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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO EM 19 DE FEVEREIRO DE 1864

PRESIDENCIA DO SR. CESARIO AUGUSTO DE AZEVEDO PEREIRA

Secretarios os srs.

Miguel Osorio Cabral

José de Menezes Toste

Chamada — Presentes 62 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs. Annibal, Abilio, Ayres de Gouveia, A. B. Ferreira, Quaresma, Brandão, Gouveia Osorio, Ferreira Pontes, A. Pinto de Magalhães, Mello Breyner, Lemos e Napoles, Pinheiro Osorio, Pinto de Albuquerque, A. V. Peixoto, Palmeirim, Barão da Torre, Barão do Vallado, Abranches, Almeida e Azevedo, Beirão, Cesario, Almeida Pessanha, Cypriano da Costa, Domingos de Barros, Poças Falcão, Fernandes Costa, Ignacio Lopes, Borges Fernandes, F. L. Gomes, Sant'Anna e Vasconcellos, Mendes de Carvalho, J. A. de Sousa, Mártens Ferrão, J. J. de Azevedo, Nepomuceno de Macedo, Sepulveda Teixeira, Torres e Almeida, Mello e Mendonça, Neutel, Galvão, Infante Pessanha, Alves Chaves, D. José de Alarcão, J. M. de Abreu, Costa e Silva, Frasão, Sieuve do Menezes, Menezes Toste, José de Moraes, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Julio do Carvalhal, Alves do Rio, Sousa Junior, Murta, Pereira Dias, Vaz Preto, Marianno de Sousa, Miguel Osorio, Modesto Borges, Monteiro Castello Branco, R. Lobo d'Avila, Simão de Almeida e Teixeira Pinto.

Entraram durante a sessão — Os srs. Adriano Pequito, Affonso Botelho, Garcia de Lima, Braamcamp, Vidal, Soares de Moraes, Sá Nogueira, Carlos da Maia, Correia Caldeira, Gonçalves de Freitas, Seixas, Arrobas, Mazziotti, Antonio Pequito, Pereira da Cunha, Lopes Branco, A. de Serpa, Zeferino Rodrigues, Barão de Santos, Barão do Rio Zezere, Freitas Soares, Carlos Bento, Ferreri, Cyrillo Machado, Claudio Nunes, Conde da Torre, Fernando de Magalhães, Fortunato de Mello, Bivar, Barroso, Coelho do Amaral, F. M. da Costa, Gaspar Pereira, Gaspar Teixeira, Guilhermino de Barros, Henrique de Castro, Medeiros, Blanc, Silveira da Mota, Gomes de Castro, J. da Costa Xavier, Calça e Pina, J. Cabral, J. Coelho de Carvalho, Simas, Matos Correia, Rodrigues Camara, J. Pinto de Magalhães, Lobo d'Avila, Ferreira da Veiga, José da Gama, Luciano de Castro, Casal Ribeiro, Batalhós, Mendes Leal, Camara Falcão, Camara Leme, Freitas Branco, Rocha Peixoto, Manuel Firmino, Mendes Leite, Placido de Abreu, Ricardo Guimarães, Fernandes Thomás e Thomás Ribeiro.

Não compareceram — Os srs. Eleuterio Dias, Fontes, David, Barão das Lages, Garcez, Oliveira e Castro, Albuquerque e Amaral, Pinto Coelho, Conde da Azambuja, Drago, Abranches Homem, Diogo de Sá, Izidoro Vianna, Gavicho, Bicudo Correia, F. M. da Cunha, Pulido, Chamiço, Cadabal, Carvalho e Abreu, J. Chrysostomo, Fonseca Coutinho, Aragão, Caldeira, Ferreira de Mello, Faria Guimarães, Silva Cabral, Sette, José Guedes, Fernandes Vaz, Figueiredo Faria, Latino Coelho, Alvares da Guerra, Rojão, Silveira e Menezes, Levy Maria Jordão, Affonseca, Martins de Moura, Alves Guerra, Manuel Pinto de Araujo, Charters, Moraes Soares, Seiça e Visconde de Pindella.

Abertura — Á uma hora da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

1.º Declaro que, por incommodo de saude, não assisti ás sessões de 11, 12 e 13 do corrente, e que por este motivo unicamente deixei de assignar o auto de reconhecimento de Sua Alteza o Principe D. Carlos Fernando, como successor da corôa. = Antonio Pinto de Albuquerque Mesquita e Castro.

Mandou-se lançar na acta.

2.º Declaro que, por incommodo de saude, não pude assistir a algumas das sessões passadas, sentindo não estar presente á sessão das camaras reunidas para o reconhecimento do Principe Real o Senhor D. Carlos. = F. I. Lopes.

Mandou-se lançar na acta.

3.º Declaro que se estivesse presente teria votado pela moção apresentada pelo sr. deputado Fontes, na sessão de terça feira 17. = Antonio Bernardo Ferreira.

Mandou-se lançar na acta.

4.º Do sr. Coelho de Carvalho, de que o sr. Pinto de Araujo, por motivos justificados, não pôde comparecer á sessão de hoje. — Inteirada.

5.º Um officio do ministerio do reino, dando os esclarecimentos pedidos pelo sr. Freitas Soares ácerca do exercicio do professor da cadeira de introducção á historia natural dos tres reinos, do lyceu de Vianna. — Para a secretaria.

6.º Do mesmo ministerio, respondendo a um requerimento do sr. Visconde de Pindella, que se vão tirar copias dos relatorios sobre a inspecção aos lyceus nacionaes de Lisboa, Porto, Braga, Evora e Santarem; e logo que estejam promptas, serão enviadas á camara. — Para a secretaria.

7.º Do mesmo ministerio, acompanhando, em additamento, ao officio de 8 de janeiro ultimo os mappas com o resumo das contas de receita e despeza do anno de 1860-1861 das camaras municipaes do reino e ilhas adjacentes. — Mandou-se publicar no Diario.

8.º Do ministerio da fazenda, dando os esclarecimentos pedidos pelo sr. Menezes Toste, relativos á concessão do edificio e cerca do extincto convento de Nossa Senhora da Luz, da Villa da Praia, para estabelecimento de um asylo de mendicidade. — Para a secretaria.

9.º Do mesmo ministerio, dando os esclarecimentos pedidos pelo sr. Bivar sobre a arrecadação, e applicação que tem tido o imposto especial creado para as obras da barra de Villa Nova de Portimão. — Para a secretaria.

10.° Do ministerio da guerra, acompanhando dois autographos de decretos das côrtes geraes, ambos com data de 27 de janeiro ultimo, e que deram logar á publicação das cartas de lei, uma relativa aos primeiros sargentos que serviram a junta do Porto, e outra que auctorisa o governo a confirmar com certas vantagens a patente de commissão de primeiro ajudante do batalhão de milicias do Porto Santo, conferida ao alferes reformado José Urbano de Madeira. — Para o archivo.

11.° Do mesmo ministerio, participando, em additamento ao officio de 3 do corrente, que por decreto de 21 de novembro do anno passado foi nomeado membro da commissão permanente do corpo do estado maior, o major do estado maior Antonio Maria Barreiros Arrobas. — Para a secretaria.

12.° Do mesmo ministerio, acompanhando a consulta do supremo conselho de justiça militar, relativa ao tenente addido ao 1.° batalhão de veteranos Manuel de Almeida do Azevedo e Vasconcellos. — Á commissão de guerra.

13.° Do ministerio dos negocios estrangeiros, participando, em vista de uma nota de interpellação do sr. Lopes Branco, que não obstante haver já sido officialmente declarada sem fundamento a noticia que corrêra sobre a cedencia de uma porção do nosso territorio, e occupação do mesmo por forças estrangeiras, está prompto a responder, em qualquer occasião, á interpellação do mesmo Sr. deputado. — Para a secretaria.

14.° Do ministerio da marinha, acompanhando cento e cincoenta exemplares da conta da gerencia á este ministerio relativa ao anno economico de 1862-1863 e da do exercicio de 1861-1862. — Mandaram-se distribuir.

O sr. Monteiro Castello Branco: — Sr. presidente, quando pedi a v. ex.ª a palavra tinha em vista tratar de um objecto differente d'aquelle que hoje vou considerar em primeiro logar; mas depois aproveitarei a fortuna que hoje tive para tratar de outros assumptos, ainda que a meu pezar, na ausencia do illustre ministro das obras publicas.

Em primeiro logar vou mandar para a mesa uma representação dos parochos do arcyprestado de Monsanto, do districto de Castello Branco, em que pedem a esta camara que, pela commissão dos negocios ecclesiasticos, seja dado quanto antes o parecer sobre a proposta de lei apresentada pelo actual ministro d'esta repartição, que tem por fim estabelecer melhor a dotação do clero, para que a camara possa dotar o paiz com uma lei justa e necessaria. Este é o pedido que fazem os signatarios, e que eu espero a camara ha de aceitar benigna. Devo porém dizer, como membro da dita commissão, que os signatarios estão em equivoco, porque a commissão já deu o parecer, foi impresso, está distribuido e até está na ordem do dia, como sabe toda a camara. Esta declaração porém não invalida o fim ultimo da representação, extingue só a parte que respeita á commissão. Entretanto uno os meus votos aos dos illustres signatarios d'esta representação, para que entre em discussão com a maior brevidade esse tão importante assumpto. É necessario fazer justiça inteira a uma classe respeitavel. É necessario que os poderes publicos velem cuidadosamente pela sorte de todos os funccionarios, e a classe a que me refiro agora é das mais importantes, mas a que é mais mal retribuida, principalmente pelos vexames e desigualdades a que está condemnada pelas nossas leis actuaes. Espero que esta representação ha de ser considerada pela camara pelos motivos ponderosos em que se funda, e porque estou convencido que esta camara está disposta a decidir esta momentosa questão, que ha bastantes annos tem em todos elles sido levantada no parlamento.

O fim sobre que primeiro tinha pedido a palavra, era para fazer algumas considerações em relação á estrada que tem de partir de Coimbra até á Portella, para ligar a provincia da Beira; estrada esta que já está decretada ha muito, e desde março ultimo assentado que a directriz seja pela margem direita do Mondego.

Para isto desejava ver presente o sr. ministro das obras publicas, o qual eu desejava ouvir sobre o que tenciona dizer a respeito d'esta estrada, que quanto antes deve entrar em construcção.

Em duas das sessões anteriores já o Sr. Quaresma fez algumas considerações a este respeito, e uma das vezes teve a fortuna de ver presente o sr. ministro das obras publicas; e eu tambem em uma das sessões passadas mandei para a mesa um requerimento, para que s. ex.ª o sr. ministro das obras publicas mandasse a esta camara as informações relativas á construcção d'esta estrada.

Supposto que ainda não veiu resposta directa d'essa secretaria, comtudo na sessão em que o sr. ministro respondeu ao meu amigo e collega, o sr. Quaresma, por essa occasião disse que = os estudos relativos a essa estrada estavam promptos no conselho de obras publicas =; e desde já declaro que fiquei satisfeito com a resposta de s. ex.ª, porque tornou assim mais publico e official o que eu já sabia, mas particularmente.

O meu desejo é que s. ex.ª dê quanto antes prompta execução aos trabalhos da estrada de Coimbra á Portella, porque, como muito bem disse o sr. Quaresma, a Beira não póde auferir todos os proveitos que das estradas tem de

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tirar, emquanto não estiver prompta a parte da estrada entre Coimbra e a Portella.

Na parte superior da provincia da Beira, em quasi todos os lances da estrada a construcção está adiantada, e é preciso que se complete quanto antes, e toda a demora que houver n'essa construcção causa grave prejuizo para a provincia da Beira.

Outro ponto sobre que desejava tambem chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas é sobre a construcção da estrada transversal da Covilhã a Tondella, tambem decretada na tabella annexa á lei de 16 de julho de 1862. Esta estrada é toda util e necessaria. Mas a parte entre a Covilhã e Gallizes é uma das estradas mais importantes em relação ao paiz.

A Covilhã, como de certo a camara deve saber, não tem uma estrada por onde exportar os seus productos fabris, e emquanto essa estrada não estiver feita a Covilhã está privada de uma facil exportação para os seus productos.

Pedia portanto a s. ex.ª que mandasse quanto antes pio ceder aos estudos d'esta estrada transversal em toda a extensão, porque se ella em alguns pontos não presta immediato proveito á povoação da Covilhã, comtudo presta immediato proveito a outras populações que, senão são fabris, exercem a industria agricola èm tão larga escala que precisam estradas para exportarem os seus productos agricolas. Como não está presente o sr. ministro das obras publicas não farei mais largas reflexões, e peço simplesmente a v. ex.ª que me reserve a palavra para quando s. ex.ª estiver presente.

