O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 156

( 156 )

N.º 11. Sessão em 18 de Fevereiro 1850.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada - Presentes 56 Srs. Deputados.

Abertura - Á uma hora depois do meio dia.

Acta - Approvada sem discussão.

Não houve correspondendo.

O Sr. Cabral Mesquita: - Participo a V. Exa. e á Camara, que o Sr. Deputado Queiroz Machado não póde comparecer á Sessão da hoje por incommodo de saude.

O Sr. Presidente. - Tem a palavra o Sr. Pereira dos Reis, para apresentar um Projecto de Lei.

O Sr. Pereira dos Reis: - Vou lêr, e mandar para a Mesa o seguinte Projecto de Lei.

RELATORIO. - Senhores: O Porto de Lisboa é sem duvida um dos tres melhores da Europa: dão-lhe porém conhecida vantagem muitas condições e qualidades, de que carecem os proprios de Napoles e Constantinopla. Modernamente se escreveu que o Governo, que possuia este Téjo, e era pobre, dava uma demonstração plena da sua inepcia.

Este Porto, que, pela sua situação, grandesa e segurança, pela facilidade das suas barras, e pelo riquissimo abastecimento que lhe da a Capital, devia ser o encanto dos navegantes estrangeiros, é infelizmente olhado por elles como um escolho temeroso; póde dizer-se que nenhum vem voluntariamente demanda-lo.

A causa que produz este admiravel resultado, está no absurdo da Lei e Regulamentos, por onde se dirige a fiscalisação, relativa ás embarcações vindas de fóra; está principalmente, na existencia do Quadro estabelecido por Decreto de 16 de Janeiro de 1837, quadro que só serve para vexar o Commercio, para por em risco muitas fortunas, e para dotar largamente empregos ociosos ou antes dispensaveis. Aquelle Decreto, escripto e publicado, quando a opinião dominante assoalhava que Portugal, para ser feliz, devia abster-se de todo o commercio ou communicação com estrangeiros, foi desde logo condemnado como inutil para a fiscalisação, e como contrario ás noções mais vulgares de Commercio, e Economia Politica.

Sem embargo, porém, das razões allegadas contra o dicto Decreto, é certo que os interesses creados por elle, ajudados da nossa natural negligencia, teem podido mante-lo até hoje.

Não só o Decreto de 16 de Janeiro de 1837, mas todas as providencias, que nelle tiveram origem, são de uma natureza excepcional ou singular: em todas temos andado ao revez do que em materia igual ou similhante se observa, sem excepção, nos demais Portos do Mundo.

Em quanto outras Nações se empenham em tornar mais espaçosos, mais abrigados e mais seguros os seus Portos, vencendo para esse fim obstaculos quasi insuperaveis - em quanto procuram attrahir, por tal modo, a navegação estranha -em quanto, finalmente, diligenceiam conciliar a boa fiscalisação com a ausencia do menor vexame - estamos nós sustentando um quadro, que conduz a fins oppostos, sem especie alguma de compensação - estamos inutilisando os beneficios, que nos liberalisou a natureza, e circumscrevendo a poucas braças um dos mais vastos, e mais bellos ancoradouros, de que ha noticia.

E para em tudo ser desastrosa a concepção do quadro, nem ao menos lhe falta a ruindade do local, em que foi estabelecido. No Tejo não ha parte mais descoberta, ou mais sujeita, aos insultos de uma tempestade.

É verdade que, por favor da Providencia, os navios amontoados no quadro não teem soffrido, nos ultimos doze annos, consideraveis avarias; porém é igualmente indubitavel que a collocação actual do Quadro, em vez de abrigar, põe em risco imminente, não só os navios ali enfeixados, mas muitas das embarcações ancoradas no Tejo. Supponha-se um sueste rijo, auxiliado pela violencia de agoas do monte, e diga-se como será possivel, em tal caso, segurar a maior parte dos navios existentes no Quadro: dois ou tres, que tenham de garrar, darão cabo de todas as embarcações de menos lote, que lhe ficarem ao noroeste.

A opinião dos homens imparciaes e competentes, a quem tenho ouvido sobre este assumpto, é conforme:

1.º - Em que a existencia do Quadro não attinge o fim da melhor fiscalisação, que apparentemente lhe serviu de motivo;

2.° - Que tal Quadro affugenta do nosso Porto muitas embarcações estrangeiras, que lhe dariam preferencia, e deixariam aqui grandes sommas, se a fiscalisação fosse feita entre nós, como se faz em outros Paizes; isto é, de maneira que o zelo não chegue jámais a confundir-se com a oppressão;

3.° - Em fim, que a fiscalisação actual, além de vexatoria, é excessivamente cara; e que, além de cara, tem o defeito capital de ser incapaz.

Por estes fundamentos, que apoiarei e desenvolverei em occasião proprio, tenho a honra de trazer á vossa deliberação o seguinte

PROJECTO DE LEI: - Art. 1.º, O Governo é auctorisado para reformar o actual systema de fiscalisação do Porto de Lisboa; cingindo-se, no uso desta auctorisação, ás seguintes bases:

Primeira. - Extinguira o Quadro, creado por Decreto de 16 de Janeiro de 1837.

Segunda. - Entregará toda a fiscalisação, desde que o navio tomar o primeiro Piloto até o seu total descarregamento e carregamento, ao Director da Alfandega de Lisboa.

Terceira - Sugeitará os Guardas Fiscaes á direcção do Guarda Mór da mesma Alfandega.

Quarta. - O producto das tomadias, que se effectuarem, será exclusivamente entregue, na parte relativa aos apprehensores, ao individuo ou individuos, que fizerem as ditas tomadias.

Quinta. - A despesa da nova fiscalisação não poderá exceder á que se faz actualmente.

Art. 2.° - O Governo dará conta ás Cortes do uso que fizer desta auctorisação, logo que tenha ordenado definitivamente os trabalhos, de que ella o incumbe.

Página 157

( 157 )

Art. 3.º - Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Sala das Sessões em 18 de Fevereiro de 1850. - Antonio Pereira dos Reis, Deputado pelo Minho; José Joaquim Lopes de Lima, Deputado pela Estremadura; Agostinho Albano da Silveira Pinto, Eusebio Candido Pinheiro Eurtado, Luiz Augusto Rebello da Silva, Domingos Manoel Pereira de Barras, Manoel de Freitas Costa, José Ricardo Pereira de Figueiredo, Bernardo Gorjão Henriques, José Lourenço da Luz, João da Costa Xavier Cerveira e Souza, José Caldeira Pinto d'Albuquerque, Francisco Antonio Gonçalves Cardoso, Augusto Xavier Palmeirim, João Amaro Mendes de Carvalho, Gabriel Antonio franco de Castro, Francisco Antonio da Fonseca.

Continuando disse: - Sr. Presidente, senão é exigir muito, pedirei a V. Exa. que consulte a Camara sobre a urgencia deste Projecto de Lei; e se consente igualmente que seja impresso no Diario do Governo.

Consultada a Camara, foi declarado urgente, e remettido á Comissão de Fazenda, ouvida a de Commercio e Artes: resolvendo-se tambem que fosse impresso no Diario do Governo.

O Sr. Barão d'Ourem: - Mando para a Meza um Parecer da Commissão de Guerra sobre o Requerimento da Sociedade Pharmaceutica Lusitana.

O Sr. Presidente: - Fica para ser discutido na occasião opportuna

O Sr. Freitas Costa: - O Sr. Faria Barboza não tem comparecido estes dias ás Sessões por incommodo de saude.

O Sr. Peixoto: - Mando para a Meza o seguinte Requerimento.

Leu-o, e delle se dará conta quando tiver segunda leitura.

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão especial do Projecto n.° 70, sobre a organização do Banco de Portugal.

O Sr. Presidente: - Na Sessão passada começou a discutir-se, o n.º 5 do art. 15.°, e agora continua esta discussão, e é o Sr. Agostinho Albano que tem a palavra.

O Sr. Agostinho Albano: - Cedo da palavra.

O Sr. Cunha Sotto Maior: - Eu cedo tambem da palavra, mas peço á illustre Commissão, e á Camara, que tome em consideração o que se disse na Sessão de sabbado, que me parecia que este n.° 5.º devia voltar a Commissão, para vir nelle consignada a totalidade da divida já liquidada, por uma resolução do Conselho d'Estado, á Companhie das Obras Publicas.

O Sr. Agostinho Albano: - Já que o nobre Deputado me deve muita consideração por ser Deputado, por isso pedi a palavra, Sr. Presidente, para dar uma explicação. Este negocio não está ainda completamente liquidado, está affecto ao Conselho d'Estado, e assim como é que a Commissão póde tomar conhecimento delle? O illustre Deputado não tem cabal conhecimento desta questão: a Consulta a que alludiu o Sr. Deputado, e que o Publico leu no Diario, deu logar a que houvessem reclamações da parte dos interessados, e voltou esse negocio outra vez ao Conselho d'Estado, para consultar sobre essas reclamações; e não estando ainda definitivamente feita a liquidação, como acabo de dizer, por isso parece-me extemporanea a exigencia do nobre Deputado; não digo mais nada.

O Sr. Cunha Sotto Maior: - Sr. Presidente, do que acaba de dizer o nobre Deputado, deprehendo eu, e muito bem, que os documentos officiaes não valem nada; por que eu li, e todo o Paiz leu no Diario do Governo uma Consulta do Conselho d'Estado, em que dava por liquidadas as quantias devidas á Companhia das Obras Publicas; se depois houveram reclamações, não o sei eu, e nem o sabe o Publico; e era firmado na parte official, que eu entendia que estas contas estavam liquidadas; se essa liquidação não vale de nada, isso é com o Governo, e d'aqui por diante ninguem póde acreditar nas peças officiaes que vem no Diario do Governo; e se a Camara duvida da minha declaração eu posso mandar buscar o n.º do Diario do Governo, em que vem liquidadas as dividas á Companhia das Obras Publicas. Por tanto visto que essa liquidação não estava feita, declaro que d'aqui por diante não acreditarei nos documentos officiaes, que venham no Diario do Governo.

O Sr. Presidente do Conselho: - Esse negocio da liquidação dos contas com a Companhia das Obras Publicas e um d'aquelles que tem merecido o maior escrupulo não só a este Ministerio, mas aos Ministerios antecedentes. Existe um trabalho sobre aquelle objecto feito pela Commissão Liquidataria, que direi á Camara que é chefe d'obra n'aquella materia, e a Camara ha de ter conhecimento d'elle no devido tempo: aquelle Parecer da Commissão Liquidataria foi ainda mandado á Secção Administrativa do Concelho d'Estado, que examinou com a maior circunspecção aquelle objecto, e fez subir uma Consulta ao Governo, sobre esse objecto, a qual o Governo mandou Publicar no Diario do Governo, e é a que se refere o nobre Deputado; mas as partes não ficaram contentes com esta Consulta, e apresentaram novas reclamações, e essas reclamações teem já tido o devido andamento, e hoje acham-se na Secção Administrativa do Conselho d'Estado: espera o Governo que suba uma Consulta sobre estas reclamações, para com a maior facilidade tomar a sua resolução, e este o estado do negocio, - não ha pois motivo para se não acreditar nas peças officiaes, mas como se acaba de dizer, as partes interessadas não convieram, e sobre as suas reclamações é que se tracta de tomar agora uma resolução.

Não havendo quem mais pedisse a palavra julgou-se a materia discutida, e foi approvado o n.° 5. O n.° 6.º foi approvado sem discussão.

Entrou em discussão o § unico do art. 15.

O Sr. Cunha Sotto Maior: - Mando para a Mesa uma Emenda a este § unico, e é a seguinte:

EMENDA. - Esta época começa para as classes inactivas em Dezembro de 1841: para as inactivas, que não são de consideração, em Agosto de 1842; e para as não activas de consideração, em Junho de 1842. - Cunha Sotto Maior.

Foi admittida, e ficou em discussão conjunctamente com o § unico.

O Sr. Antunes Pinto: - Sr. Presidente, eu tombem tenho de mandar para a Mesa uma Emenda quasi no mesmo sentido, e tinha tenção de apresen-

VOL. 2.º - FEVEREIRO - 1850. 40

Página 158

( 158 )

ta-la depois de a ter fundamentado. Fallando sobre o § unico pois, uzando da palavra direi que a Camara acaba de approvar o n.° 6.° do art. 15.°, e a consequencia natural desta decisão é que a divida do vencimento dos Servidores e Pensionistas do Estado teem direito de serem pagas pelo Fundo de Amortisação, mas é a divida do Estado até 30 de Julho de 1846. Era porem necessario marcar uma época, desde quando se hão-de contar essas dividas que devem ser pagas pelo Fundo de Amortisação. A designação pois dessa época é o objecto principal do § unico. São 3 as Classes destes Pensionistas, ou Servidores: Classes Activas, Classes Inactivas de não consideração, e Classes Inactivas de consideração; para as Classes activas, marca-se a época de Dezembro de 1841, para as Classes Inactivas de não consideração desde Agosto de 1842, e para as Inactivas de consideração de Julho de 1845. Eu não me opponho a designação e fixação da época, pelo que respeita ás 2 primeiras Classes, mas opponho-me á fixação da época da 3.ª Classe, isto é das Classes Inactivas de consideração; e por consequencia quando sufixar a época como está no paragrafo, dá em resultado que estas Classes Inactivas de consideração não teem direito, não se reconhece a essas Classes direito para haverem o pagamento dos seus vencimentos de 20 mezes, a contar desde Novembro de 1843 até Julho de 1845, são 20 mezes que ficam de fóra do Fundo de Amortisação.

Os portadores dos Titulos respectivos a este, vencimentos dos 20 mezes dirigiram o anno passado uma representação a esta Camara, a qual foi premente á illustre Commissão, e este anno dirigiram outra de que eu fui portador, queixando-se elles da injustiça que se fez em serem preteridos, esquecidos ou excluidos desses 20 mezes. A injustiça que se lhes fez, eu vou demonstra-la, para ver se posso convencer a Camara da justiça, que lhes assiste, a fim de serem contemplados n'aquelles 20 mezes: e por consequencia a necessidade de se fixar para estas Classes uma época mais remota, isto é, uma época a partir de Novembro do 1843.

Sr. Presidente, para se conhecer a justiça desta pertenção talvez não fosse necessario mais do que attender á origem destes vencimentos. Em 4 d'Abril de 1833, publicou-se em Decreto no Porto, em que se concederam pensões ás viuvas, irmãas e filhas daquelles que morressem durante a guerra da lucta com a usurpação; as viuvas, filhas ou irmãas dos officiaes e soldados que morressem na lucta, prometteu-se-lhes uma pensão, igual no vencimento delles; aos empregados publicos metade dos seus ordenados, e áquelles que não fossem empregados uma quantia igual a esta pensão. Fiados nesta solemne promessa muitos morreram nos combates sem lhes importar o futuro de suas familias, que ficavam debaixo da protecção do Estado, por que no art. 5.° do Decreto se promettia que se pagariam essas pensões como ao Exercito effectivo. Debaixo desta solemne promessa quantas victimas morreram durante aquella lucta a favôr da liberdade! Desse sangue que se derramou, e que teem origem estes vencimentos; é pois o preço do sangue derramado, preço do sangue que se derramou a favor dessa liberdade pela qual nós nos sentamos nestas cadeiras.

