem ao sr. deputado sobre as contas da companhia de tabacos. - Mandam apareceres de commissões os srs. Correia de Barros, Joaquim Tello, Loureço Cayola e Dias Costa, que apresenta e pertence ao parecer n.º 19 que entrou logo em discussão e foi approvado. - Mandam papeis para a mesa os Srs Telles de Vasconcellos, Teixeira de Sousa e Marianno de Carvalho.

Na ordem do dia, discussão do projecto n.º 18 (contrato com o banco de Portugal), fallam sucessivamente os Srs. Dias Ferreira, ministro da fazenda, Marianno de Carvalho, conde de Burnay, Franco Castello Branco e Jacinto Candido.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 44 srs. deputados. São os seguintes: Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alvaro de Castellões, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões, Arthur Alberto de Campos Henrique, Carlos José de Oliveira, Conde de Alto Mearim, Conde de Paçô Vieira, Eduardo José Coelho, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Furtado de Mello, Francisco Silveira Vianna, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, João Catanho de Menezes, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João de Mello Pereira Sampaio, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, Joaquim Simões Ferreira, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Augusto Correia de Barros, José Bento Ferreira de Almeida, José Dias Ferreira, José Frederico Laranjo, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Barbosa de Magalhães, José Maria Pereira de Lima Fialho, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Libanio Antonio Fialho Gomes, Loureço Caldeira da Gama Lobo Cayola, Luiz José Dias, Manuel Telles de Vasconcellos Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Sertorio do Monte Pereira e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Tavares Festas, Augusto Cesar Claro da Ricca, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Conde de Burnay, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Ressano Garcia, Jacinto Candido da Silva Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Monteiro Vieira de Castro, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Viega, José Adolpho de Mello e Sousa, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Eduardo Simões Baião, José Joaquim da Silva Amando, José Maria de Oliveira Matos, Luiz Fischer Berquó Poças Falcão, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Pinto de Almeida, Marianno Cyillo de Carvalho, Visconde de Melicio e Visconde de Silves.

Não compareceram á sessão os srs.: - Antonio Maria Dias Pereira Chaves Maziotti, Augusto José da Cunha, Conde de Idanha a Nova, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco de Castro Mattoso da Silva Côrte Real, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Abel da Silva Fonseca, João Antonio de Sepulveda, João Joaquim Izidro dos Reis, José de Abreu do Couto Amorim Navaes José Benedicto de Almeida Pessanha, José da Cruz Caldeira, José Estevão de Moraes, Sarmento, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Malheiro Reymão, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Affonso de Espregueira e Sebastião de Sousa Dantas Baracho.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio do reino, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Marianno de Carvalho, os documentos ácerca do estabelecimento de tracção electrica em Lisboa.

Para a secretaria

Senhores: - A verba n.º 294, classe 6.ª, tabella n.° 2., da lei de 21 de julho, de 1893, diz: - «Nas constituições sociaes mencionadas n'esta verba pagar-se-ha mais sobre todo o capital nominal da constituição e no futuro sobre qualquer augmento d'esse capital... 2 por 1:000.

N'esta verba não se fez menção de nenhumas constituições sociaes e por isso é completamente inexequivel tal disposição. - É certo, que a lei quiz fazer referencias ás verbas anteriores 292 e 293, em que se mencionam varias constituições sociaes; mas como disse cousa differente e as leis de fazenda que impõem encargos se devem interpretar restrictamente, não é justo fazer applicação dos seus preceitos por quaesquer considerações mais ou menos admissiveis.

Para evitar de futuro difficuldades e sanar desde já inconvenientes, tenho a honra de submetter á vossa apreciação approvação o seguinte

Projecto da lei

Artigo 1.º A verba n.º 294, classe 6.ª, tabella. n.º 2, da lei de 21 de julho de 1893, será emendada substitui-

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do-lhe as palavras «n'esta verba» por as palavras «nas verbas n.ºs 292 e 293».

Art. 2.° Serão relevados de toda a responsabilidade aquelles que, porventura tenham deixado de pagar, nos contratos sociaes mencionados na verba n.° 292, o sêllo de 2 por 1:000 do capital social.

Art. 3.º Ficarão sem nenhum effeito todos os processos que, por supposta infracção da citada verba n.° 294, tenham sido instaurados e se achem pendentes dos tribunaes ou de qualquer repartição publica.

Art. 4.° É revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 10 de agosto da 1897 = O deputado pela Certã, João Pinto Rodrigues dos Santos.

Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

Senhores: - A carta de lei de 13 de abril de 1875 concedeu á camara municipal de Setubal, o producto da taxa pelos deslastres dos navios no porto d'aquella cidade, durante dez annos, para se effectuar o atterro necessario entre o caes de Nossa Senhora da Conceição e o baluarte do Livramento, e concedeu-lhe os lastros dos navios para empregar tambem no referido aterro.

A carta de lei de 6 de julho de 1886 prorogou por mais dez annos o praso d'aquella concessão, para conclusão da referida obra; é certo, porem, que ella não póde ser concluida no sobredito praso pela circumstancia impreterivel e insuperavel da falta manifesta da procura de sal, producto quasi unico, que constitue objecto de commercio maritimo n'aquella cidade, acrescendo ainda que a exportação d'este genero é feita na sua maior parte em navios a vapor, cujo lastro é de agua.

Com a grande falta de navios em aquelle porto, nos ultimos annos, escasseou por tal modo a receita proveniente da taxa dos deslastres o deu-se tal falta de material para a obra do aterro que o seu proseguimento tem sido lento e em acanhadas dimensões.

N'estas circumstancias, a sobredita obra, da maior e mais reconhecida importancia sob o ponto de vista hygienico e como meio de melhorar e ampliar a área da cidade cuja população augmenta admiravelmente, justificou a necessidade instante de nova prorogação de praso para a continuação do mencionado aterro, e foi assim que por decreto da 28 de março de 1895 se manteve a cobrança da alludida taxa dos deslastres, até que as côrtes resolvam definitivamente sobre o assumpto. Senhores, Setubal, considerada sob todos os pontos de vista como uma das mais importantes e populosas cidades do reino, tem por isso, e pelas suas gloriosas tradições que a tornaram notavel, jus a que se lhe dispense toda a protecção, mórmente quando d'essa protecção não resulta encargo algum para o thesouro, antes pelo contrario como ao diante se demonstrará, e, n'esta convicção, entendo da maior conveniencia e utilidade que á mesma camara sejam concedidos os terrenos marginais do rio Sado, a partir do baluarte do Livramento, terminus da concessão feita pela carta de lei de 13 da abril de 1875, até Albarquel; isto será o complemento das obras mais importantes a fazer n'aquella cidade por todos os titulos digna da attenção dos poderes do estado.

É conveniente, porém, que fique bom constatado que a camara municipal do Setubal não pretende, com o pedido d'esta concessão, tolher os direitos adquiridos que os pescadores têem em grande parte d'aquelles terrenos marginaes onde encalham, limpam e concertam as suas embarcações, pois o contrario seria uma aberração, attendendo o que são esses pescadores que, com a sua vida laboriosa e sempre arriscada, concorrem por differentes fórmas para o augmento das receitas tanto do estado como d'aquelle municipio.

Uma obra de grande alcance está tambem naturalmente indicada, e é uma doca para abrigo de embarcações. Existe uma, de um particular, mas que não tem condições de existencia, pois que alem de estar no coração da cidade, está sujeita ás oscillações das marés, o que a torna anti-hygienica e prejudicial á saude publica, especialmente nas baixa-mares em que fica a descoberto todo o solo constituido de lama.

Posto isto, é manifesta a necessidade de construir uma doca em boas condições, e essa construcção póde fazer-se no terreno marginal a partir do caes de Nossa Senhora da Conceição para o nascente até ao sitio da Senhora da Graça, que assim poderá abrigar a grande quantidade de barcos costeiros, os de serviço das marinhas e embarcações pequenas que n'aquella cidade existem.

Enaltecer o valor de tão importante melhoramento acho desnecessario, quando todos conhecem que Setubal tem um porto e um rio magnificos, o que por uso uma doca em boas condições se impõe como uma necessidade inadiavel.

Esta, portanto, aquella cidade carecendo de um plano de saneamento e de ser aformoseada, pois que tem em si todos os elementos necessarios, especialmente nos pontos marginaes, para proporcionar não só aos seus habitantes, mas aos seus visitantes e ao grande numero de familias que a ella concorrem na epocha balnear, as maiores commodidades.

O plano de melhoramentos em Setubal está de ha muito sendo a preoccupação de todas as vereações d'aquelle municipio, que só não têem poupado a todos os esforços para conseguirem os de maior necessidade, cumprindo por isso á actual vereação, e assim o deseja ella, proseguir n'esses melhoramentos, iniciando os que ficam indicados.

É superfluo, porque são bem de prever, indicar especificadamente os interesses que podem advir de taes melhoramentos, pois que com elles se empregará muito pessoal operario e se attenuará a crise geral de trabalho ha tantos annos latente, e será um engrandecimento para aquella cidade pelo alargamento da area; indispensavel para novas edificações, do que resultarão vantagens obvias para as varias industrias e consequentemente para o estado pela materia tributavel assim creada.

Confiando, pois, na vossa alta comprehensão e no desejo que a todos anima de contribuir para tudo quanto seja de utilidade geral, tenho a honra de submetter á vossa illustrada approvação o seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.° É prorogado por mais dez annos o praso da concessão feita á camara municipal de Setubal do producto da taxa dos deslastres dos navios no porto d'aquella cidade, bem como dos lastros trazidos pelos mesmos navios, conforme a auctorisação dada pelas cartas de lei de 13 de abril de 1875 e 6 de julho de 1885, para a referida camara ter ou meios necessarios para a conclusão das obras do prolongamento do caes de Nossa Senhora da Conceição até ao baluarte do Livramento, e para as obras a fazer, por effeito da presente lei, na mesma cidade de Setubal.

Art. 2.° São concedidos á camara municipal de Setubal, para a construcção de uma doca para abrigo de embarcações, os terrenos marginaes do rio Sado, a partir do caes de Nossa, Senhora da Conceição para o nascente, até ao sitio de Nossa Senhora da Graça.

Art. 3.° São concedidos á mesma camara municipal de Setubal todos os terrenos marginaes do dito rio, desde o baluarte do Livramento, terminus da concessão já feita até Albarquel, a fim de serem applicados em melhoramentos do saneamento o embellezamento da cidade, sem prejuizo da parte que for indispensavel aos pescadores para encalharem e repararem as suas embarcações.

Art. 4.º Os terrenos já conquistados ao rio Sado, por effeito da concessão feita pela carta da lei de 13 de abril de 1875, bem como os que forem conquistados por effeito

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da presente lei, ficam pertencendo em pleno dominio á referida camara municipal, sem prejuizo das providencias geraes, relativas á fiscalisação aduaneira e ao regimen dos portos do reino.

§ unico. Todas ás obras a executar por effeito d'esta concessão, serão previamente estudadas, e levantada a competente planta, que será submettida á approvação da respectiva, instancia; com os competentes projectos.

Art. 5. Quando as novas obras de que se falla nos artigos 2.º e 3.º não tenham começado no praso de dois annos, depois da publicação d'esta lei, caduca a concessão.

Art. 6.º 4 Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões parlamentares, em 10 de agosto de 1897. = O deputado, Carlos Augusto Ferreira.

Lido na mesa, foi admittida e enviado ás commissões de administração publica e de fazenda.

