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SESSÃO N.º 34 DE 13 DE MARÇO DE 1902 15

completamente, como deveria ser, estabelecendo que essa producção minima de 5:000 hectolitros se daria, pelo menos, depois de tres annos de funccionamento; mas este limite, Sr. Presidente, era grande, muito grande, e então o Sr. Ministro das Obras Publicas, nesse mesmo decreto é levado a criar um outro grupo de adegas, cuja producção minima estabeleceu em 1:000 hectolitros, restabelecendo d'este modo, depois d'esta evolução, a adega, que já se vae approximando de tantas outras cooperativas, que se levantam pela Europa.

Tudo isto é extraordinario, como a Camara tem visto e vae ver, em assumpto tão importante, porque o é realmente; e demais a mais declarando o Sr. Ministro das Obras Publicas que é na criação das adegas sociaes, que elle julga encontrar um poderoso meio de combater a crise. Errada orientação do Governo, que não fez senão aggravar cada vez mais a crise, e aggravar em muitas centenas de contos o Thesouro publico. (Apoiados).

Mas pergunto Sr. Presidente, que fazer, que destino a dar áquellas primitivas adegas das propostas de lei de 11 de março, em face do segundo grupo de adegas, criadas pelo decreto de 14 de junho? Como áquellas tinham sido propostas pelo Sr. Ministro das Obras Publicas, e tinham, até, tido parecer favoravel da commissão parlamentar, que as modificou, ainda assim, sensivelmente, e como seria contraditorio apagá-las, risca las d'aquelle decreto, visto na proposta de lei terem sido consideradas como uma das principaes medidas de salvação d'esta crise vinicola, o que se havia de fazer a tanta adega? Como justificar esta innovação, esta complicada e extraordinaria forma de cooperativas até aqui desconhecidas, mesmo nos países mais adeantados? A Camara vae ver e admirar; de um modo muito simples e muito seductor: tornar todo este conjunto de adegas uma verdadeira legião de associações, sustentadas, já se sabe, á custa do Estado, uma federação vinicola, como diz o Sr. Ministro das Obras Publicas, dando ás adegas regionaes o grande papel de adegas-mães, de grandes centros de irradiação, as quaes com as adegas livres formariam uma extensa e apertada rede, que absorveria de modo tão engenhoso todo o vinho do pais, e debellaria por completo esta tremenda crise! Que absurdo de federação é este, Sr. Presidente? como se ella se formasse, se enraizasse em um país, que nem pela sua indole e educação, nem pelos seus costumes e leis a abraçaria, por emquanto, por principio algum, sobretudo emquanto nelle, nas povoações ruraes não estiver perfeitamente comprehendido e radicado todo o alcance da beneficio da cooperação.

A propria Suissa, Sr. Presidente, que nas suas leis, nos seus costumes e na sua organização social dá exemplo de um federalismo bem organizado, bem pensado e bem querido pelas suas tradições historicas, não logrou, ainda, apesar d'isso levá-lo a effeito nas suas adegas sociaes. E Portugal que já por decreto de 30 de setembro de 1890, isto é, ha 12 annos, diligenciou provocar a criação das adegas sociaes por valiosos e importantes subsidios, dados pelo Estado, conseguiu, apenas, uma, a de Vianna do Alemtejo; e demais a mais não possuindo o país, ainda, hoje, a nitida comprehensão d'estes problemas sociaes, que certamente se não estudam no Diario ao Governo, é que deveria, Sr. Presidente, adoptar este systema de federação, absurdo, pelo principio falso, em que se funda, e condemnavel pelos grandes encargos que traz ao nosso depauperado Thesouro. (Apoiados).