Esta justiça ainda era attendida pontualmente em Agosto de 1836, quando uma Portaria desta data introduziu a respeito destas pensões os recibos notados, mas declarou-se que fossem entregues aos interessados para se lhes pagar a par do Exercito effectivo. Na capitalisação de 1841 foram contemplados estes vencimentos como divida effectiva, e recebidos pela Companhia Credito Nacional os que eram vencidos até 1837 a 25 por cento, e os posteriores a 26 por cento, que era o preço da divida dos effectivos; ainda depois se attendeu muito á origem destas dividas e por isso é que estas Classes Inactivas de consideração foram attendidas no Decreto que creou a Loteria Nacional, porque eram admittidos estes recibos para o pagamento dessa loteria; ainda nos emprestimos de 1844 e 1845 foram admittidos e só o Decreto de 19 de Novembro de 1846 é que os desconsiderou e os desconheceu, marcando para estas Classes Julho de 1845, como exactamente se encontra neste § unico.

Aqui tem pois a Camara como a origem desta divida reclama ser attendida, e contemplada ao mesmo tempo e da mesma sorte que o foi até l9 de Novembro de 1846; e não só a origem, mas attendendo ainda aos direitos adquiridos, porque o são todos aquelles que se adquirem por virtude de uma Lei, e o Decreto de 4 de Abril de 1833 era lei que creou direitos; por consequencia estes servidores, estes Pencionistas do Estado tem um direito incontestavel a serem contemplados.

Estes principies não podiam deixar de ser reconhecidos pela illustre Commissão, ella reconheceu a justiça, mas recuou perante duas razões; a primeira foi que a importancia destes 20 mezes de divida, se reputava acima de 300 contos, e a segunda os direitos adquiridos pelo Decreto de 19 de Novembro.

Ora, Sr. Presidente, a primeira consideração não devo impedir a Camara para que deixe de reconhecer esta divida, porque se ella e consideravel, tambem o é o Fundo de Amortisação, enriquecido por tão copiosas fontes de rendimentos. Não se deve recuar diante da importancia da divida de 20 mezes, porque, pelas memorias que os interessados destribuiram pela Camara, se vê que a divida não deve passar de 80 a 90 contos de réis; mas seja o que for não devo a Camara recuar, como recuou a Commissão, para deixar de reconhecer esta divida, deve sim ordenar que se lhe faça o pagamento pelo Fundo de Amortisação.

Desde que se mandou fazer o pagamento de outras dividas de menos consideração, a desigualdade está, manifesta; as Classes Inactivas de não consideração manda-se pagar desde Agosto de 1842, e para estas de consideração que é uma divida muito mais sagrada, adopta-se uma época muito mais proxima para excluir 20 mezes! Seria até absurdo deixar de considerar, ao menos ao par, esta divida que é reconhecida como divida de consideração. Aonde está a consideração, se ella é mais desconsiderada do que as de não consideração? Os direitos adquiridos segundo o Decreto de 19 de Novembro não é razão bastante para se não attender a esta classe, porque os direitos adquiridos pelas Classes Inactivas de consideração antes daquelle Decreto eram mais fortes, do que os que se crearam depois por aquelle decreto.

Peço pois a Camara que attenda a todas estas considerações, a fim de que esta reclamação seja attendida. Neste sentido pois mando para a Mesa uma

Página 159

(159)

Emenda, não nos termos em que a concebo o Sr. Deputado Cunha, porque a minha abrange só o que é necessario para comprehender os 20 mezes; não é necessario mais. Mas ainda faço uma limitação, mesmo porque querendo levar as convicções dos illustres Membros da Commissão a attender a esta reclamação, pode fazer muita duvida esse mesmo direito que se diz adquirido desde o Decreto de 19 de Novembro, e para que a Camara não recue diante dessa difficuldade, porque as Classes Inactivas que foram consideradas na primeira e segunda época, já teem recebido 18 por cento, e os reclamantes querem receber d'ahi por diante, sem offensa dos direitos adquiridos até agora; isto é quando receberem a prestação que se segue aquelles que já teem os Titulos, estes que entrarem agora recebam a primeira, e assim por diante até inteiro pagamento. É neste sentido pois que eu mando para a Mesa a minha Emenda, abrangendo estas idéas.

EMENDA. - Em vez das palavras = e para as não activas de consideração, em Julho de 1845 = proponho estas - e para as Inactivas de consideração, em Novembro de 1843.

§ 2.° As Acções, que se emittirem a favor das Classes Inactivas de consideração, serão contempladas sómente nas prestações, que se pagarem depois da publicação desta Lei, sem prejuizo das prestações já pagas aos outros Accionistas. - Antunes Pinto.

Foi admittida.

O Sr. Presidente: - A primeira parte é com effeito uma Emenda, e fica em discussão com o artigo; mas o paragrafo é um Additamento, que fica reservado para ser tractado em occasião opportuna.

O Sr. Cunha Sotto Maior: - Sr. Presidente, eu concordo com muitas das observações feitas pelo illustre Deputado que acabou de fallar; mas peço licença para observar a S. Sa. que não posso admittir a limitação que mandou para a Mesa a respeito da minha Emenda. Eu desejo que entrem no Fundo de Amortisação os vencimentos de 1842, e S. Sa. quer que esse praso principie em Novembro de 1843. Ás Classes não Activas de consideração devem-se-lhes 26 mezes; 6 de 1842, 2 de de 1843, 12 de 1844, e 6 de 1845. A Camara approvou ha pouco o n.° 6.º do art. 15.° que diz (Leu).

Isto e tacitamente minha Emenda, porque o Parlamento não podia estabelecer uma excepção odiosa. O illustre Deputado pelo Algarve, o Sr. Assis de Carvalho, disse na Sessão de sabbado que tinham entrado no Fundo Especial de Amortisação os Titulos dos servidores do Estado que a Companhia Confiança Nacional tinha descontado, e que aquelles que a Companhia comprou, não entraram nesse Fundo Especial de Amortisação; e é exacto. Este artigo é um negocio de compadres, aquelles credores que teem influencia no Banco ou aqui, conseguem que os seus creditos sejam contemplados; e aquelles que não teem esta influencia, não conseguem ser incluidos no Fundo de Amortisação. O facto é este; os Titulos que eram da Companhia Confiança vão contemplados e serão pagos, e aquelles que essa Companhia não comprou, não entram em linha de conta. Neste proposito não ha justiça, ha patronato, e só patronato.

Pergunto ao Sr. Relator da Commissão, porque boa razão excluiu estes creditos; qual é o principio de justiça equitativa que a Commissão tomou em consideração para excluir algumas Classes que deviam, como as outras, ser comprehendidas? Sr. Presidente, se acaso se me disser que o Fundo Especial de Amortisação não podia carregar com todas as dividas dos Pensionistas do Estado, tomarei a liberdade de lembrar á Camara, que o Fundo Especial de Amortisação é valioso; e por esta occasião notarei uma contradicção do Sr. Ministro da Fazenda; S. Exa. tem-se empenhado para me persuadir, e á Camara que a Lei de 28 de Maio de 1848 está derogada, e a Camara acabou de votar no art. 14.º uma referencia a esta Lei.

A Camara votando este artigo deu-me, sem querer, razão, todas as vezes que eu disse que esta Lei não estava derogada, e agora fica claro que nem tudo quanto sae dos bancos do Ministerio é exacto... (O Sr. Ministro da Fazenda: - Ainda continua a asseverar que está derogada) O Orador: - Mas então, porque o não prova? (O Sr. Ministro da Fazenda: - Porque não tenho ainda a palavra) O Orador: - Mas o paragrafo já está approvado; só se S. Exa. quer que a Camara reconsidere a votação, e declare que a Lei está derogada.

Eu já ouvi pedir a palavra ao Sr. Relator da Commissão, e ouso lisongear-me que S. Exa. adoptará a minha Emenda ou a do Sr. Deputado Antunes Pinto, que em todo o caso e menos injusta do que a doutrina do paragrafo, mas a minha é mais justa, porque abrange as quatro épocas de 1842, 1843, 1844, e 1845. Por ora não tenho mais nada a dizer; depois de ouvir o Sr. Relator da Commissão, verei se devo tornar a palavra novamente ou não.

O Sr. Ministro da Fazenda: - Eu não fazia tenção de fallar agora, mas na presença das amabilidades que o illustre Deputado costuma dirigir ao banco do Ministerio, não posso deixar de o fazer.

Sr. Presidente, a Lei de que se tracta no art. 16.° não está derogada; o nobre Deputado de certo não attendeu que ha duas Leis de 23 de Maio; a Lei que tracta da remissão de fóros, que é aquella a que se refere este artigo, não é a Lei que eu aqui tenho sustentado que está derogada; pelo contrario, esta sustento que o não está (O Sr. Cunha Sotto-Maior: - Sei muito bem que ha duas Leis de 23 de Maio, tenho-as em minha casa) O Orador: - Então permitta-me o illustre Deputado que lhe diga que e S. Sa. que está enganando o Parlamento de proposito, e que está lançando imputações que não deve lançar sobre o Ministerio, porque aqui não se deve argumentar, senão de boa fé. Se o illustre Deputado sabia que existiam duas Leis com a mesma data, e sabia que uma dellas estava derogada, não devia soltar as proposições, que soltou.

Mas já que estou de pé, permittam-me os nobres Deputados que fallaram a respeito das Classes Inactivas, que lhes diga que teem completa razão nas ponderações que apresentaram. Não ha duvida nenhuma; estas Classes deviam estar collocadas na mesma situação em que se collocaram os vencimentos que foram comprehendidos no Decreto de 19 de Novembro de 1846; mas ha aqui um equivoco a respeito de épocas; não ha contradiccão da parte dos nobres Deputados, ha unicamente uma pequena inexactidão quanto a épocas; os nobres Deputados teriam argumentado mais exactamente, se da mesma maneira que foram procurar uma época mais antiga do que a que se mencionava no Projecto, procuras-

Página 160

( 160 )

sem para as Classes Inactivas de não consideração a época de 31 de Outubro de 1841, e para as Inactivas de consideração a época de 31 de Dezembro de 1841, porque são as duas épocas legaes, das quaes se devia ter partido, quando se fez o Decreto de 19 de Novembro. Sr. Presidente, o ponto de partida de 31 de Dezembro de 1841 não tinha ainda tanta força absolutamente fallando, quanta tinha o ponto de partida de 31 de Outubro de 1841, porque o ponto de partida de 31 de Outubro de 1841 para as Classes Inactivas foi resultado de uma Lei, largamente discutida no Parlamento, que tive a honra de referendar, e que sustentai no Parlamento, em quanto que o ponto de partida de 31 de Dezembro de 1841 foi um acto Ministerial, tomado sobre a responsabilidade do Ministerio, e que hoje é Lei, porque o Parlamento por differentes actos o tem reconhecido. Ora a Lei, a que me refiro relativamente ás Classes Inactivas, tractou de regularisar o serviço das Classes Inactivas. O Ministerio de que eu tinha a honra de fazer parte em 1841, entendeu que devia fazer uma separação entre a paga dos serviços que se prestavam ao Estado, e a recompensa dos serviços que se tinham prestado, e que não devia fazer distincção nenhuma quanto ao pagamento da recompensa dos serviços prestados. Para isto centralisou no Thesouro o pagamento dos vencimentos de todas as Classes Inactivas, e marcou-lhes uma época a de 31 de Outubro de 1841 para se pagarem pontualmente esses vencimentos com desconto de 10 por cento ficando o Governo auctorisado a capitalisar o passado a juro de 3 por cento, com tanto que a tolidade dos juos não excedesse a 60 contos

Eu digo francamente, não estava em Portugal na occasião em que o Decreto de 19 de Novembro se publicou, não sei por consequencia os motivos, que poderiam ter dirigido a illustre Commissão que o propôz, e o nobre Ministro que o referendou; mas não posso deixar de reconhecer que nessa occasião não podia haver razão nenhuma que podesse justificar esta differença. Pois se se foi procurar a época de 31 de Dezembro para as Classes Activas, quando havia a quasi certesa de que não havia nenhum daquelles vencimentos que fosse até 31 de Dezembro, porque os pagamentos tinham continuado com regularidade, e os 4 mezes que se achavam em atraso em Junho de 46, eram os capitalisados, não sei pois a razão porque tendo-se procurado esse ponto de partida, não se procurou para as Classes Inactivas o ponto de partida de 31 de Outubro, sobretudo havendo de facto vencimentos comprehendidos nessa época! Para a primeira época não havia vencimentos que ella podesse comprehender, para a segunda havia. Por consequencia devia o Decreto ter-se feito desta maneira.

As distincções que os nobres Deputados fazem, Classes de consideração, e sem essa consideração, teem uma época muito mais remota do que a de 31 de Dezembro de 1841, por consequencia mesmo quando as Emendas ou Additamentos dos illustres Deputados, fossem approvadas, ainda havia de haver pessoas que com razão se queixassem, era possivel. O illustre Deputado, a quem me refiro a este respeito, parece-me que na sua Emenda, que mandou para a Meza marcou a época de Outubro de 43 para as Classes Inactivas de consideração. Ora peço ao illustre Deputado que me permitta, que lhe observe, e mesmo admittida esta época era possivel haver ainda alguns que ficassem prejudicados. A este respeito, eu devo dizer que o anno passado na Commissão emitti a mesma opinião que teem os nobres Deputados, com a differença de que eu ía buscar a época de 31 de Outubro de 1841; e esta questão foi largamente debatida na Commissão de Fazenda, e eu cedi ás considerações que foram apresentadas nessa Commissão, e por isso assignei este Parecer sem declaração alguma. Ora estas considerações não são só as que estão exaradas no Relatorio, a que o illustre Deputado se referiu; mas o que a Commissão de Fazenda fez foi para evitar o inconveniente que se encontraria em ir dar hoje um valor muito subido em relação áquelle que teem actualmente no mercado, por virtude deste esquecimento, papeis que vinham aggravar consideravelmente o Fundo de Amortisação, quando era do interesse do Parlamento, e do Governo do Paiz, por outra parte, que nós tractassemos de amortisar o mais depressa possivel a divida; e então a Commissão de Fazenda em presença dessas considerações entendeu que sem prejudicar o direito que tinham os possuidores destes Titulos ao seu pagamento, se devia indicar ao Governo a necessidade do adoptar uma providencia, que os viesse a comprehender, e se lhes fizesse justiça. Ora esta razão que eu abracei o anno passado na Commissão, porque torno a dizer fui convencido por este arbitrio, e por isso assignei sem declaração o Projecto, é ainda a que eu hoje tenho. E não é só relativamente a estes, tambem é a respeito de outros. Já aqui se fatiou nas quinzenas em atraso de 47 até Junho de 48; mandei proceder á liquidação da importancia dessas quinzenas, e tinha feito o mesmo a respeito destes papeis; porque desenganem-se os nobres Deputados, os considerações que se apresentam e são de eterna justiça sou o primeiro a reconhecel-as; póde com tudo não ser o arbitrio que se propõe o mais conveniente em presença da somma a que póde ser levada esta divida, talvez outro arbitrio occôrra preferivel áquelle que agora, na ignorancia e ausencia dos documentos, se apresenta.