O sr. Fialho Gomes: - Sr. presidente, mando para a mesa o parecer da commissão de agricultura sobre a proposta de lei n.º 8-B, auctorisando o governo a applicar diversas verbas de receita á constituição de um fundo especial, denominado «fundo nacional de credito agricola», creado para a realisação das medidas de fomento, que, muito efficazmente; hão de concorrer para o restabelecimento economico e financeiro do paiz.

Para a commissão de fazenda com urgencia.

O sr. Conde de Paçô Viera: - Sr. presidente, mando para a mesa uma representação das fabricas de alcool de S. Miguel, contra á proposta de fazenda relativa ao exclusivo do assucar de beterraba, que acaba de me ser entregue por um distinctissimo membro do partido progressista michaelense, o meu velho amigo dr. Marianno Raposo Alvares Cabral, e faço esta declaração porque desejo frisar bem que me não movem n'este assumpto quaesquer sentimentos politicos.

Desejava acompanhal-a de algumas considerações que, n'este, me suggere a proposta de lei do sr. Ressano Garcia. Como, porém, não vejo presente nem o sr. ministro da fazenda, por cuja pasta corre o assumpto a que me estou, referindo, nem outro qualquer membro do gabinete, e como enteado ser da minha parte um dever de cortezia não fazer as considerações que desejava fazer, na ausencia do sr. Ressano Garcia, peço a v. exa. que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro da fazenda.

E já que estou com a palavra, peço tambem a v. exa., sr. presidente, o favor de fazer saber ao sr. presidente do conselho que muito desejo que s. exa. compareça na camara para poder interrogal-o sobre a exportação do milho dos Açores a que se refere o aviso previo que apresentei na sessão de 3 do corrente.

O sr. Presidente: - Devo dizer ao sr. deputado e á camara que me parece não estar no espirito do regimento o pedido da palavra para quando estiver presente algum dos membros do gabinete. O regimento antigo é que, com effeito, permittia a qualquer sr. deputado pedir a palavra para quando estivesse presente o ministro que se desejava interrogar ou qualquer dos membros do ministerio, mas no regimento, que actualmente regula os trabalhos parlamentares, menciona-se simplesmente a inscripção da palavra para antes da ordem do dia, e a inscripção da palavra para depois da ordem do dia.

Entro, pois em duvida a este respeito, porque a concessão da palavra para quando estiver presente algum dos membros do governo altera a ordem da inscripção.

Exponho apenas o meu parecer a este respeito, desejando que a camara, na sua alta sabedoria, regule este assumpto pelo modo que entenda ser mais conveniente á boa ordem dos trabalhos parlamentares e dos interesses do parlamento, para quando um outro pedido se fizer n'estas condições se não firme no procedente, desejando, portanto, que este assumpto seja regulado por fórma que se evite más interpretações do regimento.

O sr. Franco Castello Branco: - V. exa. permitte-me uma explicação?

sr. Presidente: - Sim, senhor.

O sr. Franco Castello Branco: - Estou de accordo; com v. exa. em que o pedido da palavra para quando estiver presente algum dos srs. ministros não prefere áquelles que estejam inscriptos sem designação. Este pedido visa apenas a que a palavra não seja concedida em occasião em que não esteja presente o membro do ministerio a quem se deseja interrogar.

O sr. Presidente: - Tenho a declarar á camara que a mesa acceita a interpretação apresentada pelo sr. deputado Franco Castello Branco.

O sr. Campos Henriques: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação, que me foi entregue por uma commissão delegada da associação dos constructores civis e mestres de obras da cidade de Lisboa, protestando contra a idéa de alteração ou revogação do decreto de 6 de agosto de 1895, que estabeleceu alguns preceitos e principios para garantia e segurança dos operarios na construcção civil.

Como a representação que mando para mesa está redigida em termos correctos e convenientes, peço a v. exa. a fineza de consultar a camara sobre se permitte a sua publicação no Diario do governo.

(Foi auctorisada a sua publicação.)

O sr. Lopes de Carvalho: - Sr. presidente, pedi a palavra simplesmente para mandar para a mesa uma representação, que me foi enviada de um concelho que tenho a honra de representar ao parlamento.

A camara de Alemquer, interpretando o pensamento dos seus municipes, dirige-se ao governo para que ordene que se façam desde já as necessarias obras de conservação na igreja da Varzea, onde se acham depositados os restos de Damião de Goes.

Sr. presidente, Damião de Goes não foi só um chronista erudito, nem um escriptor fluente, foi tambem um politico eximio, que desempenhou cargos muito importantes nas diversas côrtes da Europa, onde o mandou El-Rei D. João III. Acompanhou o movimento scientifico e litterario do seu tempo e correspondesse com os sabios mais eminentes, seus contemporaneos. De volta á patria escreveu a Chronica de El-Rei D. Manuel, livro primoroso, onde, a cada passo, se revela o seu muito talento e fino criterio de historiador.

Sr. presidente, o nosso compatriota, não obstante o nome glorioso que lhe aureolava a fronte, foi victima das intrigas que lhe moveram os seus inimigos, sendo quasi no fim da vida entregue ao ignominioso tribunal da inquisição, do qual só se viu livre na avançada idade de setenta annos, com o corpo tolhido pela gotta e com as suas faculdades intellectuaes inteiramente apagadas.

Alguns dos nossos homens de letras julgavam que Damião de Goes não tinha sido sepultado na igreja da Varzea, fundando-se, para sustentarem a sua duvida, na morte mysteriosa do chronista, e ainda na falta de algumas letras que ficaram por abrir no epitaphio da lapide tumular.

Esta duvida não tem hoje rasão de ser, graças aos trabalhos de investigação de um estrangeira illustre, que logrou descobrir no pulverulento archivo de Triana o assento do obito do chronista. N'este precioso documento vê-se que Damião de Goes morreu em Alemquer, e que foi sepultado no tumulo que elle mesmo mandára construir, na igreja da Varzea. A falta de letras na data do fallecimento mostra apenas menos cuidado por parte de alguns dos seus descendentes.

Sr. presidente, em 1898 passa o 4.° centenaria da descoberta da India, acontecimento assombroso que marcou o inicio do nosso maior periodo de gloria. É provavel que por essa occasião o nosso paiz seja visitado por hospedes

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illustres, e que nem todos se contentem com gosar os bellezas naturaes do paiz e admirar os nossos monumentos architectonicos preferindo alguns, em piedosas romarias, visitar as jazidas dos homens que, pelo seu trabalho, engrandeceram Portugal. Que vergonha será para nós todos, sr. presidente, se alguns d'esses estrangeiros quizer visitar o tumulo do chronista do rei venturoso, justamente o monarcha em cujo reinado foram levadas a effeito as mais prodigiosas descobertas dos portuguezes India; que vergonha, repito, se algum d'esses estrangeiros quizer visitar aquelle tumulo, e tivermos que mostrar lhe apenas um sarcophago mutilado entre o entulho de uma igreja em ruinas!

Sr. presidente, eu peço á camara e ao nobre ministro das obras publicas para mandar proceder ás obras precisas na igreja da Varzea, pagando assim uma divida sagrada ao mais illustre filho de Alemquer e uma das glorias mais eminentes da patria.

O sr. Jacinto Candido: - Pedi a palavra na esperança de que estivesse presente o sr. presidente do conselho, ou algum dos srs. ministros.

No entretanto, como s. exa. poderão ter conhecimento do que vou dizer pelo registos parlamentares, e ainda porque peço a v. exa., sr. presidente, a bondade de transmittir ao sr. presidente do conselho as considerações, que vou fazer, mesmo na ausencia do governo, usarei da palavra, que v. exa. acaba de conceder-me, porque o caso é tão importante como urgente, para, mais uma vez, chamar a attenção do sr. ministro do reino sobre os factos, a que já, n'esta casa me referi, relativos á nunca assás celebrada justiça da noite, instituição unica no genero, e que se mantem, e proposta, na ilha Terceira.

A este respeito, como v. exa. e a camara se recordam de certo, trocaram-se explicações entre mim e o sr. presidente do conselho.

Pedi a s. exa. para comparecer, e responder pelos factos, a que eu tinha de me referir; s. exa. teve a bondade de vir a esta camara, e eu fiz as minhas allegações, segundo as informações, que tinha, fornecidos principalmente pela imprensa periodica local; e por cartas de amigos meus.

S. exa. respondeu-me lendo uns officios do governador civil d'aquelle districto.

E depois, como esta leitura me não satisfizesse, em primeiro logar porque não percebi o que s. exa. dizia, em virtude do tom de voz, que empregou, e em segundo logar, porque me pareceu deprehender do pouco que pude apanhar da leitura, que effectivamente não estava justificado o procedimento da auctoridade superior d'aquelle districto, antes bem ao contrario, os effeitos que mandára, mais, a compromettiam ainda do que os proprios dados que eu possuia, requeri copia d'esses documentos, e annunciei ao sr. presidente do concelho uma interpellação, pedindo a v. exa., sr. presidente, que logo que fosse possivel, marcasse o dia para se realisar essa debate parlamenta.

Chegaram-se agora á mão as copias que pedi, e como n'esses officios vejo que, longe de desfazer as conconsideração e receios, que tive a honra de apresentar á camara, o governador civil referido, como eu suppozera, de facto, mais se compromette, e mais vem justificar as supposições e conjecturas, que submetti á apreciação da camara e do governo, não quero, por mais tempo, demorar a justa apreciação e camara critica d'estes documentos, que, tenho para mim, pela justiça; devida no sr. presidente do conselho, leu aqui, n'esta casa, pela primeira vez. De contrario não se traria cá:

Bom é, porém, que se veja bom quem é, e o que vale, este delegado do governo, e como elle entende os seus deveres, ajuiza das suas funcções, e cumpro as ordens, que lhe são enviadas.

Que largueza do criterio, que comprehensão elevada a d'este magistrado!

Um portento! Um prodigio!

Vamos devagar e serenamente. O caso não é para indignações, é antes para rir. Refiro-me aos officios do governador civil, que não aos latrocinios e devastações da justiça da noite. Estes indignam os mais calmos de espirito.

Vamos aos officios.

Ora, sr. presidente, o governador civil diz o seguinte, para que peço a attenção da camara.

(Leu.)

Queixam-se ao administrador do concelho os donos de uma propriedade, de que ella está occupada por um troço de homens armados o mascarados, que impedem, á viva força, que elles exerçam os seus direitos de proprietarios. O que faz este administrador do concelho? Officia para o governador civil do districto, dando-lhe parte do facto e dizendo-lhe que alvitra um de dois procedimentos, ou um aboletamento de força militar na freguezia, e n'um auto de investigação.

O que ordena o conspicuo governador civil, em presença dos factos expostos?

Pensa a camara que elle manda immediatamente uma força militar para o logar do crime, a proteger os proprietarios esbulhados dos seus direitos, a afugentar os bandidos e a restabelecer a ordem publica?

O governador civil de Angra, em presença d'esta situação, manda levantar um auto da investigação na administração do concelho!

É de opera comica do theatro da Trindade esta auctoridade e esta resolução; mas é a propria que saiu do cerebro pujante d'aquelle magistrado! E este magistrado é o governador civil da um districto!

Isto não se commenta.

É phantastico, pyramidal, inacreditavel; suppõe a gente que ha aqui uma mystificação qualquer. Pois não póde haver duvida; é o proprio governador civil que o diz no seu primeiro orneio que, já agora, ha de ficar memoravel!

Está aqui escripto n'este delicioso documento

Um bando de salteadores, armados, mascarados, á luz do dia, com tendas, bandeiras, postos, bivaques, sentinellas e tudo, occupa uma freguezia, permanentemente, tendo-a sob a pressão do terror, e esbulhando, pela força, os proprietarios, do uso dos seus direitos. Os offendidos queixam-se e podem protecção á auctoridade; o administrador julga o caso grave e consulta o governador civil. O governador civil manda levantar um auto na administração do concelho!