O sr. Quaresma: — Pedi a palavra para mandar para a mesa o parecer da commissão de verificação de poderes, relativo á eleição de um deputado pelo circulo de Mogadouro.

Repito o requerimento que já por outras vezes tenho feito, isto é, que v. ex.ª consulte a camara sobre se quer que, dispensado o regimento, se entre já na discussão d'este parecer.

Os motivos que tenho para fazer este requerimento são, o não ter havido reclamação alguma contra esta eleição, e o ser feita com toda a regularidade, conforme se vê do mesmo parecer.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o parecer, para depois consultar a camara sobre o requerimento do sr. deputado. É o seguinte:

PARECER

Foram presentes á commissão de verificação de poderes, as actas e documentos relativos á eleição de um deputado, que teve logar no dia 31 de janeiro ultimo, e em virtude do decreto de 13 do mesmo mez, no circulo 51 (Mogadouro). Examinou a commissão com a devida circumspecção todo o processo, e reconheceu que elle correu regularmente, satisfazendo-se aos preceitos essenciaes da lei; ás quatro assembléas do circulo concorreram 2:802 eleitores, e d'estes 2:778 votaram no reverendo D. José Luiz Alves Feijó, bispo eleito de Macau. Nestes termos, é de parecer que seja approvada esta eleição. E como o reverendissimo D. José Luiz Alves Feijó mandou seu diploma legal, entende tambem a commissão que deve ser proclamado deputado.

Sala da commissão, 19 de fevereiro de 1864. = Manuel Alves do Rio, presidente = Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida = Antonio Egypcio Quaresma Lopes ce Vasconcelos = Antonio Vicente Peixoto.

O sr. José de Moraes: — Eu não me opponho a que se discuta o parecer da commissão de verificação de poderes, porque á vista d'elle, vejo que a eleição correu regularmente. Mas desejava que a commissão me elucidasse sobre um ponto em que tenho algumas duvidas; e se nenhum dou illustres membros da commisão se julgar habilitado para me responder, então verme hei na necessidade de pedir a v. ex.ª que me inscreva para quando estiver presente o sr. ministro da marinha.

Tenho em meu poder um officio dirigido a esta camara pelo sr. ministro da marinha, em resposta a um requerimento feito por mim n'esta camara em uma sessão do mez passado, no qual s. ex.ª declara que o ar. José Luiz Alves Feijó foi eleito bispo de Macau.

Desejo saber se o sr. Feijó, sendo approvada a sua eleição, vem tomar assento n'esta camara, e se por esse facto fica a diocese de Macau sem bispo.

O sr. ministro da justiça nomeou o sr. Feijó para bispo de Macau, porque entendeu que a diocese de Macau necessitava de bispo. Ora todos -nós sabemos que os bispos têem obrigação de residirem nos seus bispados, e portanto como é que sr. Feijó, tendo de residir em Macau, ha de ser ao mesmo tempo deputado?

Já succedeu ha tempo o mesmo, em relação a uma diocese do ultramar, refiro-me á de Loanda, que chegou a ter tres bispos eleitos, e não tinha nenhum na diocese. E o resultado era que no orçamento crescia averba dos subsidios dados a todos os tres bispos, e elles não residiam.

Desejo portanto saber se o sr. Feijó, logo que seja confirmada a sua nomeação, larga ou não a sua cadeira de deputados vae para Macau.

Quando aqui se discutiu a lei eleitoral, eu propoz que n’ella se estabelecesse o principio de que, nenhum empregado de justiça do ultramar podesse ser eleito deputado; e propuz isto, lembrando-me dos abusos que havia nas nomeações de varios empregados publicos para o ultramar, os quaes forcejavam por ir para aquelles empregos, não com o fim de exercerem seus encargos, mas tão sómente para diligenciarem o serem eleitos para deputados, fazendo-se eleger muitas vezes pela força que essa auctoridade de empregado lhes dava, e não pelas sympathias dos povos.

(Interrupção de um sr. Deputado.)

O que eu sei é que a carta constitucional mão dá a dignidade de par senão aos bispos do continente do reino; e se o illustre deputado entende que, os bispos do reino tambem não devem ser pares, apresente um projecto de lei n'esse sentido.

Por ultimo digo que se alguma vez eu tiver occasião de propor alguma alteração nas leia eleitoraes, de certo hei de propor uma restricção, em virtude da qual se não dêem casos como o que se dá agora com relação ao sr. Feijó.

Provoco pois uma resposta, ou do governo ou da commissão de verificação de poderes, sobre o ponto a que me referi.

O sr. Presidente: — Faltou ainda agora consultar a camara sobre o requerimento do sr. Quaresma; isto é, te dispensa o regimento, a fim d'este parecer entrar já em discussão, e por isso consulto-a a este respeito.

Resolveu-se afirmativamente.

O sr. J. M. de Abreu: — Eu tinha pedido a palavra antes de se votar o requerimento do sr. relator da commissão, não por ter duvidas sobre a legalidade do processo eleitoral, mas com relação ao ponto a que se referiu o illustre deputado, o sr. José de Moraes.

Eu achava mais regular imprimir-se primeiro o parecer da commissão e depois vota-lo; mas esta questão está prejudicada pela votação da camara. Com relação porém ás duvidas apresentadas pelo sr. deputado José de Moraes, parece-me que convem ouvir alguns esclarecimentos por parte da commissão.

Eu tenho para mim, que emquanto o sr. bispo eleito de Macau não for confirmado pela santa sé pôde ter assento n'esta camara (apoiados); mas parece-me que desde o momento em que for confirmado, temos obrigação de resolver esta questão, que é grave, e entendo que então s. ex.ª tem perdido o seu logar de deputado (apoiados); porque se admittirmos que os bispos do ultramar sejam membros do corpo legislativo, acabou a residencia de todos elles no ultramar (apoiados).

A carta constitucional, como todos sabem, estabeleceu, que só possam ter assento na camara dos dignos pares os bispos, com diocese no continente, não tornando extensiva essa disposição aos bispos das ilhas adjacentes, posto que estas em tudo o mais sejam consideradas como o continente do reino, e apesar dos meios faceis de communicação que temos com aquellas ilhas. E se a carta constitucional não estendeu essa disposição aos prelados das dioceses insulares, como se poderia tornar extensiva aos do ultramar, que não poderiam residir nunca na sua diocese, porque metade do anno estavam na camara, e a outra gastava-se nas viagens de ida e volta, ficando assim aquellas christandades privadas dos seus pastores? Alem d'isso a lei eleitoral, referindo-se aos magistrados do ultramar, na sua letra e espirito reforça esta opinião, porque ali os magistrados judiciaes, que aceitam o logar de deputados, perdem o da magistratura; por consequencia, se este é o seu preceito em relação a estes e outros funccionarios porque se entendeu, e muito bem, quanto a mim, que havia gravissimos inconvenientes n'esta accumulação de funcções, com muito maior rasão os bispos do ultramar não podem exercer as funcções legislativas no continente; porque o magistrado do ultramar póde optar entre as, funcções de deputado e o seu cargo; mas os prelados não, pelos vinculos que canonicamente os prendem ás suas igrejas, o que os obrigam á residencia n'ellas, o que se torna impossivel se elles forem elegiveis, e se lhes permittirem exercer as funcções legislativas. O principio da lei eleitoral foi não privar os povos do ultramar dos magistrados que lhes devem administrar justiça; o mesmo, principio é logica e rigorosamente applicavel aos bispos d'aquelles nossas longinquas possessões para que os fieis d'aquellas christandades não fiquem privados dos soccorros espirituaes, que lhes devem ministrar os seus pastores.

Mas no momento actual, se a eleição, como diz a commissão, é regular; se contra ella não houve protesto nenhum entendo que a eleição do sr. bispo eleito de Macau é regular, e que elle pôde tomar assento n'esta casa; porém des de que for confirmado, parece-me então que a questão fica completamente prejudicada (apoiados) e que não pôde s. ex.ª continuar a ter assento n'esta camara (apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda (Lobo d'Avila): — O nobre deputado que me precedeu preveniu-me no que tinha a dizer para responder ao sr. José de Moraes.

Agora do que se trata é da validade d'esta eleição (apoiados), e estando ella regular parece-me que pôde ser approvada, e depois da confirmação do sr. bispo então trataremos da outra questão, que me parece agora inopportuna.

Aproveito esta occasião para pedir a v. ex.ª que consulte com urgencia a camara, se permitte que entrem já em discussão os projectos nos 13 e 14 relativos ás contribuições predial e pessoal do anno civil de 1864, que já estão dados para ordem do dia, e que são indispensaveis para andamento dos trabalhos; e tambem outro relativo á auctorisação para a cunhagem da moeda de prata, porque já está esgotada a auctorisação anterior que o governo tinha para esse fim.

O sr. Quaresma: — O sr. ministro disse muito bem que = a questão que se suscitou é inopportuna =.

O sr. José Luiz Alves Feijó não está ainda confirmado bispo, quando o for trataremos d'essa questão, mas por emquanto é um cidadão como qualquer outro, e como tal pôde exercer as funcções de deputado.

Portanto agora não temos a fazer senão votar o parecer.

Foi approvado o parecer, e proclamado deputado da nação portugueza o sr. José Luiz Alves Feijó.

O sr. Presidente: — O sr. ministro da fazenda requer que consulte a camara, se permitte que entrem já em discussão, com preferencia a qualquer outro assumpto, os pareceres n.ºs 13 e 14 d'esta sessão, e por isso vou consultar a camara a este respeito. Resolveu-se afirmativamente.

Entrou em discussão o projecto de lei n.° 13, que é o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 13

Senhores. — Á commissão de fazenda foi enviada a proposta do governo n.° 7-K, fixando a importancia da contribuição pessoal para o anno civil de 1864 em 180:000$000 réis, e o contingente que pertence a cada um dos districtos administrativos do continente do reino, na conformidade do artigo 12.º da lei de 30 de julho de 1860.

A commissão, tendo examinado esta proposta, é de parecer que ella deve ser approvada e convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A contribuição pessoal que se ha de vencer no anno civil de 1864 é fixada na importancia de 180:000$000 réis, repartida pelos districtos administrativos do continente do reino, segundo o mappa que vae annexo a esta lei e que d'ella faz parte.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 30 de janeiro de 1864. Belchior José Garcez = João Antonio Gomes de Castro = Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos = Claudio José Nunes = Placido Antonio da Cunha e Abreu = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = Antonio Vicente Peixoto.

Mappa, a que se refere a lei d'esta data, dos contingentes da contribuição pessoal que pertencem aos districtos administrativos do continente do reino, e têem de ser n'elles repartidos em relação ao anno de 1864.

[Ver diário original]

O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra para chamar a attenção do sr. ministro da fazenda sobre varias representações que os corrieiros e donos das casas de bilhares têem dirigido á repartição de s. ex.ª, em que se queixam da excessiva verba que pagam pela tabella da lei da contribuição pessoal. Estas representações entraram na repartição das contribuições directas do thesouro. O sr. ministro da fazenda mandou logo pedir informações ás auctoridades respectivas; essas informações já vieram, no sentido de que as verbas que são exigidas aquellas classes, em virtude da lei da contribuição pessoal, são excessivas.

Quando estava no ministerio o sr. Antonio José d'Avila, os confeiteiros e doceiros da cidade de Coimbra enviaram igualmente á camara uma representação, queixando-se das taxas que lhes eram applicadas.

O sr. Antonio José d'Avila mandou exigir informações das auctoridades competentes, e em vista d'ellas foi diminuida a taxa que lhes exigiam, ficando sem effeito a antiga tabella.

A antiga tabella exigia-lhe tres libras, não se considerando que os confeiteiros e doceiros de Coimbra fazem muito menos negocio do que os de Lisboa e Porto; mas em consequencia da representação que dirigiram ao parlamento ficou reduzida a 4$500 réis; e qual foi o resultado? Foi que o augmento da contribuição subiu e melhorou.

Portanto pedia a s. ex.ª que, tendo em consideração o exemplo que apontei, e attendendo á posição das classes a que me refiro, faça o que for de justiça, sem prejuizo do fisco e em beneficio dos contribuintes.

O sr. Ministro da Fazenda: — Pedi a palavra para declarar a s. ex.ª, o sr. José de Moraes, que o governo terá em consideração a representação a que se referiu. O interesse do governo é fazer, a distribuição o mais justa e equitativa, na qual se conciliem as vantagens do thesouro com as dos contribuintes. Foi approvado o projecto com a tabella annexa.

Passou-se ao projecto de lei n.° 14.

E o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 14

Senhores. — A vossa commissão de fazenda foi presente uma proposta de lei apresentada pelo governo, e tendente a fixar o contingente da contribuição predial, com que o continente do reino deve concorrer no anno de 1864 para as receitas geraes do estado.