Por consequencia eu entendo que devia dar aos nobres Deputados esta explicação, primó para que se convençam de que da parte do Governo não ha desejo algum de condemnar esta divida, nem este negocio; e em segundo logar, que é preferivel esperar pela liquidação desta divida, e na presença della ver-se-ha se é conveniente estabelecer um modo especial de amortisação para ella, ou comprehendel-a no Fundo de Amortisação, porque o Corpo Legislativo não fica inhibido de mandar passar Acções do Fundo de Amortisação a esta ou outra divida. Por consequencia a questão não fica prejudicada por se approvar hoje o Parecer da Commissão, e esses documentos eu tractarei de os apresentar ao Parlamento o mais depressa que fôr possivel, porque tenho interesse nisto, e obrigação de o fazer, e realmente é necessario fazer justiça a quem justiça é devida.

O Sr. Agostinho Albano. - Sr. Presidente, esta materia já começou a ser debatida na Sessão passada, e é necessario leval-a ao ponto de esclarecimento, a que ella póde ser levada, tanto quanto fôr possivel; assim nós podessemos levar o dinheiro ás algibeiras dos credores.

Sr. Presidente, pagar a quem se deve, é o princi-

Página 161

( 161 )

pio de eterna justiça (Apoiados) quem possue estes titulos e credor ao Estado, é innegavel que o Governo lhe deve, é tambem innegavel que deve pagar-lhe: isto são innegaveis principios de eterna justiça (Apoiados) todos partilhamos estes principios, estas mesmas idéas, nem podemos deixar de partilhar. Mas o que é injusto, em frase juridica, me parece a mim, é tudo quanto é contra direito. O que está de direito estabelecido é o que consignou o Decreto de 19 de Novembro, é aquillo que nesta parte se conserva neste Projecto: isso que era de direito, excluia desgraçadamente, preteria um principio de justiça, excluia certos vencimentos de Pensionistas do Estado; mas eu que não tive parte alguma na concessão desse Decreto, nem sei bem os motivos que assistiram então á sua coordenação, o que sei agora é que em virtude desse Decreto se tem feito obra desde então, e que elle tem constituido um direito para com aquillo que elle comprehendeu; isto é que é innegavel. Escusamos portanto de querer sustentar principios de justiça, eternos, innegaveis, inconcussos com principios de sentimentalismo, nem com outras cousas assim; não é necessario recorrer a tal, basta recorrer ás cousas em si como ellas são, nem mais, nem menos. Sei tambem, e pouco me importa, que a maior parte destes Titulos hoje estão na mão de quem os comprou; e tambem sei mais ainda, que os primeiros mezes foram comprados por preços elevados, talvez por 90 por conto, ou 95, mas tambem sei que muitos outros foram comprados ao desbarato: nem me importa saber por quem, nem em que mãos se acham; o que sei é que é divida que o Governo deve, e deve pagar integralmente, porque os contractos entre quem comprou e vendeu lá ficam entre elles, isto é objecto que não é do Governo, o Governo não póde importar-se com isto; é principio que tenho sustentado e hei de sustentar; desgraçadamente tenho ouvido fazer aqui uma distincção; e é que todos esses papeis estão na mão dos agiotas. E então por tal motivo perderam o credito? É claro que não; estejam em que mão estiverem, o que é certo é que estão fóra das mãos do Governo, que os não pagou ainda. É necessario que o Governo os pague: qual será o methodo mais competente para os pagar? Será aquelle que querem os credores? Será esse o mais justo? O que eu digo, Sr. Presidente, é que é justo pagar; mas agora pelo methodo que elles requerem, entendo que não; porque é contra a boa razão, é uma injustiça contra os direitos adquiridos daquelles que foram comprehendidos no Decreto de 19 de Novembro; isto é o que eu entendo. Diz-se, para attenuar a importancia, que ascenderá toda esta divida a 80 contos. Eu nego esta asserção, sobe de 200 contos; e se eu tivera o que vai acima destes 200 contos em moeda potavel, ainda me considerava riquinho. É querer deitar poeira aos olhos de qualquer com cousas sem base, com asserções infundadas!... Quem as faz, sabe muito bem que não são verdadeiras, e está-me ouvindo. Não são exactas. E então para que argumentar com tal principio, se elle é inferior absolutamente ao principio de eterna justiça, que é pagar a quem se deve?!... Mas eu já fico muito esperançado de que estes Titulos e outros mais hajam de ser attendidos pelo Governo, e não fiquem para aí assim ao abandono, em esquecimento eterno, e a vagarem, como vagam as almas nos Campos Elisios, espero que assim aconteça, e que o Governo, que quer ter credito, que quer augmentar o seu credito, ha de necessariamente trazer ao Parlamento ainda este anno uma Proposta, qualquer que ella seja, em virtude da qual se dê uma esperança a esses credores, mas uma esperança que venha a realisar-se, que não seja illusoria, que não seja fosforica, ou meteóros, que andem diante de nós, e se dissipem momentaneamente; eu confio muito na promessa, que o nobre Ministro acaba de fazer, é isso que me faz ainda insistir cada vez mais neste negocio.

A divida aos credores do Estado por taes Titulos não importa só como disse em 80 contos, e mais que isto, importa em 200 contos: digo eu que remediar uma injustiça, praticando outra, não é isto proprio de um Parlamento, que respeita o direito que representa um principio de justiça eterna: isto que são factos consummados não podem deixar de constituir um direito do qual ficariam privados aquelles que o adquiriram, sem grande vantagem daquelles que desejam ser pela mesma fórma pagos. Póde ser possivel que occorra ao Sr. Ministro da Fazenda algum outro meio mais vantajoso de se fazer este pagamento, e por isso é necessario deixar á consideração do Governo este negocio que não se deve descuidar de attender todas as dividas desta natureza: mas era todo e qualquer tempo que não haja possibilidade de obter os meios necessarios para pagamento desta divida, o Parlamento não fica inhibido de a fazer lançar no Fundo de Amortisação, mas augmentando este Fundo, de alguma maneira, com uma dotação maior (Apoiados).

Ora agora com referencia a uma equivocação que teve o illustre Deputado que se senta no banco inferior, occorreu-me haver ha muito tempo lido, que certo Cavalheiro muito odiado, porém muito protegido do Rei de Hespanha, fôra avisado de que se preparasse para morrer naturalmente em dia de S. Martinho: passou-se este dia, e o homem ficou muito contente, porque não morreu nelle: mas no dia seguinte morreu: não foi no dia de S. Martinho Bispo, mas foi no dia de S. Martinho Papa (Riso geral). Ora o nobre Deputado quando citou a Lei de 23 de Maio, não se lembrou que haviam duas Leis com a mesma data, cada uma porém sobre objectos distinctos.

Por tanto voto pela manutenção e sustentação do paragrafo como se acha; declarando que as considerações que se adduzem agora, foram presentes á Commissão o anno passado, e aí foram muito debatidas; fui eu mesmo que trouxe este negocio á discussão (O Sr. Ministro da Fazenda: - Apoiado), fui eu que tornei com o maior calor a defeza da causa destes credores; entretanto as observações que aí se produziram, foram de tal pezo que não tive a mais pequena duvida em assignar o Parecer sem declaração alguma. Por consequencia hoje voto a favor do paragrafo e contra as Emendas, attentas as razões que ficam expostas; esperando que sejam realisadas e cumpridas as promessas do nobre Ministro a fim de ser attendida esta e outras dividas de igual natureza.

O Sr. Xavier da Silva: - Em quanto á questão cedo da palavra: porém aproveito a occasião para mandar para a Mesa o Parecer da Commissão de Fazenda sobre as Emendas que se fizeram ao art. 8.° e 9.º

VOL. 2.º - FEVEREIRO - 1850. 41

Página 162

( 162 )

O Sr. Presidente: - Fica reservado para occasião opportuna.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: - Agradeço ao illustre Deputado a comparação que fez de mim com o Duque d'Alva, e o vaticinio da minha morte em dia de S. Martinho; mas ha de permittir que lhe diga, que a comparação é muito mal trazida: eu sou pouco amigo de vinho; neste ponto a comparação não tem muito cabimento para a minha pessoa. Declaro ao Sr. Ministro da Fazenda, que como Deputado da Opposição o meu dever é atacar sempre; e a obrigação do Governo é defender-se, se póde.

Muito idiota seria eu, se tendo uma arma para ferir, não lançasse mão della. A minha Proposta e a Proposta do nobre Deputado pelo Algarve não são de tão pouco pezo como se pertende inculcar; o proprio Sr. Ministro da Fazenda, e um illustre Deputado Membro da Commissão já disseram que a Proposta era de eterna justiça. A theoria que o illustre Relator da Commissão quiz estabelecer a respeito destes credores, é a cousa mais perniciosa e immoral que se póde pronunciar no Parlamento (Apoiados); pagar a todos quando ha muito dinheiro, não é difficil; mas quando ha pouco dinheiro, deve-se pagar quantitativamente, deve-se estabelecer uma escala de proporção, e nunca fazer monopolio do pouco dinheiro que ha para certas e determinadas pessoas (Apoiados). É este principio que o Sr. Deputado devia proclamar, e não devia ir aqui advogar um privilegio odioso, declarando o Thesouro Publico um folar para afilhados (Apoiado). A questão é muito simples, deve-se 6 mezes de 1812, 2 mezes de 1843, todo o anno de 1844, 6 mezes de 1815, e alguns mezes de 1847: pergunto, deve-se isto ou não se deve? Se se deve, tracte-se do pagamento: e não se esteja a illudir os credores do Estado, e a Nação com essas bancas-rotas parciaes: se esta divida não entrar no Fundo de Amortisação, ha de facto uma banca-rota, ainda que não a haja de direito. Mas diz o Sr. Ministro da Fazenda "O Governo não fica inhibido de pagar esta divida" mas se o Governo promette pagar esta divida, porque não ha de converter esta promessa em realidade! Nós temos rigorosa obrigação de sermos desconfiados para com as promessas do Poder; tambem o Banco disse que havia de pagar as suas Notas em metal, e depois de as ter capitalisado não as quiz pagar nessa especie; preferiu ir chicanar perante os Tribunaes. As minhas asserções não são tão infundadas como parecem, e aprova está em que quando fallo, vejo logo pedir a palavra ao Sr. Ministro da Fazenda, e ao Sr. Relator da Commissão, não para destruirem os meus argumentos, mas para verem se lhes será possivel sofisma-los.

Ouvi dizer que não podemos modificar as Leis votadas! É um absurdo monstro. Pois nós não temos direito para alterar e modificar as Leis? Não é esta a nossa missão? Se esta faculdade não está nas nossas attribuições, para que estamos a rever o Decreto de 19 de Novembro de 1846? O que é este Parecer? Uma modificação d'alguns artigos do Decreto de 19 de Novembro, e alteração de alguns outros. A Camara póde rever, derogar, alterar, modificar não só uma Lei, mas todas.

Em quanto á outra razão que deu o Sr. Ministro para não se pagar essa divida, o receio da subida do valor que virão a ter esses Titulos, peço licença para dizer, que esta Camara não é loja de cambios, nem os Deputados agiotas; bastantes agiotas tem o Paiz, e mal seria se os Deputados viessem aqui valer-se destas cadeiras, e da sua posição especial para jogo de fundos. A obrigação do Sr. Ministro da Fazenda era estabelecer o credito e a confiança pagando; mas S. Exa. quer o contrario, quer credito e confiança não pagando, e assim não é que se estabelece o credito, não é assim que se adquire a confiança. S. Exa. que é tão entendido em materias de finanças, e que se apregoa como tal, porque não deixa o seu credito por mãos alheias, e que não cessa de se inculcar como o Messias da Fazenda... (O Sr. Presidente do Conselho: - Isso é o Sr. Carlos Bento) O Orador: - Eu não sei se é o Sr. Carlos Bento, mas declaro, que tambem me julgo muito apto para ser financeiro, se o ser financeiro nesta terra é, depois de reduzir, conservar o Paiz na miseria e desgraça em que se acha. Em 1833 Portugal tinha muitissimos recursos; os nossos abalizados Estadistas empenharam tudo, esmeraram-se cada qual mais em desbaratar a Fazenda Publica; somos a unica Nação na Europa que não tem estradas, que tem os seus bellos rios entupidos, as suas pontes caídas, que não tem uma escola, uma instituição que attenue esse montão de ruinas em que nos sepultaram os taes grandes Estadistas que nos teem governado; não possui-mos uma unica instituição se quer, que honre o Systema Representativo, e illustre o predominio dos homens que estão e estiveram á frente dos negocios; e todos estes Cavalheiros que se dizem financeiros, não teem trazido senão males á Fazenda Publica, porque só nos teem legado a miseria.

Sr. Presidente, em 1833 Portugal tinha uma divida muito pequena que estava a cargo do Brazil, de então para cá que tem acontecido? Mandamos todos os annos enormes sommas para Londres, só para pagamento dos juros da divida que os nossos financeiros contrairam, Deos sabe como, e para que. Ha certas verdades que são duras, mas não ha remedio senão dize-las e reconheçe-las. (O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado que se restrinja á questão) O Orador: - A questão é de Fazenda. (O Sr. Presidente: - Mas que se restrinja ao objecto que está em discussão, ao ponto dado) O Orador: - Tambem o Sr. Relator da Commissão fallou em S. Martinho; e n'outro dia quando se tractou dos supprimentos, fallou nas minas da Siberia e da California (O Sr. A. Albano: - Tinha muito mais relação com o objecto do que o que o Sr. Deputado está dizendo.) O Orador: - Sr. Presidente, eu sou dos poucos homens que levantam a mão até onde podem chegar, pecco talvez por demasiada humildade, porque vivo n'um Paiz aonde os fanfarrões fazem progressos; se eu quizesse percorrer o caminho que outros percorrem, de certo que tinha empurrado para traz muita gente que está adiante de mim, não sei com que bullas; mas não o faço, porque não quero seguir um caminho que me repugna.

Sobre a minha Proposta sustento que a Commissão não póde, excluir as Classes Inactivas; se o Sr. Ministro da Fazenda tivesse um pensamento sincero, e organisador, a sua obrigação era applicar a todas as Classes as disposições do Decreto de 19 de Novembro de 1846; era chamar ao Fundo de Amortisação aquella parte da Lei de 23 de Maio de 1848 que estabeleceu o pagamento das quinzenas, e servir-se de todos os recursos de que podesse lançar mão

Página 163

( 163 }

para pagar a todas as Classes por igual, e não andar todos os dias com Leis de favor.

Concluo insistindo na minha Emenda, e tambem desde já declaro que não me importa que a Camara a approve ou não, essa circumstancia não me ha-de privar de nos outros paragrafos mandar outras Emendas analogas, para ao menos ver a Camara ter o trabalho de as rejeitar; e assim dou um documento ao Publico, de que tracto dos interesses da Nação como entendo, e de certo desta vez não os entenda mal.

O Sr. Ministro da Fazenda: - A Camara permittir-me-ha que eu convide o illustre Deputado, para dizer quaes são os Projectos de favor, que tenho trazido ao Parlamento? (O Sr. Cunha Sotto Maior: - Este) Este não foi trazido por mim; ainda suppondo que é de favor, que o não é.

O illustre Deputado disse, que se o Ministro da Fazenda tivesse um pensamento organisador, havia de organisar a Fazenda como elle entendia, mas S. Sa. mesmo reconheceu, que não entendia cousa alguma a este respeito, do que já tinha dado provas.