Unico! Unico! Unico!

Nunca se viu mais absoluta inepcia e mais completa incapacidade administrativa, ou então mais miseravel cobardia, ou ainda mais evidente connivencia e cumplicidade com os bandidos. Escolha-se á vontade; mas é incontestavel que, fôra d'estas tres determinantes, só por qualquer de per si, ou por concorrencia de todos, não ha explicação possivel para tal procedimento.

Autos da investigação na administração do concelho para restabelecer a ordem publica, alterada pela persistencia de um bando armado n'uma localidade... é incrivel! Não tem classificação possivel!

E então a inconsciencia com que isto é dito n'este official?

Por isso, sr. presidente, os bandidos, que bem sabiam a auctoridade que tinham á frente do districto, continuaram, impavidos, no seu caminho, e no mesmo dia, em que eu aqui interrogava o sr. ministro do reino sobre este assumpto, elles completavam a sua obra de vandalismo e destruição, acabando de arrasar todo o plantio da propriedade, que haviam invadido.

Aquillo que o mais boçal regedor da mais aclvatica e sertaneja parochia teria, de prompto, feito, que era accudir, com força militar, á localidade infestada, dispersar o bando dos salteadores, e estabelecer um policiamento regular e permanente, que impedisse o regresso d'elles, e mantivesse a ordem, - o que era da maxima facilidade

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aliás, - foi substituido pelo genial conceito do auto de investigação levantado a duas leguas de distancia na administração do concelho!

É, ou não é, pyramidal e unico?!

Ha, porém, mais ainda e melhor não digo, porque o que fica visto é inexcedivel de talento é de genio!...

Mas vejo entrar agora o sr. ministro da guerra, e devo dar conta a s. exa., como mui digno membro do governo, do assumpto, a que me estava referindo, se v. exa., sr. presidente e a camara m'o permittem.

Resumirei, apenas, o que tenho dito, para que s. exa. se oriente devidamente sobre o resto, que tenho a dizer, e que resumirei tambem:

Tratava da famigerada justiça da noite, sobre a qual já, n'uma das sessões passadas, tive a honra de conversar com o sr. presidente do conselho.

S. exa., então, em resposta ás minhas considerações, limitou-se a fazer a leitura de diversos officios, cujo conteúdo não pude bem perceber.

Annunciei, pois, uma interpellação que não entrou ainda em ordem do dia, e requeri copia dos officios tidos pelo sr. presidente do conselho.

Agora estava fazendo a analyse d'esses preciosos documentos, na esperança de que chegasse algum membro do governo pelo menos, quando não o mesmo sr. presidente do conselho, ou de que, em ultimo recurso, pelos registos das nossas sessões, o governo tomasse conhecimento do caso, que, cada vez se aggrava mais.

O governador civil, n'este officio, confessa os factos attentatorios da ardem publica. A existencia de uma quadrilha de bandidos, armados, mascarados, com organisação militar, occupando pela força uma freguezia, devastando plantações e, impedindo o exercicio do direito de propriedade, - isto em pleno dia, com um desplante até então nunca visto.

É a primeira vez que a justiça da noite procede com este arrojo e confiança.

Nunca fôra tão longe, nem operara de dia, ousadamente, sem; o menor receio, como quem põe e dispõe das auctoridades.

Sob a pressão da queixa dos ofendidos, ao cabo de mais de um; mez de inacção, o administrador do concelho propoz ao governador civil em officio, de que aqui tenho copia, de duas cousas uma, ou um aboletamento de força militar na freguezia, presa dos bandidos, ou um auto de investigação na administração do concelho.

O governador civil, depois d'esta communicação, limitou-se a mandar levantar o auto e deixou continuar os salteadores na mesma liberdade de acção em que estavam. Isto consta do officio do governador civil, e é a expressão da verdade por mais, inverosimil que pareça. Elle proprio o diz, com uma adoravel ingenuidade, como quem se sente forte, nos seus brios de auctoridade energica e na sua consciencia de magistrado á altura do cargo de que o investiram.

Para isto chamava eu a attenção do governo, porque uma auctoridade d'estas não se póde manter.

A sua inacção não tem explicação possivel.

N'esta altura ia eu quando o sr. ministro da guerra entrou. Mas, ha ainda mais.

A imprensa começou, naturalmente; no uso do seu direito, e mais até, no cumprimento do seu dever, a occupar-se do caso, stigmatisando os salteadores e censurando a inacção das auctoridades.

Sabe v. exa. o que fez o governador civil? Mandou metter os jornaes em processo. Estão processados os jornaes que se referiram ao facto, stigmatisando o procedimento dos salteadores e a falta de energia por parte da auctoridade administrativa.

Mais ainda; o proprio governador civil confessa, n'este mesmo officio, que esta propriedade estava murada e tapada havia quinze mezes. Pois só depois que o actual governador civil tomou posse é que os bandidos, ousaram apparecer. Até então livraram-se bem das ousadas aventuras em que andam agora.

Mais ainda. Durante todo o tempo do governo, regenerador de que tive a honra de fazer parte, não houve, na ilha Terceira, um caso unico de justiça da noite. e na ilha de S. Jorge, quando alguns rendeiros da casa Camarido se rebellaram, e resistiram aos mandados judiciaes embora em defeza de suppostos direitos; como eu visse que o administrador, do concelho não procedia com a energia e actividade que eram dever no seu cargo, fil-o demittir, e foi substituido por um administrador ad hoc, que ao cabo de um anno, se tanto, tinha restabelecido a ordem.

Este exemplo já eu citei outro dia ao sr. presidente do conselho, e tenho a certeza de que se s. exa. substituisse de prompto o governador civil de Angra por quem levasse instrucções para acabar com justiça da noite, e tivesse o proposito de as comprir tambem antes de um anno, muito antes tudo estaria descoberto, e os criminosos responderiam pelas suas proezas e façanha. E quanto, a essa vergonha de administração, que se ostenta, á luz do sol e aos olhos de toda a gente, da occupação de uma freguesia por um bando de salteadores, isso acabava de um dia para o outro.

O sr. presidente do conselho, de cuja rectidão a este respeito estou convencido, porque prelo que s. exa. se propõe seriamente, e honradamente a acabar com este, estado de cousas, que é deshonroso e affrontoso para o proprio governo, porque é uma terrivel manifestação de anarchia local, garantiu-me que empregaria todos os meios ao seu alcance para manter a ordem n'aquella freguezia. Sei que, de facto, tem mandado telegrammas energicos ao governador civil mas o que sei também é que o governador civil não é capaz de os comprehender, e menos de os cumprir. Basta ler este officio para ver que quem tem uma tal comprehensão, como aqui se manifeste, dos deveres do seu cargo, não póde fazer cousa alguma, muito embora o quisesse. Até ao auto de investigação vae, porque o administrador do concelho lh'o lembrou, e por ahi se fica muito contente, por ver o caso affecto ao juiz de direito: para quem tudo declina, como se fosse ao poder judicial que competisse manter a ordem publica.

Esta doutrina nova de direito publico contem-se aqui, n'este inexgotavel thesouro do officio do governador civil. Não se fez nada, nada, nada mais do que o auto de investigação, e guardar o juiz quando foi fazer o corpo de delicto.

Policiar a freguezia; manter lá um destacamento; organisar um serviço de patrulhas, ao menos com cabos de policia; isto que é comesinho e rudimentar, que um regedor sertanejo receiaria não fazer, para não passar por incapaz, não se fez.

Deixaram-se á vontade os bandidos e aguardou-se, com uma serenidade olympica, o auto e a acção ao poder judicial.

Aqui tem v. exa. sr. presidente, a situação desde abril até ao presente. E assim se mantem.

Mas o mais curioso ainda é que este governador civil ousa dirigir-se, com censura, ao digno juiz de direito da Praia da Victoria, que é, reconhecidamente, um magistrado distinctissimo, porque esta auctoridade chama a sua attenção para o estado anarchico da freguezia, que viu e presenceou, e estranha a inacção do regedor, que mais parece cumplice dos bandidos do que agente de auctoridade. Que atrevimento o d'este juiz que ousa, sobre um caso gravissimo e unico, solicitar do governador civil providencias, e informal-o de uma situação, affrontosa do decoro do poder, offensiva dos direitos individuaes e attentatoria da ordem social! Que comica indignação e que ridiculo zêlo pelo seu regedor aqui mostra este governador civil!

E o mais curioso é que, logo em seguida á queixa for-

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mal contra o juiz, prenhe do tetricas ameaças de um ajuste de contas formidando, o mesmo queixoso elogia o funccionario, de quem antes faz a censura.

Que coherencia e que genio!

Sr. presidente, eu sinto ter de demorar-me um pouco na analyse critica d'este documento; mas, realmente, depois que vi estes officios, convenci-me de que é um grave perigo para o districto, que tenho a honra de representar em côrtes, a permanencia de uma auctoridade superior que, nas mais graves questões de ordem publica, procede da tal modo como o governador civil de Angra. E para fundamentar esta convicção perante a camara e perante o governo tenho, no uso do meu indiscutivel direito, de mostrar, á luz de toda a evidencia, a manifesta incapacidade d'aquella auctoridade, por ella propria revelada, para que o governo proceda, e a camara julgue, da rasão do meu juizo. Já disse, e repito, que, pessoalmente, nada de aggressivo ha contra o sr. visconde das Mercês, que é um pobre homem. Mas ou trato do governador civil, auctoridade superior de um districto, representante do governo e responsavel pela ordem publica, sujeito, portanto, á minha apreciação, nos seus actos publicos, como magistrado. Estou no pleno uso do meu direito, e cumpro o meu dever, correspondendo á confiança dos que me honraram com o seu mandato.

É preciso frisar bem todo este acervo de dislates, toda esta insensatez, para se evidenciar que, com um tal governador civil, o que admira é que os bandos de salteadores não infestem todo o districto e não façam até o seu quartel general no proprio edificio do governo civil.

Aqui tem v. exa. a copia do officio do juiz de direito, dirigido ao governador civil, e chamo a attenção de v. exa. para os periodos que vou ler; dizem assim:

(Leu.)

Sabe v. exa. o que aconteceu? Dois dias antes d'esta força partir da séde do districto para se pôr as ordens do juiz de direito, já toda a cidade sabia que a força partia n'esse dia. O desejado sigillo pedido pelo juiz de direito ao governador civil foi de tal maneira guardado por esta auctoridade administrativa, que dois dias antes da partida da força, como disse, já toda a cidade sabia que a força ia partir para aquelle ponto.

Ora eu pedia ao sr. ministro da guerra, visto que s. exa. está presente, e que teve a bondado de prestar attenção ás minhas considerações, que levasse tudo isto ao conhecimento do sr. presidente do conselho, e que lhe fizesse, da minha parte, o pedido de que tome todas as providencias necessarias para que termine este estado de cousas.

Coherentemente com o que ha dias foi aqui declarado pelo illustre leader do partido regenerador, eu declaro a s. exa. que nem eu, nem os meus amigos politicos do districto de Angra, fazemos politica partidaria com estas questões de ordem publica. Para a resolução d'ellas pomo-nos ao lado do governo. Póde o governo ficar tranquilo a este respeito, e tem como garantia o nosso passado.

Já citei o precedente da freguezia dos Razaes na ilha da S. Jorge.

É frizante esse precedente, que representa o sacrifício aos superiores interesses publicos das conveniencias partidarias eleitoraes.

