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SESSÃO DE 25 DE FEVEREIRO DE 1876

Presidencia do ex.ª sr. Joaquim Gonçalves Mamede

Secretarios — os srs.

Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos Barão de Ferreira dos Santos

SUMMARIO

Apresentação de representações, requerimentos, propostas de -lei, etc. — Ordem do dia: discussão e approvação do pertence ao n.°8 da commissão de fazenda, relativamente ás propostas apresentadas pelos srs. deputados Pereira de Miranda e Pinto Bessa quando se discutiu o projecto para o estabelecimento da caixa dos depositos. — Discussão do projecto n.º 41, auctorisando a camara a vender em hasta publica o terreno e materiaes que lhe foram concedidos por decreto de 27 do fevereiro de 1867, com todos os melhoramentos e edificações que presentemente tem, ficando a mesma camara obrigada, dentro do praso de cinco annos da data da venda, a construir um edificio proprio para o estabelecimento de uma escola primaria.

Presentes á chamada 42 senhores deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Adriano Sampaio, Osorio de Vasconcellos, Rocha Peixoto (Alfredo), Braamcamp, Avila Junior, A. J. Teixeira, Cunha Belem, Pereira Carrilho, Barão de Ferreira dos Santos, Correia da Silva, Carlos Testa, Conde da Graciosa, Eduardo Tavares, Francisco Mendes, Mouta e Vasconcellos, Van-Zeller, Paula Medeiros, Palma, Illidio do Valle, Barros e Cunha, J. M. de Magalhães, Ribeiro dos Santos, Vasco Leão, Gonçalves Mamede, J. J. Alves, Matos Correia, Cardoso Klerck, Pereira da Costa, Namorado, Moraes Rego, Pereira Rodrigues, Mexia Salema, Luiz de Lencastre, Luiz de Campos, Bivar, Pires de Lima, Mello Simas, Cunha Monteiro, Pedro Jacomo, V. da Arriaga, V. da Azarujinha, V. de Carregoso, V. de Villa Nova da Rainha.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Pereira de Miranda, Antunes Guerreiro, A. J. Boavida, A. J. de Seixas, Arrobas, Rodrigues Sampaio, Augusto Godinho, Mello Gouveia, Neves Carneiro, Zeferino Rodrigues, Conde de Bertiandos, Forjaz de Sampaio, Filippe de Carvalho, Vieira das Neves, Fonseca Osorio, Francisco Costa, Camello Lampreia, Guilherme de Abreu, Jeronymo Pimentel, Ferreira Braga, Dias Ferreira, Guilherme Pacheco, Luciano de Castro, Pinto Bastos, Lourenço de Carvalho, Freitas Branco, Manuel d'Assumpção, Rocha Peixoto (Manuel), Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Mariano de Carvalho, Pedro Franco, Pedro Roberto, Julio Ferraz, Thomás Ribeiro, V. de Moreira de Rey, V. de Sieuve de Menezes.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Agostinho da Rocha, Teixeira de Vasconcellos, Cardoso Avelino, Barjona de Freitas, Falcão da Fonseca, Ferreira de Mesquita, Sousa Lobo, Vieira da Mota, Francisco de Albuquerque, Pinto Bessa, Quintino de Macedo, Correia de Oliveira, Figueiredo de Faria, J. M. dos Santos, Nogueira, Julio de Vilhena, Camara Leme, Faria e Mello, Alves Passos, D.Miguel Coutinho, Placido de Abreu, Ricardo de Mello, V. de Guedes Teixeira.

Abertura — Á uma hora e meia da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Do ministerio do reino, acompanhando os documentos pedidos pelo sr. deputado Adriano Sampaio, com referencia a uma herança em S. Thomé.

A secretaria.

2.º Do mesmo ministerio, participando que serão opportunamente remettidos á camara os documentos solicitados pelo sr. deputado Pedro Franco, os quaes foram pedidos ás respectivas auctoridades.

A secretaria.

3.° Do mesmo ministerio, acompanhando, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Pires de Lima, a representação dos povos de Valmaior ácerca das minas do Caima, e a informação dada pelo governador civil de Aveiro sobre a mesma representação.

Representações

1.ª Da camara municipal de Alter do Chão, pedindo que seja convertido em lei o projecto que tem por fim proceder a uma nova divisão comarca, e que não seja approvado o projecto de reforma administrativa apresentado pelo sr. deputado Namorado, na parte relativa á extincção dos concelhos. (Apresentada pelo sr. deputado Mello Gouveia.)

2.ª Da camara municipal do concelho de Soure, pedindo que seja reformada a circumscripção judicial d'aquella comarca. (Apresentada pelo sr. deputado Mexia Salema.)

A commissão de legislação civil.

Requerimentos

1.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, seja enviada a esta camara uma relação dos juizes de direito da magistratura do ultramar fallecidos em serviço nas colonias desde 1834 até hoje. = O deputado pela Figueira, Luiz Lencastre.

2.° Requeiro que, pelo ministerio da justiça, seja mandada com urgencia copia da representação do reverendo prelado de Angra ácerca da suppressão de dois capellães na sé de Angra do Heroismo. = Visconde de Sieuve de Menezes — Pedro Roberto Dias da Silva.

Foram remettidos ao governo.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. — A vida do funccionario publico no nosso paiz é quasi sempre cheia de amarguras e dissabores para em recompensa de um trabalho insano receber uma triste e mesquinha remuneração.

Mas, apesar da verdade manifesta d'esta asserção, muitas vezes o funccionalismo portuguez tem sido accusado de constituir um enxame de zangãos, que só chupa os favos da colmeia social, sem contribuir para o fabrico de mel, que ella produz.

Cremos que esta asserção injusta para o funccionalismo em geral, mais immerecida se torna a respeito dos escrivães de fazenda, que estão onerados com um trabalho insano, que só póde ser apreciado por quem tiver perfeito conhecimento d'este ramo de serviço publico.