Em harmonia com as disposições exaradas n'aquelle documento, temos a honra de submetter, á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A contribuição predial respectiva ao anno civil de 1864 é fixada na importancia de 1.649:211$000 réis, e será repartida pelos districtos administrativos do continente do reino, na conformidade do mappa junto, que faz parte d'esta lei.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, 3 de fevereiro de 1864. = Belchior José Garcez = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = João Antonio Gomes de Castro = Guilhermino Augusto de Barros = Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos = Antonio

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Vicente Peixoto = Anselmo José Braamcamp = Claudio José Nunes.

Mappa, a que se refere a lei d'esta data, dos contingentes da contribuição predial que pertencem aos districtos administrativos do continente do reino, e têem de ser repartidos com relação ao anno de 1864.

[Ver diário original]

O sr. José de Moraes: — Desejo chamar a attenção do sr. ministro da fazenda sobre o seguinte facto.

Ha decimas excessivamente lançadas em algumas partes, por serem, deixem-me assim dizer, as matrizes mal feitas e arbitrariamente. Não entro agora n'esta questão, porque não desejo provocar grande discussão sobre este objecto.

Podia citar outros factos alem deste que vou citar, mas não quero; e só citarei um que se passou com a minha pessoa, que é em relação á decima que está por lançar ainda em alguns districtos, e em outros ainda por pagar.

Eu quiz pagar a decima no concelho do Figueiró dos Vinhos, districto de Leiria, e mandei para ali ordem ao meu procurador para que pagasse a decima, porque eu não tinha recebido os recibos das decimas de 1862-1863. Respondeu me que não podia pagar mais do que a decima de 1861-1862, porque a de 1862-1863 ainda estava por lançar, e mandou me só o recibo de. 1861-1862. Tornei a instar com o procurador, e disse-lhe que não queria dever decimas, que fosse ter com o escrivão de fazenda e lhe exigisse o recibo, pelo menos para mim, da decima que de via. Respondeu-me que o escrivão lhe tinha dito que não podia, porque, como já disse, não estava ainda lançada.

Estou certo de que a culpa não é do sr. ministro, mas na realidade tem sido e é um grande desleixo que uns districtos paguem excessivamente uma decima, e que outros não paguem ou estejam muito atrazados. Isto não só é inconveniente para o thesouro, porque não entram os rendimentos publicos no thesouro, quando devem entrar, mas tambem para os contribuintes que têem poucos meios, porque depois se lhes hão de pedir cumulativamente as decimas de dois ou tres annos. 1

Alem d'este districto podia citar outros, onde se dá esta circumstancia, mas não o quero fazer, porque quero apresentar um facto, o qual ninguem me pôde contestar.

Chamo tambem a attenção do sr. ministro da fazenda sobre o seguinte facto.

Ha na recebedoria do districto de Coimbra uma grande quantidade de decimas que se representam em divida no mappa que vem no fim do anno para o thesouro; mas tal divida não existe, porque refere-se a decima sobre capitães de juros, cujos devedores pela maior parte já foram ha dez e quinze annos julgados fallidos por sentença, e apesar d'isso todos os annos se estão a tirar conhecimentos para pagamentos d'estas decimas, que ha muito estão julgadas incobraveis.

Sei que o sr. ministro me pôde responder — que ha na lei meio para julgar fallidos esses individuos, mas parece-me que s. ex.ª deve tomar uma providencia para que essas dividas sejam julgadas fallidas, mas não n'um processo para cada uma das dividas, porque se acaso fosse assim, o escrivão de fazenda teria que abandonar todo o expediente para formar um processo para cada divida.

Era pois conveniente que s. ex.ª resolvesse, como entendesse esta questão, de maneira que não estejam pejadas as gavetas e estantes das recebedorias dos concelhos com conhecimentos de contribuições que se reputam como valores existentes e que não existem.

Houve no concelho de Condeixa a casa de um capitão mór, á qual se fez um processo por dividas, e concorrendo os credores com artigos de preferencia, parte d'elles não receberam nem capital nem juros; ficaram excluidos do concurso de preferencia, e isto ha talvez vinte annos, e hoje está-se ainda a lançar a decima sobre os juros d'esse capital! Isto é inconveniente ao serviço e é inconveniente mesmo que se apresentem dividas que na realidade não existem.

Espero que o sr. ministro da fazenda tome em consideração estas observações.

Voto o projecto porque não posso deixar de o approvar.

O sr. Coelho de Carvalho: — Não combato o projecto, voto-o, nem podia deixar de o votar porque é de necessidade publica. Mas aproveito a occasião para chamar a attenção do sr. ministro da fazenda sobre a irregularidade que em alguns concelhos tem havido no pagamento dos louvados que fazem as avaliações.

Este negocio é grave e serio, menos pela necessidade absoluta de que esses louvados tenham o pouco vencimento que se lhes deve, pelas avaliações que fazem, do que pelo principio.

Entendo que o estado para ser bem servido, deve pagar pontualmente, e não entorpecer o pagamento dos vencimentos dos louvados. O direito dos louvados á precepção dos interesses que lhes são arbitrados pela lei, pelas avaliações que fazem, é tão sagrado como aquelle que, têem os outros servidores do estado, de exigirem o pagamento dos seus ordenados. Citarei para exemplo o concelho de Lagos.

V. ex.ª sabe perfeitamente que no, concelho de Lagos ha uma verba, não insignificante, a pagar pelas avaliações anteriores. Os louvados têem reclamado, e eu sei mesmo que algumas das auctoridades do concelho têem dirigido as suas requisições ao respectivo delegado todo thesouro, mas informara-me, e ahi não chegam com certeza as minhas reflexões, porque não posso asseverar a sua verdade, que o delegado do thesouro respondêra, para aquelle concelho que = não podia realisar o pagamento do vencimento dos louvados pelas louvações feitas pelas matrizes anteriores, porque isso pertencia a exercicios findos =.

Não sei se é verdade que essa divida pertence a exercicios findos, porque não sei quaes são os annos que se lhes devem; mas sei que se lhes deve, e que não se lhes tem pago.

Chamo para este ponto a attenção de s. ex.ª, e espero que dará prometas providencias para que se pague a cada um d'aquelles louvados, o que se lhe deve, porque n'isto não ha senão justiça. Ha justiça no meu pedido, assim como ha justiça na exigencia dos louvados.

Quero crer que pelos seus muitos afazeres, e por negocios importantes que lhe estão affectos, é que s. ex.ª tem esquecido este negocio, e não seria isso para admirar, porque negocios de uma importancia muito superior devem prender a sua attenção. Eu tinha o proposito de fallar neste negocio antes da ordem do dia, mas como esta occasião se apresentou, chamo para este ponto toda a attenção de s. ex.ª, e espero que muito brevemente os louvados dos diversos concelhos do districto de Faro, a quem se devem vencimentos, a que elles têem direito, serão pagos d'elles com a promptidão que o caso reclama.

Tenho concluido.

O sr. Abilio da Costa: — Pedi a palavra para fazer um pedido igual aquelle que acaba de fazer o sr. Coelho de Carvalho.

Sei tambem que os louvados do concelho de Tábua e do alguns outros concelhos não têem sido remunerados dos seus serviços. Elles por vezes se têem dirigido ao delegado do thesouro; mas ainda ha muito pouco tempo ouvi queixarem se de não terem sido ainda pagos dos seus trabalhos.

Por esta occasião faço tambem outro pedido ao sr. ministro da fazenda. Devo declarar a s. ex,a que os regulamentos tributários não são executados era alguns concelhos, e, sem querer fazer accusações a ninguem, é certo que alguns escrivães de fazenda empregam muitas vezes todos os meios para tolher os recursos aos contribuintes. Peço por consequencia providencias a este respeito.

Tambem peço a attenção de s. ex.ª relativamente á maneira como se fazem as avaliações dos predios urbanos para a contribuição pessoal. Creio que todos nós estamos concordes em que as casas devem ser avaliadas, não segundo o valor da construcção, mas segundo o valor locativo, cujo valor varia muito, segundo a situação de qualquer casa. Uma casa situada n'uma rua ou num bairro tem um valor, e situado n'outra rua ou em outro bairro tem outro valor.

E eu devo declarar que alguns escrivães de fazenda tratam de desvairar os louvados, dizendo-lhes que devem ser arroladas todas aquellas casas, cujo valor de construcção chegar a 5$000 réis. Ora d'esta maneira não ha casa nenhuma que não seja arrolada, e nas aldeias ha muitissimas casas que não podem ter esse valor locativo.

Pedirei tambem a s. ex.ª, e estimarei muito ouvir a opinião de s. ex.ª relativamente a um dos artigos da lei, me parece, de 7 de julho de 1862. E aquella lei que s. ex.ª aqui propoz, em que cortou as attribuições judiciarias que tinham os escrivães de fazenda. Ha um artigo n'essa lei que diz: «Que as relações que apresentarem os informadores louvados não terão valor, não sendo assignadas por esses mesmos louvados».

Da maneira que está feita esta redacção, o que eu posso dizer a s. ex.ª é que em alguns concelhos, e não sei se em alguns districtos, os escrivães de fazenda não têem necessidade de se ligarem ás informações dos louvados. Ora eu conheço muito bem que essas informações podem ser viciosas, podem ser falsas, mas lá está na lei uma providencia, que dá o meio de se nomearem outros louvados, porque eu não posso interpretar a lei de maneira que fique ao arbitrio dos escrivães de fazenda o fazer as relações como elles entenderem.

Posso dizer a s. ex.ª que já fui testemunha de um facto que aconteceu em uma freguezia. Um escrivão de fazenda pediu uma relação de uns predios; os louvados não deram essa relação tão extensa como elle queria; mas depois de muitas instancias do escrivão de fazenda, elles fizeram outra relação do valor dos predios no sentido era que lhes foi exigida.

Portanto peço a s. ex.ª que faça cumprir os regulamentos tributários, porque eu vejo desgraçadamente uma grande tendencia em toda a parte para elles se não cumprirem, e para tolher o recurso aos contribuintes. Se acaso esse artigo, a que me referi, da lei de 1862, relativamente aos informadores, tem essa interpretação que lhe tem sido dada em algumas partes, eu devo declarar a s. ex.ª que a proposta, que foi aqui apresentada, para contar as attribuições dos escrivães de fazenda, é inutil, e que tornámos ao estado em que estavamos antes de 1862, tornando-os juizes officiaes de diligencias e tudo quanto ha.

O sr. Ministro da Fazenda: — A maior parte dos dignos deputados referem-se a casos excepcionaes, que se dão n'uma ou noutra localidade; e portanto eu tomo nota das reflexões que apresentaram, e tratarei de examinar o que ha a este respeito, e de dar as providencias necessarias, na certeza de que o governo não quer senão que se cumpram os regulamentos e as leis. Não quer outra cousa.

Pelo que respeita á divida que se diz existir para com os avaliadores, tambem mandarei examinar esta questão, e aquillo que for devido legalmente, ha de ser pago.

Não se deu ordem, nem se insinuou para parte alguma ás auctoridades que alterassem as avaliações legalmente feitas. Não posso responder de um modo absoluto; n'um ou noutro sitio, n'uma ou outra localidade pôde haver qualquer alteração; é necessario examinar bem o caso especial, — a hypothese, e providenciar a esse respeito.

O governo emprega todos os meios, fazendo recommendações a todas as suas auctoridades, e sendo escrupuloso na escolha dos delegados do thesouro.

Durante o tempo da minha administração tratei de prover os logares de delegados do thesouro que achei vagos, e que eram sete, em individuos competentes, e tratei de activar as inspecções, que é o modo de regularisar este serviço, mandando inspecções extraordinarias para examinar o que se passa; mas é impossivel que este serviço esteja em uma perfeição absoluta; ha de ir-se corrigindo successivamente; e eu tomarei nota do que dizem os illustres deputados, na certeza de que o desejo do governo não é senão de que as cousas corram regularmente, e as leis e regulamentos sejam completamente executados e justiça feita a todos.

Não havendo mais algum sr. deputado inscripto, foi submettido á votação o projecto, e foi approvado com a tabella annexa.

O sr. Ministro da Fazenda Mando para a mesa a seguinte

PROPOSTA

Senhores. — Peço á camara dos senhores deputados que, na conformidade do artigo 3.8 do acto addicional da carta constitucional da monarchia, permitta que o sr. deputado José Luciano de Castro possa accumular, querendo, o exercicio de director geral dos proprios nacionaes do thesouro publico, com o das funcções legislativas.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, 19 de fevereiro de 1864. = Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

Foi logo approvada.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO SOBRE A PROPOSTA DE ADIAMENTO, APRESENTADA PELO SR. SANT’ANNA E VASCONCELLOS, DA PROPOSTA DO SR. PINTO DE ARAUJO ACERCA DAS ELEIÇÕES MUNICIPAES DO DISTRICTO DE VILLA REAL.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Julio do Carvalhal para continuar o seu discurso.