Essa isenção é preciso tel-a nos casos graves como este e em crises gravissimas como a que o paiz atravessa.

Não póde consentir-se a permanencia de um fóco de anarchia o insurreição, como este da freguezia da Agualva, sem graves perigos e serios riscos para todos, porque são de ordem publica, e se hoje estão limitados, ámanhã se alargarão, e não sabemos, nem podemos prever, até onde poderão ir. O proprio governador civil, que é um proprietario abastado, póde ámanhã ser victima tambem.

Deixe continuar a lavrar a desordem; continuem impunes e em plena liberdade os bandidos, sem o menor receio da auctoridade, e verá até onde póde chegar esse estado anarchico e violento.

Ora é em casos taes que a opposição regeneradora garante ao governo que póde contar com o seu leal e dedicado apoio.

Tome o governo providencias energicos e decisivos. Vá por diante sem receio, e não toma encontrar difficuldades, antes conte com o auxilio da opposição n'aquelle districto, para a resolução do problema, que já é hoje gravissimo, e que ámanhã póde ser quasi insoluvel sem graves sacrificios.

Este é o meu pedido e esta a minha solemne declaração, que confio, justificadamente, os meus amigos d'aquelle districto hão de honrar com o seu procedimento.

Estou convencido de que o governo ha de corresponder, pelas suas resoluções, á lealdade d'estes propositos, e que ha de cumprir o seu dever de manter a ordem publica, nos pontos em que lhe conste que ella póde ser alterada. (Apoiados.)

Aproveito a ocasião de estar com a palavra, e visto estar presente o sr. ministro da fazenda, para lhe fazer uma pergunta, que, naturalmente, me foi suscitada pela leitura, n'um jornal da noite de hontem, de um artigo que me causou profunda impressão, como creio aconteceu a quantos o leram.

Não quero antecipar o debate sobre a questão dos tabacos com esta minha pergunta; que, todavia, deriva de uma legitima curiosidade, a que supponho s. exa. me póde satisfazer em breves palavras; ao mesmo tempo que, por certo, tranquilizará e esclarecerá o espirito publico, justamente interessado em conhecer a verdade sobre tão importante e grave questão.

Segundo os extractos dos relatorios, que são feitos por esse jornal, parece evidente e indiscutivel haver o thesouro portuguez o direito de exigir uma participação de lucros nos interesses de companhia de tabacos, que attingem já uma quantiosa somma, de que, em beneficio da mesma companhia, tem estado privado.

Ao que se vê dos mesmos extractos, e de modo que parece não offerecer a menor duvida, os calculos feitos dão como resultado estar o estado no desembolso de 2:600 contos de réis, que lhe pertencem, como participação nos lucros havidos, em virtude do contrato feito entre o estado e a companhia.

Se assim é, como parece, repito, que explicação póde ter o novo projecto de novas e valiosissimas concessão á companhia, em vez de, pura e simplesmente, promover a arrecadação das sommas que a companhia deve, e das quaes é o estado credor?

Affirmo, mais uma vez, que não é meu proposito antecipar debates e entrar na apreciação do projecto dos tabacos, que o governo pretende trazer á camara, mas protesto contra elle, e aproveito esta opportunidade para, desde já, deixar lavrado o meu protesto.

O sr. Presidente: - Faltam poucos minutos para se passar á ordem do dia.

O Orador: - A minha pergunta resume-se no seguinte: se, com effeito, o governo tem conhecimento d'esta questão, qual é o seu ponto de vista a respeito d'ella; e se está ou não disposto a fazer entrar nos cofres do thesouro a quantia devida por aquelle companhia.

Comprehende v. exa. que desde o momento em que esta questão veiu a publico e produziu uma natural curiosidade, suscitando um legitimo interesse o alarme, sobre assumpto que já de per si só concitava todas as attenções, qual o do projecto dos tabacos, e ainda porque este projecto está dado para ordem do dia, o contra elle já todo o paiz lavrou energicamente o seu protesto, porque represento um compromettimento da nossa situação; é necessario que haja declarações, por parte do governo, que affirmem seriamente o seu proposito de fazer entrar nos

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cofres publicos as quantias que lhe sejam devidas. (Apoiados.)

N'este momento angustioso da nossa vida economica e financeira n'este occasião em que o governo vem pedir ao paiz sacrificios de todas as ordens, não é legitimo nem justo que as companhias privilegiadas que até agora, têem sido isentas, de todos os encargos, que têem affectado as outras classes sociaes, continuem gosando de um privilegios que são singularmente odiosos, para se contraporem, de um modo frizante, aos sacrificios exigidos e impostos aos outros contribuintes! (Apoiados.)

Permitta-me agora a camara, que ainda faça uma observação; de caracter meramente pessoal, porque não quero antecipar, repito a discussão d'esta questão, dos tabacos.

N'uma das sessões passadas o sr. conde de Burnay indicando o seu plano financeiro preconisava o projecto dos tabacos como a verdadeira medida salvadora da nossa situação financeira.

O sr. Presidente: - Tenho a dizer ao sr. deputado, que faltam poucos minutos para se passar á ordem do dia.

O Orador: - Já vou concluir, mas como entrei n'esta ordem de considerações não queria deixar de ultimar o meu pensamento que é seguinte:

Queria communicar a v. exa. e á camara, que, quando o sr. conde de Burnay, - com quem, aliás tenho superficialissimas relações, mas que na qualidade de deputado, respeito, como respeito todos os membros do parlamento, - tratou de expor o seu plano financeiro, que se cifrava n'este projecto, dos tabacos e no da exploração do districto de Lourenço Marques pelo banco ultramarino, grande foi a minha surpresa.

Não me refiro agora a esta segunda parte, com a qual, de resto, tambem não concordo absolutamente.

Mas quanto á primeira parte, ou projecto dos tabacos, confesso que foi grande a minha estranheza, porque, como sabem todos, aquelle illustre deputado é um dos membros mais importantes e influentes e poderosa companhia, a quem se projectam fazer novas e valiosas concessões.

Bem sei que não está comprehendido na letra, da lei das incompatibilidades, e tanto que o seu direito, como defensor, lhe está reconhecido, e póde s. exa. discutir n'esta casa os assumptos, que entender e quizer, e não serei, eu que pretenda contestar-lhe essa faculdade, - no campo legal, em face da letra expressa da lei.

Mas a minha estranheza, apesar d'isso, subsiste, porque, muito embora o illustre deputado não seja director da companhia o que é certo e indiscutivel é que á uma das suas figuras mais importantes e preponderantes.

Por outro lado, ainda, alem do que relataram sem desmentido, os jornaes, parece-me que o mesmo sr. deputado declarou já n'esta camara, que, por parte da companhia, tivera diversas conferencias com o sr. presidente do conselho, sobre o mesmo projecto.

Não quero apreciar fatos; mas é meu direito nota-os e é o que faço.

O sr. Presidente: - Peço licença para dizer ao illustre deputado que o assumpto de que está tratando é propriamente para quando se discutiu o projecto, que nem sequer está dado para ordem do dia.

O Orador: - Eu não estou discutindo o projecto, estou fazendo referencia um facto que se passou antes da ordem do dia.

Nem assisti ao discurso do sr. conde do Burnay; mas vi pelos jornaes o que s. exa. dissera, aqui, como deputado, em defeza de projecto de negociações com a companhia sendo um dos seus membros mais influentes, e tendo andado a combinar, por parte da mesma companhia, os termos do contrato, com o sr. presidente do conselho.

Limito-me, repito, a consignar a minha estranheza, por que vivendo nós um regimen de incompatibilidades, que dizer; n'um regimen em que, perante a camara, os banqueiros, industriaes e commerciantes interessados nos negocios ou operações, que o governo haja de realisar, não podem interferir, s. exa., que está aliás a coberto da letra da lei n'este assumpto, mas que está dentro do seu espirito, veiu n'esta casa preconisar, antecipadamente, esse projecto de lei como o unico do programma do governo, que resolvia a nossa situação financeira.

Eu bem sei que o momento é critico e grave para o paiz, e que, n'esta situação affictiva, todos nós devemos contribuir, tanto quanto em nos caiba, para a resolução do problema, que se nos impõe, e que reclama os nossos mais patrioticos esforços.

O sr. Presidente: - Com toda a delicadeza já por duas vezes disse a v. exa. que faltavam poucos minutos para se passar á ordem do dia, pela terceira vez lembro a v. exa. que apenas falta um minuto.

O Orador: - Se v. exa. me quer retirar a palavra..., mas eu creio que tenho o direito de usar da palavra sobre qualquer assumpto antes da ordem do dia, e porque nós não estamos na ordem do dia, não tenho que limitar-me a este ou áquelle assumpto.

No entretanto, como o meu pensamento ficou expresso definido, e lavrado o meu protesto contra o projecto dos tabacos, concluo esperando do sr. ministro da fazenda a resposta á pergunta que formulei.

O sr. Presidente: - O sr. ministro da guerra pediu palavra, e como é a hora de se entrar na ordem do dia, não lh'a posse conceder sem consultar a camara.

Vozes: - Falle, falle.

A camara votou a concessão da palavra.

O sr. Ministro de Guerra (Francisco Maria da Cunha): - Pedi a palavra unicamente por consideração pessoal para com o illustre deputado, visto que não tenho conhecimento dos factos narrados por s. exa. se o tivesse podia ter conversado a tal respeito com o sr. presidente o conselho, e saber o juízo que s. exa. formava ácerca d'elles e as providencias que tencionava adoptar.

Em nome do sr. presidente do conselho, agradeço ao lustre deputado a justiça que fez aos sentimentos liberaes e ás boas intenções de s. exa., a quem farei sciente dos factos e estou certo de que tomará as providencias que julgar convenientes.

O sr. Presidente: - Pela mesma rasão que expuz ha pouco, não posso dar a palavra no sr. ministro da fazenda sem consultar tambem a camara.

Vozes: - Falle, falle.

Votou-se a concessão da palavra.

O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Não quero faltar á consideração devida ao illustre deputado, deixando de responder á pergunta que me fez.

O anno social termina em março e a assembléa geral, por disposição dos estatutos, reune no dia 31 de julho, para lhe ser presente o relatorio e contas.

Recebi o relatorio ha poucos dias, e, devo confessal-o, ainda não tive occasião de o examinar; mas tenho tal confiança no escrupulo com que o meu antecessor o sr. Hintze Ribeiro, administrou a fazenda publico, que devo suppor que os calculos publicados n'um jornal de hontem á tarde não são verdadeiros; e se porventura o fossem, oramos nós que tinhamos de protestar contra a administração do governo transacto, porque o actual não tem a minima responsabilidade em qualquer conta da companhia.

Tendo recebido ha pouco o relatorio, como disse, ignoro qual é a partilha dos lucros, que porventura possa haver para o estado.

O que digo é que confio de tal fórma no escrupulo com que o sr. Hintze Ribeiro administrava a fazenda publica, que deve acreditar que os calculos não são exactos; se o fossem, desde 1892 ou, 1893 que o estado estava privado de centenas de contos de réis.

Não posso suppor que o sr. Hintze Ribeiro tivesse o seu espirito tão obsecado quanto á administração de interesses valiosissimos que lhe estavam confiados que igno-

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rasse que a companhia devia concorrer annualmente com a quantia de 300 ou 400 contos de réis para o estado.

É esta a resposta que tenho a dar ao illustre deputado.

O sr. Correia de Barros: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre um projecto de lei.

O sr. Joaquim Tello: - Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra, sobre as propostas apresentadas durante a discussão do projecto de lei n.° 29.