Mas não é só o excessivo trabalho que torna precaria a situação d'estes funccionarios, muitas outras circumstancias aggravam a sua triste posição na sociedade.

É grato saborear os deliciosos fructos da civilisação, mas a todos amargam os sacrificios que o progresso impõe aos povos cultos e se traduzem no imposto, qualquer que seja a fórma da sua distribuição.

Ora, consistindo a principal missão dos escrivães de fazenda na fiscalisação e arrecadação do imposto em todas as suas manifestações, é evidente que o exercicio d'este cargo se torna odioso e ingrato aos olhos do povo.

A vida do escrivão de fazenda consome-se quasi sempre entre um trabalho insano e uma luta permanente contra as injustas pretensões do contribuinte, que, salvas rarissimas excepções, procura eximir-se o mais possivel á justa distribuição do imposto.

A verdade d'esta affirmativa salta aos olhos de todos, mas os desgostos, os dissabores e as decepções que este viver attribulado faz soffrer, só podem ser devidamente

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apreciados por quem consumiu uma grande parte da sua existencia n'estas attribuladas e incessantes lutas.

Como consequencia necessaria d'este viver agitado resulta o repentino enfraquecimento das forças physicas e a prematura decrepitude das faculdades intellectuaes, porque não ha energia nem fortaleza de espirito que se não gaste depressa no embate d'estas tempestades moraes. E todavia a classe dos escrivães de fazenda não tem diante de si um futuro; o militar que no ultimo quartel da vida se sente extenuado de forças, tem como recompensa de seus preteritos serviços á patria, a reforma; o magistrado, a aposentação; o professor de qualquer categoria, a jubilação; os empregados das alfandegas, incluindo os guardas e muitos outros servidores do estado, a reforma; os escrivães de fazenda, a caridade publica.

Os tabelliães, contadores; revedores e escrivães do juiz de direito permaneceram por muito tempo nas precarias circumstancias em que actualmente se acham os escrivães de fazenda, mas a carta de lei de 11 de setembro de 1861, sem crear onus alguns para o thesouro, estabeleceu uma providencia que muito melhorou a situação d'esses empregados.

Essa providencia foi a faculdade concedida a esses funccionarios de se fazerem substituir nos seus officios por pessoa idonea e de sua confiança, quando enfermidades physicas ou moraes tornarem impossivel, ou pelo menos muito difficil o exercicio pessoal das funcções do seu cargo.

É igual faculdade que em nome da justiça e equidade se deve conceder á classe dos escrivães de fazenda.

D'este beneficio não resulta encargo algum para o estado e até de ahi lhe póde provir manifesta vantagem, porque em vez de ser servido por um funccionario physica e moralmente decrépito, falto de forças para o bom desempenho do seu cargo, deve encontrar um servidor no vigor da vida, cheio de zêlo e energia no desempenho das suas funcções.

Portanto, senhores, temos a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São applicaveis aos escrivães de fazenda as disposições da carta de lei de 11 de setembro de 1861, com as modificações seguintes:

§ 1.° Os escrivães de fazenda que por sua avançada idade, impedimento physico permanente ou temporario legalmente comprovado se impossibilitarem de exercer o seu cargo, podem fazer-se substituir no desempenho de suas funcções por um ajudante por elles proposto com responsabilidade civil solidaria, informação do respectivo delegado do thesouro e approvação do governo.

§ 2.° Os escrivães de fazenda que pretenderem aproveitar-se da faculdade concedida no § antecedente, devem requerer pelo ministerio da fazenda, direcção geral das contribuições directas, a concessão d'esta substituição que só póde ser permittida depois de se verificar, em exame feito por dois peritos na presença do administrador do concelho e delegado do procurador regio, que o requerente está impossibilitado de exercer as funcções do seu cargo.

§ 3.° O escrivão de fazenda que pretender fazer-se substituir tem o direito de escolher para seu ajudante pessoa da sua confiança e mudar de ajudante quando o primeiro perder a sua confiança.

Art. 2.° Os escrivães de fazenda podem escolher para seus ajudantes individuo d'entre os escripturarios dos escrivães de fazenda ou qualquer outra pessoa da sua confiança, sendo essa escolha approvada pelo governo.

Art. 3.° No caso de impedimento moral, legalmente comprovado, será o officio provido, independente de requerimento do interessado, pelo governo em pessoa idonea, debaixo das condições seguintes:

§ unico. Se o escrivão impedido tiver mais de quinze annos de serviço, receberá do nomeado metade do rendimento do officio; se porém tiver menos de quinze annos, receberá sómente a terça parte.

Art. 4.° Cessando o impedimento moral, de que falla o artigo 3.°, entrará novamente em exercicio o empregado que estiver impedido.

Art. 5.° O ajudante, nas condições designadas no artigo 2.°, que tiver tres annos de bom serviço fica com o direito de ser preferido para a primeira vacatura de escrivão de fazenda de concelho de 3.ª ordem que vagar depois do fallecimento do individuo por quem estava servindo.

Art. 6.° O governo fica com a faculdade de mandar proceder a novos exames, no escrivão de fazenda substituido, todas as vezes que assim julgar conveniente, e cassar a licença para a substituição por ajudante, quando por esse exame ou por outro qualquer meio se verificar ter cessado o impedimento.

Art. 7.° Esta lei não altera nem modifica as disposições da de 11 de setembro de 1861, respectivamente aos empregados a que ella se refere.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara, 23 de fevereiro de 1876. = O deputado, Augusto Zeferino Rodrigues = Visconde de Sieuve de Menezes = Fortunato Vieira das Neves.

O sr. Bivar: — Mando para a mesa, e desejo que seja remettida á commissão de fazenda, uma representação, na qual o digno vigario capitular da diocese do Algarve pede a esta camara que o seminario episcopal de Faro seja relevado de, pagar a quantia de 2:000$000 réis, em que a repartição de fazenda o collectou da decima de juros, ou que se lhe conceda este pagamento em prestações, visto a impossibilidade em que aquelle estabelecimento de instrucção e beneficencia está, de satisfazer de prompto a importancia das decimas em que foi collectado, por isso que a sua dotação consiste principalmente no subsidio que annualmente lhe é dado pelo cofre da bulia da santa cruzada.