O sr. Julio do Carvalhal: — Eu sinto não ver presente o nobre, deputado a quem queria responder; mas embora elle esteja ausente, como tenho necessidade de continuar no discurso para que tenho a palavra, vou usar d'ella, e continuarei examinando até que ponto, onde e como o governador civil de Villa Real fez pesar a influencia do seu cargo sobre as eleições municipaes.

Creio ter demonstrado na ultima sessão, e demonstrado plenamente, que em sete dos quatroze concelhos do districto, isto é, em metade ou mais de metade do districto, elle não tivera ingerencia por fórma alguma nas eleições. Demonstrado isto, tinha passado a examinar o que acontecêra nos concelhos onde elle tivera alguma ingerencia nas eleições, e estava examinando o que se passára no concelho de Murça, quando deu a hora, e eu pedi a v. ex.ª que me reservasse a palavra para hoje.

Fallára aqui o nobre deputado em uma tentativa que houvera em Murça contra a sua pessoa, tentativa que eu já lastimei, e que ainda torno a lastimar, porque o que eu desejava que houvesse em toda a parte, como verdadeiro liberal que me prezo de ser, era ordem, paz e legalidade (apoiados).

Deu-se esse desgraçado acontecimento, e o nobre deputado attribuiu aquillo ao estado anarchico em que estava o concelho de Murça. Eu vou explicar a rasão por que se deu aquelle acontecimento; não o vou desculpar, vou explica-lo.

O nobre deputado havia sido eleito pelo circulo de Alijó, de que faz parte o concelho de Murça, e não aconteceu de certo n'aquella eleição, como s. ex.ª dissera, o ter sido s. ex.ª hostilisado pela auctoridade; foi o contrario d'isso: o nobre deputado saíu eleito no circulo de Alijó, embora não fosse ali candidato do governo, por proposta do cavalheiro que como logar tenente do governo dirigia as eleições no circulo de Villa Real (apoiados). Isto parece-me que é uma verdade que se não pôde contestar (apoiados). O secretario geral que servia de governador civil apoiou a eleição do illustre deputado, e os administradores dos dois concelhos pelo mesmo motivo apoiaram igualmente a eleição do illustre deputado. Por consequencia não sei para que vem aqui dizer-se que o illustre deputado fôra eleito contra a vontade da auctoridade, quando elle foi eleito por protecção e larga protecção da auctoridade. É certo porém que quando se procedeu á eleição de 1861 aquelle cavalheiro apresentou-se ali como candidato do partido progressista, e como progressista foi eleito por lá, e a camara ha de estar lembrada (sinto que não esteja presente o illustre deputado para dizer isto na sua presença) de que o illustre deputado, o sr. Pinto de Araujo, entrando n'esta camara principiou por aggredir o sr. Antonio de Serpa (muitos apoiados), o sr. Casal Ribeiro (apoiados), o sr. Fontes (apoiados), e todos os cavalheiros que fazem parte da opposição d'esta casa. Em uma das sessões de então esteve dirigindo acres censuras e duras aggressões a alguns dos cavalheiros da opposição, e em outra em que a ordem esteve aqui transtornada, eu como amigo que era do sr. Pinto de

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Araujo levantei-me da minha cadeira, e fui pedir a s. ex.ª que se moderasse, e passando por junto do sr. Fontes, que tambem tenho o sentimento de não ver hoje presente, disse-me s. ex.ª: vejam se evitam estes escandalos, se têem mão n'isto. Mas não tinham passado oito ou dez dias, e estava o sr. Pinto de Araujo aggredindo o governo e os homens que estavam do lado da maioria (muitos apoiados):

Ora, aqui tem v. ex.ª e a camara a rasão por que o sr. Pinto de Araujo foi mal recebido pelo concelho de Murça, porque os eleitores disseram = que elle tinha falseado a procuração que se apresentará com uma côr politica na urna, e que viera aqui representar outra =; e desde então o sr. Pinto de Araujo foi imprudente em apparecer no concelho de Murça, porque s. ex.ª sabia a grande indisposição que ali havia contra elle.

Não desculpo o facto, torno a repetir; já declarei que o lastimava e lastimo-o muitissimo; mas explico o, e foi esta a rasão por que s. ex.ª foi ali mal recebido.

É certo que depois se manteve a ordem, como já disse, e mantida está hoje, porque não conheço concelho algum onde haja mais ordem do que no concelho de Murça.

Censurou o sr. Pinto de Araujo a auctoridade porque não preveniu o estado anarchico em que disse estar o concelho.

E bem visivel sobre toda a gente, que tem pratica dos concelhos ruraes, que ali não ha uma policia regular. O sr. deputado appareceu na praça n'um dia em que estava por lá muita gente. Houve gritos de fóra, deram lhe morras, e o sr. deputado retirou se...

O sr. Ferreira Pontes: — E isso é ordem?

O Orador: — Já declarei que n'esse dia não havia ordem, já lastimei o facto; o illustre deputado conhece-me e sabe que lastimo sempre que se transtorna a ordem (apoiados).

A auctoridade não podia estar em toda a parte; mas é certo que o administrador do concelho apenas soube d'aquelle desagradavel acontecimento correu á casa para onde se dirigia o povo, gritando contra o nobre deputado, e livrou-o de soffrer alguma affronta, que não sei se o povo lhe faria n'aquella occasião, no estado de excitação em que estava. Por consequencia, o nobre deputado em logar de vir aqui censurar o administrador do concelho, homem respeitavel e venerando, manso como os homens que são mansos e pacíficos, e talvez que a sua acção administrativa perca alguma cousa pela bondade do teu coração; em logar de vir aqui censurar aquelle digno cavalheiro, devia vir tecer-lhe louvores, que elle merecia (apoiados).

A opposição foi derrotada em Murça; mas o que causou a sua derrota nem foi a divisão das assembléas, nem foi a influencia que exerceste o governador civil. O que produziu a derrota da opposição no concelho de Murça foi o cofre de oiro que se abriu para comprar os eleitores (apoiados).

O sr. Ferreira Pentes: — E o cofre de mocas. O Orador: — Mas eu preciso de dar uma explicação á camara.

Quando fallo em opposição, não me dirijo á opposição parlamentar, porque n'esta opposição vejo homens respeitabilissimos, a quem venero e estimo tanto como venero e estimo os homens respeitaveis que estão do outro lado, porque respeito o venero as virtudes e o merecimento onde quer que estejam (apoiados).

Entenda-se pois que sempre que me tenho dirigido e continuar a dirigir-me á opposição, é ao corrilho que se chama opposição no districto de Villa Real.

O sr. Ferreira Pontes: — É como os outros.

O Orador: — Não é como os outros. A opposição aqui tem idéas e principios politicos; a opposição no districto de Villa Real não significa senão caprichos e ambições mal soffridas (apoiados), não significa senão orgulhos amarrotados (apoiados). A opposição aqui deseja vencer para governar; a opposição em Villa Real deseja vencer para escravisar, para opprimir (apoiados), para fazer do districto de Villa Real... não sei se diga... uma roça de escravos brancos, como se fazem na America roças de escravos pretos.

Querer-se-ha talvez dizer que a opposição foi derrotada em Murça pela influencia do governador civil? Já o anno passado, e não estava então lá este governador civil, mas sim no districto de Bragança, o partido progressista venceu a eleição da commissão do recenseamento, e este anno tornou a vence-la da mesma maneira. Parece que isto é uma prova de que o partido progressista tinha ali mais influencia e poderio que o partido da opposição (apoiados).

Disse o nobre deputado, que o governador civil, o sr. Jeronymo Barbosa de Abreu e Lima, era malquisto e não tinha influencia no districto. Pelo que toca ao concelho de Murça, não sei se o governador civil tem lá influencia; mas o sr. Jeronymo Barbosa de Abreu e Lima é, sem contestação, a primeira influencia n'aquelle concelho. E eu estou convencido de que os habitantes de Murça quererão que eu os associe aos sete concelhos que desejam a conservação do governador civil. E que o querem provam-o os centenares de assignaturas que eu aqui apresentei na sessão passada pedindo a conservação do digno magistrado (apoiados).

Passando ao concelho de Villa Real pouco direi, porque o sr. Guilhermino de Barros, que já tem a palavra, é de certo não só pelos seus conhecimentos, mas tambem por ter sido testemunha presencial da maneira por que ahi correram as eleições, mais competente do que eu para historiar os factos; entretanto sempre direi alguma cousa.

Na representação apresentada a El-Rei no Porto, diziam os cavalheiros que a apresentaram:

«Em todos os concelhos houveram violencias promovidas pelas auctoridades, e cada um d'elles fará subir á presença de Vossa Magestade as justas queixas do seu aggravo.»

Creio que não aconteceu assim. Não vieram ainda todas as justas queixas dos aggravos. Aqui falhou a promessa dos cavalheiros que se apresentaram a El-Rei, porque não appareceram as tais justas queixas, e o que tem apparecido são demonstrações, assignadas por trezentas e por quatrocentas pessoas de cada concelho, dizendo que = esses cavalheiros faltaram á verdade = (muitos apoiados):

«No concelho porém do Peso da Regua não ha memoria de se ter abusado tanto da força da auctoridade.»

O quer d'aqui se deprehende é que nos outros concelhos em outros tempos houve muitos exemplos de se ter abusado tanto mais (apoiados). E então para que veiu o nobre deputado dizer que = os horrores praticados no districto de Villa Real eram uma cousa como nunca se tinha visto, é como nunca mais se havia de ver? = Tinham se visto muitos, e são os proprios cavalheiros que apresentaram a representação a El-Rei que o confessam. Só no concelho do Peso da Regua se não tinham visto, mas nos outros tinham se visto (apoiados). -

«Senhor. — Houve já uma epocha em que o resultado da uma não era a fiel expressão do suffragio popular.»

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Referem-se a 1861.

O Orador: — Já tinha havido esta epocha. São elles que o dizem, não sou eu (apoiados).

E então faltou á verdade o nobre deputado, dizendo que = nunca se tinham visto horrores tamanhos como se haviam praticado agora = (apoiados).

Encarregaram se os representante; a El Rei de responder á priori ao que o nobre deputado disse aqui (apoiados).

«Em todos os concelhos, disseram os cavalheiros que se apresentaram a El-Rei no Porto, houveram violencias promovidas pelas auctoridades.»

Agora dizem os membros da junta geral do districto que = se reuniram de seu motu proprio e despoticamente =, como ha dias disse aqui o meu nobre amigo, o sr. Joaquim Pinto de Magalhães.

«Aqui, no primeiro concelho do districto, na sede do governo civil, innumeraveis attentados se perpetraram pelas auctoridades e empregados do governo de Vossa Magestade.

«Não nos fazemos cargo de relatar todas as enormes violencias que o funccionalismo e seus agentes exerceram sobre os eleitores, ameaçando uns com decimas e recrutamento, intimidando outros com a prisão, e espalhando o terror por toda a parte.

«O apparato militar, o cruzar da infanteria e cavallaria...»

Ora, quem vir isto: o apparato militar, o cruzar da infanteria e cavallaria, ha de assentar que esteve em Villa Real, por occasião das eleições, um exercito de Xerxes! Estiveram seis homens de cavallaria e nove de infanteria! Eis os exercitos que aterraram os espiritos! (Apoiados).

Alludindo ao que se passou em cada concelho, dizem os cavalheiros, que eram membros da junta geral do districto, o seguinte:

«No concelho de Chaves tambem n'uma assembléa foi arrombada a uma e inutilisadas as listas; e no concelho de Boticas a auctoridade mandou tocar os sinos a rebate, impondo aos povos a sua lista, e fazendo-lhes reunir seus gados, ameaçava de tributar aquelles que se recusassem, exercendo toda a pressão sobre os eleitores.»

Aqui estão mais concelhos, assim como o de Santa Martha, onde se diz = que ai auctoridades tiveram uma influencia muito directa, e que as eleições foram ganhas por violencia =. E aqui já aquelles cavalheiros, que compunham a junta geral do districto, não disseram que foram as violencias em todo o districto; exceptuaram os concelhos de Val Passos, de Montalegre, de Ribeira de Pena, de Mondim de Basto e de Mesãofrio. Iam já em retirada da accusação que os primeiros apresentantes da representação, no Porto, fizeram a Sua Magestade; e por consequencia encarregaram-se de negar, de provar o contrario do que elles tinham dito ao Monarcha para o surprehenderem.

Mas ha mais ainda. Vem agora a Lisboa os outros embaixadores, commissionados, ou não sei como lhes chame...

O sr. Ferreira Pontes: — Estão no seu direito.

O Orador: — como homens podem vir, mas representando se cada um d'elles a si mesmo, e não representando o districto, como vieram dizer que representavam, porque ninguem lhes deu procuração para isso. Representavam-se a si e a mais ninguem (muitos apoiados).