O sr. Lourenço Cayola: - Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra sobre a proposta de lei, tendente a modificar o decreto de 10 de janeiro de 1895, e estabelecer regras fixas nobre o onus de servidão que deve existir nos terrenos adjacentes ás fortificações.

Mando tambem para a mesa um projecto de lei, creando um officio de tabellião em cada um dos concelhos de Alter do Chão e Castello de Vide, e na freguezia de Sernache do Bom Jardim.

Este projecto não traz encargo para o thesouro.

O sr. Dias Costa: - Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra, sobre as propostas apresentadas durante a discussão do projecto de lei n.° 19, reforma da
Escola do exercito.

Peço a exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento, para que este parecer possa entrar desde já em discussão.

Assim se resolveu.

O sr. Joaquim Tello: - Faço igual pedido em relação ao parecer que mandei ha pouco para a mesa.

Assim se resolveu.

Foi lido na mesa. é o seguinte.

ERTENCE AO PARECER N.º 19

Senhores. - A vossa commissão de guerra, a quem foram presentes no decorrer de discussão do projecto de lei introduzindo algumas alterações nas leis organicas da escola do exercito, as propostas de iniciativa dos srs. deputados Marianno de Carvalho e Albano de Mello, e do relator do mesmo projecto, que vão juntas, tem a honra de submetter á vossa illustrada apreciação, de accordo com o governo, o seguinte parecer:

1.° Sendo muito consideravel o numero de praças de pret, que actualmente se encontram nas condições de admissibilidade á matricula nos cursos de cavallaria e infantaria, prescriptas no dito projecto, e excedendo esse numero o que deverá ser fixado nos termos do artigo 2.° do mesmo projecto, não deve realisar-se o caso previsto na proposta do illustre deputado sr. Marianno de Carvalho, a qual, portanto, não póde ser approvada.

2.° Não podendo estabelecer-se equivalencia entre o 1.° anno de desenho, a que se refere a alinea e) condição 6.ª do artigo 1.º do dito projecto, e qualquer outra das disciplinas professadas nos estabelecimentos de instrucção superior mencionadas no mesmo artigo, não póde tambem ser approvada a proposta do illustre deputado sr. Albano de Mello;

3.º Finalmente as propostas apresentadas pelo relator da commissão, fundando-se em motivos de equidade, ou de conveniencia do ensino, e não prejudicando a economia do projecto merecem a vossa approvação.

Sala (das sessões da commissão de guerra, 11 de agosto de 1897. = Joaquim Heliodoro da Veiga = Joaquim Tello = Avellar Machado = Loureço Caldeira da Gama Lobo Cayola = F. F. Dias Costa, relator. = Tem voto do sr. Marquez Sarmento.

Proposta de lei n.º 8-N de 6 de julho de 1887:

Additamento ao artigo 23.° das alterações á organisação da escola do exercito a que se refere a proposta de lei da presente data.

Substituir o § 2.° pelo seguinte:

«§ 2.° Se o numero dos candidatos á matricula no primeiro anno do curso de cavallaria e infanteria, nas condições previstas no paragrapho antecedente, não for sufficiente para o preenchimento do numero fixado (§ 1.° do artigo 2.°), será permittida a matricula no dito anno aos primeiros sargentos graduados cadetes habilitados com o curso do real collegio militar até preencher o dito numero.»

3.° (O mesmo que este 2.° substituiu.)

Sala das sessões, 10 de agosto de 1897. = Marianno de Carvalho,

Aos candidatos á matricula no 1.° anno do curso de infanteria e cavallaria é exigida a approvação em qualquer classe das materias professadas no 1.° anno de mathematica da universidade, escola polytechnica de Lisboa e academia polytechnica do Porto, e desenho ou, em substituição do desenho, approvação em qualquer disciplina, ensinada n'aquelle instituto, ou preparatorios dos cursos superiores. = Albano de Mello.

Tenho a honra de propor que nas alterações annexas ao projecto de lei n.° 19 se façam as seguintes substituição, emenda e additamentos;

1.° Substituição do artigo 17.° e seus paragraphos:

«Art. 17.° Os primeiros sargentos cadetes, de que trata o artigo 53.° da carta de lei de 13 de maio de 1896, serão promovidos a aspirantes de 2.ª classe da administração militar, os quaes terão a categoria de aspirantes a official das armas de cavallaria e de infanteria, e o vencimento diario o unico de 700 réis.

«§ 1.° Os aspirantes de 2. classe da administração militar, promovidos nos termos do presente artigo, praticarão durante tres mezes na escripturação e contabilidade das companhias, ou baterias, em que forem collocados, e serão obrigados aos tirocinios prescriptos nos n.°s 2.° e 3.° do citado artigo 53.° da carta de lei de 13 de maio de 1896.

«§ 2.° Terminados os tirocinios, a que se refere o paragrapho precedente, os aspirantes de 2.ª classe da administração militar serão distribuidos pelos corpos das diversas armas, onde exercerão as funcções de secretario do conselho administrativo até lhes pertencer a promoção a aspirante com graduação de alferes do quadro a que se destinam.

2.° Emenda ao artigo 24.°:

No artigo 24.°, em vez das palavras «No anno lectivo de 1897-1898», deverá dizer-se:

«Nos annos lectivos de 1897-1898 e de 1898-1899.»

3.° Additamento ao artigo 26:

«§ unico. Até á plena vigencia da reforma do ensino secundario, decretada em 22 de dezembro de 1894, é dispensada, para a matricula no curso de estado maior, a Approvação no exame de lingua allemã nos lyceus centraes, não podendo, porém, ser passadas cartas do referido curso sem previa habilitação na referida disciplina e na lingua ingleza.»

4.° Additamento ao artigo 27.°:

«§ unico. É tambem applicavel aos actuaes alferes de cavallaria e de infanteria o disposto no § unico do artigo 14.°»

Sala das sessões, 10 de agosto de 1897. = F. F. Dias Costa, deputado pelo circulo n.° 34 (Arouca).

Proposta

Tenho a honra de propor que nas alterações annexas

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ao projecto de lei n.º 19 se façam as seguintes substituição, emenda e additamentos:

l.º Substituição do artigo 17.°:

Artigo 17.º Os primeiros sargentos cadetes, de que trata o artigo 53.º da carta de lei de 13 de maio de a896, serão promovidos a aspirantes de 2.ª classe da administração militar, os quaes terão a categoria de aspirantes a official das armas de cavallaria e de infanteria, e o vencimento diario e unico de 700 réis.

§ l.º Os aspirantes de 2.ª classe da administração militar, promovidos nos termos do presente artigo, praticarão durante tres mezes na escripturação e contabilidade das companhias, ou baterias, em que forem collocados, e serão obrigados aos tirocinios prescriptos nos n.ºs 2.º, 3.º do citado artigo 53.º da carta de lei de 13 de maio de 1896.

§ 2.° Terminados os tirocinios, a que se refere o paragrapho precedente, os aspirantes de 2.ª classe da administração militar serão distribuidos pelos corpos das diversas armas, onde exercerão as funcções de secretario do conselho administrativo até lhes pertencer a promoção a aspirante com graduação de alferes de quadro a que se destinam.

2.º Emenda ao artigo 24.°

No artigo 24.°, em vez das palavras: «No anno lectivo de 1897-1898», deverá dizer-se:

«Nos annos lectivos de 1897-1898 e de 1898-1899».

3.° Additamento ao artigo 26.°:

«§ unico. Até á plena vigencia da reforma do ensino secundario, decretado em 22 de dezembro de 1894, é dispensada, para a matricula no curso do estado maior, a approvação no exame da lingua allemã nos lyceus centraes, não podendo, porém, ser passadas cartas do referido curso sem previa habilitação na referida disciplina e na lingua ingleza.»

4.° Additamento ao artigo 27.:

«§ unico: É tambem applicavel aos actuaes alferes de cavallaria e de infanteria o disposto no § unico artigo 14.º»

Sala das sessões, 10 de agosto de 1897. = F. F. Dias Costa, deputado pelo circulo n.º 34 (Arouca).

O sr. Presidente: - Está em discussão o parecer que acaba de ser lido.

Não havendo quem pedisse a palavra, foi posto á votação e approvado.

O sr. Presidente: - Os srs. deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa, podem fazel-o.

O sr. Manuel Telles de Vasconcellos: - Mando para a mesa, um projecto de lei, dispensando do curso especial o exame previo que é exigido pelo artigo 12.° do decreto de l de dezembro de 1892, para serem admittidos ao concurso dos logares de officiaes, os aspirantes ajudantes do quadro telegrapho-postal que já pertencessem ao referido quadro á data do mencionado decreto.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Teixeira de Sousa: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio do reino, sejam enviadas a esta camara, com a maior urgencia, as representações apresentadas ao governo em execução dos decretos de 14 e 25 de fevereiro ultimo, com relação ás circumscripções administrativa e judicial. = Teixeira de Sousa.

Mandou-se expedir.

O sr. Marianno de Carvalho: - Declaro que lancei na caixa das petições um requerimento documentado de Antonio José Neto, sargento ajudante de caçadores n.° 5, pedindo que a antiguidade do posto de primeiro sargento lhe seja contada desde 19 de janeiro de 1885, data da sua promoção.

Recommendo á commissão de guerra este requerimento, por me parecerem justos os fundamentos do pedido.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.º, que auctorisa o governo a contratar com o banco de Portugal um supprimento de 4:500 contos de réis, destinados ao pagamento das classes inactivas

O sr. Dias Ferreira (sobre a ordem): - Começa lendo a seguinte:

Moção

A camara reconhece que, nas circumstancias excepcionaes em que se encontra o paiz, já não é possivel dar solução satisfactoria quer ao problema economico, quer ao problema financeiro, sem larga reducção nas despezas do estado, e passa á ordem do dia. = Dias Ferreira.

Em seguida, apreciando a situação financeira do paiz, em geral, fAz o orador sentir quanto alla é gravissima. As despezas já estão orçadas para este anno economico em, proximamente, 56:000 contos de réis, e isto depois da reducção de juros que se fez, há seis annos, e que não póde repetir-se sem perigo, devendo notar-se que aquella despeza é já superior á que estava orçada, quando se fez a reducção.

No seu entender, a crise é tão grave que não bastam as forças do governo e das camaras para se sair d'ella. Julga necessario que todo o paia empenhe os seus esforços para que isso se consiga.

Parece-lhe que o sr. ministro da fazenda, relatando as difficuldades que encontrou, poz perfeitamente a questão, mas deixou perceber que não confia na efficacia dos remedios que propoz.

Dizia s. exa. que o paiz tem recursos, e que o producto das contribuições quadruplicou nos ultimos quarenta annos.

Embora isto seja assim, na opinião d'elle, orador, o paiz não tem recursos para os sacrificios que actualmente se exigem, porque aquelle augmento de receita, mais significa empobrecimento do que augmento de riqueza.

Referindo-se ao agio do oiro, sustenta que uma das suas principaes causas está no facto de ter o governo de pagar annualmente alguns milhares de contos de réis de juros da divida externa.

Preoccupa-o tanto esta, questão, que acceitaria os mais pesados sacrificios para nos libertarmos d'aquella divida, porque, alem d'ella pesar enormemente no cambio, póde trazer-nos consequencias que affectem interesses mais altos.

A seu ver, não é com emprestimos que as condições economicas do paiz hão de melhorar, mas com uma administração escrupulosissima, grande parcimonia na applicação dos dinheiros publicos e com providencias taes que, por todas as fórmas, se desenvolva o movimento industrial, e commercial do paiz.

A nossa regeneração só poderá conseguir-se quando, pondo-se de parte os processos até agora seguidos por todos os governos, nos governarmos só com a prata da casa, porque o contrario, não é senão satisfazer encargos creando outros novos.