Creio que a camara, attendendo a esta representação, praticará mais um acto da sua costumada justiça.

O sr. Dias Ferreira: — Mando para a mesa uma representação dos membros da associação commercial e proprietarios de marinhas da ria de Aveiro, pedindo para ser modificada a lei de 20 de março de 1875, na parte em que tributou o sal vendido para consumo, eliminando o imposto de 2 */a réis em alqueire, e que o sal vendido para consumo seja isento de tributos.

Peço a V. ex.ª que mande esta representação á commissão competente.

O sr. Carrilho: — Mando para a mesa o parecer do commissão de fazenda sobre o orçamento da receita da estado para o exercicio de 1876-1877.

O sr. J. J. Alves: — Mando para a mesa uma representação que fazem a esta camara os alugadores de pannos e sacos, em que ponderam, que estando comprehendidos na 4.ª classe, sob n.º 437.° da tabella B, annexa ao regulamento da contribuição industrial de 28 de agosto de 1872, e achando-se a taxa exagerada em comparação dos pequenos lucros que auferem de tão pequena industria, pedem para passar á 6.ª classe.

Peço a V. ex.ª a bondade de enviar á commissão respectiva esta representação, esperando eu que ella, apreciando maduramente as considerações dos requerentes, lhes faça a justiça que merecem, mudando-os, se não para a 6.ª, pelo menos para a 5.ª classe, onde de certo ficarão menos aggravados.

Apresento tambem um requerimento de João Guilherme Teixeira, segundo official da contabilidade do hospital da marinha, em que declara que, tendo sido prejudicado na sua carreira por decreto de 26 de dezembro de 1868 no que lhe estava garantido por decreto de 20 de outubro de 1859, pede para ser indemnisado, auctorisando-se a sua promoção á categoria immediata.

Peço igualmente a V. ex.ª que mande este requerimento

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á, commissão de marinha, a fim de o tomar na consideração que merece. j

O sr. Namorado: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho da Chamusca, pedindo para que sejam convertidos, em lei os projectos que apresentei na sessão de 25 de janeiro ultimo, para serem creadas dezoito novas comarcas e para a colonisação do Alemtejo.

N'esta bem elaborada exposição faz ver aquella camara quanto é justo que se attenda aos seus interesses, por isso que aquelle concelho é composto de cinco freguezias com mais de 8:000 almas espalhadas por uma área de 79:000 hectares, podendo no futuro conter um numero superior a 20:000 almas. Demais, os habitantes de algumas freguezias têem que percorrer 40 kilometros e mais atravez de charnecas inhospitas, valles e outeiros asperos, e que transpor um rio caudaloso, o que ás vezes é difficil e perigoso, para chegar á sede da comarca.

Peço a V. ex.ª que mande publicar esta representação no Diario do governo.

O sr. J. M. Magalhães: — Mando para a mesa um requerimento de Antonio Maria Ferreira, escripturario da repartição de fazenda do concelho da Batalha, pedindo augmento dos seus vencimentos, attendendo ás precarias circumstancias em que se acha em virtude do augmento do preço dos generos alimenticios e da renda de casas, sendo insufficientes os seus ordenados para poder acudir á sua sustentação.

Mando tambem um requerimento de Henrique de TresKow, tenente reformado do exercito, no qual pede á camara que se lhe torne extensivo o beneficio concedido aos officiaes estrangeiros pela portaria de 11 de agosto de 1856.

Peço a V. ex.ª que mande estes requerimentos á respectiva commissão, a fim de dar o seu parecer, tomando na devida consideração o allegado pelos supplicantes, que julgo dignos de serem attendidos.

O sr. Mexia: — Mando para a mesa um requerimento de D. Maria Antonia Gomes de Magalhães, viuva do general de divisão Luiz Maria de Magalhães, em que pede uma pensão, em vista das rasões que allega.

Parece-me de justiça este pedido, e peço a V. ex.ª que mande dar a este requerimento o destino conveniente.

O sr. Eduardo Tavares: — Aproveito a occasião de estar presente o sr. ministro da fazenda para dizer algumas palavras a respeito de uma pretensão, que está pendente d'esta camara, e que me parece extremamente justa.

Ha dois ou tres annos que os diversos empregados das repartições de fazenda dos districtos, e designadamente os amanuenses ou aspirantes, têem mandado a esta casa as suas representações, fazendo ver que não podem subsistir com os magríssimos vencimentos que o estado lhes dá. Ultimamente veiu tambem uma representação dos empregados da repartição de fazenda do districto de Lisboa, redigida em termos muito respeitosos, mostrando que lhes é impossivel viver na capital com os vencimentos exiguos que percebem actualmente.

Sei que o sr. ministro da fazenda tem procurado remediar este inconveniente pelos meios ao seu alcance, ordenando que os serviços feitos com assiduidade e zêlo, em proveito do estado, sejam retribuidos extraordinariamente, & n'esta parte os empregados estão muito agradecidos a s. ex.ª, com quanto isto seja um acto de grande justiça; aquelles empregados têem mesmo a convicção de que, se a administração da fazenda estivesse eternamente nas mãos do actual sr. ministro, não lhes havia de faltar este recurso que muito tem contribuido para minorar as circumstancias desgraçadas de uma grande parte d'elles; mas como isto não é possivel, eu chamava a attenção de s. ex.ª e da camara para a situação precaria em que se acham estes funccionarios, a respeito de muitos dos quaes se dão circumstancias especiaes que muito os recommendam na sua justissima pretensão.

Convencido, como eu estou, de que o nobre ministro está na disposição de lhes fazer justiça, peço-lhe que tutele esta causa logo que julgue ser chegada a occasião opportuna para a sua solução.

