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SESSÃO DE 28 DE FEVEREIKO DE 1885

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Gosta

Secretarios - os exmos. srs.

Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Deu-se conta de dois officios do ministerio da marinha, um enviando esclarecimentos pedidos pelo sr. Elvino de Brito, e outro remettendo o processo original do concurso para um logar de segundo official realisado n'aquelle ministerio. - Presta juramento o sr. conde da Praia da Victoria. - A camara approva que sejam publicados no Diario do governo uma representação apresentada hontem pelo sr. Caetano de Carvalho, e o projecto do sr. Elvino de Brito sobre a reorganização da commissão central de estatistica. - Apresentam projectos de lei, ou renovam a iniciativa de outros, os srs. Joaquim José Alves, Sousa Machado e Ribeiro Cabral. - Apresentam representações: o sr. Arroyo, da conferencia pedagogica do Porto; o sr. Avellar Machado, da camara municipal de Ponte de Sor. - Teve segunda leitura o projecto do sr. Pedro Diniz apresentado na sessão anterior. - Enviam requerimentos os srs. Correia de Barros e Santos Viegas, o primeiro pedindo esclarecimentos de differentes ministerios, o segundo dos mestres de musica de caçadores n.° 8 e de infanteria n.° 4. - Justificam faltas os srs. J. A. Neves, Agostinho Fevereiro, Joaquim José Alves, Ernesto da Costa, Sousa Pinto Basto, Antonio da Costa Côrte Real e Avellar Machado. - Por um requerimento do sr. Moraes Carvalho é aggregado á commissão do legislação criminal o sr. Lopo Vaz. - O sr. Marçal Pacheco declina a honra de fazer parte da commissão de administração publica. A camara não lhe concede a escusa pedida. - O sr. Tito de Carvalho requer, por parte da commissão do ultramar, que sejam enviados ao governo, para os informar, os requerimentos de Napoleão Baptista Joaquim da Pureza e Castro, sargento quartel mestre do corpo de policia do estado da India; de Izabel Maria Carreira da Silva e Antonio Carlos Cardoso de Sá. - O sr. Avila requer, por parte da commissão de guerra, que seja enviado ao governo, para informar, o requerimento de Maria Elvira da Fonseca e Vicente Justino da Fonseca. - O sr. ministro da fazenda apresenta o seu relatorio sobre o estado da fazenda publica, acompanhado das seguintes propostas: n.° 1, auctorisando o governo a reorganisar a direcção geral das «alfandegas, o conselho geral das alfandegas, os quadros e serviços internos aduaneiros e os da fiscalisação externa; n.- 2, alterando as tabellas do imposto do sello annexas ao regulamento de 14 de novembro de 1878 e lei de 22 de junho de 1880; n.° 3, creando uma caixa de aposentações para todos os empregados publico» civis do continente e ilhas adjacentes que forem nomeados depois da data que se fixar no respectivo regulamento; n.° 4, remodelando a caixa economica portugueza.; n.° 5, renovando a iniciativa da proposta de lei que tem por fim estender a arca da caixa geral de depositos; n.° 6, fixando a despeza extraordinaria do estado no exercido de 1884-1885 em réis 4.940:700$000. - O sr. ministro da marinha renova a iniciativa da proposta do lei que auctorisa o governo a reembolsar os credores das provincias ultramarinas de Africa por dividas que oneram os respectivos cofres com encargos de juro e amortisação. - Constitue-se a commissão de legislação criminal.

Na ordem do dia continua a interpellação do sr. Elvino de Brito no sr. ministro da marinha, e continua com a palavra o sr. deputado interpellante. - Em consequencia do susurro que se manifestou na sala por uma leitura que o sr. Elvino de Brito começou a fazer, e continuou, apesar das observações do sr. presidente e das reclamações de uma parte da camara, foi o orador chamado á ordem por tres vezes, e por fim retirada a palavra, suspendendo-se a sessão por vinte minutos. - Aberta de novo, e dando-se outra vez a palavra ao interpellante, pede este que a camara declare se proferiu insinuações ou palavras injuriosas. - Consultada a camara sobre se o sr. deputado fez allusões e usou de palavras pouco convenientes á boa ordem e á gravidade da discussão, e resolvendo-se affirmativamente, novo susurro se levantou, saíndo o deputado da sala. - O sr. Sousa Machado requer, e é approvado, que se generalise a discussão, podendo tomar parte no debate outros srs. deputados. - Faz o sr. ministro da marinha algumas considerações sobre o incidente, declarando parecer-lhe que se não podiam confundir as suas responsabilidades de ministro com as de escriptor. - Dá algumas explicações o sr. Scarnichia, e encerra-se a sessão.

Abertura - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada - 59 srs. deputados.

São os seguintes: - Adolpho Pimentel, Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Agostinho Lucio, Moraes Carvalho, Garcia de Lima, Albino Montenegro, A. da Rocha Peixoto, Alfredo Barjona de Freitas, Silva Cardoso, A. J. da Fonseca, A. J. d'Avila, Antonio Ennes, Cunha Bellem, A. M. Pedroso, Santos Vielas, Almeida Pinheiro, Seguier, A. Hintze Ribeiro, Urbano de Castro, Augusto Poppe, Pereira Leite, Avelino Calixto, Barão de Ramalho, Sanches de Castro, Lobo d'Avila, Ribeiro Cabral, E. Coelho, Elvino de Brito, Emygdio Navarro, Estevão de Oliveira, Fernando Geraldes, Correia Barata, Mouta e Vasconcellos, Francisco de Campos, Mártens Ferrão, Baima de Bastos, Augusto Teixeira, Souto Rodrigues, João Arroyo, Ribeiro dos Santos, Sousa Machado. J. A. Neves, Ponces de Carvalho, J. J. Alves, Coelho de Carvalho, Simões Ferreira, Amorim Novaes, Avellar Machado, Correia de Barros, Azevedo Castello Branco, Ferreira de Almeida, Laranjo, José Frederico, Oliveira Peixoto, Simões Dias, Pinto do Mascarenhas, Luiz Ferreira, Bivar, Manuel d'Assumpção, M. da Rocha Peixoto, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, M. J. Vieira, Marçal Pacheco, Guimarães Camões, Sebastião Centeno, Dantas Baracho, Pereira Bastos, Visconde de Ariz, Visconde das Laranjeiras e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Sousa e Silva, Antonio Candido, Antonio Centeno, Lopes Navarro, Pereira Borges, Jalles, Carrilho, Sousa Pavão, Pinto de Magalhães, Ferreira de Mesquita, Fuschini, Neves Carneiro, Bernardino Machado, Caetano de Carvalho, Conde da Praia da Victoria, Conde de Villa Real, Cypriano Jardim, E. Hintze Ribeiro, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Castro Mattoso, Guilherme de Abreu, Matos de Mendia, Sant'Anna e Vasconcellos, J. A. Pinto, J. C. Valente, Melicio, Scarnichia, Franco Castello Branco, Teixeira de Vasconcellos, Ferrão de Castello Branco, J. Alves Matheus, Joaquim de Sequeira, Dias Ferreira, Elias Garcia, Lobo Lamare, Pereira dos Santos, J. M. dos Santos, Lopo Vaz, Luiz de Lencastre, Reis Torgal, Luiz Osorio, M. P. Guedes, Pinheiro Chagas, Martinho Montenegro, Miguel Dantas, Santos Diniz, Gonçalves de Freitas, Pedro Roberto, Rodrigo Pequito, Tito de Carvalho, Vicente Pinheiro, Visconde de Balsemão e Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão os srs.: - Agostinho Fevereiro, Anselmo Braamcamp, Pereira Côrte Real, Garcia Lobo, Fontes Ganhado, Moraes Machado, Augusto Barjona de Freitas, Conde de Thomar, Sousa Pinto Basto, Goes Pinto, Filippe de Carvalho, Vieira das Neves, Wanzeller, Frederico Arouca, Barros Gomes, Silveira da Motta, Costa Pinto, Ferreira Braga, Teixeira Sampaio, José Borges, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano, Ferreira Freire, Julio de Vilhena, Lourenço Malheiro, Luiz Dias, Luiz Jardim, Aralla e Costa, Mariano de Carvalho, Miguel Tudella, Pedro de Carvalho, Pedro Correia, Pedro Franco, Visconde de Alentem, Visconde de Reguengos e Wenceslau de Lima.

Acta. - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Do ministerio da marinha, remettendo o processo original do concurso para um logar de segundo official,

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550 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

realisado n'aquella secretaria d'estado em 20 de novembro ultimo.

Á secretaria.

2.° Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Elvino de Brito, copias da correspondencia trocada entre o ministerio e o governador geral da provincia de Moçambique ácerca da sublevação do Massingire, e de parte da acta da sessão da junta consultiva do ultramar em que foi approvado o projecto do decreto constituindo o districto de Manica.

Á secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores.- A explosão que teve logar junto á porta do paiol na fortaleza de S. Miguel da provincia de Angola, no dia 24 de junho do anno proximo passado, por occasião da entrega e inventario do material de guerra ao respectivo director, o tenente da guarnição da mesma provincia, Joaquim Carlos Gilberto da Silva Azevedo, causou a morte do tenente Antonio Agusto Lusignan do Azevedo, chefe da secção militar da junta de fazenda, que presidia á commissão do entrega; o malogrado official, pelos seus serviços, honestidade provada, e brilhante desempenho dos seus deveres, bem merece a sua memoria a consideração publica de que em vida sempre gosou, concedendo-se á viuva uma pensão que a ponha a coberto da miseria, e a auxilie na educação de seus filhos.

Considerando que outras pensões do sangue, não mais justas do que esta, têem sido concedidas ás viuvas de outros officiaes; tenho a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder a D. Elvira Adelaide Pereira Martins de Lusignan de Azevedo, viuva do tenente do exercito da Africa occidental, Antonio Augusto Lusignan de Azevedo, victima da explosão que teve logar na fortaleza de S. Miguel na provincia de Angola, estando ali em serviço especial, a pensão annual de 180$000 réis.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 27 de fevereiro do 1885. = O deputado, Pedro Diniz.

Enviado á commissão de fazenda ouvida a do ultramar.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da commissão composta dos professores primarios do primeiro circulo da segunda circumscripção escolar do Porto, expondo os inconvenientes da lei de 2 de maio de 1878 e indicando as bases de uma reforma de instrucção popular que seja exequivel e garanta ao professorado uma situação que o livre da miseria.

Apresentada pelo sr. deputado João Arroyo, enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria, ouvida a de fazenda e mandada publicar no Diario da camara.

2.ª Da camara municipal do concelho de Ponte do Sôr, pedindo ser auctorisada a levantar do cofre da viação municipal a quantia de 5:000$000 réis a fim de ser applicada á construcção dos paços do concelho, e uma casa para escola do sexo feminino e um cemiterio.

Apresentada pelo sr. deputado Avellar Machado e enviada á commissão de obras publicas.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.° Requeiro que seja enviado ao governo, pelo ministerio da guerra, o requerimento de Maria Elisa de Fonseca e Vicente Justino da Fonseca, a fim de que se sirva informar a camara sobre esta pretensão.

Sala da commissão de guerra, 28 de fevereiro de 1885.= Antonio José d'Avila, secretario.

2.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha, seja com urgencia remettida a esta camara uma nota especificada da applicação que teve cada uma das verbas de que se compõe a quantia de 25:435$669 réis, gasta nos termos e por effeito do decreto de 3 de julho de 1884. = Correia, de Bar r os.

3.° Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja, com urgencia, remettida a esta camara uma nota especificada da applicação que teve cada uma das verbas, de que se compõe a quantia de 30:000$000 réis, gasta nos termos e effeito do decreto de 3 de julho de 1884. = Correia de Barros.

4.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja com urgencia remettida a esta camara uma nota especificada da applicação que teve cada uma das verbas em que se decompõe a quantia de 100:200$000 réis gasta nos termos e por effeito do decreto de 3 de julho de 1884. = Correia de Barros.

5.° Requeiro que, polo ministerio do reino, seja com urgencia remettida a esta camara uma nota especificada da applicação que teve cada uma das verbas de que se compõe a quantia do 87:270$607 réis gasta nos termos e por effeito do decreto de 3 de julho de 1884.= Correia de Barros.

6.° Roqueiro que, pelo ministerio da guerra, seja com urgencia remettida a esta camara uma nota especificada da applicação que teve cada uma das verbas em que se decompõe a quantia de 185:000$000 réis, gasta nos termos e por effeito do decreto de 3 de julho de 1884.= Correia de Barros.

7.° Requeiro, por parte da commissão do ultramar, que seja ouvido o governo pela secretaria dos negocios da marinha e ultramar, sobre os seguintes requerimentos:

De Napoleão Baptista Joaquim da Pureza e Couto, sargento quartel mestre do corpo de policia de guarnição do estado da India, pedindo que a lei de 10 de abril de 1879 seja extensiva ao ultramar;

De Izabel Maria Carreira da Silva, viuva do capitão tenente da armada, Germano Augusto da Silva, pedindo um subsidio.

De Antonio Carlos Cardoso de Sá, pedindo melhoria de reforma.

Sala da commissão, em 28 de fevereiro de 1885. = O secretario da commissão, Tito Augusto de Carvalho.

Mandaram-se expedir.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Declaro que faltei a algumas sessões por motivo de doença. = Avellar Machado.

2.ª Declaro que por motivo de serviço publico faltei á sessão de hontem. = J. J. Alves, deputado por Lisboa.

3.ª O sr. deputado pela Feira, Antonio de Castro Côrte Real, encarregou-me de participar a v. exa. e á camara que tem faltado e continuará a faltar a algumas sessões, por motivo justificado = J. J. Alves, deputado por Lisboa.

4.ª Estou encarregado de participar á camara que o illustre deputado, o sr. Ernesto da Costa Sousa Pinto Basto, por motivo de serviço publico, tem faltado e continuará

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a faltar a algumas sessões. = J. J. Alves, deputado por Lisboa.

5.ª Declaro que faltei a algumas sessões do corrente mez do fevereiro por motivo justificado. Faço igual declaração a respeito do sr. deputado Agostinho Fevereiro. = J. A. Neves.

Participação

Participo a v. exa. e a camara que a commissão de legislação criminal se constituiu, escolhendo para seu presidente o sr. conselheiro Lopo Váz o a mim, participante, para sou secretario =José Novaes.

Para a acta.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

l.º De Domingos Antonio Caldeira, mestre da musica de infanteria n.º 4 e de Francisco Fernandes de Almeida, mestre da musica de caçadores n.º 8, pedindo para ser melhorada a reforma aos mestres de musicas.

Apresentados pelo sr. deputado Santos Viegas e enviados á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

2.º Da Joaquim Anthero Vieira, pedindo que lhe seja concedida uma reforma em attenção aos documentos que apresenta.

Apresentado pelo sr. deputado Neves Carneiro e enviado á commissão de fazenda.

O sr. Presidente: - Convido os srs. deputados J. J. Alves e Baima de Bastos a introduzirem na sala o sr. conde da Praia da Victoria, para prestar juramento.

Foi introduzido na sala e prestou juramento o sr. conde da Praia da Victoria.

Foi tambem auctorisada a publicação no Diario do governo da representação apresentada na sessão anterior, pelo sr. Caetano de Carvalho, e bem assim do projecto sobre a reforma da estatística do sr. Elvino de Brito.

O sr. J. A. Neves: - Mando para a mesa duas notas de justificação do faltas, uma pelas que dei com motivo justificado durante o mez de fevereiro, e outra do illustre deputado Agostinho Fevereiro que me pediu para fazer igual declaração.

O sr. Arroyo : - A conferencia pedagógica do Porto resolveu, em sessão publica, representar aos poderes do estado, expondo-lhes os inconvenientes que na execução da lei de 2 do maio do 1878 têem sido evidenciados.

A mesma conferencia elegeu uma commissão para executar aquella resolução; é no comprimento d'esse mandato que os signatários elaboraram uma representação expondo os inconvenientes principaes das ultimas leis de ensino primario, e indicando os tópicos culminantes ou cardinaes de uma reforma de instrucção popular que seja verdadeiramente exequível e garanta ao professorado uma situação que o livre da miseria.

Eu envio para a mesa esta representação, que parece merecerá toda a consideração das competentes commissões d'esta casa e do governo.

Rogo a v. exa. que consulto a camara se consente que ella seja publicada no Diario das nossas sessões.

Foi concedida a publicação no Diario das sessões.

O sr. J. J. Alves: - Pedi a palavra para declarar que, por motivo do serviço publico, faltei á sessão de hontem; participo tambem á camara que estou auctorisado a declarar que os nossos dignos collegas os srs. Ernesto da Costa Sousa Pinto Basto e Antonio de Castro Corto Real, por motivos justificados, têem faltado e continuarão ainda a faltar a algumas sessões.

De tudo isto mando para a mesa as respectivas notas.

Aproveitando a occasião, peço licença para mandar para a mesa uma nota renovando a iniciativa do projecto de lei que apresentei na sessão do 18 de março de 1875, e que tem por Em proceder-se á reforma da casa da moeda, e papel sellado.

Sr. presidente, imperam no meu animo ainda as mesmas rasões que tive ao apresentar similhante projecto, para que inste novamente seja convertido em lei; e sinto não ver presente o sr. ministro da fazenda para chamar a attenção de s. exa. para assumpto de tanta importância.

Effectivamente não se comprehende que possa existir um regulamento, que, tornando os operarios responsaveis por valores importantes, e que apenas têem o salario do 400 réis nos dias uteis, o que equivale a ganharem pouco mais de 320 réis, só cuidasse em lhes augmentar as horas do trabalho, não lhes dando garantia alguma, quer por doença quer pela avançada idade.

Estas injustiças e outras, que poderia citar, são motivos mais que suficientes para se fazer uma reforma digna, que de certo não trará augmento do despeza, e quando a haja, os lucros que dá este estabelecimento poderiam bem compensal-a.

O sr. Moraes Carvalho: - Requeiro a v. exa. para que seja aggregado á commissão de legislação criminal o sr. deputado Lopo Vaz.

Foi approvado o requerimento.

O sr. Sousa Machado: - Tenho a honra de mandar para a mesa um projecto do lei para a abolição dos passaportes de transito do continente do reino e ilhas adjacentes para as provincias ultramarinas.

No relatorio que precedo o projecto tratei de o fundamentar, abstendo-me por agora de adduzir outras considerações que reservo para apresentar á camara, se por ventura o projecto merecer a honra de um parecer, e este for discutido, como espero.

Mando igualmente um projecto sobro a pauta das alfândegas do archipelago do Cabo Verde, e mui resumidamente explicarei as principaes alterações que pretendo introduzir no regimen fiscal d'aquella província.

Pela pauta actualmente em vigor pagam as mercadorias nacionaes e nacionalisadas 30 por cento dos direitos estabelecidos na tabella de importação.

Reduzo este beneficio differencial a 50 por cento dos mesmos direitos.

Não seguindo os princípios das escalas extremas, porque me não seduzem os exageros intransigentes dos proteccionistas, nem o optimismo dos princípios absolutos do liberdade proclamados pelos livre-cambistas, procurei conceder às industrias nacionaes uma protecção ainda extremamente vantajosa, mas que estivesse mais em harmonia com o intuito fiscal da pauta.

Toda a industria que não prospera e progride á sombra de um beneficio de 50 por cento não tem condições de existência, e elevar mais a protecção equivale a decretar o monopólio, que mata todo o estimulo ao aperfeiçoamento e barateza dos producto.

Tão longe levo o espirito de transacção que concedo um beneficio do 15 por cento às mercadorias retiradas dos depósitos do reino, embora cate direito diferencial já não existisse na pauta que vigorou, desde 1871, a qual foi substituída por decreto de 14 de dezembro de 1882 pela que actualmente vigora.

Nos preliminares estabeleço grandes alterações em relação á armazenagem, estatuo outras quanto á firma dos processos do descaminho de direitos, e consigno varias disposições tendentes a dar mais garantias ao commercio sem prejudicar a fazenda publica.