Sr. Presidente, eu reconheça os direitos da Opposição, tambem já fiz opposição; alguns Cavalheiros que aqui estão, sabem muito bem, e podem attestar como é que eu fazia opposição (Apoiados). Todas as vezes que estava convencido de que se queria fazer passar uma medida, que eu julgava inconveniente ao Paiz, eu fazia toda a opposição que podia, para que essa medida não passasse; todas as vezes que: via o contrario, todas as vezes que eu entendia que qualquer medida que o Governo propunha, podia ser util e vantajosa para o Paiz, eu, Deputado da Opposição, sustentava essa medida (Apoiados). Eis aqui como eu entendo que deve proceder um Deputado da Opposição. Appello para a intelligencia dos outros Deputados da Opposição, que me digam, se a missão do Deputado da Opposição e atacar a torto e a direito, apresentando asserções que não são exactas, qual foi a de ainda agora confundir duas Leis, só porque tinham a mesma data. O illustre Deputado andaria mais regular dizendo, que tinha confundido essas duas Leis, que não se lembrava da Lei de 23 de Maio sobre remissão de fóros; essa desculpa era mais nobre do que aquella a que recorreu.

Eu não disse nada do que o nobre Deputado me attribuiu; eu não disse que esses recibos, que não tinham sido comprehendidos no Decreto de 19 de Novembro, deixassem de o ser agora, porque iam subir de valor, relativamente ao valor que teem actualmente no mercado; não disse tal; o que eu disse foi, que não era conveniente adoptar uma providencia a esse respeito, sem se saber qual era a importancia dessa divida; e que se eu tivesse feito esta Lei, não tinha marcado este prazo; tinha marcado como primeiro prazo para as Classes inactivas de não consideração o de 31 de Outubro de 1841; e para as inactivas de consideração o de 31 de Dezembro de 1841; mas que o não fazia agora, porque não estava habilitado para isso; e declarei ao mesmo tempo que o Parlamento não ficava inhibido de o fazer amanhã, se entendesse que era de justiça. Declarei mais, que já tinha mandado examinar quanto montava toda esta divida, e que, por consequencia, depois de devidamente habilitado informaria a Camara, e veriamos o meio que era possivel adoptar, mas com perfeito conhecimento de causa: talvez mesmo seja conveniente adoptar o que quer o nobre Deputado, mas não precipitadamente, não sem conhecimento perfeito do objecto.

Agora permitta-me V. Exa. que eu diga alguma cousa era resposta ao que disse o Sr. Deputado, relativamente ao estado da Fazenda Publica em 1833, porque é da honra do Parlamento, que se não deixe passar sem resposta uma asseqção tão forte, como a que apresentou o illustre Deputado, unicamente com o desejo de accusar e mais nada. (Apoiados)

Como queria o illustre Deputado, que em 1834, quando se acabou a guerra, a Fazenda Publica estivesse no mesmo estado em que estava em 1832? Pois quem havia de pagar a contribuição da guerra da Restauração? - Quem havia de pagar as dividas da guerra?... (O Sr. Carlos Bento: - Se isto está na discussão, tambem peço a palavra.) O Orador: - Sr. Presidente, eu não esperava que um mancebo desta época fosse o que viesse querer interromper uma explicação de tal natureza, sobre um objecto, que nos abriu a todos nós as portas do Parlamento. (O Sr. Carlos Bento: - Eu não quero interromper, quero só, visto que se tracta deste objecto, usar tambem da palavra.) O Orador: - Sr. Presidente, nós devemos respeitar o nosso passado, o passddo glorioso deste Paiz (Apoiados). Quem pagou as despezas da guerra da Restauração, senão os emprestimos que se contraíram na Praça de Londres? Quaes eram as hypothecas que se deram? A sorte da guerra, e os peitos dos nossos Bravos; não havia outra; porque então o unico baluarte que sustentava a liberdade e os direitos da Rainha era a Ilha Terceira (Apoiados). Como queria o illustre Deputado que esse punhado de Bravos empenhados em plantar a liberdade nesta terra, o podessem conseguir, senão fosse com a ajuda desses emprestimos? Chegou-se a Portugal, Sr. Presidente; tractou-se da alienação dos bens nacionaes; que medida queria o illustre Deputado que se adoptasse melhor do que essa? Eu sei a razão porque se adoptou essa medida, porque era membro da Commissão de Fazenda nessa época, e note-se que eu não recebi um titulo que valesse nem um crusado novo; mas queria o illustre Deputado que os homens que tinham estado nas masmorras seis annos durante a guerra da Usurpação, que tinham estado exilados, que tinham sustentado os direitos da Rainha na Ilha Terceira, e depois no Porto, na Serra do Pilar, e que todos tinham derramado seu sangue pela liberdade, queria o illustre Deputado, que quando chegassem a Portugal se lhes dissesse - as suas contas estão justas, e os Senhores que fizeram tantos sacrificios, que perderam as suas casas e as suas familias, que derramaram o seu sangue, hão de receber o mesmo que os outros que de cá os estavam combatendo? (Apoiados) A estes homens, Sr. Presidente, liquidaram-se-lhes as suas contas; passou-se-lhes um Titulo, e este Titulo foi admittido na compra dos bens nacionaes, e esta medida produziu um resultado vantajosissimo, porque foi o meio de fazer com que essa massa enorme de bens nacionaes fosse vendida grande parte por preço muito superior ao seu valor. Se o illustre Deputado quizesse vêr o excellente trabalho da Commissão interina da Junta do Credito Publico, a este respeito, veria como a maior parte desses bens foram vendidos, chegando alguns a serem comprados

Página 164

( 164 )

por dez vezes mais do seu valor. E pode o illustre Deputado duvidar do grande beneficio que resultou para o Paiz da venda desses bens nacionaes? Pode negar isto? Não pode.

Sr. Presidente, não digo mais nada sobre este ponto, porque não é este o objecto da discussão, e só toquei nelle, porque entendi que não devia deixar passar sem resposta a asserção avançada pelo illustre Deputado de que a Fazenda Publica desde 1833 para cá foi sempre administrada ao desbarate; leia o illustre Deputado os documentos dessa época, e faça mais justiça aos homens que atravez das maiores difficuldades conseguiram que S. Sa. tivesse uma cadeira nesta Casa (Apoiados).

O Sr. Antunes Pinto: - Sr. Presidente, quando propuz na minha Emenda que a épocha começasse em Novembro de 1843, é porque os possuidores dos Titulos referiam-se sómente a esta época, exigindo só 20 mezes; fui verificar os apontamentos que tinha tomado, e vi que eram exactos, (a Representarão está em poder da Commissão) vi que fixaram exactamente a época de Novembro de 1843: foi por isso que a minha Emenda se limitou a essa época, sem comtudo attender a outros vencimentos que tivessem igual justiça anterior. O Sr. Ministro da Fazenda reconhece que para se fazer justiça igual, era necessario que a época se marcasse em 31 da Outubro de 1841, e como todas as considerações que se teem feito, tendem a demonstrar a justiça da Representação, vou propôr uma Emenda neste sentido, de que a épocha se marque em 31 de Outubro de 1841.

Diz-se que não é opportuna a occasião para fazer o pagamento desta divida pelo Fundo de Amortisação, e que a liquidação ainda não está feita. Esta consideração, posto que tenha algum pezo, parece-me mesmo não destroe por fórma nenhuma a justiça da Representação que se fez; é uma divida sagrada que deve ser attendida, e esta Camara deve ser a primeira a dar direito a quem pertence.

O Derreto de 19 de Novembro de 1846 (este facto foi reconhecido pelos illustres Oradores que fallaram a favor do paragrafo da Commissão) fez-se uma flagrante injustiça aos Pensionistas e Servidoras do Estado, excluindo os seus vencimentos desde 31 de Outubro de 1841 por diante, e então se nós reconhecemos que essa injustiça se fez, por que não havemos de hoje remedia la? Este é o nosso dever, e por isso sem accrescentar nada mais ás considerações que expendi quando fallei a primeira vez, vou mandar para a Meza uma Emenda para ser substituida por aquella que mandei ha pouco.

EMENDA. - Em vez das palavras - em Julho de 1845 - proponho estas - em 31 de Outubro de 1841 - sem prejuizo das prestações já pagas pelo Fundo de Amortização - Antunes Pinto.

Foi admittida, ficando em logar da primeira, que foi retirada.

O Sr. Agostinho Albano: - Sr. Presidente, a minha idade, e as minhas cãas chamam-me a ser circumsperto, e muito circunspecto; acredite o nobre Deputado que se vai tambem approximando á minha idade; note as suas cãas, e veja se ellas o obrigarão a ser muito mais circumspecto do que tem sido.

Sr. Presidente, só quando se falla para fazer um effeito fosforico e momentaneo, é que se podem empregar similhantes asserções; o nobre Deputado não é tão novo que esteja muito arredado de mim; mas em fim ponhamos de parte essa consideração.

Sr. Presidente, eu conservo nesta Caza a mesma posição que comecei a representar desde o anno passado; ainda não mudei, nem arredei um unico passo della; hei de combater forçosamente tudo quanto me parecer contrario aos interesses do Paiz, aconteça o que acontecer, e hei de sustentar aquellas Propostas que da parte da Opposição vierem, e que entender que convém ao Paiz: a minha opposição não é, nunca foi, nem póde ser frenetica (Apoiados) esta em vez de fazer bem ao Paiz, destroe todo o bem que as Opposições podem fazer-lhe (Apoiado) um Deputado que se lembre de fazer uma opposição neste sentido, faz perder um tempo preciso, faz perder o interesse do tempo que póde empregar em cousas mais convenientes do que destruir sômente. Disse o nobre Deputado que o direito de um Deputado da Opposição é atacar o Governo; o direito de um Deputado da Opposição consiste em empregar as armas leaes nas questões, o não póde ser dos seus principios, da sua razão, nem da sua logia atacar o Governo em todas as medidas que delle partem, sem lhe importar se são ou não convenientes, só se a sua razão está completamente prevertida, porque a Opposição não está auctorisada a argumentar com as armas que melhor lhe convenham, para fazer effeito. (Apoiado) A condição do Deputado da Opposição é fazer valer as suas razões em bem do Paiz, razões convenientes e bem fundadas. (Apoiado)

Sr. Presidente, a doutrina que emitti e que o nobre Deputado taxou de immoral, rebatel-o-hei com a que acabou de emittir, e como foi rebatida pelo nobre Ministro da Fazenda - comparada, vejamos em que parte está a moralidade - quando se disse e pertendeu demonstrar a justiça desses direitos garantidos pelo Decreto de 19 de Novembro, negou-se por ventura que os creditos de outros não deviam ser pagos? Direi, Sr. Presidente, que não se podem fazer proposições desta ordem que transtornam completamente a razão clara, e o espirito do nobre Deputado que as profere. Pois aonde é que o nobre Deputado viu preferir os afilhados ao suor destas pobres classes? Aonde é que se repartiu esse beneficio! Eu dou ao nobre Deputado todo o quinhão que me podesse caber: reparto-o com toda a gente; faço uma abstenção completa de toda a parte que posso ter no ovo do folar (Riso). Sr. Presidente, eu defendo principios, estes são - pagar a quem se deve - (Apoiados) mas quando ha uma pertenção que prescreve certas fórmas legaes, em virtude de Lei e em que foram estabelecidos direitos, pertender com uma injustiça destruir esses direitos é muito maior injustiça ainda. Aonde está a immoralidade, aonde está a injustiça? Mas a do nobre Deputado é muito mais desagradavel, porque queria que todos os que contribuiram para os acontecimentos desgraçados de 1828 e 1833 tivessem uma partilha igual; que não houvesse differença entre os que combateram por uma causa injusta, e commetteram barbaridades com os que fizeram sacrificios directos para sustentar o Throno da Rainha, e a Carta Constitucional (Apoiados) queria o nobre Deputado que uns e outros fossem igualmente satisfeitos! Eis-aqui a doutrina moral que o nobre Deputado quer, e reconhece na sua moralidade que é a preferivel: pois, Sr. Presidente, não troco os meus principios pelos seus (Apoiados).

Página 165

( 165 )

Sr. Presidente, o que é necessario é pagar a quem se deve, como já disse o nobre Ministro da Fazenda, elle prometteu que esta divida havia de ser paga, e que havia de propôr os meios convenientes para que o fosse (O Sr. Ministro da Fazenda: - Apoiado) que não convinha que fosse incluida já, porque sua importancia total não estava clara, não estava liquidada, e é esta mais uma razão das que occorreram á Commissão, quando essa materia aí foi tractada. E não pense o nobre Deputado que tudo quanto parece não ter relação com a questão, seja julgado tal. Pois as minas da California sobre que fallei na Sessão passada, não tinham uma correlação immediata com o ponto em questão (Apoiados)?. Sim, Senhor, immediata e connexa. Só se o nobre Deputado quer desconhecer esses principios da sciencia, e se os desconhece, peço ao nobre Deputado que se instrua mais, ou preste mais alguma attenção ao que lê e estuda, ou que o apresente da maneira como o lê e estuda; isto é que eu queria que aproveitasse da posição que tornou, e que é em seu proveito (O Sr. Cunha Sotto-Maior: - Não tiro proveito nenhum) em proveito dos seus talentos, e da sua dialectica.

Sr. Presidente, quando se procura demonstrar profundamente, é necessario recorrer a citações que á primeira vista parecem alheias do ponto em questão, mas que teem uma ligação muito immediata com ella; é a razão porque parece que estou fóra da questão, mas estou na verdade argumentando nella.

Sr. Presidente, ainda não posso admittir a nova Emenda de outro illustre Deputado, ella amplia ainda mais, e se eu rejeitei a outra, como posso admittir esta? É claro que muito menos ainda quando diz respeito a ampliar. Ha tambem um calculo aqui differente do que se pede relativamente á divida destas classes, assim como ha uma quantidade de dividas, cuja importancia nem provavelmente se conhece; ora realmente querer-se incluir uma divida cuja importancia se desconhece, não me parece ser desejo justo do meu nobre Amigo. Não posso, portanto, approvar a Emenda do nobre Deputado, e espero que a Camara possuida destes principios, e principios de moralidade, e doutrina muito moral acolherá de muito bom grado toda e qualquer providencia que haja de ser apresentada pelo Sr. Ministro da Fazenda, a respeito desta divida com a brevidade possivel a fim de ser attendida.

O Sr. Rebello da Silva: - Sr. Presidente, a discussão tem corrido já tão larga; tem tomado a palavra nella tantos Cavalheiros, que podiam esclarecel-a, que eu só me resta fundamentar a minha opinião, e nada mais. Mas pedi a palavra sobre tudo, quando o meu nobre amigo, respondendo ao discurso pronunciado pelo nobre Relator da Commissão, taxou de impertinente uma das mais bellas theorias, que o nobre Relator aqui tinha apresentado; qual era a theoria que aqui apresentou sobre a circulação, parecendo-me até, que o meu nobre Amigo não tinha visto este objecto com aquella pausa, com que costuma ver as cousas, porque realmente elle tem immensa connexão com a questão da fórma dos pagamentos; e mesmo porque as questões de fazenda, não são questões tão faceis como se quer figurar, e por consequencia não podem ser tractadas com uma completa abnegação de tudo quanto se passa lá fóra. O nobre Relator da Commissão, apresentando uma das mais bellas theorias que se póde apresentar nesta questão, não exorbitou do ponto em discussão. Agora entrando na materia.... (O Sr. Agostinho Albano: - Não admira, porque eu já estou cachetico) Ora cachetico! Isso foi um aparte do nobre Deputado; o nobre Deputado não podia fazer esse conceito do nobre Relator da Commissão, porque lhe não é merecido, porque basta ver a maneira porque está escripto o Relatorio da Commissão de Inquerito ao Banco. Esta expressão não foi mais do que um áparte gracioso do nobre Deputado. Mas ha ainda mais algumas outras razões, que me obrigaram a pedir a palavra. O Sr. Ministro da Fazenda declarou á Camara, que havia de tractar primeiro de liquidar esta divida; sobre esta liquidação e que eu julgo que devia haver alguma discussão; mas depois desta declaração do nobre Ministro, feita neste Parlamento, eu entendo que todo e qualquer debate se torna perfeitamente inutil: S. Exa. comprometteu-se, depois de proceder á necessaria liquidação, a vir propor á Camara os meios de pagar estas dividas; agora o dever do Parlamento é ver a melhor maneira dellas se pagarem.