Um aspirante de uma repartição de fazenda fóra de Lisboa tom o vencimento de 120$000 réis annuaes; e em Lisboa e no Porto têem os aspirantes de 2.ª classe 160$000 réis; isto é, têem menos do que têem os serventes das secretarias!

Devo dizer em relação á repartição do fazenda em Lisboa que o quadro é limitado, porque alem dos amanuenses, consta apenas de dois primeiros officiaes e de seis segundos; e é por isso muito difficil, senão quasi impossivel, que uma grande parte dos amanuenses possam um dia chegar por accesso a occupar qualquer d’aquelles logares.

Conheço empregados distinctissimos, e melhor do que eu os conhece o sr. ministro da fazenda, que têem trinta e seis annos e mais de serviço, que são empregados d'aquella repartição desde a sua organisação em 1849; e que são ainda amanuenses, e outros segundos officiaes, o que é o mesmo que dizer que estes ultimos recebem do estado a limitada quantia de 300$00 réis annuaes!

Se algum chegar um dia a primeiro official, isto é, se chegar á maxima fortuna a que póde aspirar terá talvez no fim da vida apenas 400$000 réis de vencimento annual!

N'estas circumstancias chamo a attenção do sr. ministro da fazenda e da commissão respectiva para a sorte d’estes funccionarios, convencido, repito, de que s. ex.ª e a commissão têem a mesma opinião que eu tenho, de que o serviço que elles prestam não está devidamente retribuido. E se o sr. ministro da fazenda, com a coragem que o caracterisa em todos os seus actos, tem mandado retribuir extraordinariamente este serviço, é uma rasão de mais para se encher de animo e trazer uma proposta á camara, a fim de que, com os vencimentos actuaes e com a importancia d'essas gratificações, possa satisfazer-se aquelles empregados, distribuindo essa somma proporcionalmente pelos vencimentos das diversas classes de uma maneira justa e rasoavel.

O sr. Ministro da Fazenda (Serpa Pimentel): — Os empregados das repartições de fazenda dos districtos não estão largamente remunerados; longe d'isso e muito longe, sobretudo os empregados das repartições de fazenda do districto de Lisboa, onde a vida é maia difficil.

Se se tratasse sómente d'estes empregados, não teria duvida em trazer á camara uma proposta, mas infelizmente ha muitas classes que estão em circumstancias identicas; por isso acho que é necessario andar com toda a prudencia n'estas questões, para não desequilibrarmos as finanças do estado, remunerando todos os empregados de uma maneira condigna.

Entretanto o projecto está na commissão e eu não tenho duvida alguma em lhe dar todos os esclarecimentos, para vermos se alguma cousa se póde conseguir.

O meu desejo é que todos os empregados sejam bem remunerados, mas tambem devemos attender a outras considerações, que impedem que desde já se possa fazer a todos a justiça que pedem.

Aproveito esta occasião para mandar para a mesa duas propostas de lei.

Proposta de lei n.º 27 - A

Artigo 1.º São igualados os ordenados dos empregados do serviço interno das alfandegas de 2.ª classe da raia, aos ordenados dos empregados da alfandega de 1.ª classe da raia, e maritimas de 2.ª classe.

E igualmente igualado o ordenado do chefe fiscal do districto da alfandega do Porto ao ordenado do chefe fiscal do districto da alfandega de Lisboa.

Art. 2.° É o governo auctorisado a revêr e alterar a tabella n.º 8 que faz parte do decreto n.º 1 de 7 de dezembro de 1864.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

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Ministerio dos negocios da fazenda, 25 de fevereiro de 1876. = Antonio de Serpa Pimentel.

Proposta de lei n.º 27 - B Senhores. — O governo) procedendo á reforma das alfandegas e legislação penal respectiva, em virtude da auctorisação que lhe fóra concedida pela lei de 10 de junho de 1864, promulgou, entre outros decretos, o do n.º 6 de 7 de dezembro do dito anno, reduzindo a simples multas, graduadas segundo as circumstancias dos casos, as penas de perdimento das mercadorias descaminhadas, transportes e multa que se achavam estabelecidas pela legislação até então vigente.

Sem embargo do espirito com que fóra estabelecida a nova penalidade e da execução que desde logo teve logar, suscitaram-se, posteriormente, duvidas sobre a sua intelligencia, de que resulta a necessidade de ser declarado o mesmo decreto; e portanto tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.° As multas por descaminho de mercadorias serão impostas pelos chefes das casas fiscaes em cujo districto forem arrestadas essas mercadorias, podendo as partes que se julgarem aggravadas recorrer para o ministro e secretario d'estado dos negocios da fazenda, que resolverá o recurso sobre consulta do conselho da direcção geral das alfandegas e contribuições indirectas.

Art. 2.° Fica por esta fórma declarado o decreto n.º 6 de 7 de dezembro de 1864, e revogada toda a legislação em contraria.

Ministerio dos negocios da fazenda, em 25 de fevereiro de 1876. = Antonio de Serpa Pimentel.

O sr. Lencastre: — Mando para a mesa o seguinte requerimento. (Leu.)

Pedia, -se fosse possivel, a urgencia na remessa d'estes documentos que me são precisos para fundamentar um projecto de lei que tenho tenção de apresentar sobre a magistratura do ultramar.

Por este documento e outros se verá que não se deve regatear as vantagens que tenciono propôr no projecto.

ORDEM DO DIA

Discussão do parecer da commissão de fazenda sobre as alterações propostas ao projecto de lei n.º 8 que cria uma caixa de depositos

É o seguinte:

Pertenço ao n.º 8

Senhores. — Á vossa commissão de fazenda foi presente a proposta dos senhores deputados Pereira de Miranda e Pinto Bessa, por occasião da discussão do projecto de lei n.º 8, que trata da creação da caixa geral dos depositos.

A proposta tem por fim eliminar do projecto todas as disposições relativas aos depositos voluntarios, e bem assim a faculdade que a caixa dos depositos teria de fazer emprestimos a curto praso sobre o exclusivo penhor dos titulos de divida publica consolidada.