Na tabella de importação são moderadas as taxas dos direitos por me parecer que assim obtenho maior receita, e promovo o alargamento do consumo.

Finalmente, junto a tabella dos emolumentos dos empregados internos e externos das alfandegas para evitar arbítrios que não se podem tolerar, principalmente em matéria de impostos.

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A illustre commissão do ultramar, ouvida a de fazenda por certo corrigirão os muitos defeitos do projecto, e a camara o aperfeiçoará com a sua elevada sabedoria.

Ainda mando para a mesa a renovação de iniciativa de tres projectos de lei, por mim apresentados na ultima sessão da legislatura anterior.

O que se refere aos empregados fiscaes foi já em parte attendido nas ultimas tabellas de receita e despeza da províncias ultramarinas, mas insisto ainda pelas disposições do projecto, por julgar que é de justiça o que propuz Roqueiro a v. exa. se digne dar as convenientes ordens para que sejam publicados no Diario em que forem im pressas estas palavras os projectos, cuja iniciativa renovo a fim de melhor poderem ser apreciados sem recorrer aos diários antigos.

O sr. Correia de Barros: - Mando para a mesa os seguintes requerimento s.

(Leu.)

Peço que estes requerimentos sejam expedidos com urgência, pois que a camara comprehende a necessidade que ha em que os esclarecimentos que n'elles peço sejam aqui remettidos urgentemente para poder ser devidamente apreciado o projecto do Lei de indemnidade que já está dado para ordem do dia.

N'esta occasião não posso deixar de exprimir a profundissima mágua com que redigi este requerimento, porque realmente eu creio que o governo tinha restricta obrigação de se ter antecipado aos pedidos formulados n'estes requerimentos.

É singular a situação do governo, e a situação que elle pretende crear ao parlamento.

O decreto de o de julho de 1884, que por si só já constitue a violação da nossa lei fundamental, tem como corollario a violação deste mesmo decreto, porque o artigo 2.º impõe ao governo a obrigação de dar conta á camara da forma por que tiver usado das attribuições que pelo mesmo decreto lhe são conferidas; e não me parece que seja dar essa conta às cortes o simples facto de vir pedir para ser relevado da responsabilidade em que incorreu promulgando-o.

Dada esta explicação peço a exa. que faça expedir com a maxima urgencia os requerimentos que mando para a mesa.

O sr. Marçal Pacheco: - Pedi a palavra para declarar a v. exa. que, tendo-se constituído a commissão do administração publica, nomeando o presidente e secretario, sem que eu tivesse sido ouvido nem consultado, resolvi declinar de mim a responsabilidade do cargo com que a camara me honrou nomeando-me para aquella commissão.

Consultada a camara resolveu não conceder a escusa pedida.

O sr. Avellar Machado: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho de Ponte do Sor, pedindo para desviar do cofre de viação municipal a quantia de 5:000$000 réis, para a applicar á construcção do edifficio dos paços do concelho, do uma escola do sexo feminino e de um cemitério.

Todas estas obras são de necessidade municipal, e alem disso lançando-se aquelle concelho 50 por cento de contribuição municipal sobre as contribuições geraes do estado, é claro que, só não se desviar esta quantia, terá de se elevar essa percentagem a 90 por cento.

Quando por toda a parte se levantam clamores contra as contribuições que as camaras municipaes, juntas geraes de districto e juntas de parochia lançam sobre as contribuições do estado, não devemos contribuir pela nossa parte para aggravar esta situação, ou obrigar aquella camara a lançar uma percentagem intolerável, qual é a de 90 por cento.

Por isso espero que a commissão de obras publicas, a que vae ser enviada esta representação, se compenetro da justiça do pedido, tomando-o em consideração.

O sr. Eduardo Cabral: - Mando para a mesa uma nota renovando a iniciativa de um projecto de lei.

O projecto a que mo refiro já foi approvado por esta camara o se não teve igual votação na outra casa do parlamento foi por falta de tempo.

O projecto e de bastante importancia, e por isso peço a v. exa. a maxima celeridade na remessa d'elle às commissões respectivas.

O sr. Neves Carneiro : -- Mando para a mesa o requerimento do Joaquim Anthero Vieira, antigo empregado da casa da moeda, pedindo a sua aposentação.

ORDEM no DIA

Continuação com interpellação do sr. Elvino de Brito sobre administração colonial

O sr. presidente: - Continua a discussão da interpellação ao sr. ministro da marinha, e tem o sr. Elvino de Brito a palavra, que lhe ficou reservada na sessão anterior.

O sr. Elvino do Brito: - Continuando o sou discurso interrompido na sessão de quarta feira, d'isso que já tinha mestrado que o augmento de despeza nas provincias ultramarinas não coincidia com grandes melhoramentos nas mesmas provincias o que nenhum augmento houvera na dotação da instrucção primaria, tendo só havido grande o exagerado angmento nos vencimentos dos governadores.

Para provar essa asseveração, como promettêra, apresentou a nota dos vencimentos dos governadores de S. Thomé e Principe, Macau e Timor ha alguns ânuos e as quantias que se despendiam então d'essas províncias com a instrucção primaria, e bem assim tanto a nota dos vencimentos que os mesmos governadores têem actualmente, como a das quantias que ali se despendem ao presente com a instrucção primaria.

Por estes dados se via que os vencimentos d'aquelles governadores tinham constantemente crescido e que as despezas com a instrucção primaria n'aquelas provincias se tinham conservado estacionarias.

Comprehende que uma das causas do crescimento dos orçamentos de despeza em todos os paizes é a necessidade de se civilisarem o de realisarem melhoramentos públicos; mas ha tambem attenuantes, e essas attenuantes são, por exemplo, a boa fiscalização dos serviços administrativos.

O sr. ministro da marinha apresentara como deficit das provincias ultramarinas no actual anno economico a cifra de 245:000$000 réis.

Disse que, sendo as receitas calculadas, segundo os precitos da lei de contabilidade publica, achava que esse déficit subiria a 900:000$000 réis, porque a verdade era que o déficit real mal se approximava do dificit calculado.

Todo o seu empenho era occupar-se das questões ultramarinas, mas sem as confundir e sem querer fazer politica, e só vinha a esse campo quando a elle era chamado pelo sr. ministro da marinha.

Desejava que o sr. ministro dissesse se effectivamente nos calculos que apresentava havia erros do apreciação, que fizessem pôr em duvida os resultados a que chorou.

Desejava que o sr. ministro declarasse se sanccionára a portaria do governador geral do Angola croando a colonia penal de Malange. Se sanccionou, qual era a data do diploma?

Se não foi sanccionado tal acto, perguntava se s. exa. concordára com todas as verbas consignadas na portaria provincial, e em tal caso, porque era que essa verba não afigurava na tabella das despezas decretadas pelo sr. ministro.

Devia, fazer obra pelos documentos que se publicaram, não encontrava na folha official, nem nos boletins do ultramar, diploma algum referendado pelo sr. ministro do

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ultramar, pelo qual fosse sanccionado o acto do governador da Angola.

Pelo ultimo paquete da India acabava de receber noticias, de um conflicto entre o governador e o poder judicial.

O governador da Índia decretara a revogação de umas certas leis, e os tribunaes não quiseram reconhecer o acto do governador.

Perguntava o que vigorava na India?

Como era que s. exa. tencionava pôr cobro ao conflicto que se dava entro o poder judicial e a auctoridade superior.

Que auctoridade ficava tendo o governador geral da India?

Desejava que sobre todos estes pontos o sr. ministro desse explicações.

Passando a tratar das missões scientificas no ultramar, alludiu às explorações que na costa oriental de Africa anda fazendo o sr. Serpa Pinto, sentindo que não fosse publicado o documento que de tal missão o encarregara, não sabendo por conseguinte a natureza da exploração que lhe fora commettida pelo actual sr. ministro da marinha.

Mas, á falta d'esse documento, leria o que a respeito d'esse mesmo cavalheiro escrevera o sr. Pinheiro Chagas num jornal que se publica no Rio de Janeiro.

Passou a ler diversos periodos de um artigo publicado no jornal brazileiro o Paiz, e transcripto no Correio da manhã.

O sr. Presidente: - Disse ao sr. deputado que não podia estar a ler na camara o que se dizia nos jornaes, e pedia-lhe que não estivesse fazendo insinuações.

O sr. Elvino de Brito: - Replicou que não fizera mais do que ler o que escrevera o sr. Pinheiro Chagas ácerca de Serpa Pinto.

Era sabido que Serpa Pinto partira do seu logar em Zanzibar para uma exploração na costa oriental de Africa, e não tendo outros elementos para apreciar a nomeação, tivera de lançar mão de um escripto do sr. Pinheiro Chagas, e por isso não podia prescindir de continuar na leitura que estava fazendo.

O sr. Manuel d'Assumpção: - Disse que, se as ordens do sr. presidente não eram cumpridas, então pedia licença para se ir embora.

Insistindo o sr. Elvino de Brito na leitura do jornal, e levantando se susurro na sala, o sr. presidente chamou o sr. deputado á ordem, tirou-lhe a palavra e seguidamente suspendeu a sessão.

Eram cinco horas menos dez minutos.

Às cinco horas continuou a sessão.

O sr. Presidente: - Declarou que chamara á ordem o sr. Elvino de Brito em conformidade com a disposição do artigo 100.º do regimento, o qual leu.

O sr. deputado podia portanto continuar o seu discurso, mas abstendo-se de fazer allusões.

O sr. Elvino de Brito: - Insisto que não injuriou ninguém e que está no seu direito lendo o que o sr. Pinheiro Chagas escrevera nuin jornal a respeito do explorador Serpa Pinto; e só lhe resta lamentar a desusada violencia com que o sr. presidente procedera para com elle, e contra a qual protesta energicamente.

O sr. Presidente: - Como s. exa. se queixa da resolução da mesa e appella para a lealdade da camara, é do meu dever consultal-a sobre se entende que s. exa. fez allusões, e usou de palavras pouco convenientes á boa ordem e á gravidado da discussão.

Consultada a camara, resolveu afirmativamente.

(Susurro.)

Varios srs. deputados pedem a palavra.

Protestos da esquerda. Vozes da direita: Ordem, ordem.

Outras Vozes: - É uma violencia; não póde ser.

O sr. Francisco Beirão: - V. exa. diz-me se já te votou?

O sr. Presidente: - Já, sim senhor; e o sr. Elvino de Brito póde agora continuar a usar da palavra, mas nas condições em que eu já declarei.

O sr. Francisco Beirão: - Eu pedi a palavra antes da votação e v. exa. não ma deu.

O sr. Presidente: - Não ouvi que o illustre deputado pedisse a palavra sobre o modo de propor e antes da votação.

Agora só o posso inscrever, querendo, para explicações no fim da sessão.

O sr. Francisco Beirão: - Mas eu não pedi a palavra para explicações.

O sr. Presidente: - Se o sr. deputado interpellante não quer continuar a usar da palavra, eu vou concedel-a ao sr. Sousa Machado, que a pediu para um requerimento.

O sr. Elvino de Brito tinha-se retirado da sala.

(Pausa.)

O sr. Presidente: - Tem a palavra para um requerimento o sr. Sousa Machado.

O sr. Sousa Machado (para um requerimento): - Eu pedi a palavra para requerer que se consultasse a camara sobre se queria que se generalisasse a discussão para poderem tomar parte no debate os srs. deputados que o quizessem.

Em vista do estado em que se encontra a camara, quasi que me não animo a fazer esse requerimento; entretanto v. exa. fará o que julgar mais conveniente.

Pela minha parte declaro que não tenciono tomar parte na discussão desde que a camara se apresenta tão tumultuosa.

Resolveu-se que se generalisasse a discussão.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Scarnichia.

O sr. Scarnichia: - Desisto da palavra.

O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Não desejo interromper a discussão.

Venho apresentar á camara o relatorio, propostas de lei e documentos relativos á questão de fazenda.

Nos termos do regimento cumpria-mo proceder á sua leitura, todavia como é um trabalho que ha de ser impresso no Diario do governo e distribuido a todos os srs. deputados, e como a camara está preza por uma questão que n'este momento occupa toda a sua attenção, a questão colonial, limito-mo a mandar para a mesa o relatório.

O relatorio e as propostas de lei vão publicadas no fim da sessão.

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas): - Lamento o incidente que se levantou na camara o de que eu não fui por forma alguma culpado.

Causou-me effectivamente estranheza o ter-se trazido para a discussão um artigo humorístico que ha tempo escrevi, no uso de um exercicio, que do ninguém escondia, e de que me honro. O illustre deputado o sr. Elvino de Brito foi o proprio que já aqui disse que eu, apesar de ministro, tenho necessidade de manter a minha família. Não me envergonho de dizer que as necessidades da vida particular me obrigam a occupar-me no mister de obscuro escriptor litterario. (Apoiados.)

Eu trabalho porque isso me é necessario e hei de trabalhar como até agora, mas parece-me que não offendi a dignidade de ministro escrevendo um artigo humorístico a respeito de Serpa Pinto; era facil, e tem-se visto muitas vezes escrever n'este genero sem offensa para ninguém, e por isso pareceu-me estranho que se fosse procurar a um folhetim, escripto nestas condições, argumentos para contrapor às observações que eu tinha apresentado em resposta ao illustre deputado.

Lamento que o sr. deputado Elvino de Brito fosse interrompido na leitura do folhetim, (Apoiados na esquerda.) não porque a maioria não tivesse rasão para fazer o que fez, por isso que não é muito conveniente, digo, para os debates parlamentares, em que unicamente se deve tratar

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dos negocios do paiz, fazer a leitura de folhetins, que tem o seu logar em outra parte. (Apoiados.)

É facil admittir em mim como em outro qualquer esta dualidade: eu posso ser aqui ministro lá fora escriptor ou folhetinista, e n'esta ultima qualidade parece-me que podia fallar de Serpa Pinto. No que disse me baseei senão unica e exclusivamente, e o illustre deputado póde confrontar, se quizer, nas noticias que a respeito de Serpa Pinto um jornal tinha dado. Não ha uma phrase que não seja a reproducção do que já estava escripto.

Imagine s. exa. portanto, a estranheza que eu tive quando vi ,que o illustre deputado vinha fazer politica com aquelle artigo, o illustre deputado que não à devia fazer n'esta questão, porque sabe melhor do que ninguém que eu não faço politica nem despachos de qualquer ordem (apoiados), é procuro unicamente, com relação às colonias, fazer o que julgo util ao seu desenvolvimento, procurando, os homens que julgo que são proprios para as missões que lhes são incumbidas, e ninguém estranharia que eu fosse procurar o sr. Serpa Pinto para fazer uma exploração.

Não quero entrar agora no debate, que. s. exa. levantou, refiro-me só ao lamentavel incidente que se levantou.

Posso dizer affontamente que se s. exa. lesse todo aquelle folhetim, e sê o não leu todo, póde-o fazer, havia de encontrar n'elle esta expressão humoristica que se encontra vinte vezes nas paginas de Ramalho Ortigão mais brilhante do que as minhas; porém não encontraria uma palavra sequer, que não seja uma homenagem aos talentos e á audácia patriótica de Serpa Pinto.

(S. exa. reviu as notas tachygraphicas.)

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Orador: - Mando para a mesa a renovarão de iniciativa de um projecto de lei.

Vae no fim da sessão.

O sr. Scarnichia: - O que tinha a dizer é relativo a um ponto em que tocou o sr. Elvino de Brito, mas, como s. exa. não está presente, peço ao sr. presidente que me reserve á palavra para outra occasião.

Aproveito estar com a palavra para dizer, que, com relação a um incidente que houve outro dia entre mim e o sr. Elvino de Brito estou plenamente satisfeito com as explicações de s. exa.

O sr. Presidente: - Estando terminado este incidente, e visto a hora estar adiantada, dava para ordem do dia de segunda feira a discussão do bill de indemnidade.

Está levantada á sessão.

Eram cinco horas e meia da tarde.

Relatorio e propostas de lei apresentadas n'esta sessão pelo sr. ministro da fazenda, e proposta de renovação de iniciativa apresentada pelo sr. ministro da marinha

N.º 15-A.

Senhores. - Pouco depois do. haver assumido a gerencia dos negócios da fazenda, vim exporvos, com a isenção e franqueza que devo á representação politica do meu paiz, os principios que professava e as convicções que me assistiam, ao entrar em lucta com as difficuldades que acercam o problema financeiro, de todos o mais grave na vida economica de uma nação. Um anno é decorrido; a experiencia que até hoje adquiri mais me confirma no juizo e apreciação, que então fiz, das condições em que esse problema se agita, e da necessidade, que de dia a dia se accentua, de o encarar na sua inteira verdade, sem exageros que o desvirtuem, e sem exaltações que o compliquem. Nesta questão, se o optimismo se avizinha da imprudencia, em perigoso desalento resvalam as carregadas invectivas que infelizmente a paixão politica não raro inspira.

Com a verdade todos temos a lucrar; oxalá que por ella, e para ella, se abatessem de vez as animosidades partidarias, e que, dirigidas por uma vontade consciente, e segura, as armas de combate porfiassem tão só no utilissimo emprehendimento da mais completa regularisação das nossas, finanças.

Comprehende-se, que n'um systema: genuinamente constitucional, e obedecendo mesmo às boas práticas parlamentares, as - opposições se esforcem - e genericamente fallo, não me referindo em especial a nenhum dos partidos militantes - por conter nos mais severos limites aadministração dos negócios públicos, discutindo os actos do governo, ou impugnando as suas propostas legislativas, quando menos convenientes se lhes afigurem; esse é o seu direito, o seu próprio dever. O que, porém, mal se justifica, o que deixa de ser um serviço prestado á causa publica para se converter num prejudicialissimo aggravo feito aos mais altos interesses do estado, é que no ardor da peleja tudo se sacrifique ao apertado desejo de mal ferir a situação política que se digladia, fazendo uma impensada propaganda de terror, que para logo se reflecte nos mercados, onde a confiança é uma condição de vida.

Segundo o movimento impulsivo das sociedades modernas, lançámo-nos no caminho do progresso; abrimos estradas, talhámos caminhos de ferro, estabelecemos telegraphos, instituímos escolas, melhoramos serviços, procurando assim firmar as bases primordiaes de um complexo desenvolvimento de forças e de meios de acção, que pela actividade e pelo trabalho nos preparem um futuro de mais largas compensações. Estão dados os primeiros passos; e não sem custo por certo. Para que, todavia, possamos prosseguir, de uma cousa precisamos sobretudo manter o credito. E o credito é como á sensitiva; retrahe-se mal lhe tocam.

Ao credito nos temos soccorrido, para fazer vingar os nossos mais productivos commettimentos; foi elle a poderosa alavanca de que nos servimos pára conquistar um tão apreciavel incremento de riqueza, que ninguém de boa fé o póde sequer por em duvida; a todas as luzes, se patenteia, em factos de todos os dias se traduz; de molde lhe cabe aquella expressiva affirmação de um escriptor de outros tempos: Hoc quisquis non videt, coecus; quisquis videt nec laudat, ingratus; quisquis. laudanti reluctatur, insanus est.

Trouxe-nos encargos esse ousado recurso, incontestavel é; encargos pesados, que nos absorvem uma avantajada parte das receitas do thesouro. Quando, porém, nos lembramos de que as nossas receitas se, inscreviam por réis 10.362:271$043 no orçamento de 1881-1882, e de que no orçamento de 1880-1886 se inscrevem por 31.378:490$OOO réis, temos o direito de perguntar se a esta notavel elevação de receita não corresponde uma sensível melhoria nas circumstancias economicas do paiz, e se tão estéreis são os sacrificios que nos temos imposto que nos não dêem a fundada esperança de lhes vermos succeder um período de mais rasgada prosperidade.

Não quer isto dizer que irreflectida e imprudentemente nos abalancemos a todas as despezas que demandaria o prompto implemento das nossas mais sentidas aspirações. E longa bastante a vida de uma nação para que gradual e successivamente progrida; preparar e promover a sua natural evolução é uma conveniência; precipitai a seria um erro.