O sr. Ferreira Pontes: —E a mais alguem.

O Orador: — O districto de Villa Real não conhece, outros representantes senão os que estão n'esta casa com o mandato que elle lhes deu (muitos apoiados).

O sr. Ferreira Pontes: — Para o representarem n'esta casa, sim; mas lá fóra podem outros representa-lo.

O Orador: — Não apresentaram procuração de ninguem; e por consequencia não se representavam senão a sr.

Vem estes cavalheiros e dão baixa já ás violencias do concelho de Chaves, do concelho de Boticas e do de Santa Martha. De maneira que actualmente só se praticaram violencias em sete concelhos. Elles proprios o confessam; elles proprios vêm confirmar o que eu tinha dito na sessão passada.

Toma porém a palavra o illustre deputado, o sr. Pinto de Araujo, e dá alta nas culpas ao concelho de Santa Martha, a que elles tinham dado baixa; dá baixa ao de Montalegre, a que elles tinham dado alta (riso); e hão falla já de Chaves, nem de Boticas, nem de mais nada; por consequencia reduz se a cousa já a seis concelhos (apoiados). E eu tenho pena de que não venham mais representações, porque depois de se apresentarem mais duas ou tres, as violencias desappareciam completamente de todos os concelhos (hilaridade).

O sr. deputado, Pinto de Araujo, faz mais dizendo — os signatarios da representação a El-Rei e os membros da junta geral que no concelho de Villa Real tinham havido os maiores horrores; o illustre deputado passa pelo concelho de Villa Real como gato por brasas, muito pouco ou nada disse com relação ás violencias que se diziam praticadas n'aquelle concelho.

Pois se ha alguma cousa que censurar n'aquelle concelho, essa censura compete a quem quiz alterar as assembléas, tirando-as do local onde estavam estabelecidas ha muitos annos; e quem fez isso não foi o governador civil nem o concelho de districto, mas a camara municipal, que queria arrastar os povos aonde ha muitos annos não costumavam ir, nem podiam ir com tanta commodidade como ás assembléas que antes estavam estabelecidas; e o conselho de districto nada mais fez do que restabelecer as assembléas no local, aonde estavam ha muitos annos (apoiados). Se em alguma parte a opposição foi derrotada com muita legalidade, creio que em nenhuma o foi com mais do que nó concelho de Villa Real. (O sr. Guilhermino de Barros: — Apoiado.) Isto custa a soffrer, bem o sei, mas eu tambem já soffri, já fiquei derrotado por mais de uma vez, e resignei me; tem-se paciencia, soffre-se e appella-se para o futuro (riso).

Quanto ao concelho de Santa Martha, o sr. deputado Pinto de Araujo encarregou se de contestar as representações, ou o que asseveraram os signatarios da representação a El-Rei, e o que disseram os membros da junta geral; de modo que, não sabendo de que lado está a verdade, deixo os contradizer uns ao outros, lá se averbam os signatarios da representação com o sr. Pinto de Araujo e o sr. Pinto do Araujo com elles (riso); e passo ao concelho da Regua.

Disse o sr. Pinto de Araujo que = no concelho da Regua as eleições tinham sido por tal fórma violentadas, que os excessos tinham sido de tal ordem, que postas na balança as violencias e excessos praticados no concelho da Regua de um lado e as violencias o excessos praticados em todo o resto do districto do outro, verificar-se-ía que os excessos praticados no concelho da Regua eram muito superiores aos praticados em todos os outros concelhos reunidos =.

Ora vamos a ver o que houve na Regua para depois distribuir por todos os outros concelhos, a ver o que póde pertencer a cada um. Se as violencias praticadas no concelho da, Régua pesarem muito, pôde pertencer alguma cousa aos outros concelhos, mas se posarem pouco, como creio poder provar que pesam, depois da analyse que vou fazer, parece-me que ha de ser pequeno o quinhão que ha de haver a distribuir pelos outros concelhos (hilaridade).

A eleição na casa da camara é uma das grandes accusações que se tem feito ao conselho de districto, por indicar para casa da assembléa a casa da camara, porque é uma casa acanhada e pequena, como dizem os procuradores á junta geral.

«Tendo a capital d'esse concelho um espaçoso templo aonde a eleição se podia e devia fazer, desattendeu á reclamação de cidadãos eleitores que pediam que a eleição se fizesse no dito templo, o ordenou que ella tivesse logar na sala da casa particular que a camara tem alugada para as suas sessões, e que apenas tem de comprimento dez metros e tres e meio de largura, para a qual se entra apenas por uma pequena porta, a que se seguem logo umas escadas estreitas e corredor das mesmas dimensões. A camara, á disposição da qual estava o edificio, era com o governador civil empenhadissima na luta.

«N'aquella sala é que a auctoridade mandou reunir uma assembléa de mais de 600 eleitores!!

«Este era o logar azado para a emboscada eleitoral.»

A camara persuadir se ha talvez que é a primeira vez que se fez isto, e que se fez muito de proposito para os fins de violentar os eleitores e evitar que se exercesse livremente o direito eleitoral; pois não foi assim. Aqui está um documento que o prova:

«Ill.mo e rev.mo sr. — Diz Manuel Joaquim da Costa Santos, proprietario d'esta villa, que para mostrar aonde lhe convier, precisa que v. s.ª lhe passe por certidão, se desde que está parochiando esta freguezia de S. Faustino, do Peso da Regua, se fizeram na igreja matriz eleições de deputados ou camararias, ou se na casa dos paços do concelho. Outrosim designando o ultimo anno em que se fizeram as referidas eleições na sobredita igreja. — Pede a v. s.ª, ill.mo e rev.mo parocho, se digne passar a certidão pedida. = E. R. M.ce = Manuel Joaquim da Costa Santos.

«Certifico que desde 1848, que vim para parocho d'esta freguezia, só uma vez, no tempo em que era administrador d'este concelho Antonio Osorio de Figueiredo, é que me lembra fazer se n'esta igreja uma eleição de deputados, não me lembra comtudo o anno em que foi; emquanto á eleição camararia não me lembra que se fizesse vez alguma n'esta igreja.

«S. Faustino, do Peso da Regua, 11 de janeiro de 1864. = O reitor, João Julio Guedes Pinto.

«Reconheço a assignatura retrò, de que dou fé. Peso da Regua, 11 do janeiro de 1864. Em testemunho de verdade. = Manuel José de Oliveira Lima.»

Já se vê que não foi uma invenção o mandar fazer a eleição na casa da camara, era uma cousa que estava assentada ha muitos annos, e por esses mesmos que hoje accusam os outros de fazerem lá a eleição (apoiados).

Fallou se muito na imprensa nas representações apresentadas no Soberano, e fallou o illustre deputado, n'esta casa, dos terrores produzidos pela tropa na assembléa da Regua, o fez-se d'elles especial menção na representação que foi apresentada a El Rei, no Porto, dizendo-se:

«Sobre uma mesa collocada no meio da rua publica, cercados de tropa, ouvindo as ameaças dos sicarios, e sob o receio da dispersão por meio da força, nós os eleitores a quem a coragem não faltou para não fugir ante estas horrorosas prepotencias, não podemos fazer a Vossa Mages-

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tade uma minuciosa descripção das scenas de ferocidade e de vergonha, que esta villa está com espanto e assombro observando!»

Não posso comprehender onde estivesse a coação. Pois a tropa coagiu os e vieram para o meio da tropa lazer o seu protesto! (Muitos apoiados).

Foi tambem grande motivo de terror na Regua, o estarem dois homens segundo disse o illustre deputado, á porta da assembléa armados de clavinas e cartucheiras á cinta. Devo observar á camara que taes homens não appareceram lá armados, e emquanto não vem um documento que mandei agora buscar, permitta-me a camara que diga, que pessoa que para mim é um cavalheiro perfeito, e que era, um dos candidatos da lista opposicionista da Regua, me disse que taes homens armados lá não estavam. Este cavalheiro era o sr. Amaral, muito conhecido e amigo dos srs. Pintos de Magalhães, de Alijó, e conhecido como homem de muita honra por muitas pessoas que aqui estão. Encontrei-me por acaso com este cavalheiro em Amarante, quando eu vinha para Lisboa, e disse-lhe: «Tenho ouvido dizer tanta cousa por um e outro lado contra as eleições do concelho da Regua, que peço que me esclareça sobre o que houve». Esse cavalheiro disse-me: «Houve muita paixão de um e outro lado; muita provocação de um e outro lado, mas tem-se mentido muito em toda esta questão». Isto são expressões de um amigo que eu relato, taes quaes elle m'as contou.

Perguntei-lhe: «E quanto a esses dois homens que estavam armados á porta da assembléa, foi isso verdade?» Respondeu-me: «A porta estavam dois empregados de policia, porque o espaço era pequeno e entrando para dentro todos os que quizessem entrar e que não tinham direito a votar, quando viessem os eleitores não podiam entrar». Mas estavam armados? Respondeu-me: «Não sei se tinham armas escondidas, mas não se lhes via nenhuma».

Ora este cavalheiro respeitabilissimo era incapaz de faltar á verdade, e era, como disse, um dos candidatos á lista opposicionista da camara da Regua. O sr. Amaral sustenta o que disse em toda a parte. Tenho inteira fé na sua honra e cavalheirismo.

Mas não é só o testemunho do sr. Amaral, é o testemunho de mais alguem. Aqui está o que dizem os dois officiaes que commandaram a força armada que foi requisitada para o concelho da Regua...

«Ill.mo sr. — Em resposta aos quesitos, sobre os quaes V. s.ª no seu officio n.° 229, de 30 de novembro ultimo, me pede declare o que se me offerecer, sou a dizer:

«Que não vi gente armada a vedar a entrada a individuo algum, que tivesse de votar para vereadores da camara municipal na assembléa da Regua no dia 22 de novembro do corrente anno.

«Que durante a eleição a força militar de infanteria, que por essa occasião ali se achou debaixo do meu commando, esteve collocada em tres differentes pontos, dos quaes não sé avistava a casa em que se estabeleceu a assembléa eleitoral; apenas uma patrulha de cavallaria girou por algum tempo na rua em que fica a dita casa.

«Que pela auctoridade administrativa não me foi requesitada força, nem n'esta auctoridade percebi intenção de a empregar, para carregar sobre os individuos que estavam reunidos junto á casa da assembléa e n'aquellas proximidades.

«E que emquanto no referido dia 22 me conservei na villa da Regua não vi praticar violencias ou outros quaesquer actos attentatorios da segurança individual.

«De quanto fica exarado pôde V. s.ª fazer o uso que lhe aprouver, para o que é d'esta fórma por mim auctorisado.

«Deus guarde a v. s.ª Quartel em Lamego, 2 de dezembro de 1863. — Ill.mo sr. administrador do concelho do Peso da Regua. = João Antonio Ferreira dos Santos, capitão do regimento n.° 9».

«Destacamento de infanteria n.° 13 em Villa Real. — N.° 8. — Ill.mo sr. — Para satisfazer ao que v. s.ª me pede no seu officio de 1 do corrente, relativo aos factos que se deram na noite de 21 para 22 de novembro passado, e bem assim n'este mesmo dia, direi:

«Que depois da força do meu commando estar aquartellada me foi requisitada pelo sr. administrador do concelho, seriam oito para nove horas da noite, uma força para obstar a uma desordem produzida por uns tiros que se dizia serem disparados das janellas de um armazem; e mandando logo uma força de oito soldados e um cabo, que permaneceram n'esse local até pela manhã, a ordem foi immediatamente restabelecida.

«Que não vi que o sr. administrador do concelho empregasse meios violentos servindo-se da força do meu commando para afugentar os eleitores da uma, pelo contrario o vi servir-se de meios conciliadores quando existia alguma altercação.

«Que a força do meu commando esteve durante o dia 22 collocada no adro do Senhor do Cruzeiro, d'onde se não via a casa da assembléa eleitoral; e não me consta que a ordem fosse alterada n'essa dia.

«Que não recebi ordem do sr. administrador do concelho para invadir á força a casa da companhia nem outra qualquer, nem me consta que isso tivesse logar.

«Que em vista da maneira por que os animos se achavam exaltados, haveria, talvez, a lamentar muita desgraça se não fosse a presença da força armada.

«D'esta minha declaração pôde V. s.ª fazer o uso que lhe aprouver.

«Deus guarde a v. s.ª Quartel em Villa Real, 5 de dezembro de 1863. — Ill.mo sr. administrador do concelho do Peso da Regua. = Augusto Cesar Saraiva, capitão do regimento n.° 13.»