Tambem foi presente á commissão uma representação de varios bancos, apresentada pelo sr. deputado Dias Ferreira, pedindo modificações no projecto de lei de que se trata.

Parece á vossa commissão, no offerecimento da proposta, que se receiava que a nova instituição fosse fundada no intuito de concorrer com os bancos do paiz em operações bancarias e de modo desvantajoso para os mesmos bancos. Errónea era de certo uma tal apreciação. Nem o governo, como se evidenciou pelas suas declarações, nem a commissão tinham em mente estabelecer uma tal concorrencia; pelo contrario, o seu fim unico era fazer da nova instituição uma como caixa economica, com succursaes em todos os concelhos do reino, onde se podessem arrecadar fructiferamente as pequenas economias do povo, levando assim a todos os pontos, aonde não chega a acção dos diversos

bancos e das caixas economicas existentes, os elementos de prosperidade nacional, que dimanam do aproveitamento das economias dos menos abastados, que aliás constituem a massa geral da população.

Não póde pois a vossa commissão concordar na eliminação do artigo 6.° do projecto, nem nas modificações resultantes d'essa eliminação. No emtanto:

Considerando que deve ficar na lei perfeitamente definido o pensamento d'ella, não dando logar a interpretações abusivas;

Considerando que fixando-se em 500$000 réis o maximo que cada depositante póde voluntariamente ter em dinheiro á sua ordem na caixa dos depositos, ou nas suas succursaes, não podendo ainda assim esse deposito ser levantado antes de decorrido o praso de tres mezes e com aviso previo de oito dias, abonando-se aos depositos voluntarios o mesmo juro que se abonar aos depositos obrigatorios, se tira todo o pretexto para reclamações fundadas, e se mantem comtudo o pensamento que presidiu á redacção, do artigo 6.° do projecto:

E de parecer, de accordo com o governo, que o mesmo artigo 6.° seja redigido da fórma seguinte:

«A administração da caixa geral de depositos fica auctorisada a receber na mesma caixa depositos em dinheiro effectivo, em titulos de divida consolidada ou quaesquer outros papeis de credito, que lhe forem voluntariamente offerecidos por qualquer pessoa, corporação ou associação legalmente constituida.

«§ 1.° Em regra estes depositos só poderão ser realisados na caixa geral dos depositos; mas o governo, ouvida a administração da mesma caixa, póde estender esta faculdade a quaesquer outros cofres.

«§ 2.° Cada depositante não poderá ter depositado em dinheiro á sua ordem, na caixa ou suas succursaes, quantia superior a 500$000 réis.

«§ 3.° Os depositos em dinheiro poderão ser effectuados por praso indeterminado, mas nunca serão levantados antes de decorridos tres mezes, e com aviso previo de oito dias por parte dos depositantes. Os depositos em quaesquer papeis de credito poderão ser depositados para serem levantados, tanto á vista como por qualquer praso.

§ 4.º E expressamente applicavel a estes depositos a disposição do § 2.° do artigo 3.° d'esta lei.

«§ 5.° A caixa dos depositos abonará aos depositos voluntarios o juro annual de 2 por cento.

«§ 6.° Pelos depositos voluntarios em quaesquer papeis de credito cobrará a caixa uma commissão de meio por cento ao anno sobre a importancia dos juros ou dividendos que competirem aos mesmos titulos, em compensação do encargo com a sua guarda e segurança.»

Quanto á eliminação do n.º 2.° do artigo 9.°, não concorda n'ella a vossa commissão. A providencia tende a fortalecer o credito dos titulos de divida publica consolidada, com o que lucra todo o paiz, e não ha, alem d'isso, na providencia a menor offensa de direitos de terceiro.

Sala da commissão, aos 18 de fevereiro de 1876. — José Dias Ferreira = Antonio José de, Seixas = Visconde da Azarujinha = Visconde de Guedes Teixeira = Manuel Maria de Mello e Simas = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita = Antonio José Teixeira = Joaquim José Gonçalves de Mattos Correia = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator.

Propomos que do projecto n.º 8 sejam eliminados: 1.° Todo o artigo 6.°

2.° Do artigo 7.° as palavras: «tanto necessarios como voluntarios ».

3.° O n.º 2.° do artigo 9.º

Sala das sessões, em 11 de fevereiro de 1876. — Antonio Augusto Pereira de Miranda = Francisco Pinto Bessa. O sr. Braamcamp: — Ainda que muito brevemente,

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não posso deixar de apresentar algumas considerações ácerca do parecer que estamos discutindo.

Sr. presidente, estava disposto a acceitar todas as modificações que fossem apresentadas, para ao menos poder conservar a idéa inicial do projecto, mas as alterações que eu vejo propostas pela commissão são de tal ordem, transformam tão profundamente a natureza da instituição que se pretende crear, que eu não posso deixar de fazer mais uma tentativa, e de procurar ver se ainda posso conseguir na camara, da commissão de fazenda, bem como do illustre ministro, algumas modificações que conservem á proposta primitiva com que foi redigido o espirito e os fins a que ella se dirigiu.

Sr. presidente, infelizmente tem-se levantado contra esta nova instituição uma opposição que me parece mal fundada.

Julgam os bancos que a creação da caixa de depositos póde prejudica-los e póde ferir os seus interesses.

Longe de mim estava tal pensamento quando trabalhei n'este projecto, e de certo tambem estava muito longe da idéa do illustre ministro da fazenda; não era esse o meu proposito, nem é de certo o do illustre ministro. A idéa que me guiou na redacção d'este projecto era muito principalmente procurar dar applicação ás economias que estão espalhadas por todo o paiz, mas que estão escondidas sem proveito, sem utilidade nem para os seus possuidores nem para a fortuna publica. A caixa de depositos era, emquanto a mim, o melhor meio de facilitar a todos o modo de poderem tirar alguma vantagem das suas economias, dando vida a estes capitães hoje dispersos e improductivos, e applicando-os por fórma que aproveitassem aos depositantes e ao paiz.