Mas erro não menos grave, e sentimento bem pouco louvavel, seria abafar e denegrir os persistentes esforços, com que todos temos diligenciado alevantar aqui o nivel da nossa situação económica, ao passo que; honrando sempre os compromissos assumido, procurámos assegurar ao credito do paiz foros de inteira lealdade nas praças estrangeiras a que houvemos de recorrer. Até agora as cotações dos nossos fundos, e as clausulas dos contratos de empréstimo que temos celebrado são uma prova irrefragavel de

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como se tem robustecido a confiança nos titulos de credito de Portugal. Não seria necessario remontar muito longe na historia da fazenda publica para encontrar os nossos fim dos cotados a 29 1/2 por cento, quando no Stock exckange se lhes permittia a cotação, empréstimos de divida consolidada, contrahidos a juro de 8 e 10 por cento e supprimentos até seis mezes com encargo de 18 por cento.

Esses foram annos de dura provação. Mas a despeito dos embaraços que se nos deparavam, pugnamos sem desanimo e com afincada tenacidade conseguimos tornar mais promptas e menos gravosas as transacções do thesouro, e mais seguros e fecundos os elementos de uma acção innegavelmente appropriada e benéfica aos emprehendimentos do commercio e á vivificação das industrias.

Ainda distanciados estamos, comtudo, do estadio a que miram os enérgicos impulsos da lucta que encetámos. Evidente se afigura que quando completarmos os delineamentos principaes da nossa rede ferroviaria; quando a locomotiva percorrer as regiões ainda por explorar em Traz os Montes e no Douro, na Extremadura e na Beira Baixa, no Alemtejo e no Algarve, atravessando o paiz de norte a sul, ligando os portos do oceano às arterias de circulação mais importantes na peninsula, e animando os centros onde a população é mais densa e a producção mais abundante; quando, illummadas as faxas de territorio que defrontam com o mar, melhorado o regimen das nossas enseadas, estabelecidas emfim as condições de desenvolvimento mercantil nos nossos ancoradouros, podermos facilitar e attrahir a navegação; e quando a par disto lograrmos diffundir a instrucção e generalisar os conhecimentos technicos que tão necessários são para o aperfeiçoamento dos grandes factores da civilisação moderna; rasgadas manifestações de actividade e de riqueza surgirão nos horisontes que ao presente entrevemos.

Para que possamos chegar a tão desejado fim, indispensável é que caminhemos com critério, sem leviandades que nos percam ; mas não menos indispensável é tambem que nos abstenhamos de exagerar em apaixonadas diatribes as difficuldades da nossa situação financeira, desconceituando os recursos que possuímos, pondo em duvida a solvabilidade dos nossos compromissos, e minando pela base o justo conceito que tanto nos convém firmar.

Attentemos, sim; no problema financeiro, tal como se representa na sua feição característica e nos diversos pontos de vista que lhe são peculiares, mas com a serenidade de animo que dá a consciencia do cumprimento de um dever, e sobretudo com o firme propósito de contribuirmos todos para a sua mais cabal e propositada solução. Seriamos nós os mais perigosos inimigos do paiz se adrede bus cassemos deprimir os naturaes elementos da nossa riqueza, e rebaixar as garantias inherentes á sustentação do nosso credito.

Estado financeiro do paiz

Tanto mais que, sem hesitar, e na inteira sinceridade da minha convicção o digo, a situação da fazenda publica longe está de dever inspirar receios.

Consultem-se as estatísticas, apurem-se as contas do thesouro, confrontem-se as receitas e as despezas dos ultimos annos; examine-se tudo, os defficits que se têem liquidado, os encargos que nos advém da divida consolidada, os balancetes da divida fluctuante, e de par com isto os recursos de que podemos dispor e que de anno para anno se avantajam; e á luz da verdade se reconhecerá que temos progredido, e não pouco, que o estado geral das nossas finanças tem sensivelmente melhorado, e que bastaria uma leal e desinteressada cooperação dos que, representando o paiz, militam em prol da causa publica, para em breve se consolidarem as bases em que se deve firmar o complemento da nossa organisação financeira.

Assim eu podesse, no decurso d'este trabalho, radicar em todos o convencimento da minha asserção. Corre-me em todo o caso a obrigação de a demonstrar; para isso me servirei de documentos officiaes, já publicados uns, colligidos outros para mais completo esclarecimento vosso.

Conta de gerencia dos ultimos annos

Comparando as receitas arrecadadas nas gerencias de 1878-1879 a 1883-1884, segundo as contas do thesouro, com as despezas effectuadas nos mesmos periodos, segundo as contas dos ministerios, apura-se o mappa que mais adiante vos apresento (documento n.º 1).

Ahi se vê que as receitas ordinárias nesses seis annos foram successivamente de 27.326:481$110 réis, réis 23.768:750$615, 25.851:357$255 réis, 28.745:365$319 réis, 27.987:866$877 réis e 29.614:678$661 réis. As despezas ordinárias, correspondentes a esses annos, foram de 30.905:488$388 réis, 29.170:691$716 réis, 30.812:881$792 réis, 31.291:912$960 réis, 31.777:064$265 réis e réis 30.891:182$380. Assim, o deficit ordinário elevou-se a réis 3.579:007$278 em 1878-1879, a 5.401:941$101 réis em 1879-1880, a 4.961:524$537 em 1880-1381, a réis 2.546:547$641 em 1881-1882, a 3.789:197$388 réis em 1882-1883 e a l.276:503$719réis em 1883-1884.

Para que d'esta comparação se possa formar um juízo seguro, importantes correcções ha, todavia, a fazer. Nas receitas ha a incluir as sommas com que a província de Macau contribuiu para os encargos do emprestimo de 1 .750:000$000 réis, que o ministerio da marinha applicou às suas despezas, no valor de 78:350$943 réis, que devemos levar á conta dos annos de 1879-1880 a 1881-1882. Nas despezas falta computar os juros e amortisacão, já pagos, das obrigações dos emprestimos para os caminhos de ferro do Minho e Douro e para os navios de guerra, e do fundo de 1876, só escripturados na conta das operações de thesouraria e que sobem a 111:870$000 réis em 1878-1879 e a 550:538$550 réis em 1879-1880.

E mais temos a considerar a antecipação que no primeiro semestre de 1879 se deu nos rendimentos do tabaco, por virtude da lei de 31 de março desse anno, e que, avolumando então a receita, fez baixar pelo menos a dos dois annos seguintes, e a antecipação que no primeiro semestre de 1882 se eftectuou nos despachos de vários géneros em previsão da lei de 27 de março d'esse anno, desfalcando a receita de 1882-1883.

Calculando os effeitos d'estas antecipações, teremos:

Rendimento dos impostos sobre o tabaco

[Ver tabela na imagem]

Feitas as correcções que acabo de indicar, e incluindo

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na despeza extraordinaria de 1878-1879 o adiantamento que então se verificou para compra de cereaes nas ilhas adjacentes, mais seguramente se destrinçam as verbas de receita e despeza que deixo especificadas no mappa, documento n.º 2.

E por esse mappa se evidencia que as receitas ordinárias foram: em 1878-1870, de 24.614:255$381 réis; em 1879-1880, de 20.093:449$819 réis; em 1880-1881, de 26.691:117$742 réis; em 1881-1882, de 27.811:643$534 réis ; em 1882-1883, 28.947:705$643 réis; em 1883-1884, de 29.614:678$661 réis.

De anno para anno; approximadamente 1.000:000$000 réis a mais.

Perante este notavel e accentuado incremento de receita, póde ainda duvidar se de que os recursos do thesouro, que são recursos do paiz, se têem desenvolvido numa progressão, que, se é uma garantia para o presente, não é menos uma esperança para o futuro? Pois, em cinco annos, 5.000:000$000 réis de acrescimo nos rendimentos ordinarios do estado não são ao mesmo tempo um testemunho dos sinceros esforços que todos os governos têem empenhado em melhorar as condições da fazenda publica, e um protesto contra as injustiças com que por vezes se tem pretendido amesquinhar-nos nos mercados estrangeiros?

Por outro lado, as despezas ordinárias têem, durante estes últimos annos, oscilado entre limites, que em pouco mais de 2.000:000$000 réis se distanciam: de 31.017:358$388 réis em 1878-1879, desceram a 29.721:230$266 réis em 1879-1880; elevaram-se dahi a 30.812:88l$792 réis em 1880-1881, a 31.291:912$960 réis em 1881-1882, a réis 31.777:064$265 em 1882-1883; e novamente baixaram a 30.891:182$380 réis em 1883-1884.

Para bem se apreciar estas oscillações, convém ter em vista que a partir de 1880-1881, e já n'esse anno, é que as despezas com a construcção de estradas e com os melhoramentos de portos e rios, até então computadas como ordinárias, passaram a inscrever-se na tabella da despeza extraordinária, o que, na comparação que acabamos de fazer, dá uma differença em favor da gerencia de 1879-1880, e uma grande attenuante com relação á gerencia do 1878-1879, em que avultadas foram as verbas d'aquella designação. Bastaria para isso attender a que em 1878-1379 as despezas descriptas como ordinarias, e pertencentes ao ministerio das obras publicas, foram 4.939:518$648 réis, e as extraordinárias 2.157:267$830 réis; ao passo que em 1880-1881 foram 2.286$448 réis as ordinárias, e réis 4.093:132$937 as extraordinárias. Mais especialmente mostram, porém, as contas de gerencia d'aquelle ministerio que as despezas totaes, effectuadas com estradas em 1878-1879, subiram a 2.451:984$416 réis, e a 250:661$733 réis se restringiram as despezas que com essa designação se reputavam ordinarias em 1880-1881; as demais passaram, como nos annos seguintes, á conta das verbas extraordinárias. E similhantemente, com respeito aos gastos com portos e rios. O que mostra que, se os mesmos preceitos houvessem presidido á classificação das despezas nos seis annos que confrontámos, menor seria a importancia das despezas ordinárias em 1879-1880, e muito menor a das de
1878-1879.

Em todo o caso, o augmento nos encargos da divida consolidada explica, na sua maxima parte a elevação que em media se possa colligir nas despezas dos ultimos ânuos; e se osso augmento é um ónus que pesa sobre o thesouro, tambem em muito representa o preço por que tivemos de pagar os emprehendimentos realisados em beneficio do paiz, o que tanto têem contribuído para o alargamento dos seus recursos.

Contas dos ultimos exercicios

Se, por um confronto mais completo, agruparmos as despezas totaes; ordinarias e extraordinárias, dos últimos exercicios a mais concludentes resultados chegaremos ainda.

Recorrendo às contas já publicadas, apura-se o seguinte:

[Ver tabela na imagem]

Nas contas dos exercícios, como nas de gerências, sensíveis oscillações nas despezas ordinarias ou totaes. Se de umas e outras só pretendesse tirar uma illacão restricta, concluiria pelo augmento na receita, e por uma diminuição nas despezas, da gerencia de 1883-1884, ou do exercício de 1882-1883.

Conclusões

Olhando, porem, de mais alto, para os dados deste problema, pois que o meu fim não é entrar em confrontos politicos de administrações financeiras, certo, como estou, de que todas se inspiraram nos melhores desejos de governar em proveito do paiz; e cotejando só, nos seus traços fundamentaes, o que procurei demonstrar com relação á elevação das receitas, e o que deixo expendido no concernente á realisação das despezas; creio poder concluir, com segurança, que mais largo e accentuado tem sido o movimento ascencional dos rendimentos ordinarios do estado, do que constante e definida a progressão das despezas publicas.

É por isso que o documento 11.º 2 nos mostra, quanto às gerencias de 1880-1881 a 1883-1884, em que a classificação das despezas se amoldou a idênticos preceitos, um déficit ordinário, successivamente decrescente, de 4.121:764$050 réis em 1880-1831, de 3.480:269$426 réis em 1881-1882, de 2:829:308$622 em 1882-1883, de 1.276:503$719 réis em 1883-1884.

Isto confirma a minha asserção de ha pouco.

Deixando as contas de gerências, que se acham completas até ao fim do anno económico de 1883-1884, e cuja apreciação acabei de fazer, calculemos os resultados prováveis do ultimo exercicio e do corrente, para melhor se poder ajuizar das bases em que assenta o orçamento que vos propuz para o anno de
1885-1886.

Exercício e 1883-1884

Está findo o exercício de 1883-1884; terminou em dezembro. Ainda, porém, não está formada a conta definitiva d'este exercicio. Suppondo, todavia, que nos seis mezes complementares, que decorreram de julho a dezembro de 1884, as liquidações fossem iguaes às de idêntico periodo do exercicio de 1882-1883, e que identica fosse a divida no fim de um e outro exercicio; e servindo-nos das contas parciaes já publicadas, quanto às liquidações de 1 de julho de 1833 até 30 de junho de 1884 podemos formular a seguinte conta provisoria de despezas:

[Ver tabela na imagem]

Procedendo pela mesma forma no tocante às receitas, e addicionando-lhes 1.200:000$000 réis, do producto do ultimo empréstimo, pois que essa quantia ficou o governo auctorisado levantar pelos meios mais convenientes, segundo

1 Conta geral da administração financeira do estado, pag. 322, com as correcções, quanto aos annos de 1878-1879 e 1879-1880, constantes da nota preliminar, pag. IX.

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a lei do orçamento rectificado de 2 de maio de 1884, a fim de occorrer aos excessos de despeza ordinaria e extraordinária ali votados, teremos:

[Ver tabela na imagem]

Assim a differenca entre a totalidade das despezas e a das receitas será de 1.215:488$523 réis, sendo o deficit ordinario de 2.271:435$257 réis.

Exercicio corrente de 1884-1885

No presente exercicio de 1884-1885, pouco mais de um semestre é decorrido ; o calculo das receitas e despezas acha-se todavia feito, com a possivel exactidão, no orçamento rectificado, que já tive a honra de vos apresentar.

Computando-se as differentes verbas, segundo os principios consignados no regulamento geral de contabilidade publica, liquida-se ali um deficit ordinario de 1.423:417$202 réis, quando o do primitivo orçamento não excedia a réis 969:021$079.

As mais rigorosas previsões, que nesse documento induzi de factos já occorridos, mostram, porém, que muito embora algumas das receitas não attinjam a sua presumida importancia, e algumas despezas possam ir alem dos limites que lhes foram attribuidos, muito superiores aos calculados serão os rendimentos, na sua totalidade, e disso é prova a cobrança do primeiro semestre do corrente anno económico, e menores serão no seu conjuncto as despezas, pelas vacaturas que se dão pelo que, fundado é o presupposto de que o déficit ordinário não irá muito alem de 600:000$000 réis no presente exercicio.

A despeza extraordinaria, que fora orçada em réis 5.238:000$000, rectifica-se agora em 7.020:122$388 réis; as verbas auctorisadas por leis especiaes, e as que derivaram das providencias sanitarias que o governo teve de adoptar no interregno parlamentar, perante a ameaça da invasão do cholera, explicam de sobra o augmento de réis 1.782:122$388. Cumpre advertir, comtudo, que entre essas despezas extraordinárias, differentes verbas se descrevem a que correspondem receitas próprias, no valor de 306:167$813 réis; taes são as das obras na alfândega de Lisboa, da compra do palácio de Santa Clara e da construcção do novo edifício do correio. E recursos tambem especiaes foram destinados á acquisição dos armamentos para o exercito na somma de 900:000$000 réis. Deduzidas estas quantias dos 7.020:122$388 réis, ficam 5.813:954$575 réis, para pagamento dos quaes tem applicação o producto do ultimo enprestimo.

Assim é evidente que a despeza extraordinária é compensada com recursos especiaes, já votados ou realizados, e que o déficit ordinario se reduz a proporções relativamente bem diminutas.

Comparação dos differentes exercios

E se compararmos os deficits destes dois ultimo? exercicios com os de annos anteriores, quaesquer que sejam as correcções que se lhes façam, ficará sempre subsistindo uma sensível diminuição na differenca entre as receitas e as despezas ordinarias. Essa differenca, que foi de réis 3.490:532$675 em 1877-1878, de 3:944:142$927 réis em 1878-1879, de 7.053:642$063 em 1879-1880 desceu a 4.113:122$646 réis em 1880-1881, a 3.060:144$609 réis em 1881-1882, a 2.529:194$023 réis em 1882-1883, e, segundo os cálculos que formulei, a 2.27l:435$207 réis em 1883-1864, e espero que a muito menos do réis 1.423:417$202 no exercicio corrente.

O que ainda confirma a minha asserção.

Orçamento para o exercício de 1885-1886

Pelo que toca ao orçamento que tive a honra de vos propor para o futuro exercicio de 1885-1886, é de 1.887:161$968 réis o deficit ordinario ahi descripto; em relação ao da tabella de 1884-1885, que se computara em 969:021$079 réis, representa um acréscimo de 918:140$889 réis, proveniente de se arbitrar em menos 58:227$000 réis a receita, e em mais 859:913$899 réis a despeza.

Das verbas em que se traduz o augmento de despeza, podereis ajuizar pelo que nas notas preliminares dos orçamentos parciaes se expende; o ministerio da fazenda inscreve-se com 36:232$800 réis, o da justiça 9:120$128 réis, o da guerra 15:250$347 réis, o da marinha e ultramar réis 108:483$945, o dos negocios estrangeiros 9005000 réis, o das obras publicas 143:216$417 réis, a mais do que no anno anterior. E, a par d'isto, transpõem-se 831:246$750 réis da venda de encargos geraes para a da junta do credito publico, que, com os encargos do ultimo emprestimo, se eleva em 1.378:137$897 réis. São estas parcellas, que, juntas, perfazem 859:913$899 réis de acréscimo na despeza; as vacaturas que sempre se dão, e em não pequena importancia, lhe servirão de attenuante.

Quanto às receitas, o seu cômputo é inferior em réis 58:227$000 ao do anno passado, unicamente em obediencia aos preceitos da contabilidade publica, que determinam o modo de as calcular, tomando por base os rendimentos anteriores; porque, de resto, e a avaliar pelas cobranças já effectuadas no presente anno, tudo nos indica e assegura que as receitas do futuro anno económico excederão em muito as dos annos que serviram de base ao seu calculo. Assim, a, verba do orçamento para 1885-1886, que mais distancia da sua similar na tabella de 1884-1885 é a dos direitos de importação; foi agora calculada era menos 251:O00$000 réis. Porque? Porque, em harmonia com a lei de contabilidade, se moldou pelo rendimento apurado em 1883-1884. Desde, porém, que se attenda a que o rendimento desta verba em 1882-1883 foi de 6.018:388$428 réis e que subiu a 6.992:432$284 réis em 1883-1884, licito é presumir que nem ficará estacionário no corrente anno, nem no futuro.

Das differentes classes de rendimentos, as únicas que no orçamento para 1885-1886 vão computadas em menos do que na tabella antedente, são as dos impostos indirectos com uma differença de 87:100$000 réis e a das compensações de despeza com uma differença de 16:154$000 réis.

Ora, a cobrança dos impostos indirectos no primeiro semestre do actual anno economico já se avantaja em réis 648:100$079 á de idêntico periodo de 1883-1884, documento n.º 3; e todavia foi este o ultimo anno em que se baseou o cômputo dos rendimentos para o futuro anno.

Na sua totalidade, as receitas ordinárias de julho a dezembro de 1884 sobem a mais 879:018$352 réis do que em iguaes mezes de 1883. Mantendo-se esta proporção, apuraremos no corrente anno mais 1.758:036$704 réis do que em 1883-1881. Que não é exagerado suppol-o mostra-o o exemplo do anno passado, em que, argumentando com o segando semestre, de 1883 em confronto com o de 1882, concluíamos- por um acréscimo de 751:302$315 réis, que, guardada a proporção, se deveria elevar, em todo o anno, a 1.500:000$000 réis; e de facto as contas certificam agora que se elevou a 1.733:469$691 réis,

1 A considerável elevação no déficit n'este exercício foi devida á antecipação, que no anno anterior se dera nos rendimentos do imposto sobre o tabaco.