Por consequencia, ao testemunho do sr. Amaral, de um cavalheiro tão respeitavel como elle é, é que é incapaz de faltar á verdade, vem juntar-se o depoimento de duas testemunhas maiores de toda a excepção, que não são suspeitos, dois officiaes distinctos, não só porque o Seu cavalheirismo, o pundonor e brios militares lhes vedava faltar á verdade, mas porque não quereriam de certo carregar com a responsabilidade moral que lhes resultava se a occultassem ou desfigurassem, e porque fôra do alcance das paixões que se agitavam na Regua, não tinham interesse em occultar o que soubessem.

, Ahi tem a camara o que elles disseram, e eram incapazes de dizer uma cousa que não fosse exacta (muitos apoiados). Está provado por consequencia que a força armada se não ingeriu nos actos eleitoraes (apoiados); está provado que não haviam taes homens armados á porta da assembléa (apoiados), e emquanto á coacção que exerceu a força armada, vou ler á camara um documento que tambem não deixa de ser curioso. E um artigo escripto e assignado pelo proprio cavalheiro que fez o protesto em face da força armada no dia da eleição. E quer v. s.ª saber o que elle vem dizer agora?

«Não temiam os eleitores que se repetissem de dia as infamias commettidas nas trevas da noite, porque ora dia e estavamos ao abrigo de força armada que, repetindo se aquellas infamias, tinha obrigação de as repellir; a falta pois d'este apoio fez com que não podessem impedir a assignatura do protesto, e muito menos o fazer-se; tentasteis impedi lo, mas faltou vos a força e o vinho que tivesteis para no escuro da noite commetterdes as infamias que, por serem já de todos assas sabidas, não repito aqui.»

Até aqui era a força armada que os coagia, e aqui dizem que = não temiam nada, porque estavam ao abrigo da força armada = (riso). Portanto aqui tem tambem comprovado, porque provado estava até á saciedade pelo depoimento dos dois officiaes que commandavam a força na assembléa da Regua, que ella não violentou nem coagiu ninguem (apoiados).

O concelho do Peso da Regua tinha sido dividido em tres assembléas; uma no Peso da Regua e as outras em Fontellas e Sedellos.

N'estas duas ultimas as cousas correram com toda a regularidade, porque a opposição contava vencer, e então não lhe convinha perturbar a ordem; por conseguinte não houve protestos; e é por esta rasão que vem o illustre deputado dizer que = nas duas assembléas a opposição tivera immensa maioria =; o tendo immensa maioria nas outras, admirava se que na Regua só tivesse a opposição quatro votos; mas se o illustre deputado fizesse entrar na casa da assembléa os 200 ou 300 eleitores que protestaram, e elles votassem como podiam votar e ninguem lhes estorvou que votassem, já a lista da opposição não apparecia só com 10 votos... (muitos apoiados).

O sr. Bernardo Ferreira: — Não os deixaram lá entrar.

O Orador: — Os taes trabucos é que os não deixaram lá entrar?...

(Interrupção do sr. Bernardo Ferreira que se não percebeu.)

O Orador: — E mais rasoavel o illustre deputado pedir a palavra e depois combater (apoiados); é mais regular do que estar a interromper uns aos outros, porque nunca interrompi pessoa alguma...

O sr. Bernardo Ferreira: — Estou no mesmo direito, visto que os outros tambem interrompem.

O Orador: — Nunca interrompi ninguem, e appello para o testemunho, de todos os membros d'esta casa...

Vozes: — É exacto.

O Orador: — Ha no concelho da Regua entre muitos cavalheiros respeitaveis, um respeitabilissimo, que é o sr. Camillo de Macedo (apoiados); e quando este cavalheiro disser que a cousa é branca, pôde acreditar toda a gente que ella é branca; mas se disser que ella é preta, é porque ella é preta, e ninguem a faz branca por mais voltas que lhe dêem (apoiados). O sr. Camillo de Macedo é um cavalheiro tão respeitavel, que o sr. Joaquim Pinto de Araujo; irmão do sr. Manuel Pinto de Araujo, nosso collega, mesmo no meio d'aquella grande excitação em que estava a Regua, no meio de acaloradas discussões e artigos insultantes que se dirigiam de parte a parte, appellou para o testemunho do sr. Camillo, e disse: «O que disser o sr. Camillo de Macedo é a verdade». Quer a camara saber o que diz o sr. Camillo de Macedo? Eu lh'o digo. Vae ver o que diz um homem insuspeito, para cujo testemunho se appellou.

«Sr. redactor. — Na correspondencia do sr. Joaquim Pinto de Araujo, datada de 1 do corrente mez, e publicada no seu acreditado jornal, com relação aos acontecimentos eleitoraes, que n'esta villa tiveram logar na noite de 21 para 22, e dia 22 de novembro ultimo, appella-se para o meu testemunho.

«Serei pois tão franco como verdadeiro na narração d'elles, por isso que os presenciei na maior parte, acompanhando quasi sempre n'aquella noite o sr. administrador d'este concelho.

«Próximo á noite de 21 foi este senhor avisado de que por ordem do chefe da opposição se reuniam na casa da companhia e nos armazens do sr. Torres, situados no extremo da rua da Ameixeira, uma numerosa porção de gente armada, com o fim de, á hora aprasada, assaltar a casa da camara.

«Em consequencia pois, d'este aviso, fez o sr. administrador reunir de prompto na casa da administração alguns cabos de policia sob as ordens do seu regedor e muitos dos seus amigos, entre os quaes me achava eu tambem, com o fim determinado de obstar a qualquer tentativa contra a casa da camara, e como supporte fez postar n'uma casa, pouco distante d'aquella, as quarenta praças de infanteria n.° 13, que pouco antes tinham chegado a esta villa, a requisição do presidente da assembléa para a manutenção da ordem no dia da eleição camararia.

«Dispostas e prevenidas assim as cousas, ás oito horas da noite, pouco mais ou menos, saíu o sr. administrador do concelho acompanhado tão sómente pelo sr. Cypriano Canavarro e por mim, em observação, dirigindo-nos para a rua da Ameixeira, aonde estão os armazens do sr. Torres, e para onde se dizia continuava a recolher-se gente armada. Um pouco adianto d'estes armazens, defronte dos quaes tinha ficado o sr. Canavarro, encontrámos logo dois homens armados com direcção aos mesmos, sendo um d'elles, por mim bem conhecido, tanoeiro do sr. Torres.

«O sr. administrador intimou-lhe a voz de presos fazendo-os seguir para o corpo da guarda de infanteria n.° 13, porém a pouca distancia deitaram a fugir e não foi possivel alcança-los.

«Sendo confirmadas por este facto as noticias da gente armada n'aquelle ponto, entendeu o sr. administrador fazer marchar para defronte dos armazens um piquete de oito soldados e seis homens dos que estavam na casa da administração, com o fim de obstar á continuação da reunião de mais gente armada n'aquelle sitio.

«Quando ali chegou esta força foram-lhe disparados de dentro dos armazens do sr. Torres, segundo affirmaram todos os soldados e homens que os acompanharam, dois ou tres tiros de espingarda, aos quaes responderam immediatamente com uma descarga, que felizmente não feriu ninguem, terminando este conflicto sem nenhuma outra consequencia desastrosa, devido tão sómente aos esforços do sr. administrador do concelho e de alguns seus amigos que ali correram logo para esse fim. Receiando o sr. administrador, por similhante provocação, a continuação de outros attentados por parte da opposição, e sabendo ao mesmo tempo que, alem d'aquellas duas forças reunidas na casa da companhia e armazens do sr. Torres, se achava ainda outra postada proximo á ponte de Jugueiros, resolveu, em harmonia com as instrucções do chefe superior do districto, requisitar mais sessenta praças de infanteria n.° 9.

«D’esta diligencia, prevenida já pelo telegrapho, foi encarregado seu proprio irmão; e quando este, seriam onze horas da noite pouco mais ou menos, atravessava na barca da passagem o rio Douro, foram lhe disparados alguns tiros. Se das immediações da casa da companhia, ou se de outro qualquer sitio, não o posso affirmar porque o não vi, nem com certeza o pude ainda saber; mas o que é certo, e que ninguem poderá com verdade negar, é que os tiros lhe foram disparados. Em uma das occasiões em que o sr. administrador, acompanhado de alguns seus amigos, rondava nas proximidades dos armazena do sr. Torres, appareceu na frente e na direcção de Jugueiros um cavalleiro, precedido de um homem a pé, a quem mandaram fazer alto para ser reconhecido. Não obedecendo á intimação marchou para a frente, e quando já voltava para a rua do Cruzeiro lhe foi disparado da retaguarda um tiro. Este cavalleiro era o sr. Joaquim Pinto de Araujo, que vinha de casa do sr. Torres.

«Pouco depois d'este acontecimento e quando saia da casa dos srs. Henriques, moradores no primeiro andar da casa da camara, e atravessava a pé a rua por entre a gente que ali estava, segundo affirma meu filho Camillo, que tambem ali se achava, foi ameaçado por dois homens armados que lhe apontaram as armas; mas foi promptamente soccorrido pelo dito meu filho, e nenhum insulto mais soffreu. Não desculpámos nem podemos louvar o acto, antes o estigmatisamos, no entretanto o sr. Araujo foi imprudente em se apresentar n'uma occasião de conflicto tal, armado de um rewolver, entre pessoas que sabia lhe não eram affeiçoadas e a quem por muitas vezes e pouco tempo antes tinha insolitamente offendido pela imprensa. Bastante depois appareceu proximo á casa da companhia o tal pobre carreiro do Salgueiral, que não ía do trabalho para sua casa, como diz o sr. Araujo, mas que vinha da sua casa do Salgueiral reunir-se á força da casa da companhia, como elle mesmo confessou, e quando o prendiam e quizeram desarmar resistiu tenazmente, e foi então que lhe deram uma bofetada e uma coronhada, da qual resultou um leve ferimento. Mais tarde tambem appareceu em frente da casa da camara outro homem, empregado no serviço do sr. Antonio Bernardo Ferreira, armado com duas pistolas e um punhal, com o fim de espionar o que se passava n'aquelle sitio; foi preso e desarmado depois de bastante resistencia, e quando era conduzido para o corpo da guarda de infanteria n.° 13, que era proximo, fugiu na direcção da casa do mesmo sr. Ferreira, á porta da qual foi novamente preso. Vi lhe sangue no nariz procedido de alguns murros que lhe deram quando resistiu. Mas alguns homens appareceram durante a noite que, por inermes e parecerem insuspeitos, ninguem se embaraçou com elles.

«Seriam seis horas da manhã do dia 22 quando chegaram a esta villa as sessenta praças de infanteria 9, requisitadas pelo sr. administrador. Com esta força e a de infanteria n.° 13, que aqui já se achava, procedeu o sr. administrador a uma busca na casa da companhia e nos armazens do sr. Torres, e ainda ali encontrou, apesar de já se terem evadido muitos, para mais de cento e cincoenta homens, segundo o que muitas pessoas e o proprio sr. administrador me affirmou, as quaes por essa occasião a pedido meu não foram presas.

«A casa da camara, que durante a noite tinha sido guardada e occupada pelos cabos de policia e amigos do sr. administrador, foi na madrugada do dia 22 evacuada, não apparecendo dentro d'ella mais ninguem armado, e foram fechadas as portas. As oito e meia horas da manhã foram estas de novamente abertas, porque junto ás quaes já se achavam todos os eleitores das freguezias de Covelinhas e Gallafura, com pequenissima excepção, uma grande parte

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dos d'esta villa, de Canellas e Loureiro, e alguns de Villa Secca de Poiares e Villarinho dos Freires.

«As nove horas precedeu se á formação da mesa preparatoria, á qual ninguem da opposição concorreu. Na occasião em que se tinha de proceder á formação da mesa definitiva foram postados á porta da casa da camara dois homens, Pedro Maria Cardoso e seu irmão Custodio Maria Cardoso, não armados, como diz o sr. Araujo, mas completamente inermes, com recommendação de evitarem a entrada tão só e unicamente ás pessoas influentes da opposição da freguezia de Godim, que ali não eram votantes, a fim de evitar que se renovassem as scenas da noite anterior.

«A ninguem mais era vedada a entrada da casa da camara, aonde todos os eleitores podiam votar como quizessem, e tanto assim que os meus particulares amigos, os srs. Avellar e Penetra, duas das mais notaveis influencias da opposição, ali estiveram por algum tempo proximos da mesa eleitoral, correndo todo aquelle acto até final sem o menor incidente.

«Depois das dez horas appareceram á porta exterior da camara os srs. Champalimaud e Pacheco, influencias da opposição, mas não votantes n'esta assembléa, aos quaes, pelas rasões já dadas, foi negada a entrada, seguindo-se por isso altercações entre estes senhores e o sr. administrador do concelho. Em seguida e com permissão do mesmo sr. administrador resolveram aquellas e outras influencias eleitoraes da opposição fazer no meio da rua e quasi defronte da casa da camara um manifesto, que fizeram assignar por todas as pessoas que o quizeram, não havendo n'este acto a menor coacção, nem sequer um pequeno dito de provocação.

