618 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Não sou muito dado a retaliações, salvo quando obrigado pela argumentação dos meus illustres adversarios.
Verifica-se agora o caso.
Ao abrir o debate sobre o projecto da conversão, cuidadosamente expliquei as nossas circumstancias verdadeiramente perigosas, sem me preoccupar com as, causas e com os factos que prepararam uma situação tão tensa, que já não ha meio de saír d´ella sem o concurso aberto e decisivo da nação.
Se não alludi nem desenvolvida nem ligeiramente a essas causas, não foi por quaesquer complacencias parlamentares ou politicas; nem por quaesquer conveniencias de discussão, mas por julgar que na situação gravissima do paiz nos deviamos preoccupar só com a questão financeira, e não gastar tempo com as questões de responsabilidades, que pouco servem n´esta hora suprema para salvar o doente de uma enfermidade perigosissima!
Mas os illustres deputados da maioria, e distinctos oradores, como o illustre relator e o sr. Eduardo Villaça, ambos os quaes me honram com a sua amisade, fizeram affirmações profundamente inexactas, que eu não posso deixar de pé.
Quero para mim as responsabilidades dos meu actos, mas não acceito mais nenhuma. Não quero cobrir responsabilidades alheias, senão quando isso for no interesse do paiz,
Sr. presidente, com surpreza soube eu que tambem o sr. ministro da fazenda na minha ausencia se entretivera a explicar n´esta casa que a origem de todas as nossas desgraças fóra o decreto de 13 de junho de 1892!
Sr. presidente, teriam sido grandes as minhas responsabilidades, se eu pelo decreto de 13 de Junho, em logar de pagar de menos aos credores, lhes tivesse pago de mais, porque o credor poderia oppor-se depois á restituição do que indevidamente recebêra, com a boa ou má rasão de que era ao ministro da fazenda e não a elle que competia fiscalisar os interesses do thesouro.
Mas desde que eu paguei de menos, se porventura aquelle decreto representava graves prejuizos para a nação, tudo se remediava facilmente, pagando os meus successores integralmente tudo quanto se devia, e portanto o que eu deixei de pagar!
Pois, em vez de se pagar por inteiro, aquelle decreto foi legalisado, e legalisado, não por mim, mas pelos meus illustres adversarios!
Quem ouvisse o sr. ministro da fazenda havia de suppor que era só o partido regenerador que pesava com a responsabilidade de ter confirmado o referido decreto.
Mas isso é assim.
O decreto de 13 de junho foi votado por unanimidade pelos dois partidos, regenerador e progressista.
O partido regenerador ainda até hoje não declinou as suas responsabilidades n´esse importante acto politico. (Apoiados.)
O partido progressista tambem não póde fugir a ellas, por mais que se canse, porque estão authenticados nos registos parlamentares os seus actos e as suas deliberações.
Quem não tem responsabilidade alguma na lei de 20 de maio de 1893 sou eu, que nem assento tinha então na camara.
Ora ninguem póde eximir-se á responsabilidade dos seus actos. A minha abrange simplesmente o decreto de 13 de junho de 1892. Essa quero-a, e reivindico-a para mim perante o paiz e perante a historia, e lisonjeio-me até com ella, porque o decreto de 13 de junho foi uma grande medida de salvação publica.
O que eu não acceito é a responsabilidade da lei de 20 de maio de 1893, que pesa toda sobre o sr. ministro da fazenda e sobre os seus amigos, bem como sobre os regeneradores.
Mas a responsabilidade do partido progressista na lei de 20 de maio de 1893 é muito maior do que a dos regeneradores, porque a votou, e portanto o decreto de 13 de junho de 1892, com a consciencia de que votava medidos prejudiciaes ao paiz, como agora confessa! Não é com clamores e com gritarias contra o decreto de 13 de junho que se restabelece o credito publico.
O melhor meio que tem o devedor de se acreditar e rehabilitar perante o credor e perante o publico é pagar o que deve e que deixou de pagar por qualquer motivo.
E o que succede com o individuo, é o que succede com a nação. Ora em vez de se pagar por inteiro seguiu-se no caminho do decreto de 13 de junho.
Tres coupons paguei eu com o juro reduzido á sombra do decreto de 13 de junho de 1892, os Çoupons de julho e de outubro d´esse anno, e o coupon de janeiro de 1893.
O coupon de abril de 1893, tambem reduzido ao terço nos termos do decreto de 13 de junho, já foi, pago pelo meu illustre successor.
Se o sr. ministro da fazenda e os seus correligionarios viam tantos perigos no decreto de 13 de junho, o seu direito e o seu rigoroso dever era, na discussão da proposta, depois convertida na lei de 20 de maio de 1893, exigir, e exigir como providencia de salvação publica, que o maldito decreto, que era o descredito do paiz, fosse trancado e se lhe impuzesse perpetuo silencio para me servir das palavras das nossas antigas leis, o que se pagasse por inteiro aos credores!
Mas não o fizeram. Pelo contrario, gostaram do decreto.
Soube-lhes bem! (Riso.}
Um decreto, que produzia a nossa desorganisação financeira e que nos deixava lá fóra completamente desacreditada, longe de ser condemnado ao esquecimento, foi legalisado pelo voto unanime de ambos os partidos na lei de 20 de maio de 1893, que começa assim:
«São confirmadas e declaradas definitivas as disposições do decreto de 13 de junho de 1892, salvas às modificações constantes dos paragraphos seguintes?! »
Assim uma providencia provisoria, verdadeiramente obnoxia, em vez de ser trancada, é confi-rmada e declarada definitiva pelas côrtes, e depois arguida de perigosa e de prejudicial pelos proprios que a votaram ?!
Similhante procedimento politico não se commenta, porque está abaixo de toda a critica!
Se o decreto era nefasto, se importava comsigo o descredito do paiz, a obrigação das duas casas do parlamento era condemnal-o por iniquo e injusto para com os credores, e negar-lhe completamente a sancção, parlamentar, mantendo intacta e bem alta a honra e a dignidade do paiz, e restituindo tudo ao antigo estado!
Mas em vez. D´isso as côrtes acceitaram o decreto, e foram ainda alem do decreto, porque declararam definitivas as suas disposições, que eram apenas provisorias! E, depois para mostrarem a sua coherencia, não passa periodo parlamentar em que me não accusem por uma providencia, que eu apenas decretei como provisoria, e que os accusadores reconheceram ser tão boa que a approvaram e declararam definitiva!
Declaro-me responsavel pela providencia provisoria que tomei.
Dos acrescentamentos que lhe fizeram os partidos, quando a transformaram em definitiva, não quero a minima parcella de responsabilidade.
Eu não dava aos credores externos nem mais 1 real alem do terço em oiro, não porque não desejasse pagar-lhes por inteiro, mas porque tinha, como tenho ainda hoje, a convicção profunda de que mesmo o terço em oiro só com grandissimo sacrificio poderia ser satisfeito.
É certo que o premio do oíro estava então entre 25 a 30 por cento.