Sr. presidente, entendo que o governo cumpre uma parte importante da sua missão, quando para um fim tão util põe ao alcance de todos os membros da sociedade os meios de que elle póde dispor, a rede de empregados que compõem a administração do estado, e que n'este serviço podem ser de tanta utilidade para os povos; comtudo julgou-se que não era assim, e que a creação da caixa de depositos ía promover uma especie de concorrencia com os bancos.

Taes receios não têem fundamento; esta instituição não se dirige aos, capitães que geralmente costumam ir procurar um emprego temporario nos cofres dos bancos, porque ali são outras as condições. Ali o depositante tem não sómente em consideração a confiança que lhe merece o banco, mas tambem o credito, a confiança que elle pretende ganhar, e as vantagens que d'aqui lhe podem resultar para quaesquer operações futuras. São portanto capitães de uma natureza muito diversa, e os depositos bancarios em nada são prejudicados com os depositos de que trata este projecto.

Se lançarmos os olhos para os paizes estrangeiros, onde podemos ir procurar lições e exemplos para uma instituição que é filha de uma civilisação economica mais adiantada, havemos de ver que em toda a parte todos os governos têem procurado ampliar, facilitar e auxiliar as instituições d'esta natureza.

Em França existe uma organisação similhante á que era proposta pelo governo; ali a caixa de consignações recebe todos os depositos que lhe são entregues, pelas caixas economicas, dá-lhes emprego, fá-los fortificar e paga o juro respectivo. Porém, ainda não basta, e hoje os economistas mais distinctos estão pedindo maior intervenção por parte do governo, porque entendem que espalhada esta instituição por todo o paiz, abertas aos depositantes todas as repartições do estado, e até mesmo as caixas de correio para a recepção dos depositos, muito ha de augmentar esta capitalisação das pequenas economias, que são uma fonte de riqueza para o paiz.

A experiencia tem mostrado que n'essas caixas de deposito as entradas, ainda que diminutas, de cada um dos depositantes, vão pouco a pouco constituindo um capital,

que elles retiram d'ali e vão empregar n'uma depuena industria, na compra de algumas geiras de terra ou em qualquer genero de commercio; tornando-se assim de simples operarios outros tantos pequenos proprietarios ou industriaes, mas intelligentes e activos.

A Inglaterra, ainda mais se empenha em acrescentar e desenvolver esta instituição; ahi vemos que o governo não satisfeito com ter facultado as caixas do correio para 03 depositos, procura facilitar quanto possivel aos operarios depositarem até parte dos seus salarios, estabelecendo que essas caixas de correio estejam abertas em todos os sab-bados, á noite, para os operarios ali poderem fazer o seu deposito, logo, sem demora alguma; procurando assim evitar que elles vão desperdiçar os seus salarios nas tabernas, em tantas despezas improductivas, e algumas vezes tão nocivas para elles e para os seus. (Apoiados.)

Sr. presidente, n'este assumpto não são menos solicites os governos na Allemanha e na Austria. Igual empenho encontrámos em toda a parte. E devo acrescentar que fóra de Portugal, em todos estes paizes entende-se que estas caixas que, servindo-me das expressões de um illustrado escriptor, são a escola primaria dos capitalistas, longe de serem prejudiciaes aos bancos, antes são auxiliares valiosos das instituições de credito, porque vão promover nas classes operarias o habito de economia e portanto a creação de capitães, que depois irão alimentar as operações dos mesmos bancos.

Sr. presidente, parece-me portanto que o receio que se manifesta no nosso paiz é infundado e que é facil destrui-lo com o exemplo, com a experiencia que podemos colher nos outros paizes, aonde esta instituição é muito mais conhecida, onde já funcciona ha muitos annos, sem prejuizo, antes com proveito dos estabelecimentos bancarios.

Sr. presidente, parece-me que acceites as modificações que a commissão de fazenda entendeu dever introduzir no projecto, isto é, que os depositos não possam exceder a 500$000 réis, e que taes depositos não sejam levantados antes de decorrido o praso de tres mezes e com o aviso previo de oito dias, parece-me que taes disposições são mais que sufficiente garantia de que os bancos não serão prejudicados. (Apoiados.)

Ainda admittida mais uma clausula se acaso se julgasse necessaria, clausula que está consignada nos estatutos d'estas caixas na Austria, e vem a ser que ao governo fique a faculdade de fazer os depositos em prestações em certo e determinado praso, condição esta que foi consignada como garantia para o thesouro em qualquer occasião de crise e para que no caso em que grande numero de depositantes exijam a entrega de seus depositos o governo possa sem difficuldade ir satisfazendo a obrigação de que lhe incumbe restituir os depositos, mas com tempo bastante para realisar os meios que lhe forem necessarios.

Sr. presidente, eu acceitaria de bom grado todas estas restricções, ainda que talvez desnecessarias, porém com o que me não é possivel conformar é com o premio insignificante estipulado para os depositos voluntarios, e não posso deixar de ponderar ao illustre ministro da fazenda que arbitrar o juro de 2 por cento para taes depositos equivale a determinar que o governo fica auctorisado a receber depositos, mas em condições taes, que não haja quem os queira fazer.

D'esta fórma fica totalmente inutilisada a disposição do projecto emquanto aos depositos voluntarios, e para que assim não succeda eu desejo e proponho que se estipule um juro um pouco mais elevado, e para isso lembraria que fosse modificado o § 5.º pela fórma seguinte. (Leu.)

Ao governo fica livre, ouvindo a administração da caixa, diminuir o juro quando por quaesquer considerações entender que assim é necessario.

O juro estabelecido no projecto é muito diminuto para

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que esta instituição possa dar ali resultado, ao passo que com a taxa do juro que eu proponho, poder-se-ha talvez alcançar alguns depositos.