1 Conta geral da administração financeira do estado, pag. 320.

2 Relatório da fazenda do auno passado, pag. 8.

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documento n.º 4. E desde que as receitas de 1884-1885 sejam superiores em 1.758:036$704 réis às de 1883-1884, bastaria que no futuro anno de 1880-1886 crescessem mais 13O:000$000 réis approximadamente, o que não seria muito, para, a não se exceder a despeza que vae descripta no orçamento, desapparecer o deficit ordinário de 1885-1886.

Considerações sobre a questão de fazenda

Tenho inteira fé no crescimento das receitas; assim as despezas se não avolumassem tambEm. A experiência mostra, todavia, que, por um lado, rara é a sessão parlamentar, se é que alguma tem havido, em que por leis especiaes, e a despeito do convencimento em que todos devem estar de que é indispensável restringir os saques sobre o thesouro, se não votem despendios que o orçamento não previra; e, por outro lado, sempre uma ou outra verba ha que acrescentar no orçamento rectificado. E tanto basta para que um maior desequilibrio se dê.

Isto nos deve levar a sermos verdadeiramente acautelados e prudentes na marcha geral dos negocios publicos. Repito: não acho perigosa a situação financeira; temos elementos bastantes para, com uma boa administração, levarmos de frente as difficuldades que se nos deparam no problema que mais fundamentalmente nos interessa - o da nossa estabilidade e desenvolvimento económico; mas para elle precisamos de fazer convergir toda a attenção, e os nossos mais dedicados esforços.

A primeira necessidade que ha é a de com affincada perseverança, procurarmos regularisar e aperfeiçoar o serviço da cobrança dos impostos já existentes dahi poderemos colher tanto ou maior provento do que de um imposto estabelecido em largas e pesadas bases, e com a grande vantagem de não affectar elementos de riqueza que não são inexhauriveis, e que para se não atrophiarem precisam de que se lhes deixe uma segura margem de vida.

Eis a rasão por que já no anno passado pedi, e agora insisto, em que se me conceda auctorisação para reformar os serviços aduaneiros e fiscaes, que respeitam á mais copiosa fonte de rendimento que possuímos - a dos impostos indirectos. O que dentro das attribuições do poder executivo me era dado fazer nesse sentido, tenho procurado levar a effeito desassombradamente, sem embargo dos attritos que sempre encontra quem se lança no caminho de uma regularisacão de serviços. A compensação da árdua tarefa que emprehendi está em olhar para os mappas de receita das três principaes casas fiscaes do paiz, as alfândegas de Lisboa, Porto e consumo, e ver que o producto dos impostos ali cobrados, no anno civil que ha pouco findou, é superior em cerca de 1.800:OOO$000 réis ao do anno anterior; prova esta bem evidente do que póde o natural impulso dos redditos públicos quando secundado com decidida energia por quem dirige e governa.

Dos impostos que actualmente existem, alguns ha, com tudo, que sem notável inconveniente se me afigura poderem ampliar-se na sua incidência, principalmente o imposto do sêllo; e se contraproducente seria aggravar sem reflectido exame forças tributarias que demandam liberdade de acção para se tornarem mais productivas, não menos desavisado seria o descurar a generalisação de um imposto, que sem ferir interesses substancia es possa contribuir para o equilíbrio das nossas finanças.

Pelo que toca á despeza, não é só uma rigorosa parcimonia que a justa previdencia aconselha, senão tambem toda a possível reducção nos encargos do thesouro; d'estes encargos, alguns, e indubitavelmente os mais pesados, provém de compromissos assumidos no uso do credito, e esses por honra e conveniência nossa os temos de manter sem quebra, solvendo-os integralmente como até aqui: outros, porém, e não pouco avultados, como os das classes inactivas, podem, mediante um systema de providencias, que se me afigura de todo o ponto adoptavel, minorar-se com grande proveito da nação.

Foram estas as idéas que presidiram á elaboração das propostas de lei, que ao diante encontrareis.

Antes, porém, de entrar na sua mais ampla justificação, corre-me o dever de vos dar conta da operação de credito que realisei por virtude da lei de 14 de maio de 1884, acrescentando às explicações que já dei os esclarecimentos que mais directamente respeitam ao estado em que se acha a divida publica, e às condições peculiares do nosso credito nos mercados financeiros a que maior numero de transacções nos prendem.

Emprestimo de 1884

Já antes de approvada a proposta de lei, em que tive a honra de solicitar do parlamento auctorisação para contrahir um emprestimo de 18.000:000$000 réis, destinado ao pagamento da divida fluctuante e a occorrer ao deficit e á despeza extraordinaria do presente exercício, havia eu recebido communicação de dois grupos de casas bancarias, umas inglezas e outras allemãs, de que desejariam entrar em negociações com o governo ácerca desse empréstimo- documentos n.ºs 5, 9 e 10; e não ignorava que os tomadores do empréstimo de 27 de dezembro de 1883 concorreriam a esta nova operação.

A todos os que sobre este assumpto se me dirigiram, respondera eu que até á definitiva votação d'aquella proposta de lei me absteria de negociar; a sua approvação teve logar no dia 4 de maio.

Em 5 de maio endereçou-me a casa Henry Burnay & C.a, como representante do Comptoir d'escompte, o officio, documento n.º 12, ponderando a conveniencia que se dava de promptamente se realisar aquella operação do credito. No dia immediato, foi-me entregue a proposta, documento n.º 6, que era uma abertura para o empréstimo, em que se traçavam condições geraes, ficando o preço em branco.

Julguei opportuno o momento para a negociação. A divida fluctuante ficara em 12.679:021$665 réis em 30 do abril ; o coupon de 1 de julho forçosamente a elevaria muito mais. A perspectiva de um tão considerável levantamento de fundos occasionara já então uma pequena depressão nas cotações, que manifestamente tenderia a accentuar-se, difficultando portanto a demora o bom exito da transacção. Eram rascaveis as condições dos mercados, constando-me haver a esse tempo nas praças estrangeiras importantes reservas disponíveis. E emfim a respeitabilidade dos estabelecimentos bancários que se offereciam a contratar, instando por uma solução, era motivo bem ponderoso para que não desse de mão a uma opportunidade que se affigurava boa.

Declarei, pois, que até um determinado dia, que fixei para 12 de maio, receberia as propostas que me fossem dirigidas, propostas que poderiam ter por base o typo do 3 ou de 5 por cento, acrescentando que desejaria que o empréstimo fosse todo tomado firmo, que para Portugal só reservasse approximadamente um quarto, e que em todo o caso guardava para mim o direito de negociar sobre as bases da proposta que me parecesse mais acceitavel, devendo influir na minha preferencia, afora a importancia das casas contratadoras, o quantitativo do preço liquido offerecido.

Em 8 e 10 de maio recebi as propostas, documentos n.ºs 7 e 8; em 12 do maio, as propostas, documentos n.ºs 11 e 14.

Como se vê dessas propostas, três foram os grupos de estabelecimentos bancários que as apresentaram : o primeiro constituído em Inglaterra por Baring Bros & C.°, Frederico Huth & C.º, Fruhling Goschen, Schroder & C.º, Kaphael & Sons, Samuel Montagu & C.º, e o Union bank of spain and England; o segundo formado na Allemanha e na Bélgica, pelo Deutsche Effecten & Wechsel bank,

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Deutsche Vereinsbant, o banco de Bruxellas e outros, representados pela casa Goldschmid de Frankfort-sur-le-Mein; o terceiro tendo por associados o Comptoir descompte, de Paris, a casa Stern Brothers, de Londres, e os bancos de Portugal, Lisboa á Açores, commercial de Lisboa, lusitano, alliança, nova companhia utilidade publica, commercial do Porto, união, mercantil portuense, portuguez, commercio e industria, banco do Minho e as casas commerciaes José Gonçalves Franco & Filhos e Fonsecas Santos & Vianna.

A consideração de que merecidamente gosam, e a alta influencia monetária de que dispõem os estabelecimentos bancários assim agremiados, eram amplissima garantia do inteiro cumprimento das estipulações que se fizessem ; a sua concorrencia n'aquella occasião foi de todo o ponto lisonjeira para o credito do paiz, e vale bem como resposta aos que por vezes o têem procurado deprimir.

Restava-me só comparar as condições das propostas que me haviam sido apresentadas, para de entre ellas preferir a que mais vantajosa fosse; a comparação está feita no documento n.º 15; por ella me decidi a effectuar com o terceira d'aquelles grupos o contrato de 20 de maio de 1884 documento n.º 16, como sendo o que maior preço liquido ciava ao governo, e o que por conseguinte menor encargo annual trazia para o thesouro.

E não me pareceu preferivel a proposta, feita ao typo de 5 por cento peio grupo Bahring, por não ser a operação tomada firme, como muito convinha; porque o preço de 79 1/2 por cento, ou antes deduzida a percentagem para despezas, equivaleria ao preço liquido de 71,325 réis por cada titulo de 90$000 réis, o que seria muito inferior ao da collocação das obrigações de 1881, prejudicando por isso muito sensivelmente os possuidores dessas obrigações, e porque o juro real do fundo de 5 por cento seria mais alto do que o da proposta que acceitei.

Cotejando-se os termos deste empréstimo com os de 22 de novembro de 1880 e de 27 de dezembro de 1883, documento n.º 17, vê-se que se alguma cousa inferior foi no preço liquido ao de 1883, o que não é para estranhar attendendo a que a sua importância foi muito maior, attingindo 18.000:000$000 réis effectivos ao passo que de réis 4.089:000$000 foi aquelle, muito menos oneroso foi, todavia, do que o de 1880 empréstimo alias do mesmo valor., e que a todos os anteriores se avantajara; o que simplesmente adduzo como mais um argumento em favor das
af-firmações que fiz quanto á suecessiva melhoria das condições dos nossos emprestimos, como irrecusavel symptoma da confiança a que realmente têem direito os titulos de divida publica portugueza, direito que só por interesses de restricta especulação se tem em determinadas conjuncturas procurado pôr em duvida.

Foi de 47$625 réis por titulo de 100$000 réis nominaes o producto liquido do empréstimo de 1880; de 4$500 réis o de 1883; de 48$125 réis o de 1884. Mas em 1880 estava a 51 a cotação rectificada dos nossos fundos em Londres, ao tempo em que a operação se realisou; em 1883 a l$125 réis; em 1884 a 50$875 réis. De forma que o preço do empréstimo distanciou-se da cotação existente 3$375 réis em 1880, só 2$625 réis em 1883, o 2$750 réis em 1884. O encargo annual do primeiro contrato foi de 6,29 por cento, o do segundo 6,18 por cento, o do ultimo 6,23 por cento. Tenho portanto a convicção de haver contratado em condições sobremaneira rascáveis.

Tendo o emprestimo de 20 de maio de 1884 sido negociado com o mesmo grupo de estabelecimentos bancários, que tomará o emprestimo de 27 de dezembro de 1883, reuniram-se os dois para o effeito da subscripção que se abriu em 26 de junho. O resultado da subscripção consta do documento n.º 18.

Embora o pagamento houvesse sido estipulado a prasos, os contratadores, usando da faculdade que lhes assistia. anteciparam a entrega por que se tinham integral e solidariamente responsabilisado. Por isso a divida fluctuante, que em 31 de maio era de 12.621:863$640 réis, baixou successivamente a 11.534:635$645 réis em junho, a réis 7.619:531$840 era julho, a 6.213:500$000 réis em agosto, a 1.336:500$000 réis em setembro, ficando desde então consolidada a parte d'essa divida contrahida no estrangeiro, e reduzida a 1.214:500$000 réis a divida interna, em outubro e novembro (documento n.º 19), sendo esta quantia, na sua quasi totalidade, pertencente á caixa geral de depósitos. Se em fins de dezembro se elevou a 2.169:414$585 réis e em fins de janeiro a 3.371:417$410 réis, foi isso principalmente devido á necessidade de occorrer ao pagamento do coupon de 1 de janeiro, e ao facto, previsto na lei do orçamento, de que, não condizendo precisamente as cobranças effectuadas com os encargos a satisfazer no decurso do exercício, se torna por vezes necessario lançar mão da divida fluctuante como representação de receita.

Cotação geral da fundos portuguezea

A cotação dos títulos deste empréstimo foi pouco depois concedida em Paris, e em Londres pelo Stocke exckange em 25 de novembro do 1884 quanto aparte ali emittida, e era 9 do corrente mez de fevereiro quanto aos fundos não invertidos de toda a operação.

Pelo que respeita á cotação geral dos nossos fundos, é certo que têem soffrido ultimamente uma baixa sensível, tanto no typo de 3 como no de 5 por cento, como se vê dos documentos n.ºs 20 a 23. As condições do cambio do Brazil sobre Lisboa e sobre Londres, documento n.º 24, e a elevação da taxa do desconto, no banco de Inglaterra, de 2 a 3 por cento em outubro, e de 3 a 4 e 5 por cento em novembro e dezembro, documente n.º 25, poderiam do certo modo influir nessa baixa; os consolidados inglezes do 3 por cento, que em fins de 1883 haviam ficado a 101 1/4 tambem desceram, em fins de 1884, a 99 3/16; por indubitável tenho, comtudo, que uma nociva especulação a fez acentuar, o que me convence de que a baixa é meramente temporaria, e me leva a crer que em breve obteremos o restabelecimento das nossas regulares cotações. Como, porém, mais facil é produzir uma baixa de momento do que conseguir depois uma alta segura e estavel, muito convém que na conjunctura actual nos inspiremos nos salutares princípios de uma prudente administração, mostrando assim quão desarrasoados são os expedientes que em desabo-no do credito de Portugal se pretenda fazer valer nos mercados estrangeiros.

Propostas do lei

Exposta na sua verdadeira luz a situação da fazenda publica, passarei a justificar as propostas de lei que julgo dever apresentar á vossa auctorisada apreciação.

Reorganisação da serviços aduaneiros e fiscaes

Não foi o prurido de fazer uma ostentosa reforma, nem o intento de favorecer interesses de partidários, que mo levou a pedir no anno passado uma auctorisação legislativa para reorganisar os serviços aduaneiros e fiscaes; foi, sim, a plenissima convicção que a largos traços então expuz, de que d'essa reorganisação dependia, em grande parte, o futuro das nossas contribuições indirectas. Não me eram desconhecidas as difficuldades com que teria do arcar; tantos são os escolhos que a indisciplina alevanta, que muitas vezes naufraga n'elles ainda a mais decidida vontade de os acatar. As graves responsabilidades que contratura para com o paiz ao tomar para mim a pasta da fazenda,
impunham-me, comtudo. o dever de luctar no utilíssimo emprehendimento de desaffrontar de nocivas peias a arrecadação dos mais avultados rendimentos do estado.

Não consegui então, mau grado meu, que definitivamente me fosse votada a auctorisação que solicitara. Circumstancias politicas, de todo o ponto attendiveis, recla-

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maram a breve praso o encerramento das camaras, antes do convertida em lei a proposta que eu formulára.

Providencias já adoptadas

No emtanto, o que me era dado fazer nos limites das attribuições que me competem, sem hesitar o tenho feito. Não é tudo, não é mesmo o sufficiente, de sobra o reconheço; mas ir mais alem só ao parlamento é dado.

Quanto em mim cabia, desveladamente tenho procurado melhorar os serviços d'este importantissimo ramo de administração; e, a proseguir, mais me anima a consciencia de não terem sido completamente baldados os meus esforços.

Uma das causas que de ha longo tempo contribuia para a indisciplina dos corpos fiscaes, era o facto de muitos empregados estarem fora dos seus logares, accumulando-se, sem vantagem, nos centros onde a vida é mais commoda, o desamparando, com manifesto prejuizo para o serviço, as estacões a que pertenciam. Assim era, que não raro se via simples aspirantes das alfandegas de raia, sem tirocinio nem habilitações formadas, servirem, quando serviam, nas alfandegas de Lisboa e Porto; e deixarem a fronteira, e os sitios onde o contrabando é mais frequente, muitos empregados da fiscalisacão externa, desfalcando assim os contingentes activos, já de si bem reduzidos.

Para pôr cobro a este estado de cousas, a que aliás os meus antecessores haviam tentado prover de remedio, fiz publicar e cumprir a portaria de 1 de fevereiro de 1884, regressando desde então, e conservando-se até hoje, todos os empregados nos seus logares; e, para que as vacaturas fossem mais promptamente preenchidas, restringi, em portaria de 10 de setembro de 1884, a quinze dias no continente e a trinta nas ilhas adjacentes, o praso para a posse dos empregos das alfandegas e da fiscalisação.

Em satisfação a uma necessidade de ha muito reconhecida, e como sendo uma das condições fundamentaes da reforma a effectuar, referendei o decreto de 30 de dezembro do anno preterito, em que se estabelece o concurso como forma de admissão para todas as alfandegas do paiz, em que se fixam os termos em que os concorrentes devem dar as suas provas, e as habilitações que devem possuir em harmonia com os logares a que se destinam; assim acabou o arbitrio nas nomeações, e espero que se perpetue uma nova phase, em que os titulos de capacidade e o conhecimento e a experiência dos serviços sejam os unicos elementos a attender na escolha do pessoal, como na sua promoção e accesso.

Tendo-se aposentado o director da alfandega de Lisboa, e nau podendo o director da alfandega do Porto occupar-se tão activamente como desejaria dos negócios da sua direcção, confiei, por portarias de 21 de novembro de 1884, a gerencia das nossas duas mais importantes casas fiscaes a commissoes collectivas de empregados superiores, a fim de pela divisão do trabalho, mais promptamente se occorrer ás multiplices exigências do largo expediente que o movimento de mercadorias ali determina. Por estas commissoes, differentes ordens de serviço têem sido dadas no intuito de ao mesmo tempo, tornar mais rigorosa a fiscalisação, e mais abreviado o despacho; e mediante a sua informação e proposta, varias providencias tenho adoptado, por portarias de 27 e 29 de dezembro de 1884, e de 31 de janeiro e 9 de fevereiro do corrente anno, remodelando alguns dos serviços internos, e procurando attender, quanto possivel, ás justas reclamações do commercio.

Pelo que toca ás condições materiaes das alfandegas de Lisboa e Porto, especial attenção lhes tenho dedicado.

Todos os que conhecem a alfandega de Lisboa sabem que a falta de accommodações apropriadas, e de meios rápidos e seguros para effectuar a carga, descarga, conducção e armazenagem de mercadorias, é o mais resistente obstaculo que só oppõe a uma vigilancia efficaz, e a uma segura promptidão nos despachos. Nem ali poderia ser verdadeiramente proficua uma qualquer reorganisação de serviços, sem que ao pessoal dessa alfandega se proporcionem os indispensaveis elementos de acção e de trabalho.

Por isso a commissão que, por portarias de 23 de outubro de 1883 e de 18 de janeiro de 1884, foi encarregada de estudar e propor os melhoramentos que mais conviria realisar nos serviços da alfandega de Lisboa, commissão que tão esclarecida e dedicadamente procurou desempenhar-se do seu alto encargo nas representações que, em 16 de fevereiro e 16 de julho de 1884, documentos n.ºs 26 e 27, dirigiu ao governo, e que bem mostram o detido exame a que se entregou nas muitas e successivas reuniões que teve, insistentemente pediu que se procedesse com urgência aos melhoramentos materiaes de que esta alfandega imprescindivelmente carecia.

Tendo commettido a um distincto engenheiro, que requisitara ao ministerio das obras publicas, a elaboração do plano das obras a effectuar, segundo as indicações dessa commissão, plano que por ella foi approvado, bem como o ante-projecto em que se converteu, documentos n.ºs 28 e 29, resolvi, depois de ouvir a junta consultiva de obras publicas e minas, que favoravelmente se pronunciou, mandar proceder á execução d'essas obras, applicando-lhes o producto da liquidação, que na junta do credito publico se effectuára, das denominadas cautelas de partes e de donatários vitalicios, como na minha proposta de lei se consignara.