Em quanto a uma referencia que o meu nobre amigo apresentou, com relação á época de 1834, o meu nobre amigo generalisou de exclusivo este objecto, e esqueceu essa lucta, e a importancia dos sacrificios que ella importou; o meu nobre amigo se examinar melhor este objecto, não póde deixar de ver os immensos sacrificios que fizeram os 7:500 homens que desembarcaram nas Praias do Mindello, contra um exercito de 80:000 homens. Por consequencia, esses sacrificios eram immensos, e esses Bens Nacionaes que se lançaram á venda, estavam obrigados a essas indemnisações, pelos sacrificios immensos que fizeram durante esse tempo. Isto é com relação ao geral; mas na parte especial direi que muitos desses bens podiam ter tido uma applicação muito mais feliz, do que tiveram, e tanto isto é assim, que uma Administração nos principios da Revolução de Septembro assim o reconheceu; mas nós agora não temos senão que revalidar os erros dessa Administração, e eu faço justiça a todas as Administrações passadas, porque suppondo que todas erraram, creio que esses erros foram da sua cabeça, e não do seu coração (Apoiados); mas a nós o que nos cumpre fazer, é não insistir n'estes erros, e servirmo-nos delles para os evitarmos.

Sr. Presidente, parece-me que não póde duvidar-se da opposição que eu faço á actual Administração, mas declaro que da minha parte não ha opposição frenetica; eu sou o mais paciente das Opposições; não tenho pressa nenhuma, mesmo porque a minha posição não me permitte ter ambições; mas sinto só uma cousa; sinto vêr a prolongação de um estado de cousas que me não agrada, de um adiamento indefinido das reformas economicas mais necessarias para este Paiz; sinto a incertesa e hesitação que vejo, em se adoptarem certas medidas que eu julgo urgentissimas; e por vêr a completa hesitação em se reconhecerem certas doutrinas politicas; que estão admittidas hoje por todas as Nações. Eis aqui, Sr. Presidente, o ponto da divergencia que póde haver entre mim, e a Administração actual. Mas ha uma cousa que faz modificar muito a minha opposição, é o logar em que os Srs. Ministros estão; é a posição que SS. Exas. occupam n'aquellas

VOL. 2.° - FEVEREIRO - 1850. 42

Página 166

( 166 )

cadeiras: tenho muito dó de todas as pessoas que se assentam n'aquellas cadeiras; mas nem por isso deixo de ter obrigação de querer que só apresentem todas as medidas, que eu julgo conveniente para o meu Paiz; e todas as vezes que da parte dos Srs. Ministros se apresentar alguma d'estas medidas, a razão ha de vir da minha parte em auxilio de SS. Exas.; eu não estou aqui para negar a intelligencia aos Srs. Ministros, porque n'aquelles bancos não vejo pessoas, vejo as questões. Peço tambem ao nobre Ministro da Fazenda, ainda que eu sei que S. Exa. tem o maior desejo de se apresentar sempre zeloso na gerencia da sua Pasta, a apresentação do seu Relatorio, e que dê mais ouvidos aos instinctos do seu coração, do que a quaesquer outros motivos da sua cabeça, e que não recue em trazer a esta Camara qualquer refórma, lembrando-se sempre de que o Paiz não póde já hastear a bandeira do retrocesso; e o partido conservador deve ser o verdadeiro partido progressista fazendo a tempo as refórmas de que o Paiz carece, para que não venha uma occasião em que ellas venham debaixo para cima, quando deve ser o contrario.

O Sr. Carlos Bento: - É bem contra minha vontade que tomo parte nesta discussão; não só porque as minhas idéas teem sido sustentadas por Cavalheiros mais illustrados do que eu sou, e que as teem sustentado de uma maneira mais conveniente do que eu as podia sustentar, como porque desgraçadamente vejo que a Opposição é realmente, uma Opposição tão pouco numerosa, que é quasi impossivel toda a idéa de se querer combater com aquelle valor que é necessario. Eu approvo as Emendas que teem sido Apresentadas no sentido, que tende a combater mais uma fórma de pagamento exclusivo que se apresenta no Projecto. Nós vemos, Sr. Presidente, pagar a uns em dia, e a outros atrasarem-se cada vez mais os seus vencimentos; eu vejo descontar a uns com um tenue rebate; em quanto que a outros não ha ninguem que lhes queira dar cousa alguma pelos seus recibos; não vejo de toda a parte senão medidas especiaes; não vejo de toda a parte, senão medidas que offendem a justa retribuição que o Estado deve a cada um. Eu protesto pela minha parte contra uma disposição que tende a destruir a igualdade da applicação de um fundo destinado á divida fluctuante. E argumenta-se aqui com a importancia da parte da divida que por isso se excluo! Isto quando se liquida uma somma importante para um contracto o mais ruinoso que se tem feito no Paiz, qual é o contracto da estrada de Lisboa ao Porto; e é nesta occasião que se regateiam 80 contos de réis! Este pensamento não é pensamento de um Ministro da Fazenda.

Sr. Presidente, é preciso muita paciencia na Opposição, muitissima; mas é facil ter paciencia na occasião em que ha esperança; todas as vezes que nos sentimos com razão, espera-se, e confia-se. Porém o que me maravilha, é S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda deixar passar sem o menor reparo accusações tão fortes, dirigidas contra elle, e contra os Membros do Ministerio, e que tomasse tanto calor, e sentisse ferida a sua susceptibilidade, quando se disse o que tinha occorrido em 1834. Ora em 1834 fazia-se politica; hoje, 16 annos depois, já se póde fazer historia; hoje, depois de passarem 16 annos, senão tivermos adquirido a experiencia, temos aprendido muito pouco. Pois não sabem todos que estas transformações politicas trazem a irritação das paixões, dos partidos? Hoje temos mais algum sangue frio para vermos bem o que se passou naquella época, e não podemos deixar de ver, que parte destas indemnisações foram muito mal applicadas; depois de 16 annos não será desacreditar um Paiz o mostrar os erros que commetteram certos homens, erros que aliás muitos outros commetteriam em iguaes circumstancias. E este systema commodo de querer confundir os partidos, de querer confundir comsigo o credito de um partido, é na verdade admiravel! E é esta a theoria do Sr. Ministro que acabou de fallar. Ora eu peço perdão a S. Exa. mas parece-me que S. Exa. trouxe para aqui uma questão de amor proprio, e não uma questão de defeza de partido... (O Sr. Ministro da Fazenda. - Foi para explicar o pensamento da Commissão)... Ora eu declaro que faço uma opposição cada vez mais decidida a este Ministerio; declaro-o alto e bom som; muítas vezes tive a fortuna de sustentar as opiniões do Sr. Ministro da Fazenda, mas depois que S. Exa. assignou um Projecto que veiu a esta Camara, sobre a Liberdade de imprensa, depois disto, declaro que não espero nada bom de S. Exa.; repito, depois que vi que S. Exa. assignou o Projecto sobre a Liberdade de Imprensa, que se apresentou nesta Camara por parte do Governo, eu não espero mais nada de S. Exa., senão mal (O Sr. Ministro da Fazenda: - Muito bem)

Sr. Presidente, eu preciso fazer algumas reflexões a respeito de uma cousa que disse um illustre Deputado que se senta a meu lado, e de que se tirou grande partido. O illustre Deputado não censurou o partido que fez a Restauração de 1033; a questão não é essa, a questão é uma outra muito diversa, mas o que S. Sa. disse, serviu logo de motivo para vir dizer se que se fez uma distribuição justa dos bens nacionaes, para depois se fallar nos defensores da liberdade, nos que desembarcaram nas Praias do Mindello, nos que, verteram o seu sangue a pró da liberdade deste Paiz; mas eu digo que estes que defenderam a liberdade, que desembarcaram no Mindello, que derramaram o seu sangue, aproveitaram muito pouco nessa distribuição de bens nacionaes, e muitos desses soldados benemeritos esmolam no Paiz que libertaram! Não é pelas algibeiras desses que ficaram os productos dos bens nacionaes; não são esses benemeritos da Patria que estão gosando esses bens; os defensores da liberdade, os que derramaram o seu sangue, os que emigraram não teem nas suas algibeiras nada desses bens; estão hoje pobres; não foram elles que gosaram de grandes beneficios! Mas o Sr. Ministro da Fazenda fallou muito na necessidade de fazer essa distribuição, ou por outra, de fazer essa indemnisação pelos serviços prestados. O Sr. Ministro da Fazenda não sabe que um grande defeito em questões politicas é o de abusar-se da situação? Não sabe o que foram as indemnisações em França? E, Sr. Presidente, na época que se tractou das indemnisações, muito se deve a dois individuos, a dois grandes talentos que tomaram parte mais activa nesta grande questão; parece que nessa occasião aquelles que defendiam as indemnisações, queriam espoliar o partido vencido de parte da sua propriedade e haveres para com uma e outra cousa indemnisarem-se dos prejuisos que diziam haverem-se soffrido. Eu ouvi até aqui chamarem-se cães aos individuos do partido que tinha caido! Eis-aqui o que

Página 167

( 167 )

são as indemnisações politicas, e quaes os seus resultados! Mas é certo que naquelle tempo não se podia esperar, em momentos de affervescencia politica, fazer melhor do que se fez; não se podia fazer melhor applicação dos bons nacionaes; hoje porém não aconteceria assim; boje tudo se faria mais convenientemente, visto que já se tinha passado bastante tempo para se pensar e bem decidir sobre uma questão tão grave como esta das indemnisações. Naquella época as cousas de mais interesse geral do Paiz puzeram-se de parte, não se tractou dellas; todos sabem que se fez um emprestimo consideravel para tirar da circulação o papel-moeda, de que senão pagava juro, e pediu-se um capital do que se está pagando juro; todos sabem que naquella época até os Empregados Publicos recebiam aos trimestres adiantados em soberanos; mas as medidas que diziam respeito a impostos, que diziam respeito á cobrança delles, tudo que dizia respeito á organisação financeira, tudo que dizia respeito ao desenvolvimento dos interesses materiaes do Paiz, tudo ficou de parte, e o resultado foi a espantosa miseria que em tudo e a todos os respeitos depois appareceu; o que não aconteceria, se desde então taes objectos se tivessem em attenção. Mas como -havia muita facilidade em pedir emprestimos á Inglaterra, não se tractou d'outra cousa, senão disto; e quando se faz a historia de taes negocios haverem assim corrido, não se ataca um partido, mesmo porque um partido qualquer não tem culpa dos erros dos homens que geriram os negocios do Paiz nesta ou naquella época; os erros de taes homens não devem nunca servir para pedir contas aos partidos, a que elles pertencem ou estão aggregados; se ha alguma culpa dos partidos é em conservarem dentro de si, ou á sua testá homens que commettem taes erros.

Sr. Presidente, não vou mais por diante nesta questão; ella ha de vir á Camara em occasião propria, em que eu possa entrar nella com maior desenvolvimento; Declaro que não posso deixar de me associar áquelles Senhores que querem dar uma mais justa distribuição aos Fundos, que são votados para as diversas classes dos credores do Estado; não posso deixar de associar-me a esse pensamento, que é por certo o mais justo, e aquelle que eu entendo que esta Camara deve votar.

O Sr. Ministro de Fazenda: - S. Presidente, peço licença á Camara para occupar a sua attenção sobre esta questão, por que realmente os Srs. Deputados que se declararam em opposição, e opposição cada vez mais tenaz, ao Governo, parece que abusam um pouco do direito que se diz pertencer á Opposição. Se nesta Casa é preciso paciencia, não é para a Opposição, é para o Governo. Eu respeito a posição que occupo, respeito o Parlamento, por isso ouço a sangue frio as palavras, ou antes as injurias, dirigidas a mim; dou isso como não proferido; mas é certo que quando taes frazes tivessem de vir aqui, não era de certo da parte do nobre Deputado, que me precedeu que ellas deviam partir; eu não esperava este procedimento da parte do nobre Deputado; o nobre Deputado disse - que não esperava nada bom de mim, desde o momento que eu tinha assignado o Projecto, que diz respeito á Liberdade de Imprenso. (O Sr. Carlos Bento: - Apoiado). Eu tinha direito de retribuir lhe igual cumprimento; não o faço, porém o nobre Deputado tome nota de que na nossa carreira Parlamentar hei de ter occasião de lhe tomar severas contas pela fraze que soltou.

Sr. Presidente, eu não disse, que tornava o partido liberal solidario pelos erros administrativos commettidos em 1834; não foi isso o que eu disse; mas a allusão do nobre Deputado, a quem me referi, era a censura a mais forte que se podia apresentar pelo que se fez naquella época. O nobre Deputado que me precedeu, desfigurou tudo o que eu disse em resposta a este ponto - O illustre Deputado o Sr. Cunha disse - que desde 1834 até hoje não se tinha feito senão augmentar a divida publica, que a divida publica de 1823 comparada com a de 1834 mostrava um excesso desmarcado, e tudo que se tinha predicado nesta ultima época e d'ahi em diante mostrava que os bens nacionaes todos se tinham dado ao desbarate; e eu em resposta a tudo disse, que os bens nacionaes não se tinham dado ao desbarate; e fiz ver que pela maneira, porque se tinha mandado proceder á venda dos bens nacionaes, não se fez mais do que pagar os serviços prestados pelos bravos, que defenderam a liberdade deste Paiz, e o que era indispensavel fazer. E com isto não quiz de certo tornar solidario o partido liberal pelos compromettimentos do Ministerio dessa época. Mas o nobre Deputado diz, "que os homens que empunharam as armas, aquelles que mais sangue derramaram pela causa da liberdade, esses homens nada receberam." Isto não é exacto: lêa o nobre Deputado os documentos que a tal respeito foram publicados pelo proprio Governo, e nelles achará o modo como se procedeu neste negocio, e quaes foram as pessoas attendidas nesta paga de serviços pelo seu Paiz. Mas accrescentou o nobre Deputado - não foi nas algibeiras desses individuos que ficou o producto dos bens nacionaes, não é no poder delles que estão taes bens. Pois é preciso que o nobre Deputado declare em que algibeiras páram. Eu posso fallar neste negocio desaffrontadamente, porque sou perfeitamente desinteressado nesta questão; eu não recebi nada, mas é preciso que o Sr. Deputado se explique a tal respeito.