Pergunta, se o governo está prevenido para cumprir a sentença do tribunal arbitral de Berne, embora a indemni-

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sação, segundo pensa, não possa ser muito avultada, por não haver logar a pagamento de juros, visto que tem de ser satisfeita no praso de seis mezes.

Conclue dizendo, que não concorda em que se possa ir buscar uma grande receita, como já ouviu dizer na camara á contribuição predial, pois que ella já está bastante sobrecarregada; mas entende que se póde tirar algum proveito da vinda dos estrangeiros ao nosso paiz, desde que se proporcionem todos os meios de os attrahir.

(O discurso será publicado em appendice a esta sessão quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - A camara acaba de ouvir o discurso annual do illustre deputado o sr. José Dias Ferreira. Faz parte do programma das sessões parlamentares e apparece sempre com a mesma regularidade, com o mesmo isochronismo que o discurso da corôa e o decreto de encerramento.

O illustre deputado, a quem tenho a honra de responder, representou n'esta casa, durante um largo periodo de annos, de 1870 a 1891, o papel muito agradavel, e relativamente bastante facil, de censor encartado de todas as situações politicas que se succediam nos bancos do poder. Todos os annos, ou na discussão da resposta ao discurso da corôa, ou na discussão de qualquer projecto de lei financeiro, s. exa. proferia um discurso brilhante, como são quasi todos os seus, um que faria alarde das suas rascadas convicções liberaes e estygmatisava os actos de todos os governos, quer progressistas, quer regeneradores, e até extra-partidarios, com aquella critica que lhe é peculiar: serena, humoristica por vezes, mas sempre correcta e levantada.

Se a thema favorito do illustre deputado, o thema invariavel dos discurso de s. exa. era sempre os fóros e regalias populares, o absoluto respeito á lei do estado, a mais escrupulosa moralidade no poder e a mais rigorosa economia nos serviços publicos, devo dizer que a sua situação mudou inteiramente de 1892 para cá, porque o illustre deputado, que até ahi se tinha mantido como censor perpetuo, passou a assumir as responsabilidades do poder, que tem de partilhar com todos nós.

Effectivamente, disse s. exa., a divida publica está em 56:00 contos, quando entes da reducção dos juros não attingiu tal cifra; mas isso o que prova é que a reducção dos juros, pelo modo por que foi feita, não surtiu os resultados que ora para desejar. E quem a fez foi o illustre deputado.

Como foi que s. exa. reduziu a divida publica? Começando por annunciar publicamente a fallencia do estado; depois procurar tratar com os credores, e para isso reconheceu como legitimos representantes d'esses credores uns certos comités que ao tinham organisado lá fóra, a que s. exa. acaba de referir-me no seu discurso.

Ajustou, um accordo com esses comités, accordo pelo qual garantia nos credores externos o pagamento em oiro de metade do juro que lhes era devido, e quando a questão estava n'esta altura, quando restava apenas ratificar o convenio, que tinha sido assignado pelo seu delegado em Franca, de subito, sem que occorresse nenhuma circumstancia nova justificasse um tal reviramento, rasgou esse convenio e publicou o decreto de junho de 1892, pelo qual, sem audiencia dos credores, s. exa. fixava, não já em metade mas n'um terço, o pagamento em oiro do juro devido aos credores.

D'ahi é que surgiram todas as difficuldades. Eu não amesquinho o auto praticado pelo illustre deputado; foi um acto de ousadia mas foi tão imprudente que d'elle derivaram todos as difficuldades, não só internacionaes, como internas, a que em mais de uma occasião nos temos referido no parlamento ao tratar das difficuldades financeiras do paiz.

Os governo estrangeiros, nomeadamente o allemão, immediatamente contestaram o direito que o governo portuguez se reservava de decidir de uma maneira tão extraordinaria a questão com os seus credores, cujos interesses elles vinham defender.

Eu não discuto agora este ponto de direito internacional, mas o que sei é que as nações pequenas e fracas, como nós, precisam ser muito mais escrupulosa se difficeis até, permitta-se-me o termo, no seu procedimento para com estranhos, porque os seus actos não têem a força a defendel-os.

Por este acto, que fez cair o governo a que s. exa. presidia, começou para nós o nosso calvario.

S. exa. disse e disse muito bem, que é necessario reduzir as despezas publicas; mas imagina s. exa. que quando reduzamos as despezas publicas a nossa questão financeira fica resolvida? De modo algum!

Disse s. exa. «remediemo-nos com a prata da casa;» mas a prata não é oiro, e de oiro é que nós precisâmos.

Nós temos a divida externa a pagar, e essa divida tem de ser paga em oiro; a prata da casa é uma phrase humoristica, mas que não resolvo um problema tão difficil como este.

É necessario que o paiz produza, porque o paiz não tem minas de oiro e ha de pagar em oiro a sua divida.

Falla-nos s. exa. em prata da casa; mas o que entenderá o illustre deputado por prata da casa?

A minha opinião é diversa; torna-se preciso que o paiz produza, mas isso consegue-se sómente por uma proposta de lei approvada, melhorado e emendada pela camara? Não. Ainda que o paiz queira ajudar o governo, ainda que as camaras lhe dêem todo o seu apoio, é necessario um certo numero de annos para se produzir o que é indispensavel e para reduzir os encargos. Durante esse tempo que fazer?

Falla-nos s. exa. na prata da casa. Pois não sabe que não é com a prata da casa que se ha de pagar o coupon no estrangeiro? O que é necessario é obter oiro dentro d'esse periodo, que deixe o paiz desafogado, para se levantar mais tarde e cumprir, pelos seus meios naturaes, as obrigações que contrahiu (Apoiados.)

O illustre deputado - cujo discurso hei de seguir um pouco desordenadamente, porque não tenho paciencia para ler os apontamentos que tomei - o illustre deputado disse, com justiça, que eu tinha acertado com o diagnostico da doença de que soffria o paiz, sómente não tinha sido tão feliz nos remedios em que s. exa. discorda. Mas eu vejo que em muitos pontos, embora a s. exa. parecesse o contrario, estamos em perfeito accordo.

Diz s. exa. «que a propriedade não póde pagar mais», porque está sobrecarregada com a contribuição de registo, real de agua, sêllo, etc. Não sei se isto é um remedio. S. exa. vê porventura no programma financeiro do governo alguma providencia tendente a augmentar o imposto sobre a propriedade? Creio que não. Diz s. exa. «que a contribuição industrial está muitissimo sobrecarregada», parecendo que já baixou no seu rendimento. Vê s. exa. no programma financeiro do governo alguma medida tendente a augmentar a contribuirão industrial? Não.

Agora vamos ao direito sobre a importação dos cereaes.

Diz s. exa. «que é o imposto da fome.» É uma phrase. Houve já algum anno em que o paiz tivesse podido deixar de importar os cereaes? Não; e todavia não se tem considerado como fome esse deficit. Ha no programma do governo alguma providencia que impeça a cultura dos cereaes no paiz? Ao contrario, as medidas do sr. ministro das obras publicas tendem a augmentar a producção cerealifera.
Ainda n'este ponto estamos de accordo.

«O que é necessario é attrahir o estrangeiro.» Outra providencia a que não me referi no meu relatorio de fazenda.

Mas tambem não me opponho a ella, devendo dizer, todavia, que não confio como s. exa em que possamos transformar o paiz n'uma Suissa. É necessario esquecer a

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situação geographica para suppor que nós possamos attrahir o estrangeiro, sobretudo os inglezes, como aquelle paiz. Podemos ter uma immigração de estrangeiros como tem a Italia, cujos monumentos e obras de arte atrahe ali?

Nas auctorisações que estão incluidas no orçamento comprehende-se a de simplificar quanto possivel os processos fiscaes na fronteira, para facilitar a entrada aos estrangeiros. Ainda n'esse ponto estamos de accordo, embora não supponha, como o illustre deputado, que nós possamos attrahir o estrangeiro ao nosso paiz como a Suissa e sobretudo a Belgica.

Ainda outro ponto. «A reducção das despezas.» Devo dizer, repetindo o que já tenho affirmado, que pela junta de fazenda fizeram-se todas as reducções que cabiam dentro das faculdades de poder executivo. Cortaram-se todas as gratificações, dispensaram-se do serviço todos os empregados nomeados fóra da lei, etc., etc. Então que fazer mais?

Entende o sr. Dias Ferreira que devemos estar promptos, isto é, preparados para pagar a indemnisação de Lourenço Marques.

Eu devo declarar ao illustre deputado que começo por são saber se o governo tem de pagar alguma cousa; mas se tiver, esteja o illustre deputado tranquillo, a indemnisação ha de ser paga.

E agora que me referi aos pontos em que estamos de accordo, devo dizer ao illustre deputado que a maneira como foi tratada a questão da divida externa em 1892 é que originou os males de que n'este momento soffre o paiz.

O governo que se seguiu ao illustre deputado procurou remediar a má vontade dos credores estrangeiros e foi até ao pouco de dar-lhes uma percentagem no excesso dos rendimentos da alfandega.

Eu não digo que esse governo tenha resolvido a questão da maneira a mais satisfactoria para os interesses do paiz, por isso que foi conceder aos credores nada menos de duas vantagens, sem ao menos fazer distincção entre ellas; mas a fórma como esse governo tratou este assumpto ainda apresenta outra desvantagem e outro inconveniente: é que tornou o credor externo, por assim dizer, o fiscal do que se passa na nossa alfandega.

E eu vou expor o seu pensamento, tanto mais que tenho ouvido censurar, que se offereceram aos credores partilha ou communicação nos nossos rendimentos alfandegarios, porque por muito que subisse o agio do oiro, esses rendimentos ainda seriam de sobra para garantir-lhe o pagamento do terço. Mas desde que se procedeu por outra fórma, desde que se dá partilha no excesso dos rendimentos das alfandegas, o que acontece é que os credores olham com muita attenção para todas as providencias que o governo tome e que possam influir n'esses rendimentos.

Eu creio que o governo transacto, a esse respeito, nos podia dizer alguma cousa, sobre se é ou não verdade quererem os credores externos intervir, logo que se pensou em modificar algumas disposições da pauta.

Se e, vez de se lhes dar uma participação no excesso, se lhes garantisse uma quantia fixa, cessava esse cuidado de fiscalisar os rendimentos das alfandegas.

Por outro lado desde que os mercados estrangeiros se fechassem, desde que se recuse a cotação a todos e qualquer titulo novo, que o governo portuguez pense em emittir a situação é irredutivel.

Diz o sr. Dias Ferreira, e diz muito bem: « nós podemos propor nova diminuição de pagamento de juros; mas por outro lado o paiz não tenho oiro, não tenho ainda o bastante para com a sua exportação compensar a importação que tenha a fazer, continua nas mesas difficuldades, e a situação é portanto irredutivel.»

Pois é por isso que entendo não se poder deixar de ir buscar ao estrangeiro o oiro indispensavel para occorrer aos encargos da propria divida externa, durante o periodo necessario para que o paiz se levante com a produção do trigo, ou de outro qualquer cereal, que oiro represente.

Mas então, dir-me-ha o illustre deputado: «onde esteve a minha falta?!»

A falta do illustre deputado esteve em não ter negociado um emprestimo, ao mesmo tempo que fazia a conversão. Ahi é que esteve o erro do illustre deputado; d'ahi é que derivam todos os nossos males. (Apoiados.)

O emprestimo devia ter sido feito antes de se annunciar, áquelles com quem tinhamos de contratar, que o paiz se achava reduzido á situação de diminuir o pagamento do juro.