As vantagens que deste emprehendimento deverão resultar tanto se evidenciam, que desnecessário é encarecel-as. Basta reflectir em que, sendo de 6:433 metros quadrados o espaço total, hoje reservado para as mercadorias nos differentes pavimentos da alfandega, a 10:760 metros quadrados se estenderá o espaço disponivel n'um só pavimento, quando a effeito se leve aquelle plano. Evitar-se ha por esta forma a elevação de mercadorias, que forçadamente se faz hoje para os pavimentos superiores, com perda de tempo e deterioração dos objectos; concentrar-se-ha mais a acção fiscal, evitando-se desvios e fraudes tão nocivos aos interesses do thesouro, como aos do commercio licito; e consideravelmente se facilitará o movimento dos despachos, obtendo-se, sem augmento de pessoal, um sensivel augmento de receita. A isto acresce que, ficando disponiveis os pavimentos superiores do actual edificio da alfandega, para ahi se poderá remover o ministerio da fazenda com as instituições que lhe são dependentes, reunindo-se o que está disperso, e cessando o risco que se dá com a permanencia d'esta secretaria em um edificio avariado, sem ter para isso de recorrer ao avultado despendio de uma nova construcção.

Ás requisições que me foram feitas, quanto a melhoramentos na alfandega do Porto, e que de menos impostancia e despeza eram, procurei deferir, com o auxilio do ministerio das obras publicas.

No que respeita ao serviço de despacho em outras alfandegas, e especialmente nas de raia, algumas resoluções tomei, que de inteira conveniencia se me afiguraram. Em conformidade com o artigo 6.° do convenio celebrado com a Hespanha em 16 de janeiro de 1877, foi dada á alfandega de Marvão, por decreto de 28 de novembro de 1883, a categoria de alfandega de 1.ª classe, de raia, para os effeitos dos despachos de importação, exportação e transito, por estar situada no ponto de ligação de um caminho de ferro portuguez com um do reino vizinho. Por decreto de 14 de dezembro do mesmo anno, tornou se essa disposição extensiva ás alfandegas de Valença e Villar Formoso, e ás que se estabelecessem nas estações terminus de linhas internacionaes. E, por portaria de 10 de julho de 1884 e instrucções annexas, se deu uniformidade aos despachos permittidos nos postos fiscaes da raia, designando-se as mercadorias que por ali poderiam transitar, cumpridas as

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formalidades legaes, e acabando por essa fórma os arbitrios e desigualdades que se davam.

Como tive occasião de ponderar no meu relatorio do anno passado, a portaria de 8 de fevereiro de 1880, tendo em vista a execução do regulamento do imposto do real de agua, publicado em dezembro de 1878, instituiu, na secretaria do ministerio da fazenda, uma repartição especial e independente para o serviço d'esse imposto; e mais tarde a portaria de 3 de janeiro de 1883 commetteu-lhe a administração do imposto do sal. Não tendo, porém, essa repartição um pessoal privativo, forçoso foi chamar para ella empregados adventicios, alguns dos quaes foram tirados das alfandegas, onde não podiam ser regularmente substituidos. D'ahi um estado provisorio, com caracter de permanente, o que longe é de ser uma organisação de serviços. Demais, se a cobrança d'aquelles impostos, em todo o paiz, havia em parte sido confiada a empregados especiaes, tambem em muito ficara adstricta aos agentes da fiscalisação externa. E nada ha mais difficil de conciliar do que serviços do mesmo pessoal, subordinados a duas direcções differentes; quando deve haver unidade de determinações, a miudo se suscita, um dualismo de requisições, de que a propria disciplina se resente. Extremar completamente o pessoal subordinado a uma e outra administração, impossivel fôra sem alargar sobremaneira os quadros, e sem augmentar sensivelmente as despezas.

Em presença d'estas circumstancias, e prestando inteira justiça ao zêlo e competencia com que da sua ardua missão se desempenhara o esclarecido funccionario que dirigira aquella repartição, determinei, em portaria de 8 de julho de 1884, que o serviço dos impostos do real de agua e do sal, e de outros que lhes estavam annexos, ficasse sujeito á direcção geral das alfandegas e contribuições indirectas, a que por lei mais propriamente pertencia. Com o regulamento de 4 de agosto de 1884 procurei dar cumprimento ás disposições da lei de 6 de junho d'esse anno, concernentes ao imposto do sal; e com o decreto de 6 de setembro ultimo, usando das auctorisações concedidas no decreto n.º 1 de 7 de dezembro de 1864 e na lei de 4 de maio de 1868, remodelei os serviços do imposto do real de agua, juntando-os aos da fiscalisação externa, substituindo as antigas circumscripções por quatro districtos fiscaes, em Villa Real, Vizeu, Abrantes e Evora, e estabelecendo, em cada um d'elles, um corpo de fiscalisação central, no duplo intuito de melhorar a percepção d'aquelle imposto e de vigiar e de combater a invasão do contrabando.

O que tem rendido o imposto do sal prova-o o documento n.° 30; até ao presente, nos mezes que decorreram de agosto de 1884 a dezembro nas ilhas, e a janeiro de 1885 no continente, 117:431$005 réis, muito mais do que eu calculára quando propuz as modificações que o parlamento acceitou.

O producto do imposto do real de agua tem crescido nos ultimos mezes, como mostra o documento n.° 31; as cobranças de julho a janeiro de 1884-1885, comparadas com as de identico periodo de 1883-1884, dão uma differença de mais 29:707$544 réis, e espero que sensivelmente crescerão de ora em diante.

No tocante á fiscalisação externa, algumas medidas tomei, de que desejo dar-vos conta.

Como já em tempo tive a honra de vos expor, os quadros d'essa fiscalisação abrangem um pessoal que em grande parte se acha invalido e incapaz para o serviço. E todavia, da diligencia e actividade d'esse pessoal depende principalmente o resultado da lucta com o contrabando, e portanto o crescimento de avultados rendimentos do thesouro. Aos que estavam nas condições legaes tenho dado aposentação. Muitos ha, porém, que, não tendo sessenta annos de idade ou trinta de serviço, mais não fazem do que tomar o logar aos que vantajosamente se poderiam recrutar em sua substituição. Foi para estes que propuz a aposentação com dois terços do ordenado aos vinte annos de serviço, e uma percentagem correspondente ao tempo que a mais se lhes podesse contar.

Não tendo a minha proposta de lei obtido a sancção legislativa, em graves difficuldades me encontrei. Por um lado a imminencia da invasão do cholera, impondo a necessidade de um rigoroso serviço de quarentenas e de vigilancia, obrigava o escasso pessoal valido, de que só podia dispor, a um pesado trabalho, que não raro deixava apenas seis horas de descanso por dia; por outro lado, oppondo-se a lei de 31 de marco de 1879 a que se admittissem, como guardas, militares com mais de trinta annos, insufficiente se tornava o numero dos que n'estas condições se apresentavam. Não podendo alterar o que na lei se achava escripto, e precisando instantemente de providenciar sobre um estado de cousas que dia a dia se aggravava, ordenei em 10 de setembro que fossem provisoriamente separados dos quadros os guardas e empregados menores da fiscalisação externa, que, tendo mais de vinte annos de serviço, manifestamente o não podessem continuar a prestar, até que ulteriormente se resolvesse sobre a sua situação; e em vista das urgentes exigencias do serviço fiscal e sanitario, mandei que tambem provisoriamente se admittissem, para os substituir, militares até á idade de trinta e cinco annos. E ao despacho que assim lavrei se tem dado cumprimento; rasão por que mais insisto na proposta de lei que a este assumpto se refere.

Com respeito ao accesso e promoção, dando por feitas as primeiras nomeações, que o regulamento de 1 de setembro de 1881 declarára livres para o governo, determinei que todos os legares superiores ao de simples guarda fossem providos por concurso, aberto para os empregados de categoria immediatamente inferior, terminando d'este modo a entrada para esses logares, de gente estranha aos quadros, e sobretudo dos que não eram militares, pois que a unica excepção ao principio do concurso é a consignada na lei de 26 de junho de 1883, em beneficio dos officiaes inferiores do exercito.

E, afóra isto, modifiquei, como de direito me assistia, e inspirando-me nas conveniencias do serviço, a circumscripção de differentes divisões fiscaes; procurei regularisar a cobrança e distribuição dos emolumentos nos diversos corpos; auctorisei a construcção de novas casetas para accommodação de postos fiscaes, a compra de mobilia e de roupa que bem necessarias eram para os quarteis da fiscalisação externa, e o fornecimento e canalisação de agua para os postos da linha, de circumvallação de Lisboa; e lancei as bases para o estabelecimento de um serviço de administração do material dos corpos da fiscalisação.

Taes são providencias mais importantes que pude adoptar, com a leal e dedicada cooperação do energico e prestantissimo funecionario, que actualmente tem a seu cargo a direcção geral das alfandegas e contribuições indirectas.

As estatisticas aduaneiras dão já um notavel augmento de receita.

Rendimento das alfandegas

Foi de 2.877:442$320 réis, documento n.° 32, o rendimento da alfandega de consumo era 1884; fôra de réis 2.453:141$604 em 1883; differença a mais 424:300$176 réis. Com relação a 1882, a differença foi de 377:927$266 réis; com relação a 1881 foi de 714:884$629 réis.

A alfandega do Porto, documento n.° 32, rendeu em 1884, ao todo 5.348:776$612 réis; mais 559:394$119 réis do que em 1883; mais 834:705$472 réis do que em 1882; mais 962:024$940 réis do que em 1881. E já a cobrança do mez de janeiro do corrente anno excedeu em réis 38:701$268 réis a de igual mez de 1884.

E emfim, a arrecadação dos direitos pautaes na alfandega de Lisboa foi em 1884, de 6.732:026$693 réis, documento n.° 38, superior em 313:906$296 réis á de 1883, em 66:628$000 á de 1882 e em 505:366$639 réis á de 1881. Q mez de janeiro, ha pouco findo, dá um acrescimo sobre o de 1884 de 38:207$907 réis, e já a primeira quin-

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zena do corrente mez se eleva era 68:286$089 réis sobre a de fevereiro de 1884.

Demonstrado é, pois, que as receitas das alfandegas subiram consideravelmente em 1884, e continuam com manifesta tendencia para a alta. Comparados os dois ultimos annos, o excedente em favor de 1884 é, n'aquellas tres casas fiscaes, de 1.297:601$125 réis; e já as liquidações do anno corrente revelam um augmento sobremaneira auspicioso.

Os dados estatisticos, contidos nos documentos a que acabo de me referir, prestam-se ainda a apreciações de todo o interesse ácerca de questões de administração financeira de verdadeiro alcance no assumpto de que estou tratando.

Influencia das medidas sanitarias sobre os rendimentos aduaneiros

Em presença da devastadora acção do cholera em França, e mais tarde na Italia e na Hespanha, viu-se o governo na necessidade de recorrer a energicas medidas de prevenção e garantia. Estabeleceram-se lazaretos e quarentenas; formou-se um cordão sanitario na fronteira. Que influencia tiveram estas medidas no movimento geral do commercio? Até que ponto se reflectiram no desenvolvimento das receitas do estado? Que illações se podem tirar da permanencia do cordão sanitario, com respeito á fiscalisação externa?

É evidente que, em absoluto, as repressões e os obstaculos oppostos á liberdade e á rapidez das transacções envolvem sempre uma demora e um prejuizo. Mas, em questões essencialmente praticas, os factos são os principaes elementos de juizo; só d'elles se póde tirar um corollario seguro.

Aqui os factos representam-se por algarismos. Tomando por base a proporção entre os impostos aduaneiros e o movimento das importações, compararemos as cobranças effectuadas nas alfandegas de Lisboa e Porto, durante os mezes de 1884 e 1883, e ainda nos mezes de janeiro de 1880 e 1884.

A comparação dá os seguintes resultados quanto á alfandega do Porto:

[Ver tabela na imagem]

Começaram em junho de 1884 as providencias sanitarias; então se impozeram as primeiras quarentenas, que depois variaram, consoante a marcha do cholera. Foi na segunda quinzena de outubro que se estabeleceram os lazaretos de Marvão, Villar Formoso e Valença, e que ao longo da fronteira se formou o cordão sanitario. Na segunda quinzena de janeiro ultimo cessaram estas providencias.

A nociva influencia das quarentenas deveria, principalmente, sentir-se no rendimento geral das alfandegas; o effeito benefico do cordão sanitario, como auxiliar da fiscalisação e meio repressivo do contrabando na raia, deveria, sobretudo, reflectir-se no rendimento do tabaco.

A verdade é, porém, que os dados estatisticos, acima apurados, não justificam uma asserção qualquer n'esse sentido. Comparar em absoluto os rendimentos de uns com outros mezes do mesmo anno, seria partir de uma base falsa, porque de todos é sabido que, pela propria natureza das transacções e por causas que só dependem do commercio em si, maior é, em regra, o movimento em determinados mezes do anno, e menos activo em outros.

Confrontando identicos mezes de 1884 e de 1883, vê-se que em junho o rendimento geral cresceu 56:706$461 réis; diminuiu, é certo, 4:700$226 réis em julho e 7:903$606 réis em dezembro, e apenas se elevou a mais 1:745$296 réis em agosto; mas são, em geral, mezes de menos avultada cobrança, e o acrescimo de junho explica a diminuição nos mezes seguintes; tambem a receita baixou réis 1:837$147 em maio, e ainda então não havia quarentenas. Mas houve-as, e bem rigorosas, em setembro, outubro e novembro; e, sem embargo d'isso, as receitas subiram a mais 40:467$407 réis em setembro, mais 40:370$879 réis em outubro, e mais 37:837$780 réis em novembro.

Pelo que respeita ao cordão sanitario, como meio a empregar contra a invasão de um flagello que a todos ameaçados, e a muitos victíma, bem justificado é; para repellir essa tristissima sentença de morte, todas as garantias são precisas, todos os sacrificios se fazem. Nada ha absolutamente efficaz, mas em tão angustiosas occasiões, e contra tão implacavel adversario, dever é dos governos lançar mão de todas as armas de combate. Outro é, porém, aqui, o meu ponto de vista; prende-se com questões de administração de bem diversa indole; olho apenas aos effeitos fiscaes. N'este restricto campo de experiencia não encontro resultados muito sensiveis.

Na alfandega do Porto, em todos os mezes de 1884 houve augmento nas receitas do tabaco, com excepção do mez de junho; esse augmento foi de 18:350$146 réis em novembro, e de 35:067$540 réis em dezembro. Mas fôra de 18:381$861 réis em setembro, de 20:658$373 réis em julho, e de 59:153$381 réis em maio; e em nenhum d'estes mezes havia cordão sanitario ao longo da fronteira.

Cotejemos, tambem, os rendimentos da alfandega de Lisboa; dão o seguinte:

[Ver tabela na imagem]

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[Ver tabela na imagem]

Basta olhar para a columna dos rendimentos geraes, para de prompto se reconhecer que, apesar das quarentenas, os rendimentos cresceram, e muito mais ainda no segundo do que no primeiro semestre de 1884, apesar de n'este não existirem ainda as medidas impeditivas que n'aquelles e deram.

Quanto ao tabaco, é certo que, diminuindo o seu rendimento aduaneiro em varios mezes de 1884, produziu mais 48:966$562 réis em novembro, e mais 7:748$509 réis em dezembro; mas em julho não houve cordão sanitario, e todavia esse rendimento cresceu 15:970$838 réis; em janeiro de 1885 o cordão sanitario demorou-se até á segunda quinzena, e todavia o rendimento baixou 42:720$077 réis; e a primeira quinzena do corrente mez, não havendo na fronteira essa linha de tropa, dá já um augmento de réis 12:398$358.

Nem mais seguras illações tirariamos, se a respeito de quarentenas attendessemos aos rendimentos do tabaco, e a respeito da força militar da raia nos voltassemos para os rendimentos geraes das alfandegas.

Creio, pois, que de todo o expendido me é licito concluir: que, sem embargo das precauções quarentenarias, as receitas aduaneiras subiram, o que prova que mais póde o movimento ascencional das importações, e pois a crescente actividade do commercio, do que esses transitorios impedimentos a que necessario foi sujeital-o; e que, como meio de fiscalisação, o desdobramento da força militar ao longo da fronteira, longe está de corresponder ao grande augmento de despeza que traz comsigo. Não me convenci de que, para obstar á introducção do contrabando, fosse facil ou sufficiente guarnecer a nossa linha de raia; tão extensa é ella, e em tantos sitios se póde transpor, que se não houver, mais para o interior do paiz, forças concentradas de fiscalisação, o contrabando em larga escala se continuará a fazer. E para a fiscalisação é muito a disciplina, e para muito serve o bom armamento e a experiencia no seu uso, mas indispensavel é, não menos, haver uma parcellação e mobilidade de forças, que mal se coaduna com o regimen dos corpos regulares do exercito, e um conhecimento dos habitos dos que se empregam na fraude, dos caminhos que preferem e dos expedientes de que usam, que só por um tirocinio especial se adquire. A fiscalisação externa deve ter uma organisação em muitos pontos similhante á militar; mas, como mister, diversa é a sua indole, e bem distincta a educação dos seus agentes.

Rendimento especial do imposto do tabaco

Ainda na apreciação das estatisticas aduaneiras desejo chamar a vossa attenção para um assumpto que demanda o mais aturado exame, por isso que respeita a uma das mais avultadas receitas - a do tabaco.

O documento n.° 34 mostra quanto esta receita tem diminuido na alfandega de Lisboa. A lei de 31 de março de 1879, elevando os direitos pautaes sobre o tabaco, deu logar a grandes antecipações de rendimento, que se reflectiram em desfalque nos seguintes annos de 1880 e 1881. Tomarei pois, como ponto de partida o anno de 1882, como sendo de importação regular. Em 1882 foi de 2.454:588$817 réis a receita do tabaco n'aquella alfandega; baixou a réis 2.335:784$615 em 1883, e a 2.105:312$810 réis em 1884; differença para menos n'estes dois annos 349:276$007 réis.

compensação subiu a receita na alfandega do Porto. Foi de 632:324$598 réis em 1882, de 701:812$068 réis em 1883, de 899:808$236 réis em 1884; augmento nos dois ultimos annos 267:483$638 réis.

Reunindo os dois elementos de cobrança, apura-se a receita total de 3.086:913$415 réis em 1882, de 3.037:596$683 réis em 1883, de 3.005:121$046 réis em 1884; o que dá uma differença de 81:792$369 réis para menos no anno que ha pouco findou.

Restringir-se-ía o consumo do tabaco? - os numeros constantes do documento n.° 35 assim o indicam. Mas, terá sido rigorosa a fiscalisação d'essa tão importante materia collectavel-com os meios de que dispõe, mal me atreveria a affirmal-o; e até que a fiscalisação se robusteça, mais me inclino a crer que é o contrabando o factor principal da diminuição de receita. Como combater a fraude? Convirá modificar a lei de 31 de março de 1879, descendo os direitos que affectam o tabaco nas suas differentes especies de importação, de fórma a attenuar o incentivo á especulação de má fé? - Não é por emquanto essa a minha opinião; por agora, mais prudente e muito preferivel se me afigura o dar á fiscalisação as condições e as garantias necessarias para que seja, como deve ser, effectiva e rigorosa. Sem isso, não posso dar por completa a experiencia, nem por averiguada a proficuidade de uma alteração nos impostos do tabaco.

É possivel fiscalisar melhor? - É não só possivel, mas indispensavel.