Ora, Sr. Presidente, eu repito, e digo-o bem alto - não se deram indemnisações a ninguem; os nobres Deputados estão perfeitamente enganados, não se deram indemnizações a ninguem, e os écos desta Casa podiam dizer quem é que queria as indemnisações, e de que modo; eram aquelles que pertendiam vêr repetida entre nós a guerra civil, era quem queria entregar este Paiz aos horrores da anarchia, era quem não queria a organisação no nosso Paiz. Não se deram pois indemnisações; o que se fez, foi mandar, liquidar a importancia dos soldos, e ordenados vencidos pelos individuos que permaneceram fieis á Rainha e á Carta, por aquelles que soffreram nas masmorras, e no exilio, e mandaram-se tambem liquidar os rendimentos dos bens sequestrados, ou confiscados, e o tempo da Usurpação, que effectivamente tinham entrado no Thesouro, e depois de feita essa liquidação, mandaram-se entregar os competentes Titulos; se isto assim é, para que vem aqui dizer o nobre Deputado, que se deram indemnisações no sentido em que designou? Isto mostra da parte de S. Sa., ou que não entendeu a questão, ou que ignora a Historia contemporanea. E a que proposito trouxe aqui, na hypothese em que estamos, as indemnizações que em França

Página 168

( 168 )

tiveram logar em 1815?... Haverá alguma paridade entre uma e outra cousa?... Agora, Sr. Presidente, o que é que se fez depois desses Titulos passados?... Votou-se no Parlamento a lei para a venda dessa massa enorme de bens nacionaes, e como era preciso que se vendessem, determinou a lei que ahi se encontrassem esses Titulos, pelo que subiram a 62 por cento, e muito bem andou o Legislador, guando assim o determinou, porque deu logar a maior procura do genero que se ia vender. Quando ainda agora fallei, e disse alguma cousa a respeito desta Lei da venda dos bens nacionaes, não fiz mais do que explicar o seu pensamento, por isso mesmo que tinha pertencido á Commissão de Fazenda, e para mostrar que os nobres Deputados estavam em erro, quando disiam que se tinham dado indemnisações. O pensamento da lei foi o mais justo, e o mais organizador, foi o que satisfez a lojas as indicações.

Sr. Presidente, os bens nacionaes não foram desbaratados, acham-se publicos todos os documentos do que se passou a tal respeito; n'um documento que foi publicado por um Ministro da Fazenda que não póde ser suspeito aos nobres Deputados, fallo do Sr. Francisco Antonio de Campos, procurem os nobres Deputados o Orçamento de 1836, e lá hão de encontrar a relação de todas as pessoas, a quem se entregaram os Titulos Azues. (O Sr. Cunha Sotto Maior: - Mas esse Ministro não encontrou um milhão de libras esterlinas que devia existir no Thesouro). O Orador: - A que proposito vem agora aqui isto?... (O Sr. Cunha Sotto Maior: - O Sr. Ministro como sabe que nós não podemos fallar, pois que já se pediu a palavra para um Requerimento, que tende a abafar a discussão depois de fallar um Ministro, por isso está a fallar assim, deixe-nos fallar que nós lhe responderemos). O Orador: - Sr. Presidente, se eu mereço alguma consideração á Camara, eu pedia-lhe que não fechasse por ora esta discussão; digam os nobres Deputados o que teem a dizer, venham aqui negar a Historia, se teem coragem para isso.

O illustre Deputado não faz outra cousa senão confundir. Que tem o milhão esterlino com isto? E do mesmo modo fallou outro nobre Deputado, que devia estar mais corrente nas questões de Fazenda, porque pertenceu a uma Repartição de Fazenda ha alguns annos, e não devia apresentar aqui um facto, sem que apresentasse as provas. Fallou o illustre Deputado em emprestimos de 1834; pois que emprestimos se fizeram em 1834, a não ser o do milhão esterlino para a extincção do papel-moeda? Nenhum, absolutamente nenhum. Em 1835 fizeram-se conversões, não se fizeram emprestimos (Apoiados). E disse o illustre Deputado - houveram indemnisações! Não houveram taes indemnisações; como póde o nobre Deputado dizer similhante cousa? Quem recebeu taes indemnisações? A Lei de 15 d'Abril de 1835 não foi uma Lei de indemnisações, não foi mais do que uma Lei sobre a venda dos bens nacionaes, e nesta venda eram admittidos os Titulos daquelles que soffreram durante a Usurpação, e não foi de todos que soffreram, porque a muitos não se lhes puderam liquidar as perdas que tiveram, e esses nunca receberam cousa alguma. E vem o nobre Deputado dizer ao Parlamento, do que eu tomei nota - que todos sabem quem foi que encheu as algibeiras por essa occasião! - O nobre Deputado tem obrigação de dizer quem é que encheu as algibeiras, deve declarar á Camara, uma vez que apresentou tal asserção, quem foram esses individuos que encheram as algibeiras.

Disse o illustre Deputado - Pois é na occasião de se approvar o contracto mais ruinoso, que se tem feito em Portugal, o contracto com a Companhia das Obras Publicas, e que se lançam estas sommas á rua, que se vem regatinhar 80 contos de réis! - Sr. Presidente, este methodo de argumentar é muito commodo; mas os illustres Deputados deviam collocar-se na posição, não de homens estranhos ás questões, mas de homens que teem obrigação de as resolver. Não entramos agora na questão se foi bom ou máo o contracto com a Companhia das Obras Publicas; o nobre Deputado sabe que eu combati aqui na Camara esse contracto; mas isso é outra questão inteiramente diversa; não tem nada com esta. Nós estamos em 1850. Creou-se uma Companhia, esta Companhia despendeu grandes sommas; e queria o illustre Deputado que essas sommas entrassem na massa, geral dessas dividas que senão pagam? Que se fez? Já em 1846 se estabeleceu um meio de indemnisação, o mais lesivo para essa Companhia, e veja-se o preço das Acções dessa Companhia, e por elle se conhecerá o prejuiso que teem soffrido os individuos que para ella entraram com os seus dinheiros. Pois ainda o nobre Deputado acha que os Accionistas se devem considerar muito satisfeitos com essa maneira de pagamento?! E queria o illustre Deputado que se eliminasse ainda essa disposição do Derreto de l9 de Novembro?!

Sr. Presidente, eu disse que esta questão de que especialmente se tracta, não se podia convenientemente resolver, senão na presença da liquidação a que se proceder, para conhecer-se a somma a que essa divida monta; já mandei proceder a essa liquidação; se, depois de um perfeito exame sobre este objecto, se entender que se podem mandar passar Titulos sobre o Fundo de Amortisação, mandam-se passar; se se entender que é conveniente tornar outra medida qualquer, tomar-se-ha; em todo o caso é a demora, de mais algum tempo, e o que se póde fazer hoje sem conhecimento de causa, faz-se amanhã com perfeito conhecimento.

Sr. Presidente, esta questão para mim não é nova, eu já na Commissão de Fazenda do anno passado, sendo membro dessa Commissão, apresentei o mesmo pensamento que os illustres Deputados agora propõem, com a differença que ou apresentava uma época que não podia ser combatida, porque reflectindo que podiam haver sommas que ficassem de fóra, eu buscava a época de 1841. E sabe já o nobre Deputado que com a sua Emenda faz justiça a todos? Não ficará Classe nenhuma excluida? Não sabe; e para que não fique, é que convem examinar primeiro o negocio, que, já disse, estou liquidando, e a Camara julgará depois; espero que ella será mais justa comigo, do que os illustres Deputados.

Disse o nobre Deputado que se não vêem por toda a parte senão medidas especiaes, e exclusivas; quaes são ellas? Apresente-as o illustre Deputado. (O Sr. Carlos Bento: - Basta olhar para V. Exa. e para o banco dos Srs. Ministros para ver medidas especiaes.) O Orador: - Sr. Presidente, é hoje a segunda injuria que o illustre Deputado me dirige; e quando se chega a este campo, não é nesta Caza que se podem continuar as discussões; quando se emprsgam as frazes e allusões que acaba de soltar,

Página 169

( 169 )

o illustre Deputado poderá ter tudo, mas de certo perderá a qualidade de digno. Deputado da Nação Portugueza (Apoiados).

O Sr. Cunha Sotto-Maior: - Chamo o Sr. Ministro á ordem. Não é o Sr. Ministro que póde assim fallar; repito o que disse o Sr. Carlos Bento. (Muitas vozes: - Á ordem, á ordem.) (Grande agitação.)- (O Sr. Ministro da Fazenda conservou-se em pé.)

O Sr. Presidente: - Chamo á ordem o Sr. Deputado que acaba de interromper o Orador que fallava. O Sr. Ministro da Fazenda estava na ordem; foi provocado e muito provocado (Apoiados), mas se houvesse direito a pedir-se-lhe explicação qualquer, não o havia por certo para ser interrompido do momo como o foi. Se eu visse que S. Exa. não estava na ordem, tinha tido o cuidado de o chamar a ella... (O Sr. Cunha Sotto Maior: - O Sr. Ministro da Fazenda não póde cassar o diploma a um Deputado.)

O Sr. Presidente: - Ordem, Sr. Deputado Cunha.

O Sr. Cunha Sotto Maior: - Ordem, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Bem! A Camara vai decidir, se o Sr. Cunha tinha direito para interromper, não só o Sr. Ministro da Fazenda que se achava fallando sobre a materia, como tambem a mim que sobre a ordem estava regulando a discussão, para em resultado se lhe impôr ou não a pena do Regimento. O Sr. Deputado teria na occasião sujeita direito de querer tomar parte n'uma questão que não era com elle, mas sim com o Sr. Carlos Bento? O Sr. Carlos Bento tinha respondido a uma pergunta do Sr. Ministro da Fazenda em termos anti-parlamentares, uma vez que não se explicassem convenientemente. Quando eu estava para exigir ao Sr. Deputado essa explicação, que tinha cabimento logo que o Sr. Ministro da Fazenda acabasse de fallar, o Sr. Cunha veiu intrometter-se na questão, chamou á ordem até o Presidente que estava no pleno exercicio do seu direito, no cumprimento dos seus deveres! (Numerosos Apoiados) Vou portanto mandar ler o artigo do Regimento, para decidir-se, se o nome do Sr. Deputado deve ser lançado na Acta como tem sido já por outras vezes! Sinto este incidente, porque esperava que a discussão marchasse como devia, mas alguns (rarissimos) Srs. Deputados teem sido os proprios que se teem desviado do caminho regular que devia seguir-se, e o resultado é este.

O Sr. Ministro da Fazenda: - (Precedendo licença do Sr. Presidente, continuou.) Sr. Presidente, eu deploro sempre estes incidentes, e pedia a V. Exs. e á Camara que consentissem que acabasse o meu discurso, sem dar mais seguimento a esta scena. Eu fui ferido na minha susceptibilidade, espero que a Camara o reconhecerá. O illustre Deputado disse, que desde o momento em que tinha visto o meu nome n'uma Lei, não esperava nada bom de mim... (O Sr. Carlos Bento: - Agora.) O Orador: - Tambem disse mais, queixando-se de que não via senão exclusivos, que bastava olhar para aqui (o banco dos Srs. Ministros) para ver esses exclusivos, e essa excepção, porque os Ministros tinham decretado pagar-se em dia a si proprios.

Foi a isto, Sr. Presidente, que eu respondi com mais algum calor; sinto ter-me visto forçado a faze-lo, e ainda insisto pedindo a V. Exa. para acabar o meu discurso, sem dar seguimento a este incidente.

Eu suppunha que todas estas cousas tinham sido explicadas até á saciedade n'outra occasião, na presença dos factos que apresentei, e que o illustre Deputado não viria de novo com similhante questão. Pois a que chama o illustre Deputado pagar em dia aos Ministros? É terem recebido a differença dos seus vencimentos anteriores? Se o illustre Deputado houvesse de receber vencimentos, não desejaria de certo que se lhe pagasse em dia assim.

Termino, Sr. Presidente, fazendo uma declaração a um illustre Deputado que definiu a sua situação na Opposição. S. Sa. apezar de declarar que fazia opposição á Administração, fez esta declaração em termos taes, que não posso deixar de lhe dar os meus agradecimentos, e de dizer ao illustre Deputado e á Camara, que como eu espero e creio que a declaração do illustre Deputado é sincera, a sua opposição não hade ser por muito tempo. O illustre Deputado disse, que desejava que o Governo tivesse a coragem de se collocar á frente de certas medidas que o partido Conservador em todos os Paizes estava adoptando e levando á execução, sob pena destas medidas terem de vir debaixo para cima, quando era mais conveniente que fossem de cima para baixo. O illustre Deputado sobre tudo referiu o facto a respeito do que chamou a minha attenção, desejando que eu apresentasse o meu Relatorio.

Eu occupo-me incessantemente deste trabalho: é unicamente o desejo de poder apresentar á Camara documentos que possam esclarecel-a para a resolução, que todos estamos empenhados em resolver, que não tenho ainda apresentado o meu Relatorio... (O Sr. A. Albano: - Apoiado, é verdade) O Orador: - S. Exa. o Sr. Presidente da Commissão de Fazenda ouve-me, e sabe que já lhe apresentei uma collecção dos documentos principaes que hei de apresentar no meu Relatorio (O Sr. A. Albano: - Apoiado) O Orador: - Em quanto os não poder imprimir, hei de apresental-os assim mesmo á illustre Commissão de Fazenda; porque, Sr. Presidente, é necessario dizer a verdade, nós temos marchado mal por conhecermos mal a situação do Paiz; não é culpa nossa, todos teem trabalhado por acertar, e por consequencia o trabalho que eu apresento, não é só filho dos meus esforços, é de tudo que se tem feito até aqui. Póde pois. illustre Deputado acreditar que o principal desejo do Governo é apresentar esse Relatorio, mas que lhe não tem sido ainda possivel, porque o quer apresentar com a maior somma de documentos que puder, a fim de habilitar a Camara para poder resolver esta questão. Em quanto ao mais, quando o Governo tiver a fortuna de poder apresentar claramente ao Paiz a sua verdadeira situação, póde estar certo o illustre Deputado de que havemos de ter a coragem precisa para o fazer.

O Sr. Presidente: - Torno a dizer que a materia que continua em discussão, é só o §. unico com a Emenda e Additamento que se offereceram e admittiram a elle, e nada mais. Todo o Sr. Deputado ou Ministro que se desviar da questão, e chamado á ordem. É neste sentido que dou por fim o incidente. Tem a palavra o Sr. Cunha.

O Sr. Cunha Sotto-Maior: - Eu tinha pedido a palavra sobre a ordem para rogar a V. Exa. que consultasse a Camara, se depois do que disse o Sr. Ministro da Fazenda, eu devo ou não fallar sobre o incidente que promovi. O Sr. Ministro tem não sei

VOL 2.° - FEVEREIRO - 1850. 43

Página 170

( 170 )

porque, um decidido empenho em me fazer passar por um advogado das idéas absolutas, e é isto que eu não quero, nem posso querer, nem admitto. Acho ridiculo vir aqui fazer profissões de fé todos os dias; no entanto posso dizer com a mão na consciencia, e peito aberto que nada detesto mais do que o despotismo, venha elle d'onde vier, venha das praças ou das secretarias. Fallei no desbarate da riqueza publica, e não me retracto. Haverá alguem no Parlamento que possa, com a mão na consciencia, dizer que eu asseverei uma falsidade? Pois não eramos uma Nação rica, e não somos hoje uma Nação pobre? Diz o Sr. Ministro da Fazenda "Empraso o Sr. Deputado para dizer em que algibeiras para o dinheiro." E eu empraso o nobre Ministro pára dizer aonde pára a grande riqueza publica, que tinhamos em 33, 34, 35, o aonde estão os restos que escaparam á devastação d'essa época.