Era necessario ter feito o emprestimo antes ou simultaneamente; era esse o pensamento de Oliveira Martins e do illustre deputado, ao principio; depois mudou e a mudança não foi feliz.

E a rasão é sempre a mesma.

Era evidente que, depois de annunciada a reducção do pagamento do juro, nos mercados estrangeiros, se havia de produzir uma tal ou qual perturbação, tendente a difficultar qualquer operação financeira.

Era antes, portanto, de ter feito a reducção de juros, que devia ter-se effectuado a operação do emprestimo, porque ficava o paiz assim preparado com o oiro necessario para pagar o juro, durante tres ou quatro annos, dando assim logar a que o paiz se levantasse. Foi isto o que não se fez, e de então para cá a nossa situação tem-se aggravado de dia para doa, porque o oiro esgota-se tambem dia a dia.

E o illustre deputado, que muito respeito, pelo seu elevadissimo caracter, o sr. Teixeira de Sousa, referindo-se aos cambios, «disse que elles tinham baixado ponto e meio n'estes cinco mezes ultimos!»

Se s. exa. se recordasse do que aconteceu antes com o governo transacto, veria que baixaram não ponto e meio, mas cinco pontos!

Não estou a fazer retaliações; mas esta lei dos cambios é fatal.

Na hydrulica agricola, ha um aparelho de irrigação, que é um grande tanque que recebe por cima a agua e pelos officios que tem no fundo, uma especie de ralo, distribue essa agua para irrigações ou para qualquer outra applicação. Ora , é evidente que os taes orificios inferiores hão de ser feitos e calculados por fórma que não sáia mais agua do que a que entra; é preciso que conserve um certo nivel, porque do contrario a agua vae descendo até que o tanque fica em seco.

Ora, é o que acontece entre nós; como o oiro que vamos exportando é mais do que o que importâmos, as reservas metallicas vão diminuindo, o paiz atraza-se e o cambio não póde deixar de peiorar, emquanto se não occorrer com um remedio efficaz, e esse é, a meu ver, aquelle que proponho nas medias de fazenda, embora desgostem ao illustre deputado.

Creio bem ter respondido um pouco desordenadamente, é verdade, ao brilhante discurso do illustre deputado que acabou de fallar o sr. Dias Ferreira.

Ha um ponto em que estou perfeitamente de accordo com s. exa., é quando nos disse, que é necessario que todos os partidos monarchicos se liguem, para debellar a crise que nos assoberba e ameaça subverter.

N'esse ponto estamos de accordo e, se tivesse auctoridade para isso, fazia um apello a todos os membros d'esta camara, para que seguissem o concelho do illustre deputado.

A França, depois dos grandes desastres de 1870, encontrou no seu patriotismo recursos para pagar uma indemnisação de 90:000 contos de réis; póde elevar as contribuições do estado em mais 135:000 contos de réis; entregou-se ao trabalho e hoje ahi a vemos grande e respeitada.

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A nossa vizinha Hespanha, esse povo nobre e sympathico, viu-se a braços com duas revoluções; para as vencer, para evitar a perda das suas mais importantes colonias, não tem hesitado diante dos mais rudes sacrificios, quer de homens, quer de dinheiro, mostrando assim quanto vale uma nação pundonorosa quando quer defender a sua integridade e a sua honra.

Sr. presidente, tambem nós atravessâmos uma crise grave e profunda, crise que nos opprime desde 1881 e que nos ameaça subverter, e entretanto em vez de nos unirmos e congregarmos, para debellar esta crise, perdemos o nosso tempo em discussões meramente politicas e n'estas pugnas improficuas da palavra.

O governo apresentou á camara as propostas que entendeu, que eram as mais convenientes para attenuar essa crise, discutâmos essas propostas serenamente, modifiquemol-as, substituâmol-os mesmo; eu acceito o bom conselho, venha elle de onde vier, não tenho caprichos, nem teimosias, e acima do meu amor proprio ou da minha vaidade, eu ponho os interesses do paiz.

(S. exa. não reviu o seu discurso.)

O sr. Ricca (por parte da commissão de obras publicas): - Sr. presidente, mando para a mesa o parecer d'esta commissão, sobre o projecto de lei n.° 24-A, apresentado á camara pelo sr. deputado José de Alpoim.

Peço a v. exa. se digne dar-lhe o destino conveniente.

Foi a imprimir.

O sr. Marianno de Carvalho: - Começa lendo a seguinte

Moção

A camara entendendo não serem convenientes pequenas operações de emprestimo que mal emendam os apuros do presente e prejudica o futuro, continua na ordem do dia. = Marianno de Carvalho.

Continuando, diz o orador que concorda com o sr. ministro da fazenda em que o deficit da situação actual provém em grande parte de não se ter feito em 1891 um emprestimo, antes de se declarar a bancarrota. Foi sempre esta a sua opinião.

Não comprehende como o sr. Dias Ferreira quer que nos governemos com a prata da casa; mas tambem não o satisfez, a resposta do sr. ministro da fazenda, porque, embora prata não seja oiro, se nós tivessemos prata em abundancia, facilmente a converteriamos em oiro.

O sr. Dias Ferreira é absolutamente contrario á existencia da divida externa, e lembra a conveniencia de nos cotisarmos todos para a extinguir; o sr. ministro da fazenda entende que é preciso fazer uma conversão d'essa divida, e pela sua parte, elle, orador, entendo tambem que é necessario fazer uma conversão, mas que seja feita em termos favoraveis para o paiz, e nas condições em que a fez, ultimamente, a Servia.

Essa conversão teria por base o rendimento dos tabacos, nos termos em que o orador indica, ou em termos quaesquer similhantes, de fórma que, resolvendo as difficuldades de occasião, dê tempo a que no paiz se faça uma larga politica de regeneração economica.

Só por esse meio e não com os pequenos emprestimos, como o sr. ministro da fazenda propõe, é que se poderá chegar ao resultado desejada.

Visto que deu a hora de se encerrar a sessão, fica com a palavra reservada.

O sr. Presidente: - O sr. conde de Burnay pediu a palavra para explicações. Eu não lh'a posso conceder sem deliberação da camara.

Vou portanto consultar a camara para esse fim.

Consultada a camara, foi concedida a palavra ao sr. conde de Burnay.

O sr. Conde de Burnay: - Sinto incommodar a camara por alguns minutos do que peço desculpa.

Pedi a palavra para explicações quando o sr. Jacinto Candido se referia a uma operação dos tabacos e questões tratadas n'um jornal accentuando nas suas apreciações a incompatibilidade da minha situação pessoal na camara com a minha posição na companhia dos tabacos.

A apreciação do artigo d'esse jornal que não li, mas de que ouvi fallar versa sobre o modo como a companhia dos tabacos estabelece as suas contas. Já o sr. ministro da fazenda respondeu a s. exa., deixando ao partido regenerador a responsabilidade da fiscalisação d'essas contas durante os quatro annos da ultima gerencia regeneradora.

Eu podia discutir e desfazer ou falsos argumentos em que se baseia essa apreciação, mas francamente considero-me superior a isso.

Não sei quem é o auctor dos principios sustentados no tal jornal de que tenho ouvido fallar, mas quem quer que fosse não sabe a primeira palavra do assumpto em que se metteu.

Pretender que uma companhia, que tem de partilhar com o governo os seus lucros, faça essa partilha antes de abater todas as despezas geraes da sua exploração, é uma cousa que nem se discute. Pelos principios estabelecidos na argumentação, a que me refiro, os lucros que a companhia tem tido de todas as suas operações de tabacos e outros não chegariam para perfazer a somma que se lhe pede, porque a companhia em toda a sua existencia não realisou lucros que accumulados cheguem á quantia a que se refere o articulista.

Sr. presidente, argumentações d'esta ordem, proferidas por pessoas importantes e por jornaes de certa posição é que nos desacreditam. Que effeito não faz no estrangeiro ouvir, passados cinco annos, discutir e contestar assim a fórma como a companhia estabelece a sua escripturação?

Inventar que faz contas falsas uma companhia onde ha homens dos mais respeitaveis do paiz, onde está um commissario regio, e isto depois do director geral da contabilidade, do director da thesouraria e o proprio governo terem acceite essas contas, é cousa grave.

As contas estão bem feitas, e não hesito tomar a responsabilidade d'ellas; na administração da companhia tive a meu lado honrados membros do partido regenerador que de certo tomam tambem commigo essa responsabilidade como são: os srs.: marquez da Praia e Monforte, Eduardo Ferreira Pinto Basto e Tito de Carvalho, e outros ata intimos do leader da minoria os srs. Gaspar Schindler e Domingos da Costa Ribeiro. Somos todos solidarios nas contas da companhia, como membros da direcção ou do conselho fiscal.

Faltarei agora da minha situação pessoal n'esta casa.

O facto de eu ter sido administrador da companhia dos tabacos inhibe-me, porventura, de ter aqui uma situação independente? Não estão aqui administradores d'essa e de outras companhias? Não estão aqui directores de bancos? O sr. Mello e Sousa, illustre deputado da opposição não á director do banco commercial? Que differença ha entre mim e os outros srs. deputados?

Eu não vim a esta casa para sustentar interesses particulares de qualquer ordem, mas sómente os interesses publicos, vim trazido por uma eleição incontestada; e emquanto aqui estiver hei de pugnar por elles, dizer o que penso e me ditar a minha consciencia.

Já recentemente fui aqui provocado pelo partido regenerador e estranho que seja d'esse lado da camara que venham lançar sobre mim suspeitas, que eu não mereço. Esse partido não tem motivo nem direito a me fazer censuras, digo-o em alto e bom som. Achou-me sempre lealmente ao seu lado em todas as difficuldades em que se encontrou e em que recorreu a mim e sem que eu fizesse jamais alarde d'isso. Não foram poucas as occasiões em que chegaram as difficuldades financeiras o ser de tal ordem que nem dinheiro se encontrava para pagar vencimentos dos

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funccionarios publicos. Quantas vezes á falta de outro recurso o chefe do partido regenerador me escreveu pedindo me em nome da ordem publica para emprestar quantias, embora mais pequenas, mas urgentemente necessarias para pagar as ferias aos operarios da camara municipal!

Satisfiz sempre a esses pedidos sem levar um ceitil de commissão, contente de poder prestar serviço ao paiz e ao partido regenerador! Muitas vezes, quando não tinha dinheiro proprio disponivel, fui ao banco de Portugal garantir a camara municipal de Lisboa, para sob a minha responsabilidade, e firma, dadas gratuitamente, se lhe emprestarem algumas dezenas de contos de réis, para pagamentos urgentissimos. Quando em occasiões criticas alguns bancos, estiveram aponto de suspender pagamentos, sem que ninguem lhes valesse foi ainda a mim que se recorreu Quando o banco ultramarino, em tempos infelizes, muito atacado se viu na impossibilidade de pagar os cheques dos seus depositos e ninguem lhe queria emprestar um real, foi a mim que por conveniencia politica e do banco se dirigiu, o governo regenerador a pedir-me que valesse ao banco.

Que o diga o banco ultramarino; quantias de 100 contos de réis e outras que absolutamente ninguem lhe queria emprestar fornecia-lh'as eu repetidas vezes sem caução, nem commissão, unicamente como serviço prestado ao banco, ao paiz e ao governo.

Estou, e á camara vê-me deveras commovido, porque me custa trazer, pela primeira vez, a publico factos passados n'estes ultimos vinte annos, que nunca divulguei nem teria divulgado se me não provocassem.