Por onde se faz o contrabando do tabaco? - O do tabaco manipulado principalmente pela raia; o do tabaco para manipulação mais perto dos centros fabris se introduz em geral no paiz. A fiscalisação faz-se directamente nas fabricas e nas alfândegas; e fóra d'ahi, quanto possivel, em toda a parte, na fronteira e no interior, junto ás costas maritimas e nos rios. Mas a fiscalisação interna das fabricas é manifestamente deficiente; se o não fora, a escripturação dos seus agentes, em parallelo com a das alfandegas, attestaria bem qual o verdadeiro movimento da producção e do consumo. E á fiscalisação externa escasseiam ainda condições de força, actividade e disciplina; não estão devidamente preenchidos os seus quadros, não tem o pessoal valido e seguro de que precisa; não possue na fronteira um numero sufficiente de postos fiscaes, com apropriadas accommodações e rapidos meios de transporte e de communicação; não póde pois desdobrar-se no interior do paiz em linhas de concentração, que se opponham ao transito das mercadorias descaminhadas; faltam-lhe armas para a defeza, estimulo para o trabalho e garantias para os revezes da lucta. E de tudo isso se vale o contrabando, assaltando as ilhas dos Açores e da Madeira, onde não é facil estabelecer em terra uma vigilancia completa, e onde não ha embarcações adequadas á fiscalisação por mar, e invadindo o continente em todos os pontos accessiveis - até nas proprias margens do Tejo.

N'estas circumstancias, não me convenço de que a diminuição dos direitos sobre o tabaco resolvesse o problema do augmento da receita; o contrabando continuaria, embora com menor lucro para quem o fizesse, e maior perda soffreriam os interesses do estado.

Ao presente, ainda a perda não é tão grande, que não possa dentro em pouco sanar-se, desde que a effeito se leve uma adequada reorganisação dos serviços aduaneiros e fiscaes.

Se era grande a minha fé no alcance da proposta de leque n'este sentido vos apresentei na sessão do anno passado, bem mais firme é hoje, ao ver os resultados que pude colher das providencias que por mim tomei. Por isso confiadamente vos peço que me habiliteis a proseguir na tarefa que me impuz, auctorisando-me a decretar uma reforma de serviços que, nos seus delineamentos fundamentaes não cabe nas attribuições do poder executivo.

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Bases para as reformas dos serviços das alfandegas e da fiscalisação

As bases d'essa reforma para vosso esclarecimento as exponho, na proposta que á vossa consideração submetto agora; em muito se conformam com as ponderações que a commissão, nomeada pelas portarias de 23 de outubro de 1883 e de 18 de janeiro de 1884, muito lucidamente desenvolveu nas representações que me dirigiu.

Converte-se a direcção geral das alfandegas e contribuições indirectas n'uma administração geral, que, pela especialidade dos trabalhos a seu cargo, fica tendo uma feição distincta das demais direcções geraes do ministerio da fazenda. A conveniencia de para essa administração superior chamar alguns empregados, que pelo seu conhecimento e experiencia dos assumptos aduaneiros e fiscaes dêem garantias de prompto e esclarecido expediente, de ha muito é reconhecida. Não quer isto dizer que as alfandegas e a fiscalisação devam ficar privadas do concurso de muitos dos seus mais prestantes auxiliares. Bastará, no meu entender, que alguns serviços mais peculiares sejam dirigi dos por funccionarios, que para elles tenham dado provas de auctorisada competencia. Esses serão substituidos nos logares que até então hajam exercido, a fim de se conservarem sempre completos os quadros, como principio essencial a observar e manter. E a todos resalvo os direitos adquiridos, para que a ninguem se faça uma injustificada violencia.

No conselho geral das alfandegas, acho conveniente que só os verificadores ou reverificadores da alfandega de Lisboa tenham logar, e não os de outras alfandegas, pois que só aquelles poderão accumular o exercicio d'essa commissão com o das suas respectivas funcções, e não desejo que, com o fundamento de pertencerem a esse conselho, se distráhiam empregados das casas fiscaes, onde têem deveres a cumprir. Abro apenas excepção para os que servirem como secretario do conselho e como chefe da secção de estatistica, pois que esses são logares de serviço effectivo e de todos os dias, inconciliavel portanto com o das diligencias aduaneiras; mas que esses, sem perda aliás dos seus direitos, sejam substituidos na sua respectiva alfandega.

O apuramento estatistico das importações e exportações deve centralisar-se na secretaria do conselho, recebendo para isso das diversas alfandegas as tabellas do seu movimento diario. E, para que a secretaria funccione com regularidade, necessario é, como de rasão o accentua o conselho na sua representação de 11 de dezembro de 1884, documento n.° 36, que se lhe institua um quadro privativo de pessoal, acabando-se com uma interinidade de nomeações, que nem estimula ao trabalho, nem importa menos despeza ao thesouro. Só assim póde o conselho desempenhar normalmente as obrigações que lho incumbem por decreto de 13 de novembro de 1878.

A suppressão de uma parte das alfandegas de raia é uma medida que a economia aconselha, e que as exigencias de serviço não desabonam. Conservando-se as que estiverem na proximidade das estações, em que os caminhos de ferro portuguezes se enlaçam com os de Hespanha, e a que, por isso, e em harmonia com o que se estipulou no convenio de 16 de janeiro de 1877, devem competir determinadas attribuições do despacho; mantendo-se, por excepção, a alfandega de Bragança, a fim de n'aquella extensa zona fiscal haver um juizo contencioso que julgue os arrestos e processos de tomadia, e um centro de inspecção para os despachos que nas suas immediações se permittirem; todas as demais alfandegas se podem eliminar, estabelecendo-se em mais larga escala postos fiscaes devidamente organisados.

A revisão dos quadros aduaneiros dará margem a uma distribuição mais adequada ao expediente das diversas alfandegas; acontece, ao presente, que se algumas, como as de Figueira e Faro, têem pessoal a mais do que o necessario, em outras, como em Lisboa e Porto, se tem elle mostrado insufficiente. Em todo o caso, supprimindo-se as que se tornam inuteis, modificando-se nas restantes o numero e a classificação dos empregos, e dirigindo-se a admissão e o accesso de fórma a garantir-lhes um pessoal instruido e disciplinado, póde, sem augmento, antes com reducção de despeza, conseguir-se uma notavel melhoria no regimen das nossas casas fiscaes.

As denominadas companhias braçaes mal poderiam continuar a manter-se. No tempo em que os seus rendimentos eram avultados, constituiam pequenas oligarchias, incommodas para o commercio, e pouco sujeitas ao trabalho e á disciplina; agora que os despachos de estiva, ou em acto successivo, vão tendo maior impulso, e que, por virtude de recentes disposições, cessa a armazenagem de muitas mercadorias, tão reduzidos ficam os proventos d'aquellas companhias, que urgente é providenciar ácerca do modo por que se deve occorrer ao movimento das cargas e descargas. N'este intuito, proponho que aos empregados existentes se attribuam vencimentos fixos, regulados pela media dos tres ultimos annos, resalvando-se-lhes os seus direitos a pensões e reformas; que para os cofres publicos revertam os fundos d'essas companhias; e que de futuro seja a direcção da alfandega que contrate, pelos salarios correntes, os trabalhadores de que precise.

Feito isto, muitos preceitos regulamentares se poderão adoptar, facilitando e abreviando os despachos, definindo e simplificando os serviços, com proveito para o thesouro e beneficio para as transacções mercantis.

E emfim, acceitas as bases que recommendo, a fiscalisação externa terá de futuro uma organisação quanto possivel militar, sem, todavia, se perder de vista a natureza especial das funcções que lhe são commettidas.

Aposentando-se os empregados fiscaes reconhecidamente inaptos; reservando-se a admissão nos quadros para os que serviram no exercito, e só admittindo na sua falta, e em restrictas condições, individuos que ahi não hajam servido, com a obrigação, ainda assim, de se instruirem no manejo das armas; fazendo-se para isso um alistamento voluntario, mas com limite de tempo não inferior a oito annos; provendo-se os logares superiores só por accesso e concurso, salvas as excepções consignadas na lei de 26 de junho de 1883; e remettendo-se para os tribunaes militares de guerra e marinha o julgamento das infracções de disciplina e a punição dos delictos; espero que em breve se conseguirá ter uma fiscalisação, terrestre e maritima, que, militarmente reconstituida, possua os indispensaveis elementos de unidade e de força.

Assegurando-se aos seus agentes a prompta liquidação da parte que lhes couber nas apprehensões e tomadias que realisarem; concedendo-se-lhes de futuro a aposentação com vencimento por inteiro quando completem vinte annos de effectivo serviço fiscal, que tão pesado é quando escrupulosamente exercido; e garantindo-se, ás familias dos que succumbirem em lucta com os contrabandistas, pensões equivalentes ao vencimento até então percebido, creio que mais se estimulará o zêlo, porque melhor se recompensará a dedicação dos que tiverem a seu cargo a defeza dos interesses do estado.

Com a administração das suas alfandegas, e dos corpos que lhe são auxiliares, não duvida a França despender alem de 10 por cento do producto dos impostos indirectos que ali são cobrados; a mais de 20:000 homens se eleva o pessoal da sua fiscalisação activa, a mais de 2:300 o numero dos seus empregados aduaneiros; cerca de 600 são as embarcações que dispõe para vigiar o contrabando nos seus rios e costas maritimas.

Entre nós, a despeza inscripta no capitulo 6.° e na parte correspondente ao capitulo 5.° do orçamento de 1885-1886 não chega a representar 7 por cento da importancia dos impostos indirectos, cobrados pelas alfandegas e pela fiscalisação externa. E salvas as aposentações, que abso-

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lutamento necessarias se tornam a bem do serviço, nenhum augmento de despeza eu peço para levar a effeito a larga reorganisação que proponho.

Imposto de sêllo

A proposta de lei n.° 2 refere-se ao imposto do sêllo; as suas disposições têem por fim obter um augmento de receita, que possa occorrer ao deficit ordinario do exercicio.

Sem embargo das successivas modificações, que a esse imposto trouxeram as leis de 2 de abril de 1873, de 7 de maio de 1878 e de 22 de junho de 1880, verbas ha que, sem grave inconveniente, me parece poderem tornar-se mais productivas, e outras que justificadamente se podem introduzir na nossa legislação fiscal.

Estimára bem não ter de propor novos impostos, nem de pedir o aggravamento dos que já existem; demasiado conheço quanto essa iniciativa pesa a quem tem de a usar; taes são, porém, as responsabilidades da gerencia da pasta da fazenda, que dever é meu expor com inteira verdade ao parlamento o que a experiencia, que tenho adquirido dos negocios publicos, me diz e aconselha.

Não julgo que, na actual situação politica do paiz, apropositado ensejo se dê para alterar substancialmente as leis que regulam o lançamento e a cobraça das nossas contribuições directas, no proposito de assim alcançar um valioso accrescimo nos rendimentos do estado; não desejaria tambem fazer agora profundas modificações nos nossos direitos pautaes, perturbando com ellas o movimento regular das transacções do commercio. O desequilibrio dos orçamentos reclama, comtudo, providencias que, quando tomadas a tempo, menos gravosas são nos seus effeitos praticos. E, de entre os impostos existentes, é o imposto do sêllo o que se me representa susceptivel de com menor prejuizo para o natural desenvolvimento da riqueza publica, contribuir, com alguns centos de contos de réis a mais, para o complemento das despezas a cargo do thesouro.

A elevação das taxas de 40 a 50 réis, de 40 e de 60 a 80 réis, nas verbas, que adiante menciono, das classes 1.ª, 9.ª, 15.ª e 16.ª da 1.ª tabella annexa á lei de 1878, já modificada pela lei de 1880, não poderá com rigor considerar-se exagerada, desde que se attente bem na natureza dos documentos que vae affectar.

Em França o imposto do papel sellado, segundo as leis de 2 de julho de 1862 e de 23 de agosto de 1871, varia, consoante as dimensões do papel, desde 0fr, 50 até 3 francos; ali o minimum de percepção é ainda superior á nossa mais pesada taxa. No Brazil o sêllo dos papeis forenses é de 200 réis, moeda fraca.

O sêllo a cobrar pela constituição das sociedades anonymas, e pelas concessões e contratos feitos pelo governo, não póde dispertar sérias reluctancias.

O augmento na importancia do sêllo applicavel ás acções, titulos de obrigações de bancos, companhias e associações mercantis estrangeiras; aos pertences de identicos documentos, quando relativos a quaesquer bancos, companhias ou associações mercantis, e a camaras municipaes e a estabelecimentos publicos; aos pertences dos conhecimentos para despachos e das apolices de seguro; e aos titulos de divida publica emittidos por governos estrangeiros; esse augmento, osculando entre 1 e 2 por 1:000 não póde de certo entorpecer o giro dos papeis de credito d'essa natureza.

Bem maiores são as taxas que os affectam, em paizes onde numerosissimas operações se fazem diariamente sobre elles. Na Allemanha, as acções e os valores ao portador, nacionaes ou estrangeiros, estão sujeitos ao sêllo de 5 por 1:000; os titulos de renda e as obrigações estrangeiras ao de 2 por 1:000, os nacionaes ao de 1 por 1:000. Em França o capital das sociedades, representado por acções, paga 1 1/2 por cento de imposto de sêllo sobre o valor nominal, quando a duração social não excede dez anãos, e 1 por cento quando superior é o seu praso; e ainda a lei de 23 de agosto de 1871 lhe acrescentou 20 por cento de addicionaes. A transmissão dos titulos nominativos das sociedades, communas e departamentos, e a conversão em nominativos dos titulos ao portador, tem de satisfazer a taxa de 1/2 por cento; a transmissão dos titulos ao portador paga 1/3 por cento sobre o valor do mercado, em virtude da lei de 22 de junho de 1872.

O imposto de sêllo de 1 por 1:000, que proponho se lance sobre a transmissão por titulo gratuito da propriedade, mobiliaria ou immobiliaria, quando isenta de contribuição de registo, não é mais do que um direito estatistico.

Reservar para o estado o monopolio da fabricação das cartas de jogar entendo ser a medida que melhor poderá cohibir a fraude, que por toda a parte se dá no paiz, fraude que de certo não provém de serem excessivas as taxas concernentes a esta industria.

Pela tabella annexa ao decreto de 3 de junho de 1880, os fabricantes de cartas de jogar, sem distincção de ordem de terras, estão sujeitos á collecta annual de 28$000 réis; o sêllo é de 40 réis por baralho, segundo o decreto de 14 de novembro de 1878; os direitos de importação, consignados na classe 16.ª n.° 129 da pauta, são de 100 réis por kilogramma.

O valor das cartas de jogar, importadas do estrangeiro em 1881 foi apenas de 569$000 réis; os direitos pautaes, cobrados nas alfandegas, não foram alem de 52$295 réis, o que mostra quanto a importação é insignificante; e isto mesmo é confirmado pelas contas de gerencia de 1883-1884, que só accusam a apresentação na casa da moeda de 7:534 baralhos de cartas, enviados pelas alfandegas de Barca de Alva, Lisboa e Porto, em que se appozeram sellos na somma de 301$360 réis. A conclusão é toda em favor de uma larga producção no paiz. As mesmas contas provam, todavia, que, no anno economico que ha pouco findou, só 23:233 baralhos foram apresentados por particulares na casa da moeda, importando todo o imposto do sêllo, assim cobrado, em 929$320 réis.

Sirva-nos ainda para confronto o exemplo da França: ahi o sêllo respectivo às cartas de jogar varia entre 0fr50, 0fr,70 e 1 franco por baralho; os direitos de importação foram fixados em 0fr,70; os fabricantes têem de pagar um imposto de licença de 100 francos por anno, fóra os addicionaes; só lhes é licito exercer a sua industria nas cidades onde haja uma direcção de contribuições indirectas; e só podem empregar na face das cartas papel fornecido pela administração do estado, e vendido por uma tarifa de 20 a 30 francos por 1:000 folhas. O producto do imposto sobe a perto de 3.000:000 de francos, ou 540:000$000 réis.

Este confronto diz tudo; guardadas as devidas proporções restará sempre uma prova irrecusavel da fraude que se dá entre nós, na venda das cartas de jogar. A contraprova está no successivo decrescimento da receita proveniente da venda das cartas de jogar, fabricadas na imprensa nacional de Lisboa.

Essa receita, que em 1874-1875 foi de 1:948$615 réis, baixou a 1:558$445 réis em 1875-1876, a 867$395 em 1876-1877, a 619$275 réis em 1877-1878, e de anno para anno a menos até que em 1883-1884 foi, tão só, de réis 23$660. E a rasão é obvia; é porque ahi se pagava alem do preço do fabrico, o sêllo.

Revertendo para o estado a fabricação, elevando-se de 100 a 500 réis o direito pautai de importação estrangeira e mantendo-se de resto a taxa actual do imposto de sêllo, para esperar é que a receita sensivelmente cresça.

E, finalmente, proponho que se auctorise a venda em Portugal de bilhetes de loterias estrangeiras, mediante o pagamento de um imposto de sêllo de 15 por cento ad valorem, e de 50$000 réis annuaes pela licença concedida aos estabelecimentos que os pretenderem vender.

Esta medida só tem vantagens, a meu ver. Permitte-se o

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que inutilmente se tem prohibido; nos termos em que a auctorisação é feita, tenho para mim que a fiscalisação será efficaz e considravel o producto da contribuição; não se vae ferir industria alguma que alimente a riqueza do paiz, fere-se tão sómente uma especulação que se traduz num jogo do acaso; e longe de se prejudicar a misericordia de Lisboa, certo estou que mais lhe aproveitarão as compensações que deste modo se lhe concedem, do que qualquer decreto ou portaria de restricção á concorrencia.

Demonstremos estas asserções.

O decreto de 3 de junho de 1841, suscitando a observancia da lei de 25 de janeiro de 1877, que prohibíra os jogos de azar, e com determinadas excepções as loterias, e querendo pôr termo aos abusos que ao uso das loterias permittidas se estão commettendo com manifesto prejuizo publico, declarou que a unica loteria subsistente de futuro seria a auctorisada per portaria de 27 de maio de 1834 e por decreto de 5 de outubro de 1838, em beneficio dos expostos da santa casa da misericordia de Lisboa, dos enfermos do hospital de S. José, dos alumnos da casa pia e dos pobres invalidos do asylo da mendicidade de Lisboa.

Mais tarde, o decreto de 5 de novembro de 1851, tendo em vista melhorar as condições da administração da santa casa da misericordia e do hospital de S. José, adoptou n'esse sentido uma serie de providencias. No relatorio d'este decreto se encontra a seguinte ponderação: «Por outra parte, torna indispensavel obstar aos repetidos abusos na introducção das loterias estrangeiras, que muitas vezes tem feito paralysar as loterias nacionaes e diminuir consideravelmente o producto d'ellas, consagrado á manutenção dos quatro mais importantes estabelecimentos de beneficencia d'esta capital». D'ahi a manutenção do decreto de 3 de junho de 1841, acompanhado de penas e medidas repressivas, applicaveis aos fabricantes, vendedores e passadores de bilhetes ou cautelas de loterias não permittidas.

Em seguida o codigo penal, decreto de 10 de dezembro de 1852, novamente prohibiu, nos artigos 270.° a 272.° todas as loteriaes não auctorisadas e estabeleceu penas pecuniarias para os infractores das leis e regulamentos concernentes a este assumpto.

E, por ultimo, a portaria de 10 de agosto de 1860 mandou, nos termos mais energicos, observar e cumprir as disposições d'aquelles decretos, dando para isso ordens terminantes ás auctoridades administrativas do reino.

A verdade é, porém, que, a despeito de todas essas prohibições, as loterias estrangeiras, e sobretudo a de Hespanha, têem aberto caminho por toda a parte, tomando cada vez maior incremento entre nós.

Em presença d'estes factos, mais avisado julgo converter em proveito do thesouro o que em beneficio da santa casa da misericordia se não tem conseguido destruir, dando a esta utilissima instituição de caridade compensações bem mais positivas.

Eis o fundamento da minha proposta de lei.

Não tenho por demasiado o imposto de 15 por cento sobre o valor nominal dos bilhetes e cautelas das loterias estrangeiras. De 15 por cento sobre os premios é o imposto do sêllo sobre as loterias nacionaes; e como todo o capital d'estas loterias é convertido em premios, com excepção de 10 por cento, o mesmo é sujeitar os prémios ao sêllo de 15 por cento que sujeitar os bilhetes ao sêllo de 13 1/2 por cento; e estas percentagens, com o addicional de 6 por cento, sobem já a 15,90 para os prémios, a 14,30 para os bilhetes; lançar, pois, 15 por cento sobre os bilhetes das loterias estrangeiras, pouco mais é do que applicar lhes o que actualmente se dá com as nossas loterias.