Sr. Presidente, o Paiz fez sacrificios para obter a liberdade, não ha duvida, immensos sacrificios; mas isto, Sr. Presidente, não importava a ruina da Nação é a miseria publica. A liberdade, Sr. Presidente, não é a igualdade da miseria, a liberdade não é o privilegio para uns se enriquecerem, em quanto uma Nação se empobrece. Os soldados, que S. Exa., com tanto sentimentalismo, disse que estiveram na Terceira andam por aí em numero avultado pedindo esmolas; não são estes os que compraram quintas e palacios, os que traficam ainda hoje com os espolios desta desgraçada terra.

Eu como Deputado da Opposição tenho rigoroso direito de negar a intelligencia de S. Exa. posso fazel-o; e nisto não faço uma injuria; exponho um facto. Pois que! Eu que passo em revista os actos do Ministerio, eu que sei a historia de como se tem governado este Paiz, como se tem arruinado esta desgraçadissima Noção, devo por ventura acreditar na bôa fé da intelligencia de S. Exa.? Não acredito, e ninguem póde acreditar em tal; os factos valem mais do que as palavras dos Srs. Ministros; palavras leva-as o vento, calamidades, essas ficam, e sentem-se.

Quando se vê uma Nação cada vez peior governada, quando se não apresentam senão Leis de favor, Leis de privilegio, Leis de excepção, levanta-se o Sr. Ministro, e diz - quaes são essas Leis?!... Pois esta Lei que estamos discutindo, este paragrafo que aqui está não é um paragrafo de privilegio, não é um paragrafo de favor, não é uma disposição excepcional? Se acaso o Sr. Ministro, ou o Sr. Relator da Commissão tivessem dito no paragrafo a esta época começa para as classes inactivas em geral e desde que se lhes deve" não tinha havido discussão, era um principio generico de justiça e verdade; mas no curto espaço de tres linhas, logo tres excepções!... E diz o Sr. Ministro da Fazenda - onde está a excepção!... - Pois S. Exa. não leu, não viu o que está aqui? Pois este paragrafo não será uma excepção odiosa, não me dará direito a mim, ao Paiz, á Camara para asseverar alto e bom som, que isto é uma operação de agiotagem? Que pela unica razão de haver a Companhia Confiança Nacional descontado certos Titulos, esses entraram immediatamente no Fundo de Amortisação, e porque não descontou outros, esses não entram?... Como é que o Sr. Ministro da Fazenda e a Commissão hão de responder a esta observação? Não podem responder; porque leio a excepção, a excepção está aqui consignada em palavras claras e intelligiveis.

Mandei para a Mesa uma Emenda para tornar o principio generico, e a Commissão e o Sr. Ministro levantaram-se e declararam logo que a não acceitavam. Se o paragrafo estivesse redigido como devia ser, se nelle estivessem comprehendidos todos os Servidores e Pensionistas do Estado, não tinha havido esta discussão; se a não tivesse havido, não teria occorrido o incidente que perturbou a tranquillidade desta Casa.

Mas V. Exa. deve-se lembrar, e a Camara tambem, que somos apenas 4 Deputados da Opposição contra uma Maioria de 170; a Maioria deve ter muita deferencia com nosco, e nós muita paciencia para soffrer, e grande coragem para nos empenharmos n'um combate tão desigual pelo lado do numero (O Sr. Presidente do Conselho. - 170! 100) 170, 160, ou 100, ha Maioria de mais; o Governo dispensou todos os Commandantes de Corpos, Generaes de Divisões, Governadores Civís, Secretarios, etc. que tinham assento nesta Camara. Não conheço nos fastos parlamentares uma Opposição tão pequena. 4 Deputados, e estes 4 Deputados promovem a indignação dos Ministros, e as coleras da Maioria da Camara! ... Tinhamos direito, senão a alguma deferencia, pelo menos a não tanto máo humor. Eu não tenho mudado, como disse o illustre Relator da Commissão, não mudei, sustento hoje os principios que sustentei em 48, e em 49, occupo acolá uma cadeira (As da esquerda) como occupava em 48, como occupei em 49, como hei de occupar daqui a 50 annos se continuar a ser Deputado, e houver os Ministros que ha hoje (Vozes: - Não ha, não).

Temos direito, Sr. Presidente, para não acreditar nas promessas do Sr. Ministro da Fazenda, porque em 48 e 49 prometteu solemnemente ao Parlamento que havia de reformar o systema do actual lançamento da decima, e não o reformou, temos tido muitas boas promessas do Sr. Ministro da Fazenda, e todas ellas não cumpridas; mas o Paiz está farto de palavras.

Se me perguntarem pelos principios, declaro francamente que me respondam pelos meios; quando vejo os principios sem efficacia, e levados á infima prostituição, renego desses principies, e procuro meios de os rebabilitar; se me perguntarem ainda pelo meu systema, direi que é o diametralmente opposto ao do actual Governo (O Sr. Agostinho Albano: - Ouçam, ouçam) Não tenho os principios, que andam na Ordem do Dia; porque vejo que com elles não se faz mais do que enredar as questões; eu peço meios para o Paiz ir por diante, e não os principios que levam este Paiz sempre para traz, e o tornam mais desgraçado. E em virtude deste sofisma dos principios que cousa alguma se executa, que ninguem se entende, que nós chegamos ao miserrimo estado em que nos achamos.

Sr. Presidente, o illustre Relator da Commissão disse, que a minha opposição era frenetica, confesso que em resultado da minha organisação, sou um pouco frenetico; e sempre que ouço S. Exa. faltar, e mais alguns Cavalheiros ainda me enfrenezio mais; presto-lhes toda a attenção, e ainda não ouvi uma doutrina, uma deducção judiciosa, um arbitrio sensato que me faça mudar de parecer. Pertende-se por meios de sofismas arredar a questão do seu campo natural.

Página 171

( 171 )

O illustre Deputado Relator da Commissão, e o Sr. Ministro da Fazenda reconheceram que a minha Emenda era justa, sancta, e racional, como é que concordando nesses predicados, concluem pela rejeição?.. Pois não esteve este Projecto na Commissão desde o anno passado até agora? Não tinha tempo o illustre Deputado, e o Sr. Ministro da Fazenda de o emendarem, de o corregirem de defeitos, e trazer aqui uma Proposta, menos sujeita a apprehensões desfavoraveis? Como é que o Sr. Ministro da Fazenda ha de negar que não ha ponto, que não ha banca-rota nesta medida? Como é que S. Exa., sendo o celebre auctor da operação de 31 de Novembro, que fez um salto nessa época com a expressa condição do pagamento em dia, ha de querer que não vejamos neste Projecto um segundo pensamento do ponto, ou banca-rota de 1841? O Sr. Ministro da Fazenda governa por meio da banca-rota, paga privilegiadamente: ainda ha tres dias para satisfazer o pret da guarnição da Capital contrahiu S. Exa. um emprestimo de 30 contos de réis (O Sr. Ministro da Fazenda: - Não é verdade) S. Exa. já veio aqui ao Parlamento asseverar que era falso o alcance dos Recebedores, e elles appareceram alcançados... V. Exa. é a negação da experiencia e dos factos, e das suas proprias palavras. É necessario muita paciencia para discutir com o Sr. Ministro; mas já agora hei de arcar peito a peito com S. Exa. Esta Camara já viu um Ministerio sair por aquella porta carregado de Maiorias, e succumbir algumas horas depois. Aqui os Ministerios morrem quando triunfam. Entenda o Governo e a Camara, uma vez por todas, que a Opposição é officio e não beneficio; é um encargo penoso, e não um passatempo lucrativo.

Pois são para nós as fitas, as commendas, as grãcruzes, os empregos, os titulos, e as condecorações? Que recolhemos? As injustiças do Poder, as injurias dos seus Jornalistas, receios e perigos se por acaso se adoptarem medidas excepcionaes e violentas.

Sr. Presidente, cingindo me á questão, peço á Commissão, por honra da Camara, e do Governo, que este artigo volte á Commissão, para lhe dar uma redacção menos injusta; menos injusta, repito.

Eu podia, como uma questão de amor proprio, não progredir na discussão com o Sr. Ministro da Fazenda; mas como entendo que as Leis de 23 de Maio não estão revogadas, posso argumentar assim em meu favor, e não sei com que direito o Sr. Ministro da Fazenda se lembrou de esperar de mim uma retractação.

Em quanto a V. Exa. me chamar á ordem, se acaso a Camara entende, que o meu nome deve ser lançado na Acta, póde faze-lo; mas, Sr. Presidente, eu chamei o Sr. Ministro á ordem, porque me pareceu que o Sr. Ministro dizendo que o Sr. Deputado Carlos Bento podia ser tudo, menos Deputado, commetteu um attentado; entendi que um Ministro da Coroa não tinha o menor direito para cassar os nossos diplomas. Se a defeza desta nossa, prerogativa promoveu um incidente desagradavel, peço á Camara que lance as culpas á imprudencia do Sr. Ministro da Fazenda. O meu nome tem sido lançado na Acta tantas vezes, que uma vez de mais ou de menos não significa cousa alguma.

O Sr. Presidente: - A responsabilidade moral é tudo para o Representante do Paiz, e devia-o ser para o Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Bento: - Sr. Presidente, a Camara ouviu o Sr. Ministro da Fazenda, e ha de fazer-me a justiça de acreditar que é preciso que eu diga alguma cousa a respeito do que S. Exa. Proferiu; para desfigurar o que eu tinha dicto.

S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda disse que eu tinha desfigurado o que S. Exa. tinha dicto. Ora S. Exa. na occasião de responder aos meus argumentos desfigurou; provavelmente o meu modo de proceder foi contagioso, porque se communicou a S. Exa. desde logo, e S. Exa. desfigurou tambem.

Disse S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda que eu tinha accusado homens que tinham feito parte de uma Administração anterior. Ora como eu tenho relações de amisade com muitos dos individuos que fizeram parte dessa Administração, como eu seria o ultimo homem que fizesse injustiça ás intenções, e ao caracter desses individuos, realmente vi-me na mais triste de todas as posições, accusado por S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda, e accusado injustamente.

Mas disse S. Exa. - tanto mais que foi comparar o que se tinha praticado no nosso Paiz com odioso do que se praticou em outro Paiz depois de uma época em que houve exaggeração do sentimento da reacção. Na verdade, Sr. Presidente, esta é a peior de todas as situações!.. De maneira que o que eu trouxe para desculpar, foi empregado por S. Exa. para aggravar a accusação, que suppunha que eu dirigira áquelles homens!.. Disse eu (note a Camara toda): ninguem póde depois de 16 annos dizer que não commetteria os mesmos erros naquella occasião; ninguem poda dizer depois de 16 annos quando a experiencia tem ensinado muitas cousas, que collocado nas mesmas circumstancias, não faria muito peior; e tanto é assim que n'outros Paizes ainda se foi muito além, e a prova está em França. E o Sr. Ministro da Fazenda quiz trazer este argumento produzido para attenuar a responsabilidade por erros commettidos, que todos commettem; mas que é muito facil depois de 16 annos dizer em que esses erros consistiram, este argumento que eu trazia para attenuação, na boca de S. Exa. serviu para aggravar a accusação; S. Exa. não desfigurou, S. Exa. fez-me justiça.

S. Exa. disse que não esperava de mim uma accusação. Esta declaração parece-me importar a opinião de que eu devo favores a S. Exa. (O Sr. Ministro da fazenda: - Eu não disse tal) Ora eu declaro que devo a S. Exa. um obsequio, que foi de me tractar com toda a amisade, quando tive a honra de servir na Repartição de que S. Exa. era chefe; mas eu agradeço ao illustre Ministro, que me deu occasião para lhe rogar, que me declare, se alguma vez eu lhe pedi a menor sombra de favor, ou obsequio: pedi em uma occasião licença, que tinha direito a exigir com vencimento, porque estava doente, e pedi-a sem elle. Saiba agora o Sr. Ministro da Fazenda, o que não sabia ainda; que tive nessa Repartição um negocio, relativo á minha familia, sobre certa quantia, cujo embolso eu entendia, que lhe era devido, e nunca antes lhe fallei nisso. Não esperava de mim? Porque? Custa alguma cousa a conservar certas posições; a minha como Opposição dá-me todo o direito de dizer ao Sr. Ministro da Fazenda, que S. Exa. está compromettendo o Paiz com todas as suas medidas; por conseguinte não era eu que não devia occupar este logar de Deputado, é S. Exa. que não devia conservar-se naquellas cadeiras.

Página 172

( 172 )

Sr. Presidente, eu disse, que havia medidas de excepção em todos os pontos, para que se lançavam os olhos; provei-o, e chamei a attenção de S. Exa. sobre um facto; e diz S. Exa. = Pois ainda se falla nesse objecto com referencia aos Ministros? A resposta é a mais triste, a mais infundada de todas as evasivas = Nós recebemos essa differença dos ordenados, porque então os nossos successores, quando vierem substituir-nos, estarão muitos mezes sem receber cousa alguma! Eu acho a resposta a mais triste de todas as evasivas! Então o que se deve dizer dos mais empregados, cujos ordenados são muito pequenos, e não se lhes pagam? Digo que a medida é de um odioso tão transcendente, e a evasiva é de uma tal puerilidade, que ainda ninguem a poz no campo da defeza.

Mas, Sr. Presidente, dizem os illustres Deputados que eu accusei, e accusei igualmente a actual Administração e as Administrações transactos; censurei, é verdade; perguntei se não houve indemnisações, e disse-se-me; isso é uma questão de palavras. Já d'outra vez fallei aqui em antecipações, respondendo-se-me: - são supprimentos, o illustre Deputado não percebe - agora fallo em antecipações, e diz-se - não são antecipações, é divida liquidada. - Pois, Sr. Presidente, se a expressão não foi feliz, a idéa foi exacta, por que a idéa era indemnisar os individuos pelo tempo que não tinham recebido. Nesta occasião perguntarei eu, quaes foram as individuos que fizeram os maiores sacrificios; e se foram esses, que tiveram as recompensas? Não podia pois haver, em se pasmarem esses Titulos, os mesmos inconvenientes? Não lhes chamam indemmsações, chamem-lhes Titulos de divida liquidada, que a respeito de muitos que receberam, a desigualdade é a mesma.

Sr. Presidente, fizeram muito as Administrações que deram a liberdade a este Paiz, prestaram muitos serviços esses homens verdadeiramente amantes da liberdade, honra a esses caracteres independentes, que souberam soffrer pelos principios que tinham defendido, e que tendo-os conservado no exilio não lhes foram infleis, quando subiram ao Poder; honra a esses Cavalheiros, que souberam comprehender a obra de um Principe Generoso! E deveria eu atacal-os injustamente? Sr. Presidente, as Dictaduras do tempo de D. Pedro, se não são de todo isemptas de censura, teem um grande pensamento; esses homens foram homens liberaes, era a sua primeira obrigação naquella época? Disse-se que nós tinhamos accusado essas pessoas, e as suas intenções; o que se disse é, que tinham commettido erros financeiros, e que esses erros ha 16 annos ainda se não emendaram: eis-aqui o que eu estou prompto a responder ao Sr. Ministro da Fazenda em toda a parte. Mas aqui o que se póde dizer do Sr. Ministro da Fazenda? Que não está na sua verdadeira posição. Em Inglaterra, que é o Paiz, que nós devemos trazer para exemplo, o Ministro da Fazenda não é o Guarda-livros do Ministerio, é o homem mais importante da Administração, e faz a politica da Administração, dá a côr politica á Administração, e as reformas economicas da Inglaterra são assignadas por um dos primeiros caracteres politicos. É preciso que S. Exa. note, que tem responsabilidade, e que tem responsabilidade pelos seus actos, e que se offende a Carla Constitucional é tão responsavel como qualquer dos outros. Mas falta tambem na minha opinião ao Sr. Ministro da Fazenda o motivo de credito como financeiro. Eu agradeço á Camara e a V. Exa. a bondade, que tiveram em me deixar explicar sobre este objecto, porque eu conheço que não estive realmente na ordem; mas a Camara reconhecerá, que eu não podia deixar de o fazer. Eu associo-me completamente á opinião do Sr. Cunha, porque a acho justa. Protesto contra as expressões do Sr. Ministro da Fazenda, por um motivo, pelo qual não podia combater, como o fez, a individuos, que aqui não existem, e devo declarar para desaggravo a esse partido, que não foi elle quem apresentou a Lei que se queria para as indemnizações, antes a combateu, unindo-se neste empenho dois caracteres o Sr. Manoel da Silva Passos, e o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães contra o auctor do Projecto, que pertencia ao Partido Cartista, e era o Sr. Joaquim Antonio de Magalhães.