Sr. presidente, limito aqui as minhas considerações, e se mais uma vez tomei a palavra foi porque entendo que d'este projecto, modificado nos termos da proposta que apresentei, podem e devem resultar de futuro não poucas vantagens para o paiz.

Nada mais tenho a dizer, e remetto para a mesa a minha emenda.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

§ 5.º O governo, ouvida a administração da caixa dos depositos, fixará o juro que deve ser abonado aos depositos voluntarios effectuados em dinheiro: a taxa do juro não poderá exceder a por cento ao anno. = Braamcamp = Paula Medeiros.

O sr. Pereira de Miranda: — Não tenho intenção de demorar o andamento d'este projecto.

Felicito-me por ter apresentado as emendas que deram motivo ao novo parecer da commissão de fazenda, e felicito-me porque o governo e a commissão, se não as attenderam completamente, introduziram no projecto algumas modificações, que, segundo o meu modo de ver, melhoram as condições do projecto.

Se fosse approvado o projecto primitivo commetter-se-ía um erro economico, e íamos preparar, para um futuro mais ou menos proximo, algum desastre, de que ha exemplos em paizes mais adiantados, e onde instituições d'esta ordem têem dado, por vezes, resultados fataes.

Não contrario as idéas do governo e da commissão, quando desejam chamar á circulação as pequenas economias que ainda não entraram n'esta luta de interesses que contribue tão vantajosamente para o progresso do paiz; mas desejo que se vão buscar essas economias onde existem, e que se criem elementos para as attrahir e não estabeleçamos uma concorrencia onde existe hoje tão desenvolvida e forte a iniciativa particular.

Não me parece, e a experiencia o demonstrará, que o meio de que se vae lançar mão seja o mais conveniente. Talvez que se se applicasse o systema de Inglaterra, creando-se verdadeiras caixas economicas nós feriamos mais vantagem. Em fim, da experiencia o sr. ministro da fazenda colherá todas as indicações para melhorar esta instituição, no futuro, no caso que o resultado das disposições agora votadas não correspondam ás suas intenções, que são as intenções de todos nós.

Por esta occasião, e sem dizer mais cousa alguma a respeito do assumpto em discussão, desejo fazer uma observação ao Sr. ministro da fazenda, e que, creio, vem a proposito na discussão d'este projecto.

Sendo a caixa que se vae estabelecer administrada pela junta do credito publico, parecia-me de grande conveniencia que nós não encerrássemos a sessão legislativa actual sem cumprirmos a disposição legal, que nos manda proceder á eleição dos vogaes da junta do credito publico. Eu creio, se a memoria me não falha, que desde 1869 ou 1870 que se não tem procedido á eleição dos membros da junta do credito publico.

Não quer isto dizer que não mereçam inteira confiança todos os membros que hoje se acham ali reunidos, uns como delegados do governo, outros como delegados do poder legislativo e outros dos juristas; se estivesse nas minhas faculdades a reconducção completa d'elles não tinha duvida em a promover, mas entendo que é conveniente dar execução á lei, sobretudo em relação a um estabelecimento de tão alta dignificação, como tem a junta do credito publico.

Por conseguinte eu pedia ao sr. ministro da fazenda que tomasse as providencias necessarias para que se não encerrasse a sessão legislativa sem se dar cumprimento á lei n'esta parte.

Já que tenho a palavra e não pude assistir á sessão desde

0 principio, eu desejava tambem pedir ao sr. ministro da fazenda que pela sua parte promovesse na commissão de fazenda o andamento de dois projectos de lei que tive a honra de apresentar. E não faço este pedido porque ligue grande valor á minha iniciativa, mas porque creio que d'aquellas propostas resulta vantagem para o andamento dos serviços a que dizem respeito.

Um é em relação á contribuição industrial. O illustre ministro da fazenda sabe muito bem que as disposições que estão consignadas n'aquelle projecto tendem a facilitar muito o serviço, e que, sendo elle approvado n'esta sessão, já se podiam applicar as suas disposições em relação ao anno corrente.

O outro projecto diz respeito á reexportação de cereaes para as ilhas, o que está causando alguns embaraços, que não são desconhecidos de s. ex.ª

Não tenho mais nada a dizer.

O sr. Ministro da Fazenda: — • Concordo perfeita--mente com as idéas apresentadas pelo illustre deputado o sr. Anselmo Braamcamp, sobre tudo quando elle diz que não foi a mente de s. ex.ª, quando apresentou o seu projecto, nem foi de certo a minha, renovando a sua iniciativa, fazer, de modo algum, concorrencia aos bancos, estabelecendo, para assim dizer, uma industria á custa da industria particular, sómente pela vantagem do governo poder facilmente obter alguns recursos. Não foi essa a intenção do governo.

Folgo muito tambem de que o illustre deputado, com a sua auctoridade, apresentasse as considerações que apresentou, e que são hoje as dos modernos economistas, em contraposição ás idéas economicas apresentadas por uma parte da imprensa, que julga a creação da caixa dos depositos contraria aos verdadeiros principios e aos verdadeiros interesses sociaes.

Respeito as opiniões de todos, mesmo as que são contrarias ás minhas, mas creio que estão no erro os que têem como evangelho aquellas theorias economicas de ha trinta ou quarenta annos, que já hoje se podem chamar antigas, e que se resumem todas no conhecido aphorismo laissez faire, laissez passer, não permittindo ao estado a minima ingerencia nos factos do mundo economico, mesmo para supprir as faltas da iniciativa individual. Este principio tem-se reconhecido pela pratica que não póde ser seguido em toda a sua amplitude.

No que discordo um pouco de s. ex.ª é na opinião de que esta restricção dos 2 por cento vae inutilisar completamente o principio do projecto.

Eu estou persuadido de que esta restricção não inutilisa o pensamento do projecto, e estou persuadido d'isso porque em algumas provincias, sobretudo nas localidades onde

1 ainda não chegou a acção dos bancos, ha muito capital completamente morto, que com a segurança e garantia que lhe dá o estado, e com esta remuneração que lhe vae dar o governo n'este pequeno lucro de 2 por cento, não deixará de vir á vida economica.