«A força de infanteria, que tinha sido requisitada para manutenção da ordem e socego publico, achava-se postada em tres differentes pontos, parte no meio da rua da Alegria, outra parte no largo do Cruzeiro, e a restante proximo á casa do sr. Ferreira.

«Nenhuma d'estas forças, aonde se achavam postadas, via nem podia ser vista pela gente que estava na casa da camara ou proximo a ella.

«Uma patrulha de dois soldados de cavallaria girava desde o cimo da rua da Alegria até ao largo do Cruzeiro.

«Finalmente, desde a madrugada do dia 22 até á noite houve o mais perfeito socego, e nem o mais levemente foi alterada a ordem.

«Eis os factos acontecidos, e tão singela como verdadeiramente narrados, não receiando por isso que com justiça possam ser desmentidos. Em vista pois do que deixo dito, quem foram os sicarios? D'onde partiu a provocação dos conflictos que se deram na noite de 21 para 22?

«Para que, e com que fim, se reuniu gente armada na casa da companhia, nos armazens do sr. Torres e proximo á ponte de Jugueiros?

« Os srs. Francisco José da Silva Torres, Antonio Bernardo Ferreira e todos os mais signatarios da representação e manifesto mentiram ao Rei. Digo com voz firme e bem alto, para que seja sabido por todos, que mentiram ao Rei, quando na representação dizem que foram disparados tiros para duas casas particulares da sr.ª D. Antonia Adelaide Ferreira, e quando alteram exagerando os acontecimentos da noite de 21 para 22. Que mentiram ao Rei, quando no manifesto dizem que homens armados de bacamarte apontam ao peito dos eleitores ao manifestarem a intenção de querer entrar na casa da camara, e outras que taes parvoíces. Que faltou á fé da verdade o escrivão que reconheceu as assignaturas do manifesto como feitas na sua presença no dia 22, quando bastantes dos signatarios não eram por elle conhecidos, e outros o assignaram dias depois.

«Que faltou á fé da verdade quando reconheceu assignaturas de cruz de pessoas que sabiam escrever, e não assignaram o tal manifesto.

«Que faltou á fé da verdade, finalmente, quando reconheceu assignaturas de outras pessoas que nunca o subscreveram.

«Para estes mentirosos e falsarios, sr. redactor, é que eu peço e espero um exemplo de alta moralidade.

«Régua, 6 de dezembro de 1863. — Camillo de Macedo.

«(Segue-se o reconhecimento.)»

Ora o tabellião faltou tanto á fé da verdade, que lá está mettido em processo. O tabellião, que reconheceu nomes de individuos que não tinham assignado, lá está mettido em processo. O sr. Pinto de Araujo estranhou muito, e eu tambem estranho, que fossem dados como tendo votado homens que ali não estavam. Realmente é um grande escandalo, se tal foi, não sei se o foi, duvido que o fosse, mas se o foi é um escandalo que não desculpo nem perdoo, porque não desculpo escandalos de qualidade alguma, venham d'onde vierem (apoiados). Mas não será tambem escandalo virem assignados no manifesto, que se apresentou á augusta pessoa de Sua Magestade, nomes de individuos que nem tinham assignado nem dado procuração para assignarem por elles? O tabellião praticou um acto de deslealdade e de má fé reconhecendo nomes de individuos que não conhecia, mas quem assignou esses nomes e depois os apresentou ao desgraçado escrivão d'aquelle concelho foi tão miseravel como o escrivão.

Os nobres deputados disseram que se ouvisse bem ler esta carta, mas se ella prova que houve algumas violencias, prova tambem por quem foi feita a provocação, e prova tambem que não houve taes homens armados á porta da igreja, e são já quatro testemunhas que dizem que não foram armados, porque não haviam taes homens armados. No entretanto o sr. deputado disse aqui em alto e bom som, que toda a camara ouviu, que estavam dois homens armados de carabinas e com cartuxeiras á cinta; e o caso é muito diverso.

A camara fará o juizo que quizer dos documentos que acabo de ler, e eu passo agora para o concelho de Villa; Pouca de Aguiar. O concelho de Villa Pouca de Aguiar, foi dividido em tres assembléas, uma na capital do concelho, outra na freguezia de Pensalvos, e outra na freguezia do Bornes.

Principiarei pela analyse do que se estabeleceu na cabeça do concelho. N'esta assembléa a opposição contava vencer por uma immensa maioria. E por consequencia pelas rasões que já demonstrei, e porque a opposição contava vencer a eleição, a ordem não foi nem levemente alterada, correu tudo muito regularmente. Não houve protesto, nem houve dissabor algum n'aquella assembléa, nem mesmo uma expressão que estranhasse por parte da opposição qualquer acto menos legal que lá se praticasse, sendo esta assembléa presidida pelo proprio chefe da opposição no concelho de Villa Pouca de Aguiar, por um homem que de certo não deixaria escapar a mais pequena nullidade ou illegalidade da parte da auctoridade sem protestar contra ella. Pois elle proprio confessou á noite que a ordem e a legalidade não tinham sido nem levemente offendidas. Quer dizer, nem levemente offendidas pelo lado dos governamentaes, porque pelo lado da opposição não deixou de se tentar a fraude e illudir a verdade.

Trago isto para responder ao sr. deputado Pinto de Araujo, que quiz fazer uma censura ao delegado da comarca, chamando a attenção do sr. ministro da justiça para o que elle tinha praticado.

Trago isto para certificar á camara e ao sr. ministro que o delegado do concelho de Villa Pouca de Aguiar é um dos magistrados mais rectos, mais imparciaes e mais cumpridores do seu dever que conheço. Mas o delegado do concelho, comquanto seja progressista, nem sequer foi votar, imitando o honrado juiz, que tambem fez o mesmo.

O administrador do concelho saíu de Villa Pouca, porque foi chamado a Bornes, onde tinha sido alterada a ordem, e levou comsigo a força de infanteria n.° 13 que estava em Villa Pouca. Quando perto do pôr do sol, estando ultimada a recepção das listas, era preciso fechar a uma, o presidente da assembléa, em logar de metter os cadernos dentro da uma, metteu os no bolso: era para que se não perdessem talvez. Tres ou quatro eleitores a quem o acto pareceu feio não consentiram que os levasse, e principiaram 1 a altercar. Foram chamar o delegado, dizendo lhe que estava para haver desordem na casa da assembléa. O delegado foi, o estranhou acremente ao presidente da assembléa o querer levar os cadernos para casa, e exigiu-lhe que os mettesse na urna como mandava a lei.

Aqui está todo o acto ou o unico acto do delegado nas eleições. E vem fazer-se uma accusação ao sr. ministro da justiça contra um magistrado que se houve d'esta maneira; que amigos da legalidade!! E vem dizer-se que o juiz estranhara ao delegado publicamente o ter praticado aquelle acto. O juiz era incapaz de o estranhar, porque é um homem que honra a magistratura portugueza, é o sr. Maximiano Osorio (apoiados), que esta casa conhece muito bem, porque já foi deputado, e deixou um nome honroso (apoiados).

Portanto o juiz era incapaz de estranhar ao delegado o acto que tinha exercido como eleitor na assembléa, embora não votasse.

Mas fosse como fosse, o que é certo, é que qualquer individuo tinha o direito de fazer aquillo, comtanto que fosse eleitor d'aquella assembléa. Aqui tem a camara o que houve na assembléa de Villa Pouca.

Vamos á assembléa de Pensalvos. É uma certa assembléa que se organisou, segundo se diz, para arrastar os eleitores a 18 kilometros de distancia, e estes eleitores eram os da freguezia de Tellões, que se diz queriam arrastar para longe de suas casas com o fim de os privar de votar! E fallou-se n'isto como de um grande escandalo. Pois não foi escandalo nenhum, porque Pensalvos era mandada para Tellões pela camara, e tão longe é de Tellões a Pensalvos como de Pensalvos a Tellões...

O Sr. Borges Fernandes: — Affirmo ao illustre deputado que nunca Pensalvos foi a Tellões.

O Orador: — E a mim parece-me que sim; porque na divisão feita pela camara não só ía Pensalvos para Tellões, mas ía tambem Parada de Monteiros, que é legua e meia mais longe de Tellões do que Pensalvos. E para que se faça verdadeira idéa d'estas distancias, direi que Tellões, por exemplo, é no terreiro do Paço, Pensalvos aqui e Parada de Monteiros em Santa Izabel. O que se queria era arrastar estas duas freguezias a Tellões para que não votassem. E o que fez o conselho de districto, que já disse que é a quem compete julgar? O conselho de districto decidiu que a assembléa se collocasse no centro, e o centro era Pensalvos.

E quem queria privar os eleitores do direito de votar? Era a camara municipal ou o conselho de districto? (Apoiados.) Esta camara o avaliará (apoiados).

Agora quanto á accusação que se faz da mesa da assembléa de Pensalvos se ter formado antes da hora, direi que me parece que esta accusação não tem o menor fundamento. A camara não sabe nem V. ex.ª qual era a hora em que de ha annos costumavam formar-se as mesas no concelho de Villa Pouca. Pois asseguro-lhes que não consta ha muitos que n'aquelle concelho a hora seja aquella que a lei marca, mas a do meio dia, uma hora e duas. E querem saber a rasão por que se fazia isto? E porque nas eleições dos deputados, no systema des grandes circulos, o concelho de Villa Pouca estava no costume de ser uma especie de reserva, um não chega, a que os traficantes para supprir a falta que havia nos outros concelhos (hilaridade) — e então fazia-se a eleição mais tarde — dizia o chefe do districto ou os seus: «Precisam-se tantos votos para fulano». Batia-se com a varinha de condão, e a uma de Villa Pouca respondia: «Ahi vão mais tantos para fulano. Ahi vae ainda mais tantos para fulano. Prompto.»

Aqui está a rasão por que ali se fez sempre a eleição tarde, e nunca se formou a mesa da assembléa menos do meio dia e uma hora. Por consequencia os da freguezia de Tellões, em logar de II em á hora de se formar a mesa, foram á hora em que costumavam ir, e então quando lá chegaram acharam a mesa formada, porque não querendo o presidente formar a mesa na hora que a lei manda, os eleitores nomearam outro presidente, e este formou a mesa com os eleitores que estavam presentes. Quando chegaram os eleitores da freguezia do Tellões a mesa já estava formada, e estava se já votando. Chegaram os senhores de Tellões, e disseram: «Nós não votámos n'essa mesa, não a queremos, vamos formar outra»; e assim fizeram; de modo que haviam duas mesas; os eleitores que eram de um partido entregavam as listas n'uma das mesas, e os do outro na outra mesa (riso). Agora que me digam — qual é a mesa intrusa? É a primeira ou é a segunda? (Riso.)

Talvez me digam, como disso o sr. Pinto de Araujo, formou se a mesa antes de dar a hora legal, adiantaram o relogio. Não tenho aqui as provas documentaes, mas breve hão de ser presentes á camara, porque esta questão é incidental de adiamento, porquanto a questão principal ainda ha de vir, ha de ser presente á camara, pois sei que fôra remettida ao governo uma justificação de seis parochos d'aquella assembléa, declarando que =a mesa fôra formada depois das dez horas =. Ha um unico parocho, que é o de Tellões, que não fez esta declaração. São seis contra um.

Disse o sr. Pinto de Araujo: «Votaram mortos e ausentes, não n'esta assembléa, n'outras». Pois n'esta assembléa se não votaram mortos, votaram ausentes, isto é, votaram homens que estão parochiando fôra do concelho ha dez annos; apesar d'isto lá foram votar... (Riso.)

Vozes: — Ouçam, ouçam.

O sr. Borges Fernandes: — E porque têem lá o seu domicilio politico.

O Orador: — A lei não permitte isso...

O sr. Borges Fernandes: — Permitte.

O Orador: — Pôde ter domicilio politico num concelho um homem que está parochiando ha muitos annos fóra desse concelho? Para mim é novo...

O sr. Borges Fernandes: — E da lei.

O Orador: — Pois tem ou pôde ter domicilio politico um parocho que está a 7 e 8 leguas de distancia do local aonde foi votar, e que está effectivamente parochiando?...

O sr. Borges Fernandes: — Tem e pôde ter.

Vozes: — Pôde, tanto em relação aos parochos, como a qualquer cidadão.

O Orador: — Não creio.

Mas vamos á assembléa de Bornes. A assembléa de Bornes tambem é accusada de violencias e de mais violencias.

Disse-se que = na assembléa de Bornes foi roubada a uma, que houve tiros no irmão do administrador do concelho, e não sei que mais violencias =.