E demais a mais, como já disse, esta federação vinicola é uma verdadeira utopia, federação, por isso, que nada resolve, nada, absolutamente nada, no estado actual do nosso regime fiscal e dos nossos convenios pautaes, com os paises estrangeiros. Queremos abertos os mercados estrangeiros, batendo ás portas das chancellarias, que nos favoreçam com as suas pautas protectoras, e ao mesmo tempo fechamos o mercado interno ao consumo do nosso vinho, encarecendo-o com os elevados impostos de consumo! E nestas condições, sem mercados externos, sem mercados internos, é que vamos estabelecer a sonhada federação das adegas sociaes; a adega regional enche-se pela drenagem da adega livre, e esta transborda pela producção do seus associados; e como nenhuma d'ellas só desavoluma, porque não ha mercados, o que é que resultará d'este estado de cousas? que maior, mais temerosa e mais desastrosa será, portanto a crise. (Apoiados). Tudo isto é verdadeiramente extraordinario, alem do absurdo, que representa a concepção de taes medidas.

Um outro ponto, Sr. Presidente, e igualmente importante, e que vem mais uma vez confirmar o quanto a criação d'estas adegas regionaes se desvia do seu fim, é este de que me vou occupar, relativo á sua distribuição geographica pelo país em oito regiões vinicolas, e para o qual eu chamo a attenção d'esta illustre Camara, pois, vae ver e admirar como em assumpto de tamanho melindre e alcance para a conservação e fama dos magnificos typos de vinhos que possuimos pelo país, se fez uma confusão de zonas vinicolas, que chega mesmo a causar lastima.

É um estudo curioso este que vou fazer, e que convém salientar, protestando contra uma tal classificação, que deve ser, quanto antes, riscada do Diario do Governo.

Parece, e não ha duvida, que desde o momento que um dos fins e vantagens principaes d'estas adegas, e que no decreta de 14 de junho se estabeleceram muito claramente, como condição essencial da sua constituição, é a criação de typos definidos de vinhos regionaes de consumo ou de lotação, deve occorrer, desde logo, logicamente e naturalmente, que na sua distribuição por este país, aonde a vinha occupa uma extensissima area, como avassallando, conquistando o territorio português, de norte a sul, desde as terras de alluvião, desde os valles mais fundos até ás mais elevadas encostas, se deveria rigorosamente attender a dois pontos importantes e essenciaes; attender: não só na sua distribuição á melhor, á mais racional classificação das zonas vinicolas do país, regiões bem distinctas, aonde os seus vinhos offerecem o maior parentesco, para assim melhor fabricarmos, aperfeiçoarmos e tornarmos bem conhecida essa grande variedade de typos de vinhos da mais excellente qualidade, que tanto caracteriza e afama esta riquissima e opulenta flora vinicola portuguesa, como faz, lá por fora, a França nos seus conhecidos typos de vinhos regionaes, e com muita vantagem, ainda, a Allemanha do Sul, mas ainda que essa distribuição das adegas se fizesse por todo o país, levando esse beneficio, admittindo a hypothese que estas adegas o produzissem, a todas as regiões vinicolas, a todas sem excepção, aonde a vinha abundasse e prosperasse pelos seus vinhos de variadas qualidades, traduzindo, d'este modo, de mais a mais, essa seductora federação vinicola em um país vinicola.

Seria esta, então, a feliz solução do problema em toda a sua largueza de vistas, a operação complementar ao fim de tantos esforços para a salvação da grande riqueza do país: o vinho.

Pois, Sr. Presidente, não se fez isto, não se fez o que naturalmente estará indicado, chegando a ser de extraordinario ensinamento o que nos diz a este respeito o Diario ao Governo de 16 de novembro, em que vem publicada essa distribuição das oito adegas regionaes nas oito regiões vinicolas, attendendo-se em algumas d'ellas, na sua classificação, mais ás divisões administrativas do país, que para a questão do que se trata nada significam, do que ás condições do meio, de qualidade, de producção e de fama de productos, genuinamente regionaes; chegando-se mesmo a privar d'essas adegas uma região vinicola, importante, do país, a transmontana, como logo demonstrarei, isolando-a completamente d'estes beneficios em um esquecimento, que nem mesmo ao Sr. Ministro das Obras Publicas será facil explicar, a não ser um proposito de desconsideração e de despreso por aquella formosa região.