Por outro lado é tambem certo que, quando uma instituição nova encontra da parte do publico, da parte d'aquelles que se julgam mais directamente interessados ou prejudicados n'ella, uma certa resistencia, convem transigir até certo ponto, sem comtudo deixar de iniciar a idéa para mais tarde se poder applicar em toda a sua plenitude.

Por consequencia parece-me conveniente que se vote a emenda da commissão; que se vote o projecto d'esta maneira redigido, para, depois mais tarde, quando os proprios interessados, os que se julgam interessados, se convencerem de que esta instituição, longe de os prejudicar, lhes é vantajosa, porque é sempre vantajosa para todos chamar á vida economica capitães que estão completamente mortos, e é este o pensamento do projecto, quando elles se

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convencerem d'isto, repito, fazermos com o accordo geral uma alteração n'esta lei no sentido que for mais conveniente.

Suppõe o illustre deputado, torno a dizer, e unicamente n'esta parte é que não concordo com s. ex.ª, que esta emenda vae inutilisar completamente o principio estabelecido no projecto; ora eu entendo que ella não inutilisa a idéa com que vamos estabelecer esta caixa de depositos; porque mais tarde, não digo eu, que de certo não terei tanto tempo de pratica no ministerio que possa ser quem venha emendar o que ficar agora incompleto, mas os meus successores hão de, em vista da experiencia, vir propôr a reforma d'esta parte do projecto, isto é, a alteração do juro, se se mostrar que a remuneração de 2 por cento é insufficiente, e que se póde elevar sem prejuizo dos bancos.

Este projecto não é, como se costuma dizer, um salvaterio, mas é de alguma vantagem para o estado, porque estabelece desde já o principio da amortisação da divida publica, alem da segurança e da vantagem para os depositos obrigatorios.

Nos primeiros annos esta amortisação ha de ser tão lenta e tão pequena que pouca influencia poderá ter no credito publico, mas mais tarde esta caixa administrada pela junta do credito publico será o fundamento e a origem de uma verdadeira caixa de amortisação»

Por ultimo direi ao illustre deputado, o sr. Pereira de Miranda, que tanto eu estou convencido da conveniencia de se fazer com que a junta do credito publico seja eleita na conformidade da lei, porque é sempre conveniente executar a lei, que já pelo ministerio a meu cargo se tomaram todas as medidas para que estas disposições legaes sejam cumpridas.

Mandou-se á junta do credito publico que fizesse o recenseamento dos juristas, e em tempo competente será o parlamento habilitado convenientemente para que tanto a camara dos senhores deputados como a camara dos dignos pares elejam os membros da junta que têem a eleger.

Emquanto aos dois projectos a que se referiu o mesmo sr. deputado, estou de accordo cem s. ex.ª, principalmente a respeito de um d'elles, tanto que, tendo tido idéa de trazer á camara uma proposta de lei n'este sentido, não o fiz, porque respeitei a iniciativa de s. ex.ª

A commissão competente dará andamento a esses projectos, e eu estou prompto para lhe fornecer os esclarecimentos de que carecer para esse fim.

O sr. Carrilho (por parte da commissão de fazenda): — Declaro a V. ex.ª e á camara que a commissão de fazenda não póde acceitar a proposta apresentada pelo sr. Anselmo Braamcamp.

Mando para a mesa o parecer da commissão do fazenda sobre as emendas offerecidas por occasião da discussão do orçamento da despeza, e bem assim o parecer da mesma commissão sobre as contas da commissão administrativa da

camara, relativas ao periodo que terminou no 1.° de abril de 1875.

A camara considerou prejudicada a proposta do sr. Braamcamp, e approvou o projecto em discussão.

O sr. Visconde da Azarujinha (por parte da commissão de fazenda): — Mando para a mesa os pareceres da commissão de fazenda sobre as propostas de lei do governo, que têem por fim legalisar a despeza feita com o transporte de subditos portuguezes emigrados do Pará para Angola, e a despeza feita com os soccorros ás povoações de Alijó e Mourilhe.

O sr. Presidente: — Passa-se ao projecto n.º 41. Vae ler-se.

É o seguinte

Projecto de lei n> 41

Senhores. — A commissão de administração publica, examinando a proposta de lei n.º 55 da legislatura passada, e tendo ouvido a illustre commissão de fazenda, é de parecer, de accordo com o governo, que ella seja convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E auctorisada a camara municipal da cidade de Aveiro para vender em hasta publica o terreno e materiaes que lhe foram concedidos por decreto de 27 de fevereiro de 1867, com todos os melhoramentos e edificações que presentemente tem.

Art. 2.° Para satisfazer ao fim da concessão primitiva fica a camara obrigada, dentro do praso de cinco annos da data da venda do referido terreno e materiaes, a construir um edificio proprio para o estabelecimento de uma escola primaria.

§ unico. O plano e local para a escola ficam dependentes da approvação do governo.

Art. 3.° No caso de não estar completo o edificio dentro do praso marcado no artigo antecedente, reverterá ao governo o producto da venda.

Art. 4.° Fica resalvado qualquer direito de terceiro para haver o producto da venda, se pelos meios competentes provar melhor direito á propriedade dos bens alienados.

Art. 5.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, 16 de fevereiro de 1875. = Jacinto Antonio Perdigão = Augusto Correia Godinho — Thomas Ribeiro = Jeronymo da Cunha Pimentel = Eduardo Tavares — Julio Marques Vilhena = Francisco Van-Zeller.

O sr. Pires de Lima: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Presidente: — Deu a hora, e como o sr. deputado quer continuar o seu discurso, fica-lhe a palavra reservada para a sessão seguinte.

O sr. Secretario: — A commissão de redacção não fez alteração ao projecto n.º 123, já approvado por esta camara.

O sr. Presidente: — Está levantada a sessão, Eram mais de cinco horas da tarde.

Sessão de 25 de fevereiro

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