A respeito da minha ignorancia estou sempre prompto a confessal-a, mas com uma restricção; eu todos os dias aprendo, e todos os dias procuro mestres; mas permitta-me S. Exa. que lhe diga, que não é a S. Exa. que hei de procurar para me instruir, e até me parece que hei de melhorar muito nas minhas opiniões, se não imitar S. Exa. em muitos pontos importantes.

Sr. Presidente esta questão está tractada pela minha parte, por consequencia vou terminar insistindo que seja reconsiderado o §. unico em discussão pelas mesmas razões que apresentam os Cavalheiros que o sustentam; o Sr. Ministro da Fazenda já declarou que a sua opinião é muito diversa d'aquella que alli te acha exarada; S. Exa. entende que a divida com data anterior deve ser comprehendida, mas que hoje não era a occasião propria, que mais tarde se deve attender a essa divida de data anterior áquella marcada no paragrafo; mas se S. Exa. entende que esta divida de data anterior deve ser considerada, qual é a occasião mais opportuna do que a actual, para attender a essa divida? Qual é a razão porque S. Exa. não concorre agora para que se attenda a essa divida? Não tem por fim este Projecto que está em discussão, as alterações que se julgou convenientes fazer ao Decreto de 19 de Novembro de 1846? De certo que sim; logo é a occasião mais propria de adoptar se uma disposição que se entenda que deve adoptar-se mais tarde. Porque senão ha de fazer isso agora? Porque não ha de contribuir o Sr. Ministro para que a Emenda que comprehende essa divida, seja adoptada? Não me importa indagar as razões que S. Exa. tem para o não fazer; as razões na minha opinião todas são a favor d'aquelles que querem que na disposição do §. unico do art. 15.° se comprehenda a divida de que tenho fallado.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado fallou não só sobre a ordem, mas sobre a materia, mas sempre fóra da questão (Apoiados).

O Sr. D. Prior de Guimarães: - Peço a V. Exa. que tenha a bondade de consultar a Camara para se prorogar a Sessão até que se vote o §. unico do art.º 15.º, e Propostas a elle offerecidas.

Resolveu-se affirmativamente.

O Sr. Rebello da Silva: - Sr. Presidente, a Camara póde estar certa de que não hei de occupar por muito tempo a sua attenção; conheço a hora em que estamos, Eu dou os parabens á Camara, e

Página 173

( 173 )

agradeço-lhe a liberdade com que esta discussão tem corrido (Apoiados). Todas as vezes que se fazem arguições graves, que parecem ferir directa ou indirectamente a honra e probidade d'um partido, ou das Administrações que geriram em nome d'elle, é de toda a conveniencia que esse negocio se aclare para que a verdade, appareça na sua verdadeira luz, e o Paiz inteiro saiba de que lado ella está (Apoiados); e é preciso aclaral-as, porque isso importa muito para o futuro, e para as paginas da Historia.

Sr. Presidente, todos os homens publicos de Portugal teem sido victimas successivas de graves accusações: as proprias Administrações da Dictadura do Immortal Duque de Bragança foram victimas a cada momento das mais serias e das mais severas accusações e arguições, e foi necessario correr um grande espaço de annos para se illibar a honra e probidade dessas Administrações; os individuos que as compuzeram, podiam francamente abrir as portas de suas casas porque ellas estavam núas, e elles estavam pobres e despidos de toda e qualquer riquesa (Apoiados); elles não tinham quintas nem palacios, essas accusações e arguições caíram completamente diante da realidade dos factos, e é de esperar que outras accusações que modernamente teem tido logar, tambem tenham o mesmo resultado, e muito bom será que assim se possa verificar por conveniencia dessas Administsações accusadas ou arguidas; e dos partidos em nome das quaes essas Administrações teem regido o Paiz.

Sr. Presidente, eu não concordo com o meu amigo o Sr. Deputado que fallou da riqueza publica que existia em 1833. Em 1833 não havia essa riqueza publica de que S. Sa. fallou; havia sim uma grande massa de terras entregues a corporações mortas, e que não tiravam d'ellas todo o producto de que eram susceptiveis; este é o facto; hoje é que tem augmentado a riqueza e prosperidade, resultado das Leis da Dictadura de D. Pedro, e tambem essa prosperidade se deve a Lei de 15 de Abril de 1835, a ella se deve uma grande parte desta riqueza publica; essa Lei fez entrar nas mãos dos particulares, entregou a individuos laboriosos e cheios de actividade essa multidão de terras e propriedades, que estavam inertes nas mãos de corporações mortas; estes foram os effeitos da Lei de 15 de Abril de 1835. Não sei, não estou habilitado para dizer essas liquidações de que ha pouco se fallou, foram bem ou mal feitas; eu havia de ter muita duvida em avançar que foram mal feitas sem ver primeiro as peças do respectivo processo; o facto é, que essas terras e propriedades são hoje possuidas por homens laboriosos, páram nas mãos de homens que teem desenvolvido grande actividade na cultura e augmento da producção dessas propriedades, o facto é este, e a riqueza publica por elle tem-se desenvolvido no Paiz, e muito mais se teria desenvolvido, se os Governos que entre nós teem existido d'então para cá, tivessem marchado de uma maneira mais conveniente, se tivessem applicado os verdadeiros principios economicos aos diversos ramos a que elles se podem applicar (Apoiados).

Agora permitta-me tambem o nobre Deputado, que lhe diga, que não posso estar de accordo com S. Sa. quando diz, que não carece de principios para a Causa Publica caminhar; eu digo que muitas vezes hei-de ter de fazer reparo aos Srs. Ministros pelas contradicções que apresentem em seus principios; se as Administrações estiverem fóra dos principios como é que eu as heide apanhar? Não posso; se os Sr?. Ministros estiverem fóra dos principios, se eu estiver fóra dos principios, estamos n'uma anarchia, n'um cahos de que não é possivel saír; não haverá uma voz que nos chame das trevas á luz, e d'uma tal confusão não ha nada possivel. Não se podem dirigir as cousas publicas sem principios (Apoiados).

Sr. Presidente, eu tambem acompanho o nobre Deputado, o Sr. Carlos Bento, em perguntar ao Sr. Ministro da Fazenda, seja lhe pedi algum favor ou bebeficio para mim? (O Sr. Ministro da Fazenda: - Não senhor) Faço a mesma pergunta ao Sr. Ministro da Marinha, a nenhum tenho pedido senão justiça.

Sr. Presidente, posso tambem dizer muito desaffrontadamente o que entender conveniente a bem do Paiz, ainda que ás reflexões que tiver de fazer forem contra a Administração; porque eu olho para as questões quando discuto, e não para os individuos que compõem a Administração (Apoiados). Sr. Presidente, nós temos demolido muito e muito, temos demolido bellas instituições, sem as substituir convenientemente (Apoiados), temos demolido Tribunaes que muito contribuiam para o bom andamento das cousas publicas; e tudo isto para nos desfazermos de certos homens que por terem errado, ou seguido um máo caminho se condemnaram os Tribunaes em que serviam; aboliram-se instituições muito convenientes ao Paiz, como por exemplo, a instituição do Conselho de Marinha e Ultramar, e a Junta do Commercio (Apoiados); se se lêrem as Consultas do Conselho do Ultramar, e da Junta do Commercio, ver-se-ha por ellas cousas importantes, conhecer-se-ha quanto essas instituições eram uteis ao Estado (Apoiados) quanto auxiliavam as Administrações; e taes instituições existem em toda a parte, onde se conhece o que é administração.

Sr. Presidente, á Dictadura de Dom Pedro se deve a nossa liberdade, e o desenvolvimento da nossa industria e dos interesses materiaes do Paiz etc. que hoje gosamos (Apoiados); a Lei de 15 d'Abril de 1835 sobre a venda dos Bens Nacionaes muito contribuiu para estas tambem; e ao mesmo tempo essa Lei não faz mais do que pagar uma divida áquelles que tinham direito de a receber.

Agora em quanto á actual Administração, tenho a fazer uma declaração muito simples, e em poucas palavras: em quanto o Sr. Ministro da Fazenda vier ao Parlamento trazer Leis, como aquella que veio apresentar ha dias, hei de combate-las, porque quero a verdade da Carta Constitucional. Direi como se disse no Hotel de Ville - Quero a Carta, quero a Carta toda, quero a Carta uma realidade - tudo quanto atacar a Carta na sua verdade, tudo quanto atacar a industria e a religião, tudo quanto atacar estes principios, ha de achar em mim tenaz e robusta opposição, despido de qualquer interesse ou vantagem; porque repito, não estou em posição, nem tenho desejos de substituir os Srs. Ministros.

Parece-me que não posso ser suspeito em dizer á Camara que muito desejaria que a actual Administração marchasse firme nestes principios constitucionaes, porque são elles que formam a verdadeira liberdade, porque são elles que lhe podem dar a força necessaria para a sua conservação. Direi mais: todas as medidas de Fazenda que tenderem ao progresso

Vol. 2.º - FEVEREIRO - 1850. 44

Página 174

( 174 )

regrado e sensato, hão de achar em mina apoio; se o Ministerio trouxer um Projecto para a organisação do Conselho Ultramarino, ou um Projecto de reforma de Pautas da Alfandega, declaro que lhe hei de dar o meu voto: nesse dia não é a Opposição que passa para o Ministerio, é o Ministerio que passa para a Opposição a defender as liberdades publicas e economicas.

O Sr. Agostinho Albano: - Desde que ouví dizer ao nobre Deputado que não tinha principios, não tenho que combater, porque não é possivel haver combate, aonde não ha principies; por isso cedo da palavra.

Não havendo quem mais pediste a palavra julgou-se a materia discutida, foi posta á votação a Emenda do Sr. Cunha, que foi rejeitada.

Seguiu-se a votação da Emenda do Sr. Antunes Pinto, e obteve 31 votos pro, e 31 contra; e tornando outra vez a ser votada, obteve 27 votos pró e 31 contra.

O Sr. Palmeirim - Não tendo havido 37 votos conformes pró ou contra a Emenda do Sr. Antunes Pinto, devia esta segundo o Regimento ser submetida ainda á votação terceira vez; no entretanto parece-me mais conveniente passar-se á votação do § unico por partes, sem prejuiso da Emenda do Sr. Antunes Pinto (Apoiados). Neste sentido pois vou sujeitar á votação a primeira parte do § unico até as palavras - em Agosto de 1848 - (Apoiados).

Posta á votação a parte do § unico referida pelo Sr. Presidente foi approvada unanimemente: seguidamente sujeitando-se á votação a ultima parte do paragrafo, obteve 29 votos pro e 28 contra, não se verificando por conseguinte votação legal.

O Sr. Presidente: - A decisão deste objecto terá logar na Sessão seguinte (Apoiados). A Ordem do Dia para ámanhã é a mesma de hoje, devendo observar que as Interpellações pendentes terão logar depois da discussão do Projecto n.º 70. Está levantada Sessão - Eram quatro horas e um quarto da tarde.

O REDACTOR,

JOSÉ DE CASTRO FREIRE DE MACEDO.

N.º 12. Sessão de 19 de Fevereiro 1850

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada - Prementes 49 Srs. Deputados

Abertura - Antes da uma hora da tarde.

Acta - Approvada.

Não houve correspondencia.

SEGUNDAS LEITURAS.

REQUERIMENTO. - "Requeiro se peça, pelo Ministerio competente, uma relação das quantias que teem entrudo no Thesouro, com a quarta parte em Notas, e as quantias que teem entrado em metal, provenientes do imposto de 4 por cento sobre os locatarios, imposto sobre os creados, e sobre cavalgaduras, respectiva aos annos de 1818-1849, e 1849-1850, remettidas pelos Recebedores particulares do Bairro de Belem." - Peixoto.

Foi admittido e ficou em discussão.

O Sr. Xavier da Silva . - V. Exa. tem a bondade de mandar lêr outra vez o Requerimento (Leu-se). Eu não me opponho, nem me posso oppor; e com quanto saiba que no Mappa, contas e outros trabalhos da Junta do Credito Publico que hãode ser presentes a esta Camara, vem incluidos os esclarecimentos que o nobre Deputado pede, com tudo não faz mal approvar-se o Requerimento.

O Sr. Peixoto: - Sr. Presidente, quando fiz este Requerimento, não sabia se os esclarecimentos que peço, viriam á Camara; mas se elles vierem antes, fica satisfeita a minha requisição, e se não vierem, então não póde haver duvida em que se peçam; em todo o caso entendo que não faz mal approvar-se o Requerimento.

Julgou-se logo discutido - E foi approvado unanimemente.

O Sr. Vieira de Araujo: - Mando para a Mesa um Parecer da Commissão de Petições.

O Sr. Presidente: - Esse Parecer, como conclue com a remessa de papeis para a Commissão de Marinha, expede-se, visto que para isso não é necessaria votação da Camara, segundo os precedentes.

ORDEM DO DIA

Continua a discussão do Projecto n.º 70 na especialidade.

O Sr. Presidente: - Achava-se vencido o art. 15.º e seus numeros, e entrou em discussão o § unico que se tinha julgado discutido. A este paragrafo apresentaram-se algumas Emendas, as quaes foram rejeitadas. mas falta para ser votada a do Sr. Antunes Pinto em razão da dificuldade que houve para haver vencimento; e daqui resultou adoptar-se methodo especial para a votação do paragrafo, votando-se primeiro e approvando-se até ás palavras = de Agosto de 1848, = e passando-se á votação da parte restante do paragrafo não houve vencimento nem pro nem contra. Neste estado tem-se de recorrer á votação nos termos proprios do Regimento, quer dizer, hade se votar em primeiro lugar a Emenda do Sr. Antunes Pinto, a qual vai ler-se (Leu- se, e veja-se a Sessão de hontem).

Esta Emenda foi apresentada pelo Sr. Antunes Pinto em Substituição á primeira que tinha apresentado. Sobre ella já houve duas votações, sem que houvesse ainda vencimento nem por um nem por outro lado, porque não se deu o numero de 37 votos nem pro nem contra por consequencia tem-se de propor novamente.

Foi rejeitada por 46 contra 10.

O Sr. Presidente: - (Continuando). Agora vota se a ultima parte do paragrafo.

Foi approvado por 55 votos contra 9.

Leu-se logo o Additamento do Sr. Antunes Pinto.

O Sr. Antunes Pinto: - O meu Additamento está prejudicado, e peço que se me consinta retiral-o.

O Sr. Presidente: - Agora devia votar-se o Addi-

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×