Convenço-me de que, com os meios de fiscalisação que alvitro, poderá a vencia dos bilhetes das loterias estrangeiras retrahir-se, apesar de agora auctorisadas, maior concorrencia para as lotarias nacionaes não creio que se dê; de umas e outras colherá o estado o que de direito lhe couber; e aos estabelecimento pios, que se tem pretendido beneficiar, acrescerá uma parte no producto dos premios que competirem aos bilhetes e cautelas que se apprehenderem por sellar, e uma parte na distribuição das multas que por transgressão da nova lei houverem de ser lançadas.

Assim, nenhum prejuizo, antes toda a vantagem, deve resultar para essas tão prestaveis instituições de philanthropia; e o estado verá augmentar as suas receitas em somma que não calculo inferior a 100:000$000 réis, sem vexar industria alguma das que contribuem para avigorar os recursos economicos do paiz.

Caixa nacional de aposentações

A proposta de lei n.° 3 tem por objecto a instituição de uma «caixa nacional de aposentações».

Sobem a 350:000$000 réis os encargos que no orçamento para o futuro exercicio se inscrevem pelos pagamentos a effectuar aos funccionarios civis aposentados. Alliviar o thesouro das largas sommas que despende com a sustentação das classes inactivas, necessidade é cada vez mais inadiavel.

Já no que respeita ás denominadas pensões de sangue, algumas providencias tomei, sob proposta da direcção geral da contabilidade, que se inspiraram no proposito de circumscrever nos seus verdadeiros limites a interpretação que rigorosamente cabe ao regulamento de 22 de setembro de 1795, mandado observar por lei de 28 de junho de 1843, e ás leis de 19 de janeiro de 1847 e de 7 de abril de 1877. Essas providencias estão consignadas nas portarias de 17 de setembro e 27 de outubro de 1884.

Para que as aposentações deixem de pesar annualmente sobre os recursos directos do paiz, indispensavel se torna, porém, um acto do poder legislativo.

Obter de prompto esse resultado, impossivel seria sem prejudicar direitos adquiridos; cortar aos que se acham aposentados o abono que percebem como recompensa de longos serviços, não tendo em geral outros meios de sustentação, nem forças sequer para de novo os grangear, fôra alem de tudo uma injustificada crueldade.

Mas sem fazer violencia aos funccionarios aposentados, sem mesmo obrigar os que estão no exercicio dos seus cargos a concorrer para as suas futuras aposentações, pois que as leis em vigor ao tempo da sua nomeação lhes prometteram esse beneficio como um direito que não teriam de conquistar com sacrificio dos seus vencimentos, creio que imperioso dever nos corre de preparar as bases de um novo systema que, não ferindo interesses já creados, desonere o estado da improductiva contribuição que em largas sommas o aggrava.

Esse é o pensamento do systema que proponho.

A partir da sua execução, os empregados civis que forem nomeados, para adquirirem direito áquelle beneficio, ficarão sujeitos a uma deducção annual de 4 por cento sobre os vencimentos que lhes couberem.

A aposentação estende-se, porém, a classes de funccionarios, até agora privados d'essa garantia; ainda os que não têem retribuições fixas, como os thesoureiros pagadores, os recebedores de comarca e outros, a que só competem percentagens de cobrança, poderão afastar de si a triste perspectiva de um futuro difficil quando se impossibilitem para o trabalho.

E nem as deducções lhes são impostas senão como uma condição da effectividade d'aquelle direito; prescindindo da aposentação, recebem por inteiro os seus vencimentos.

Mais ainda, podem prescindir da aposentação, reservando-se, todavia, a faculdade de a todo o tempo em que deixem as funcções publicas, levantarem a quantia correspondente ás deducções que lhes hajam sido feitas, com os furos capitalisados á taxa de 5 por cento; e essa quantia póde bem representar um capital importante, aproveitavel para elles, transmissivel aos seus herdeiros.

Uma unica excepção se estabelece: é a da demissão por

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crime praticado no desempenho do proprio cargo, ou em consequencia de condemnação proferida pelos tribunaes; só então perdem todo o direito que das deducções lhes provinha.

Fóra d'essa excepção, desde que se impossibilitem para o serviço, se este se manteve por trinta annos, têem a aposentação com vencimento completo: se por mais de vinte, com metade do vencimento; se nem durante vinte annos serviram, restitue-se-lhes as suas deducções com juros capitalisados.

A impossibilidade de serviço é uma condição essencial; menos para os professores de instrucção superior, pois que não basta poder reger uma cadeira, é necessario que o ensino caminhe a par dos progressos da sciencia; e á medida que as forças se gastem, mingua em geral o incentivo ao estudo.

De resto, o alvitre que exponho não aproveita só ao estado; abrange na sua acção as corporações administrativas e os estabelecimentos publicos, facultando-lhes um meio de regularem a aposentação dos seus empregados, sem de futuro sobrecarregar muito os seus orçamentos.

A administração da caixa de aposentações é confiada á caixa geral de depositos, o que tem por si a vantagem de ser desnecessario crear uma nova instituição, com augmento de pessoal e de despeza.

Empregando-se o fundo d'essa administração na compra de titulos de divida publica consolidados e de obrigações da companhia geral de credito predial portuguez, em emprestimos hypothecarios e sobre penhor de titulos do estado, e em desconto de letras de desamortisação, sufficientemente garantido fica.

Á constituição d'esse fundo se destina a deducção nos vencimentos dos funccionarios com direito a aposentação ou a levantamento de capital, e uma correspondente subvenção paga pelo estado, ou pelas juntas geraes, camaras municipaes e outros estabelecimentos publicos que concederem aposentação aos seus empregados.

A subvenção, a que o estado fica obrigado, sáe dos lucros liquides da caixa geral de depositos, e do rendimento das inscripções da junta do credito publico, com pertence averbado ao fundo de amortisação creado por lei de 10 de abril de 1876, artigo 10.°

Se estes recursos não bastassem, teria o estado de supprir a deficencia; os mais apertados calculos mostram, porém, que de sobra devem occorrer a todos os encargos.

Os lucros liquidos da caixa geral de depositos sobem já a 60:000$000 réis annuaes, e a 100:000$000 réis se elevarão uma vez approvada a proposta de lei, cuja iniciativa renovo, concernente ás operações d'essa caixa.

As inscripções averbadas ao fundo de amortisação estabelecido na lei de 1876, e actualmente existentes na junta do credito publico, têem o valor nominal de 1.000:000$000 réis, e portanto um rendimento annual de 30:000$000 réis.

Podendo com segurança calcular-se que os vencimentos dos funccionarios annualmente nomeados não excedem a 80:000$000 réis, claro é que, sendo de 4 por cento as deducções, bastará, para inteirar a subvenção do estado no primeiro anno, distrahir dos lucros liquidos da caixa geral de depositos 3:200$000 réis. No fim de trinta annos, praso em que a lei deve chegar á sua completa execução, o encargo será apenas de 96:000$000 réis, quantia inferior á importancia em que para muito breve computámos esses lucros. De esperar é, pois, que nem preciso seja recorrer aos rendimentos do fundo de amortisação, o que dará logar a que elle successivamente se avolume. Em todo o caso, só vinte annos depois da lei estar em vigor é que poderão verificar-se as primeiras aposentações, e essas com metade do vencimento; com vencimento completo só passados trinta annos; e como durante todo esse tempo crescem os lucros, que já existem, da caixa geral de depositos, e o fundo de amortisação, muito anteriormente creado, nenhuma fundada apprehensão póde haver sobre a inteira exequibilidade do systema que adoptei.

Com menos elementos, e mais duras condições, foi elle estabelecido em França. Ahi se desconta aos funccionarios civis: todo o vencimento do primeiro mez de serviço, quando nomeados; todo o augmento correspondente ao primeiro mez seguinte á promoção; e 5 por cento durante todo o exercicio das suas funcções. Só as deducções constantes subiram, no orçamento de 1881, a 15.706:000 francos, e no de 1885 se inscrevem por 22.545:855 francos; as pensões, reguladas por lei de 9 de junho de 1853 montaram em 1881 a 46.375:000 francos, e são orçadas para 1885 em 56.623:000 francos.

Entre nós, acrescendo ás deducções os recursos que mencionei, libertos ficarão os cofres publicos do pesado onus de aposentações, que tantos valores improductivamente lhes absorve.

Caixa economica portugueza

Com a proposta de lei n.° 4 tenho em vista remodelar a «caixa economica portugueza», instituida por lei de 26 de abril de 1880, como a experiencia o aconselha.

Generosa foi a iniciativa do meu illustrado antecessor, o sr. Barros Gomes, defendendo a creação de uma caixa economica garantida pelo estado. Dispertar e fortalecer nas classes menos abastadas o espirito de previdencia o economia, como correctivo aos desregramentos e tendencias de dissipação, e como apercebimento e resguardo das encontradas vicissitudes que são proprias do meio em que se vive, de ha muito tem sido o desejo e o proposito de quantos se interessam nos grandes problemas que affectam as sociedades modernas. Para isso, têem as caixas economicas sido de larga e incontestavel utilidade.

Em toda a parte, e de anno para anno, se assignala o desenvolve o seu movimento, tão salutar pela natureza das operações em que se traduz, e pelo alcance das protecções que dispensa.

Ao findar o anno de 1882, funccionavam na Inglaterra 344 caixas economicas, com 1.172:167 depositantes e 35 milhões de libras de deposito; na Irlanda 53 caixas com 303:391 depositantes, e 7 milhões de libras em deposito; na Escocia 31 caixas com 52:161 depositantes, e depositos no valor de 2.082:413 libras. Só o numero das pensões temporarias ou vitalicias que esses estabelecimentos têem concedido, desde a sua fundação, passa de 12:000 em todo o reino unido. A Prussia, no fim de 1883, contava 1:234 caixas economicas, com 956 succursaes; era de 3.363:515 o numero de depositantes, e de 1:817 milhões de marcos o valor dos depositos. Na caixa economica de Austria, os depositos existentes em 1882 representavam um acrescimo de 826 milhões de florins nos ultimos doze annos. Nos Estados Unidos só a caixa economica de New-York tem, segundo os ultimos documentos estatisticos que pude ver, 844:000 depositantes e um capital de 68 milhões de libras.

Na França, o relatorio publicado em 1884, e apresentado pelo ministro do commercio, mr. Herisson, relativamente ao anno de 1880, concluia d'este modo:- «Les 536 caisses d'épargne eu activité avec leur 869 succursales et les 675 comptables de l'état, percepteurs ou receveurs des postes, dont elles ont obtenu le concours, ont delivré 577,426 livrets à de nouveaux déposants et reçu, en 3.091:518 versements, 419,226,576 fr. 97 cent; d'autre part, elles ont solde 259:553 livrets et opere 1,456,433 remboursements s'élevant à 350,967,436 fr. 73 cent; elles ont acheté, à la demande de leurs déposants, 419,741 fr. de rente ser l'état pour un capital de 10,549,997 fr. 30 cent. et d'office 74,338 fr. de rente pour un capital de 2,077,565 fr. 99 cent. Au 31 décembre, elles avaient en dépôt, au compte de 3,841,104 déposants, 1,280,202,694 fr. 64 cent., soit, en moyenne, 333 fr. 29 cent. par dé-

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«posant. Ces derniers chiares représentaient en moyenne, par rapport à la population, 1 déposant sur 9,61 habitants ou 104 déposants ser 1,000 habitants, et 34 fr. 69 cent par habitant».

E no relatorio apresentado por mr. Cochery, concernente ás operações da «caisse dépargne postale» durante o anno de 1883, se vê que o numero de novos depositos recebidos n'essa caixa foi de 697:433, com o valor de 73.035:771 fr. 20 cent.; o dos depositos pagos 148:811, na importancia de 45,044,435 fr. 75 cent; e portanto o excesso das receitas 27,991,335 fr. 45 cent.

Entre nós, as operações das caixas economicas são ainda incipientes, e a instituição fundada pela lei de 26 de abril de 1880 não tem absolutamente correspondido ao muito que se esperava ao tempo da sua iniciação. Foi uma tentativa a dessa lei; abriu caminho para uma organisação em que melhor se possam aproveitar os ensinamentos que a experiencia trouxe-nos districtos e concelhos do paiz só foram admittidas como agencias da caixa economica portugueza as recebedorias e suas delegações; e a pratica mostra que menos acceitação encontra a idéa de fazer depositar as economias individuaes nos mesmos cofres onde se reclama o pagamento das contribuições do estado. Nem esta impressão de retrahimento é só peculiar a Portugal. Em Inglaterra, a procura das caixas economicas subiu de ponto, dando até logar a uma alta consideravel nos titulos de divida publica, quando o serviço das agencias foi commettido ás estações postaes. A França, tendo enviado a Inglaterra uma commissão especialmente encarregada de estudar os aperfeiçoamentos a introduzir no regimen das caixas economicas, abraçou tambem o expediente de considerar como agencias as estações postaes. É o exemplo d'essas nações que eu sigo na proposta de lei que estou justificando.

Differentes modificações ao que hoje se acha estabelecido me parecem ainda necessarias.

Segundo os preceitos em vigor, só annualmente se faz a capitalisação dos juros, ao passo que nos outros paizes é semestral, e até por trimestres se faz em Inglaterra. É modico o juro que se leva á conta dos depositantes; justo é, pois, que a capitalisação se faça a curtos periodos. Tambem a lei actual só permitte que os juros se liquidem por quinzenas, o que tem motivado reparos a que de plano se póde attender, evitando se que, por divergencia de datas, cerca de um mez possa correr sem que a alguns depositos se dê retribuição.

A fixação em 200$000 réis do maximo dos depositos durante cada anno, e a cessação dos juros quanto ao excedente do 500$000 réis caso os depositos se hajam accumulado em diversos annos, offerecem inconvenientes a que bem se póde obviar. A administração da caixa economica lucrará, dispondo para as suas operações de mais avultado capital; o prejuizo que lhe possa advir dos pequenos depositos melhor se compensará com os proventos auferidos de maiores entradas; e o exito d'essa instituição cobrara forças quando muitos depositantes a procurem, e muitas economias se lancem no giro dos seus fundos. Por estas rasões, proponho que aquelles limites sejam respectivamente elevados a 500$000 réis e a 1:500$000 réis, e que os monte pios, associações de auxilio, de soccorros mutuos, de beneficencia, e emfim de interesse publico, sejam admittidos a depositar as suas reservas ou saldos em cofre, sem outro limite que não seja o que as circumstancias inherentes á gerencia da caixa economica traçarem.

A condição essencial da prosperidade d'esta ordem de estabelecimentos é que as suas agencias se multipliquem, pondo-se ao alcance do todos estimulando as economias pela facilidade dos depositos, pela promptidão das liquidações, e pelos interesses assegurados aos pequenos capitaes, que, aliás, ou pela desconfiança, se mantêem improductivos, ou pelo desvario se perdem na voragem da dissipação.

Caixa geral da deposites

Cerca de cinco mil delegações tem a caixa economica de Inglaterra a funccionar por sua conta, com o nome de post office saving bank. Em Portugal, e n'este assumpto, precisâmos de nos inspirar nos beneficos exemplos que do estrangeiro nos vem, para darmos força e vida á utilissima instituição das caixas economicas.

Renovo, por outro lado, a iniciativa da proposta de lei, que já na sessão do anno passado mereceu n'esta camara a vossa approvação, e que tem por fim distender a area das operações da caixa geral de depositos, e fazer convergir para ali os saldos e receitas em cofre, pertencentes ao fundo de viação districtal, e ás misericordias, hospitaes e outros quaesquer estabelecimentos de piedade e beneficencia com administração nomeada pelo estado.

As disposições d'esta proposta de lei, como já tive occasião de dizer, augmentarão em não menos de 40:000$000 a 50:000$000 réis annuaes os rendimentos da caixa geral de depositos. E ao mesmo tempo, e pelo abono dos juros respectivos, darão movimento, garantia e lucro aos fundos disponiveis d'aquelles estabelecimentos.

Tão seguras são as operações da caixa geral de depositos, que nenhum fundado receio póde haver de se lhe entregar a gerencia d'esses capitães.

Em França, a caixa de amortização, depositos e consignações é um auxiliar a que directa ou indirectamente todos os estabelecimentos publicos se soccorrem, por dever e conveniencia; os fundos ali entrados, pertencentes ás communas, á cidade de Paris e a outras corporações ou entidades collectivas, ascenderam em 1880 a 336 milhões de francos, e em 1882 a mais de 392 milhões; os depositos feitos pelas direcções das caixas economicas representavam 1:167 milhões em 1879; o com estes muitos outros fundos se depositam ali, como os das pensões dos departamentos, das communas e dos hospitaes, o que tudo dá um importantissimo impulso ás transacções effectuadas pela caixa de amortisações e depositos.

Orçamento da despeza extraordinaria em 1885-1886

A proposta de lei n.° 6 contém a tabella da despeza extraordinaria para o futuro exercicio de 1885-1886. É calculada essa despeza em 4.940:700$000 réis; as verbas que a constituem, ou se conservam nos limites do ultimo orçamento, como as dos ministerios do reino e da guerra, e em parte, da marinha e ultramar e das obras publicas, ou são exigidas por emprehendimentos já auctorisados, e que se acham em via de realisação, como as destinadas ao caminho de ferro do Algarve e á ponte de D. Luiz; a sua totalidade é, porém, inferior em cerca de 300:000$000 réis á tabella do corrente exercicio, o que mostra quanto o governo tem a peito não avolumar as despezas, que só o recurso ao credito póde supprir.

Tanto mais que a solução a que chegaram as negociações internacionaes ácerca dos territorios do Zaire, não tardará em nos exigir, como dever de honra, que vamos tornar effectivos os direitos por que tanto pugnámos. Indispensavel é portanto que, em presença das despezas que uma dilatada occupação colonial nos occasionará, procuremos quanto possivel restringir ainda as nossas mais justificadas aspirações, pelo que toca aos melhoramentos materiaes do paiz. Que se progrida, sim, mas sem impaciencias que nos comprometiam, é o que sobretudo n'este momento devemos todos ter por lemma e norma de procedimento.

Conclusão

Como vêdes, não venho atterrar os contribuintes com a ameaça de duras imposições; não exagero a iniciativa que me cabe, embaraçando o mandato que vos foi conferido para a discussão das reformas constitucionaes, com longas e numerosas propostas, que mais caberia no tempo votarem-se; exponho a situação financeira do paiz como na rea-

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lidade a avalio, sem perigos que nos assoberbem, sem difficuldades que uma cautelosa administração não consiga afastar ou vencer.

Lembro e proponho só o que mais de prompto póde concorrer para o aperfeiçoamento dos serviços fiscaes, e para a elevação dos recursos do thesouro; tenho fé, ainda assim, de que será mais do que sufficiente para supprir o deficit ordinario, que fundadamente se possa calcular para o futuro exercicio de 1885-1886.

Tão consequente é o problema, tão graves as responsabilidades que elle envolvo, que bom fôra que no interesse do paiz se unissem as bandeiras politicas, e se pozessem de lado as dissenções partidarias, para, sem aggravos nem acintes, se attender á estabilidade do credito e á consolidação das nossas finanças.

Sois vós os representantes da nação; a vós compete julgar e decidir; nas palavras que deixo escriptas uma satisfação tenho comtudo: a certeza de ter dito o que pensava, a consciencia do haver sinceramente procurado cumprir o meu dever. O mais a vós pertence.