Ora eu vou dar conta do que se passou na eleição da assembléa de Bornes, e sei tão bem o que se passou n'esta assembléa como sei o que se está passando agora na camara, e o que se passa em minha casa quando lá estou.

N'esta assembléa tentou a opposição transtornar a ordem publica, e projectou transtorna-la porque contava perder lá a eleição. No dia da eleição, pela manhã cedo, foram mandados pelos chefes da opposição homens armados para os logares proximos do local da assembléa. Os que eram votantes deixaram lá as armas e foram para a assembléa, e os que o não eram foram vigiar aonde era preciso. O sr. Paulo Canavarro, chefe da opposição e irmão do administrador (digo isto porque se fallou aqui no irmão do administrador), é quem assistia aquella eleição, e por parte da opposição fiscalisava o acto eleitoral. O presidente da assembléa, eram dez horas da manhã, fez a proposta para a formação da mesa; a assembléa rejeitou a. O presidente renovou a mesma proposta, a assembléa tornou a rejeita-la, e a final vieram a um accordo. O sr. Canavarro, com os chefes do partido progressista, combinaram n'uma mesa mixta; formada essa mesa mixta, assentaram começar os trabalhos. Tinham votado duas ou tres freguezias, e foram dizer a um dos chefes da opposição, que estava fóra, que o reitor da freguezia de Bornes estava dando e tirando listas na igreja; este cavalheiro, chefe da opposição, entrou imprudentemente com um punhal na mão pela igreja dentro, ameaçando com elle o reitor da freguezia!

Eis o primeiro acto de provocação e transtorno de ordem que houve na assembléa de Bornes.

Vieram outros, deitaram-lhe a mão ao punhal e tiraram-n'o para fóra da igreja sem lhe fazer mal nenhum, sem responder á violencia com a violencia.

N'estas circumstancias a povoação de Bornes agitou-se, porque é muito amante do seu parocho. Constando que elle estava para ser assassinado, houve toques de sinos, e reuniu-se a povoação toda, até as mulheres e os rapazes, para lhe acudirem.

Comtudo, no meio d'esta agitação, é certo que cão foi perturbada a ordem da eleição, e que a mesa continuou invariavelmente recebendo as listas dos eleitores que se approximavam da mesa.

Em consequencia d'estes toques de sinos e do alarma que causou o facto de ter aquelle individuo puxado pelo punhal para o parocho, houve alguem da opposição que correu a Villa Pouca, e foi dizer ao administrador do concelho que acudisse, porque havia em Bornes uma grande desordem.

O administrador do concelho deixou a assembléa de Villa Pouca, onde estava em cumprimento dos seus deveres, e foi com a tropa que ali se achava acudir á desordem. Chegou a Bornes; e quando lá chegou estava a ordem restabelecida.

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Continuou pois a recepção das listas até ao pôr do sol.

Mas, ao pôr do sol, a apposição, que queria ver se achava um ensejo para fugir com a uma, perguntou: «Para onde ha de ir agora a uma?» Responderam-lhe os progressistas: «Fica em cima da mesa, e a porta aberta para a guardar quem quizer; e pede-se ao commandante da força que mande para ahi uma escolta». «Nada, a uma ha de ir para casa do padre Lino». «Não consentimos, ha de ficar em cima da mesa». E o sr. Paulo Canavarro, fingindo que saia fóra por outro qualquer motivo, foi buscar tres homens armados de punhaes é pistolas, seus creados, e entrou com elles pela igreja dentro. (Vozes: — Ouçam, ouçam.)!

O presidente, que estava de combinação com elle, pegou na urna, deu-a a um cavalheiro que era mesario; esse passou-a a outro, esse outro cavalheiro passou-a ao sr. Paulo Canavarro, e esse aos seus creados, que a trouxeram para fóra. (Vozes: — Ouçam, ouçam.)

Mas o parocho gritou, a povoação correu e a uma foi-lhes tirada e posta em cima da mesa. Ficou ali toda a noite com a porta aberta e com a força que lá estava a guarda-la, sob responsabilidade do commandante d'essa força.

E querem saber quem era o commandante? Era pessoa insuspeitissima para a opposição do districto de Villa Real.

Diz a junta geral do districto, na sua queixa a Sua Magestade:

«Bastou que um digno official, que é proprietario na capital do districto e que estava aqui com licença, mostrasse repugnancia a ouvir os manejos da auctoridade, para ser logo mandado recolher ao corpo.»

Pois foi este official, que commandava a força, quem guardou a uma da assembléa do Bornes.

Então como é que a uma foi roubada? Não sei. Deixaria elle roubar a uma, uma cousa que lhe foi entregue á sua guarda? Não o posso suppor e ninguem o crerá.

Era o sr. Luiz Antonio Ribeiro, um bello official a quem eu muito prezo e estimo, pessoa em nada suspeita para a opposição do districto de Villa Real, quem commandava essa força, e a quem os progressistas entregaram a uma para a guardar. E já se vê que o general não nomeou o sr. Luiz Antonio Ribeiro para este serviço, para o privar de influir nas eleições; nomeou-o para elle, porque precisava dos officiaes do corpo para lhes entregar forças que mantivessem o socego publico nas assembléas onde tinha de haver a eleição, para onde lho foi requisitada.

De Villa Pouca vieram tambem tres ou quatro cavalheiros pedir a demissão do governador civil, e remedio para essas grandes desgraças que houve n'aquelle concelho. Mas a esses tres cavalheiros responde um nós abaixo assignados de 600 o tantos eleitores, cuja assignatura foi reconhecida por um tabellião.

Dizem estes eleitores (leu).

Seguem-se seiscentas e tantas assignaturas. A tres que vieram dizer que o districto não queria o governador civil, responderam seiscentas e tantas que o querem.

Do concelho de Val Passos, de que fallei na ultima sessão, recebi hoje outra representação no mesmo sentido, e é assignada esta representação por cavalheiros respeitabilissimos, principiando pelo juiz de direito, o sr. José de Moraes Carvalho, e a maior parte dos homens distinctos do concelho, inclusivè alguns chefes da opposição; elles aqui estão assignados. São perto de quatrocentas assignaturas, e entre ellas as dos srs. Ayres Pinto de Magalhães Barreiro, João de Sousa Gavaias e José da Conceição Martins.

Estes, tres ultimos cavalheiros são effectivamente os chefes da opposição na cabeça do concelho. Por consequencia, uma de duas, ou é tão nojenta a perseguição que se faz ao sr. Barbosa do Abreu e Lima e tão revoltante o que d'elle se tem dito, que arrastou estes homens a protestar contra isso, ou então morreu a opposição no concelho de Val Passos. Uma das duas cousas ha de ser infalivelmente (apoiados). Estes e muitos outros homens notaveis da opposição no concelho de Val Passos estão assignados na representação.

O illustre deputado, o sr. Borges Fernandes, teve a bondade de negar o que eu dizia quando fiz uma comparação relativamente ao caminho a seguir para a assembléa de Tellões. Agradeço a attenção do illustre deputado, mas vamos a ver como é que a camara municipal de Villa Pouca designava as assembléas...

O sr. Borges Fernandes: — Eu disse que Pensalvos nunca foi a Tellões.

O Orador: — Eu leio a designação das assembléas (leu).

Tellões equivale a estar no Terreiro do Paço, Pensalvos aqui, e Parada de Monteiros fica legua e meia abaixo de Pensalvos. Por onde passavam os eleitores de Parada de Monteiros? Por Pensalvos...

O sr. Borges Fernandes: — Não, senhor, nunca por lá foi 0 caminho.

O Orador: — Eu acho esteril e inconvenientissimo estar a discutir aqui estas questões (apoiados), principalmente depois do que disso o nobre ministro do reino acho inconvenientissimo (apoiados), porque não é n'este fôro que deviam ser discutidas as eleições municipaes (apoiados). E se nós formos a discutir aqui todas as eleições municipaes, atrás das eleições municipaes hão de vir as eleições parochiaes; e as opposições, quaesquer que sejam, têem então encontrado uma mina inexhaurivel para impedir a marcha dos trabalhos do parlamento, e para o não deixar fazer cousa nenhuma (apoiados).

Eu não venho aqui desculpar quaesquer actos do governador civil de Villa Real, porque nem tenho licença d'elle para o desculpar, nem elle consente que o desculpem por cousas que praticou segundo a sua consciencia: eu venho aqui narrar os factos e dizer a verdade conforme entendo, conforme a sei, sem ter a pretensão de pedir perdão ou desculpa pura ninguem. Se ha peccado, o governo o examinará, e o saberá quando lhe for presente o inquerito a que mandou proceder (apoiados); e eu, que nunca pedi perdão para os meus peccados politicos, porque me diz a consciencia que os não tenho, tambem não venho pedir perdão para os peccados de ninguem (apoiados).

O illustre deputado, o sr. Manuel Pinto de Araujo, ameaçou nos com uma revolução, e perguntou ao ministerio — se não sabia o estado em que se achava o districto, só não temia a anarchia, se não temia uma revolução? Nem o governo pôde temer uma revolução, nem eu a temo, nem ninguem a pôde temer. Quem é que ha de fazer a revolução? Quem hão do seduzir? Querem comprar o general? Não ha oiro que o compre (apoiados). A força armada tem muito brio para se não deixar seduzir, para se não vender (apoiados). O povo? Pois os nobres opposicionistas contam com o povo do districto? Quem é que o quer? Projectam compra lo? Tambem o queriam comprar para a eleição, e elle cuspiu lhe no oiro e calcou o aos pés: se o quizerem comprar para a revolta, ha de arrojar-lh'o ás faces com a mão da indignação. O povo de Trás ás Montes não se vende por dinheiro, captiva-se com fineza.

Eu peço ao governo que se lhe for preciso tire de lá o genere! e a tropa, não deixe nenhum soldado de linha, mande os veteranos guardar as cadeias, e mais nada, que eu respondo pela tranquilidade do districto, respondo, digo o alto e bom som. E o soldado do Mindello que responde pela tranquillidade do districto. Ameaçara com a revolução? Pois tentem-a, que hão de soffrer as consequencias (apoiados).

Eu já disse que acho esteril e inutil este debate, e que o mais rasoavel era esperar-se pelo inquerito, para depois se entrar, mais miudamente e em vista dos factos e das provas, n'esta questão (apoiados). Por consequencia voto pelo adiamento, germinando assim o meu discurso. (Vozes: — Muito bem.)

Peço desculpa á camara de qualquer expressão menos agradavel que soltasse, porque o meu fim não é offender nenhuma pessoa, nem aqui nem em outra parte (Vozes: — Muito bem, muito bem); e agradeço a benevolencia com que me trataram. (Vozes: — Muito bem, muito bem.)

(O orador foi cumprimentado por muitos srs. deputados.)

O sr. Ministro da Marinha (Mendes Leal) (sobre a ordem): — Pedi a palavra para mandar para a mesa duas propostas de lei. A primeira, creando um logar de interprete da lingua china em Macau. A segunda, modificando as penas de degredo na India, assim para os gentios como para os christãos.

Se v. ex.ª permitte, aproveitarei a occasião para declarar á camara que recebi, ha poucos dias, tres notas de interpellação, uma do sr. Sieuve de Menezes, e duas assignadas pelos srs. Arrobas e Rodrigues da Camara, deputados por Cabo Verde, e que estou prompto para responder a ellas. Não 6 agora occasião, mas ámanhã, antes da ordem do dia, eu me apresentarei para responder a essas interpellações e a quaesquer outras que se tiverem de fazer. Vozes: — Muito bem.

O sr. Ministro da Justiça (Gaspar Pereira): — Tambem recebi uma nota de interpellação do nobre deputado, o sr. Mártens Ferrão, ao mesmo tempo acompanhada de um requerimento para virem certos documentos.

Os documentos apresentaram m'os hoje copiados, são um pouco volumosos, e ámanhã hão de ser remettidos. Logo que cheguem á mesa, irei declarar que estou prompto para responder á interpellação. Nesta interpellação hão de tomar parte tambem os srs. Quaresma e José Maria de Abreu, e é relativa a um despacho que se fez na camara ecclesiastica de Coimbra.

Ha uma outra, parece-me que do sr. Sieuve de Menezes, relativamente á ausencia de um juiz. Eu irei á mesa dar-me por prompto para responder a todas as interpellações que te têem dirigido, na occasião que o sr. presidente determinar que ellas tenham logar, e creio que é na prorogação da sessão que costumam ter logar as interpellações; mas em qualquer occasião estou prompto para responder a ellas.

O sr. C. J. Nunes: — Mando para a mesa o parecer das commissões de legislação e de fazenda, ácerca da proposta apresentada pelo governo para a abolição do monopolio do tabaco no continente do remo e ilhas adjacentes.

O sr. Presidente: — Faltam poucos minutos para dar a hora. A ordem do dia para a sessão de ámanhã é a mesma que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram quasi quatro horas da taras.

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