Quando publiquei os artigos. «Em legitima defeza», tinha promettido historiar algumas das minhas operações com o estado e foi precisamente por estar então no poder o partido regenerador que não fiz essa publicação, não quiz n'essa occasião mostrar quanto tinha feito nem quanto o partido regenerador se tinha utilisado e havia confiado de mim, a ponto de me dar carta branca para dispôr de valores do estado e para fazer operações do ministerio da fazenda.

(Interrupção do sr. João Franco.)

N'um telegramma em que v. exa. me mandou dizer que fizesse pelo melhor.

Mas na mesma occasião das 400:000 libras, recebi outros telegrammas. Estava tudo em sobresalto.

Havia uma corrida ao montepio que ameaçava attingir o banco de Portugal. Decorreram trinta e um dias para encontrar um ministerio que quizesse succeder-se ao que estava demissionario, por toda a parte a suspeição, ninguem no paiz parecia querer dar um vintem que fosse para auxiliar o thesouro. Foi ainda, no meio dos acontecimentos a que acabo de me referir, que o governo me communicou que o concurso annunciado para a divida fluctuante que se í verificar d'ahi a poucos dias ameaçava não ser concorrido é que seria um verdadeiro desastre se elle ficasse deserto, pedindo por isso, a minha intervenção.

Em tal situação apertada, mandei um telegramma á minha casa dizendo lhe: que subscrevesse tudo que fosse necessario para que o paiz e o sr. ministro da fazenda, que era o sr, João Franco, fizessem boa figura.

E é depois de uma pessoa ter assim procedido que se fazem remoques, o sobre ella se vem lançar suspeitas mal cabidas!

Sr. presidente, estive tão ligado e fui tão dedicado ao partido regenerador que a camara ainda se deve lembrar que a esse partido se chamou a burnaysia.

Então só me achavam bom quando precisavam de mim, quando tinham afflicções ou se viam em apuros?

Já houve um jornal orgão do partido regenerador, que a proposito de uma questão qualquer para distruir a lenda da burnaysia entendeu que devia dizer de mim cousas desagradaveis e injustas.

Escrevi então ao sr. conselheiro Antonio de Serpa, chefe do partido regenerador, e director politico do jornal, que me atacava, censurando o facto, sabe a camara o que me respondeu s. exa.?

O illustre chefe do partido regenerador não hesitou, em lealmente reconhecer e declarar que o auctor do artigo tinha procedido com brutalidade e injustiça!

Ahi está sr. presidente, quem se encarregou de julgar o procedimento de alguns membros do partido regenera dor para commigo.

Tenho dito.

O sr. Presidente: - A hora está dada, entretanto vou consultar a camara se esta entende que o sr. deputado Jacinto Candido póde usar da palavra.

O sr. Franco Castello Branco: - Não discute se é o partido regenerador que deve favores ao sr. Burnay, ou se é esto senhor que se deve áquelle partido; simplesmente quer explicar que a unica operação que fez com s. exa. como ministro da fazenda, e a que já alludiu o illustre deputado, realisou-se em circumstancias difficeis. Foi logo apoz a rejeição do convenio luso-britannico;, estando demissionario o gabinete; e fel-o a rogo do governador do banco de Portugal, o sr. Pereira de Miranda, que lhe solicitava alcançasse a verba precisa para evitar as difficuldades com que áquelle banco poderia luctar em seguida á corrida ao monte pio geral.

Depois de ter telegraphado ao Crédit Lyonnais e ao Crédit Industrielle, que se recusaram a fazer a operação, com o fundamento na agitação que lavrava no paiz, motivada pelo convenio com a Inglaterra, telegraphou então ao sr. conde de Burnay, que então tinha ido a Paris para negociar o emprestimo dos tabacos, pedindo-lhe que se encarregasse da operação. S. exa. respondeu affirmativamente, mas impondo como condição a opção das operações futuras, opção que o orador não acceitou, dizendo-lhe apenas que não faria questão de juro.

O sr. Presidente: - Consulto a camara sobre se permitte que eu dê a palavra ao sr. Jacinto Candido para explicações.

Assim se resolveu.

O sr. Jacinto Candido: - V. exa. comprehende que, depois da benevolencia da camara, concedendo-me que use da palavra, não posso, nem devo, abusar do favor, que me foi concedido. Serei, pois, muito breve e resumido.

O sr. conde de Burnay attribuiu-me propositos, que se não continham nas minhas palavras, nem estavam na minha intenção, quando fiz a minha pergunta, sobre a partilha dos lucros da companhia com o estado, ao sr. ministro da fazenda, em face das informações documentadas de um jornal de, hontem. Limitei-me a perguntar a s., exa. se conhecia a questão; no caso affirmativo, qual o seu ponto de vista a respeito d'ella; - e, em todo o caso se o governo estava, ou não, disposto, a fazer entrar nos cofres do thesouro todas é quaesquer quantias, que lhe fossem, devidas - não me referi, n'estas perguntas, nem ao sr. conde de Burnay, nem a pessoa alguma da companhia. Limitei-me a pedir informações sobre uma questão do dia importante e interessante, e a respeito da qual o governo devia de ter uma opinião.

O que, a este proposito, o sr. conde de Burnay architectou, para entreter a attenção da camara, allegando todos os serviços, intimidados e relações, pessoaes, politicas, partidarias e financeiras, que manteve com o governo passado, sirva de lição aos futuros politicos, que tenham de tratar com s. exa. As suas manifestações perante o parlamento servem apenas para indicar as cautelas, as precauções de que todos se devem rodear, porquanto não se confunda: os serviços que prestou a todos os partidos, não os prestou aos homens, prestou-os ao paiz, se os prestou, e s. exa. vem atiral-os ás faces dos homens, não respeitando até as cinzas dos que jazem debaixo da terra.

Não commento nem aprecio os factos; e s. exa. vem hoje

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com eses serviços, que prestou ao paiz, atiral-os ás faces dos homens que têem administrado este paiz; não respeitando sequer, as cinzas, dos que já não são d'este mundo?! (Apoiados)

Não commento os factos nem os aprecio; deixo isso á opinião da camara e ao juizo do paiz, de todos aquelles, emfim, que presenceiam o espectaculo, que se tem desenrolado, sempre que uma ligeira referencia se faça ao sr. conde de Burnay. A mais pequena e leve referencia, vem logo s. exa. dizendo que estranha que assim se pratique, para com quem tem feito tantos serviços!

Pois as cousas são, o que são. A verdade dos factos, tem valor superior, a todas as ficções, que porventura queiram figurar-se; e a verdade dos factos é que o sr. Burnay é incontestavelmente uma das primeiras potencias da companhia dos tabacos; e portanto, não obstante estar comprehendido na letra da lei, e ser compativel o seu logar de director d'aquella companhia, com o logar de deputado, visto que não está actualmente em exercicio como director; a verdade é, que elle é accionista e directamente interessado, nos negocios da companhia dos tabacos. É, ou não é?! É. E porventura ouviu-me s. exa. dizer que s. exa. vinha para aqui sacrificar os interesses do paiz em favor dos interesses da companhia dos tabacos?! Não o disse, nem das minhas palavras isso se inferia. (Apoiados.) O que se inferia das minhas palavras era, que se dava realmente um facto positivo e verdadeiro; que era o sr. conde de Burnay ser uma das primeiras potencias financeiras interessadas na companhia dos tabacos; e que, como tal, s. exa. tinha apresentado n'esta camara argumentos em defeza d'essa proposta do governo, preconisando-a, como a unica solução do plano financeiro do sr. ministro da fazenda. E n'estas minhas palavras não fazia injuria nenhuma, nem offensa ao sr. conde de Burnay! O que fazia, apenas, era accentuar um facto, que vale mais por si só, pela realidade das cousas, do que, todas as incompatibilidades legaes. (Apoiados.)

O que é necessario é que s. exa., todas as vezes que se fazem aqui referencias ou á sua personalidade, ou ás companhias em que s. exa. tenha interesses, e com que esta relacionado, não imagine que é um tutor ou um mentor; que estamos aqui subordinados ao seu voto e á sua opinião; e que ha de ameaçar-nos com o terror de revelações! (Apoiados.) Faça essas revelações que quer fazer, tudo o que sabe; ponha tudo em pratos limpos. (Apoiados,) S. exa. engana-se completamente, se imagina que o partido regenerador, e parece me, poder dizer tambem n'esta parte, o partido progressista, têem algum receio das suas revelações n'esta camara.

O que faço, é pugnar pelo meu direito parlamentar, em proveito d'esta camara. Não tenho receio de revelações de especie alguma, parece que uma força superior pesa sobre nós e nos esmaga; e que a nossa palavra ha de ser acautelada, que as nossas phrases hão de ser medidas, para que não possam ir magoar o sr. conde de Burnay. Porque?!

Nós todos, nas discussões parlamentares, no calor da discussão, nos invectivamos e deixâmos escapar alguma phrase mais aspera, que muitas vozes vae ferir o nosso adversario; mas somos todos os primeiros a retirar essas phrases, como ditas no calor da discussão e sem idéa de offensa pessoal; nada d'isto significa um proposito aggressivo; todos fazemos justiça ás intenções d'aquelles com quem nos degladiâmos. (Apoiados.)

O sr. conde de Burnay picou-se, saiu logo á estacada, enumerando e lendo uma estatistica de serviços e favores feitos a todo o mundo!

Ora, deixe-me s. exa. dizer-lhe, muito á boa paz: esse papel não mette medo, nem inspira receio, francamente, e creia s. exa. e a camara que se não fosse já, n'outro dia, o sr. conde de Burnay levantar-se da mesma fórma, em resposta a uma pequena e ligeira referencia do illustre leader da opposição parlamentar, e isso me ter magoado, ferido e irritado tambem, talvez que nem hoje tivesse feito esta innofensiva referencia, que já apresentei á camara, e que ella tem na sua memoria.

S. exa. com isso o que faz é provocar, naturalmente, a referencias que tenhamos de fazer no uso liberrimo dos nossos direitos de critica e de apreciação, e ir até onde muitas vezes ...; em todo o caso queria fazer estas observações, para que se não imagine que estamos com receio das criticas do illustre deputado. (Apoiados.)

Sr. presidente, eram estas as observações, que tinha a fazer, pedindo desculpa á camara de me ter alongado tanto nas minhas considerações.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Conde de Burnay: - Peço a palavra.

Vozes: - Ha sessão nocturna. (Sussurro.)

O sr. Conde de Burnay: - A minha attitude a respeito do banco parece-me que ...

O sr. Presidente: - Hoje ha sessão nocturna, começa ás nove horas, sendo a ordem da noite a continuação da que estava dada.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e vinte minutos da tarde.

Documentos enviados para a mesa n'esta sessão

Representações

Da camara municipal do concelho de Alemquer, pedindo a reconstrucção da igreja da Varzea, onde se encontra a sepultura de Damião de Goes.

Apresentada pelo sr. deputado Lopes de Carvalho, enviada á commissão de obras publicas e de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

Da associação da classe dos constructores civis, mestres de obras de Lisboa, pedindo que não seja approvada uma representação dos mestres de obras de Villa Nova de Gaia, na qual se solicita a reforma de algumas disposições do decreto de 6 de junho de 1895.

Apresentada pelo sr. deputado Campos Henriques, enviada á commissão de administração publica, e mandada publicar no Diario do governo.

De fabricas de distillação de alcool de S. Miguel e outras, contra a proposta do exclusivo via fabricação, do assucar, apresentada pelo sr, ministro da fazenda.

Apresentada pelo sr. deputado conde de Paçô Vieira, e enviada ás commissões de fazenda, de agricultura e de artes e industrias.

O redactor = Barbosa Colen.

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