Secretaria, d'estado dos negocios da fazenda, em 28 de fevereiro de 1885. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.º 15-B

Proposta de lei n.° 1

Artigo l.° É o governo auctorisado:

1.º A reorganisar a direcção geral das alfandegas, o conselho geral das alfandegas, os quadros e serviços internos aduaneiros, e os da fiscalisação externa, em harmonia com as bases que formam parto integrante d'esta lei, devendo respeitar os direitos adquiridos, e não podendo exceder n'essa reorganisação a despeza, que no orçamento geral do estado para o exercicio de 1885-1886 se acha descripta na parte correlativa do capitulo V, e no capitulo VI;

2.° A aposentar os actuaes empregados aduaneiros e fiscaes que se acharem impossibilitados de servir, concedendo dois terços do seu ordenado aos que tiverem vinte annos do serviço effectivo, e mais 2l 1/2 por cento por anno, d'ahi até aos trinta annos completos de serviço;

8.° A conceder ás viuvas, e filhos menores do treze annos, dos empregados da fiscalisação externa que morrerem em consequencia de conflicto com os contrabandistas, pensões iguaes aos ordenadas recebidos por esses empregados:

4.° A rever a legislação repressiva dos contrabandos e descaminhos de direitos, estabelecendo a pena de prisão até dois annos, que será applicada pelo poder judicial nos termos do processo em vigor;

5.° A prover á execução do plano geral das obras e melhoramentos da alfandega de Lisboa, nos termos do decreto de 9 de outubro de 1884, podendo para isso alienar e edificio que o estado possue ao norte da rua do Jardim do Tabaco.

§ unico. A auctorisação conferida nos n.ºs 1.º, 2.º e 4.º d'este artigo só terá effeito durante um anno, a contar da data da publicação da presente lei, de cuja execução dará o governo conta ás côrtes.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 28 de fevereiro de 1885. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

BASES QUE FORMAM PARTE INTEGRANTE DA PRESENTE LEI

Administração geral das alfandegas e contribuições indirectas

- A direcção geral das alfandegas e contribuições indirectas é convertida numa administração geral, cujo chefe será da livre nomeação do governo, e exercerá o seu logar por commissão, com o vencimento annual de 1:000$000 réis e parte correspondente na distribuição dos emolumentos aduaneiros.

- São resalvados os direitos adquiridos pelo actual director geral das alfandegas.

- Se de futuro for nomeado administrador geral algum empregado superior dos quadros aduaneiros ou fiscaes, deixara vago o logar que haja exercido, a fim de ser ahi devidamente substituido; mas não perderá os direitos inherentes á sua categoria, voltando para o respectivo quadro quando se dê por finda, a commissão de serviço superior.

- A administração geral das alfandegas e contribuições indirectas compor-se-ha do quatro repartições, competindo á primeira o expediente, distribuição de correspondencia, expedição de decretos, regulam eitos e portarias, redacção de propostas de lei e relatorios, movimento do pessoal das alfandegas, contabilidade das receitas e despezas dos serviços aduaneiros e fiscaes, archivo e bibliotheca; á segunda os serviços da administração das alfandegas e do contencioso fiscal; á terceira os serviços concernentes aos impostos do real do agua, sal, pescado e quaesquer outras contribuições indirectas; á quarta o movimento do pessoal da fiscalisação externa, terrestre e maritima, e o expediente da administração fiscal, inspecção e mais serviços correlativos; podendo, comtudo, o governo alterar a distribuição dos serviços pelas differentes repartições, quando a experiencia o aconselhar.

- Para dirigir os trabalhos d'estas repartições poderão ser nomeados alguns funccionarios tirados dos quadros das alfandegas de 1.ª classe ou da fiscalização externa, consoante a sua especial competencia, deixando vagos os logares que lhes pertenciam, onde serão devidamente substituidos, ficando lhes, todavia, salvos os direitos inherentes ás suas respectivas categorias; a primeiro repartição deverá ser dirigida por um chefe de serviço, que substituirá o administrador geral nos seus impedimentos.

- Os empregados que actualmente pertencem ao quadro da direcção geral das alfandegas poderão, em consequencia da reorganização decretada na presente lei, transitar, na sua categoria, para outra direcção geral do ministerio da fazenda; e de futuro poderão os empregados, que não pertencerem ás alfandegas ou á fiscalisação externa, concorrer, por accesso, aos logares superiores das outras direcções geraes.

Conselho geral das alfandegas

- De entre o pessoal dependente da administração geral das alfandegas e contribuições indirectas só poderão ter logar, por commissão, no conselho geral das alfandegas, os verificadores ou reverincadores que pertencerem á alfandega de Lisboa.

- O governo fixara o quadro do pessoal da secretaria do conselho geral das alfandegas, que, alem dos serviços de expediente, terá a seu cargo a elaboração da estatistica commercial aduaneira; d'este quadro só poderão fazer parte dois empregados technicos, verificadores ou reverificadores, um como secretario do conselho e outro para dirigir o serviço da estatistica e substituir o secretario nos seus impedimentos.

- Os verificadores ou reverificadores, que fizerem serviço effectivo na secretaria do conselho, deixarão vagos os seus logares na alfandega, onde serão devidamente substituidos, conservando, todavia, os direitos inherentes á sua respectiva categoria; os demais verificadores ou reverificadores, que fizerem parte do conselho, não ficarão por isso dispensados do exercicio das suas funcções na alfandega de Lisboa.

Serviço interno das alfandegas

-As alfandegas serão classificadas em quatro grupos, pertencendo ao primeiro as alfandegas do Lisboa, Porto e consumo; o segundo as alfandegas das ilhas adjacentes; ao terceiro as alfandegas maritimas do continente do reino; e ao quarto as alfandegas da raia.

- Só serão conservadas na raia as alfandegas que estiverem junto ás estações terminus de caminhos de ferro em

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construcção ou exploração, e ainda a alfândega de Bragança; nos outros pontos da fronteira, onde as conveniencias do serviço o reclamarem, estabelecer-se-hão postos fiscaes, com attribuições para despacho de determinadas mercadorias, ficando esses postos subordinados quanto á cobrança dos direitos á alfandega de raia que lhe for mais proxima.

- O governo procederá á revisão e fixação dos quadros do pessoal das differentes alfandegas, em harmonia com as exigencias do seu expediente.

- A direcção das alfandegas de Lisboa e Porto será confiada: ou a commissões compostas de empregados da respectiva alfandega, para esse fim designados pelo governo, ou a directores especiaes, que o governo nomeara, com as habilitações necessarias para o bom desempenho dos seus logares. N'este ultimo caso, funccionará junto ao director, e sob a sua presidencia, um conselho de direcção composto de funccionarios da propria alfandega, nomeados pelo governo; este conselho será ouvido sobre os assumptos mais importantes que á direcção da alfandega caiba ré solver, e deliberara collectivamente nos casos em que a urgencia de uma decisão não permitta recorrer á administração geral, bem como sobre a interpretação e applicação das resoluções do conselho geral das alfandegas.

- A direcção das demais alfandegas será confiada a directores especiaes, da nomeação do governo.

- As direcções das differentes alfandegas serão todas consideradas como logares de quadro, comquanto exercidas por commissão; os empregados aduaneiros, que para ellas forem nomeados, deixarão vagos os seus logares, para serem devidamente preenchidos, voltando, todavia, a exercer os serviços da categoria que lhes competir, quando finda a commissão.

- Os directores serão substituidos nos seus impedimentos por sub-directores nomeados pelo governo de entre os empregados das respectivas alfandegas.

- Na revisão dos quadros do pessoal das alfandegas poderá o governo diminuir ou augmentar o numero dos empregados das diversas categorias já existentes e crear uma nova classe de terceiros verificadores.

- As condições de admissão e accesso aos logares superiores serão definitivamente fixadas pelo governo.

- Serão supprimidas as companhias dos trabalhos braçaes, conservando-se, todavia, o pessoal existente, com salarios fixos pagos pelo estado e regulados pela media dos tres ultimos annos, e com os direitos já adquiridos a pensões e reformas, revertendo em compensação, para os cofres publicos, os fundos das actuaes companhias.

- De futuro as direcções das differentes alfandegas contratarão, pelos salarios correntes, os trabalhadores de que precisarem para o serviço.

- O governo regulara os serviços da carga, descarga e movimento de mercadorias, modificando as formalidades exigidas para o seu despacho e expediente, de fórma a tornal-o mais rapido e seguro, e fixando as taxas que por esses actos se devam cobrar do commercio.

- Alem das syndicancias, a que sempre o governo mandará proceder em qualquer alfandega, serão annualmente inspeccionadas, por funccionarios aduaneiros da escolha do governo, as alfandegas de 2.ª classe maritimas e de raia no continente e as das ilhas adjacentes.

Fiscalisação externa

- O governo determinará a circumscripção das areas fiscaes, dividindo o continente do reino e ilhas adjacentes em circulos de inspecção, districtos fiscaes e postos fiscaes; estes ultimos serão estabelecidos em numero sufficiente para a devida arrecadação dos impostos do real de agua e do sal, e para o despacho de mercadorias na fronteira.

- Os corpos da fiscalisação terrestre e maritima serão constituidos á similhança dos corpos militares, ficando dependentes do ministerio da fazenda quanto aos serviços fiscaes, e aos ministerios da guerra e da marinha quanto á manutenção da disciplina; para este effeito poderá o governo nomear um ou mais inspectores militares.

- Os guardas e empregados menores até chefes de posto serão considerados como praças de pret, alistando-se por oito annos, mas podendo conservar-se por mais tempo e tendo direito á reforma, com ordenado por inteiro, no fim de vinte annos de effectivo serviço fiscal.

- A admissão aos logares de guarda será reservada para os militares que não tenham mais de trinta e cinco annos de idade e que possuam as necessarias condições de robustez e boa nota de serviço; na falta de militares que satisfaçam a essas condições, poderão ser admittidos individuos que não tenham mais de vinte e seis annos de idade, e que estejam isentos do serviço militar, devendo, porém, fazer o tirocinio de recruta no corpo de exercito que lhes for designado.

- A promoção effectuar-se-ha por concurso e dentro do quadro, sem prejuizo do disposto na lei de 26 de junho de 1883, Quanto aos officiaes inferiores, mas preferindo os que já estiverem no quadro e ahi houverem prestado bom serviço.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 28 de fevereiro de 1885.- Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.º 15-C

Proposta de lei n.° 2

Artigo 1.º São alteradas as tabellas do imposto do sêllo, annexas ao regulamento de 14 de novembro de 1878, e á lei de 22 de junho de 1880:

1.° Elevando-se de 40 a 50 réis as taxas constantes da tabella 1.ª, classe 9.ª n.° 1.° (com excepção dos articulados, minutas e allegações forenses), e classe 16.ª, n.ºs 4.° e 7.°;

2.° Elevando-se de 40 a 80 réis as taxas constantes da tabella 1.ª, classe 1.ª, n.° 13.°, e classe 9.ª n.° 1.° (na parte em que comprehende os articulados, minutas e allegações forenses);

3.° Elevando-se de 60 a 80 réis as taxas constantes da tabella 1.ª, classe 1.ª, n.ºs 3.°, 4.°, 6.°, 7.°, 8.°, 9.°, 10.°, 11.° (com a modificação introduzida na lei de 22 de junho de 1880), 14.° e 15.°; classe 9.º, n.ºs 2.°, 3.º e 9.° (modificada pela lei de 1880), 10.°, 11.°, 12.° e 14.°, e a verba nova instituda pela lei de 1880; classe 15.ª, na verba n.° 9.ª da lei de 1880; classe 16.ª, n.ºs 2.°, 3.°, 8.° e 9.°, e verba nova da lei de 1880.

Art. 2.° Os contratos feitos com o estado, de empreitadas, construcção de obras publicas, exploração de emprehendimentos materiaes de qualquer natureza, e de concessão ou adjudicação de fornecimentos de toda a especie, ficarão sujeitos ao imposto do sêllo de 1/2 por cento sobre o capital estipulado ou calculado como necessario para o cumprimento dos respectivos contratos, devendo este imposto ser pago pelos que contratarem com o estado. A identico imposto ficam sujeitas as transmissões, por titulo oneroso ou gratuito, dos direitos que os mencionados contratos houverem outorgado.

Art. 3.° As escripturas de constituição de sociedades anonymas e de parcerias mercantis ficarão sujeitas, alem dos sellos que actualmente lhes competirem, ao sêllo proporcional de 1/2 por cento sobre todo o capital das mesmas sociedades ou parcerias; igual percentagem de imposto de sêllo pagarão as sociedades ou parcerias já existentes, ou que de futuro venham a existir, quando reforçarem o seu capital, com relação á importancia do respectivo augmento.

Art. 4.° Os pertences de acções ou titulos e obrigações de bancos e companhias, ou associações mercantis de qualquer natureza, e dos districtos, camaras municipaes e de outros estabelecimentos publicos; os pertences dos conhecimentos para despacho, e das apolices de seguros; as acções ou titulos e obrigações de bancos, companhias ou associações

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mercantis estrangeiras; o os titulos de divida publica emittidos por governos estrangeiros, pagarão segundo o seu valor nominal:

Até 10$000 réis .... 20 réis
De 10$000 réis até 50$000 réis .... 50 réis
De 50$000 réis até 100$000 réis .... 100 réis
De 100$000 réis até 200$000 réis .... 200 réis

e assim successivamente, augmentando 100 réis por cada 100$000 réis ou fracção de 100$000 réis.

§ unico. Ficam por esta fórma modificadas as disposições da tabella 2.º, classe 5.º, n.º 1.° e 2.° do regulamento de 14 de novembro de 1878.

Art. 5.° Toda a transmissão de propriedade, mobiliaria ou immobiliaria, por titulo gratuito, feita por escriptura ou instrumento publico, ou julgada por sentença em processo do partilha ou de justificação, ficara sujeita, quando isenta de contribuição de registo, ao imposto do sêllo, na proporção de 1 por 1:000 do seu valor.

Art. 6.° Sempre que nos processos de expropriação por utilidade publica o expropriado contestar a indemnisação offerecida ou arbitrada, e for a final condenmado, pagara os sellos de todo o processo.

§ unico. Fica d'este modo alterada a disposição da tabella 13.º, n.° 24.°, do regulamento de 14 de novembro de 1878.

Art. 7.° A datar da publicação da presente lei, pertence ao estado o monopolio da fabricação nacional de cartas de jogar, mantendo-se o imposto do sêllo actualmente em vigor, que acrescerá aos preços de venda.

§ 1.° Ás cartas de jogar importadas do estrangeiro serão applicaveis os preceitos que ao presente regem a cobrança e fiscalisação do imposto do sêllo.

§ 2.° Os direitos de importação, inscriptos na classe 16.ª, n.° 129.°, da pauta aduaneira são elevados de 100 a 500 réis por kilogramnia.

Art. 8.° É permittida a venda de bilhetes e cautelas de loterias estrangeiras, mediante as seguintes condições:

1.° Só é permittida a venda aos estabelecimentos que se munirem de uma licença especial, concedida pela competente auctoridade administrativa, e sujeita ao imposto de sêllo de 50$000 réis. Esta licença só vigorará por um anno, mas poderá ser successivamente renovada, pagando-se novo imposto.

2.ª Todos os bilhetes e cautelas vendidos n'esses estabelecimentos, ou que por elles forem mandados vender, ficam sujeitos ao imposto de sêllo de 15 por cento do valor nominal dos mesmos bilhetes ou cautelas.

§ 1.° Serão apprehendidos todos os bilhetes ou cautelas de loterias estrangeiras, que forem encontrados em quaesquer estabelecimentos ou á venda pelas ruas, sem o competente sêllo. O producto dos premios, que couberem a esses bilhetes ou cautelas, será dividido em duas partes iguaes, pertencendo uma ao estado e outra ás instituições de beneficencia a que se destina o rendimento das loterias actualmente feitas na santa casa da misericordia de Lisboa.

§ 2.° Os estabelecimentos que, sem a necessaria licença, expozerem á venda bilhetes ou cautelas de loterias estrangeiras, quer estes se achem sellados, quer não, incorrerão, por esse facto, na pena de multa de 100$000 réis pela primeira vez, e de 300$000 réis no caso de reincidencia.

§ 3.° Os estabelecimentos que venderem ou mandarem vender, bilhetes ou cautelas de loterias estrangeiras que não estiverem devidamente sellados, incorrerão, por esse facto, na multa de 300$000 réis pela primeira vez, e de 500$000 réis no caso de reincidencia, sem prejuizo do disposto nos paragraphos antecedentes.

§ 4.° Os vendedores ambulantes de bilhetes ou cautelas, não devidamente sellados, de loterias estrangeiras incorrerão na pena de prisão de quinze dias a um mez, e multa correspondente, sem prejuizo do disposto nos paragraphos antecedentes.

§ 5.° Os individuos, ou estabelecimentos de qualquer natureza, que, por desconto ou de outra fórma, se encarregarem de cobrar premios que caibam a bilhetes ou cautelas de loterias estrangeiras, que não houverem sido competentemente sellados, incorrerão na multa de 100$000 réis pela primeira vez, e de 200$000 réis no caso de reincidencia.

§ 6.° O producto das multas estabelecidas nos §§ 2.°, 3.° e 5.° será dividido em tres partes iguaes, competindo uma aos denunciantes e apprehensores, outra ao estado e outra ás instituições de beneficencia a que se refere o § 1.°

Art. 9.° O governo fará os regulamentos necessarios para a execução da presente lei.

Art. 10.º Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 28 do fevereiro de 1885. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.º 15-D

Proposta de lei n.° 3

Artigo 1.° É creada uma caixa de aposentações para todos os funccionarios publicos civis do continente e ilhas adjacentes, que se denominará «caixa nacional de aposentações».

Art. 2.° A caixa nacional de aposentações é administrada, e os fundos d'ella geridos, pela junta do credito publico, por intermedio da caixa geral de depositos.

Art. 3.° Os funccionarios publicos civis, nomeados depois da data que se fixar no regulamento da presente lei, que quizerem ter aposentação, ficam sujeitos á deducção mensal da quota de 4 por cento de todos os seus vencimentos, ou sejam vencimentos fixos, ou quotas, ou gratificações ordinarias ou extraordinarias de qualquer especie; o producto d'essa deducção dará entrada na caixa nacional de aposentações.

Art. 4.° Os thesoureiros pagadores, recebedores de comarcas, ou outros funccionarios que, como estes, em vez de vencimento percebem quotas sobre os valores por elles arrecadados, e que queiram ter aposentação, contribuirão para a caixa nacional de aposentações com uma quota mensal, correspondente á duodecima parte da totalidade media das quotas recebidas por elles nos tres annos anteriores, e que lhes será fixada pelo governo.

Art. 5.° Os funccionarios, que se inscreverem como subscriptores da caixa nacional de aposentações, podem prescindir da aposentação e reservar-se o direito de quando, por qualquer circumstancia, abandonarem o serviço publico, levantarem as quotas e subvenções respectivas, com os juros capitalizados.

§ unico. N'este caso revertem a favor dos seus herdeiros as mesmas quotas e subvenções com os juros capitalisados.

Art. 6.° A aposentação dos funccionarios, inscriptos na caixa nacional de aposentações, só terá logar quando esses funccionarios estiverem completamente impossibilitados para o trabalho que lhes foi distribuido. Essa impossibilidade será devidamente comprovada.

§ unico. Os professores de todas as escolas superiores de instrucção publica têem direito á aposentação nos termos da presente lei, sem que se prove a sua impossibilidade para o serviço do magisterio.

Art. 7.° Os funccionarios, que estiverem inscriptos na caixa nacional de aposentações ha mais de trinta annos, serão aposentados com uma pensão igual ao vencimento que tiverem ao tempo da aposentação.

Art. 8.° Os funccionarios, que estiverem inscriptos na caixa nacional de aposentações ha mais de vinte annos, serão aposentados com uma pensão igual á metade do vencimento que tiverem ao tempo da sua aposentação.

Art. 9.° Os funccionarios, que estiverem inscriptos na

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caixa nacional de aposentações ha mais de vinte annos, receberão, a titulo de aposentação, a totalidade das suas quotas com os juros capitalisados.

Art. 10.° A capitalisação dos juros, a que se referem as artigos 5.° e 9.°, será feita mensalmente e pela taxa de 5 por cento ao anno.

Art. 11.° Os funccionarios, demittidos por motivo de algum facto crime praticado no exercicio das suas funcções, ou por condemnação nos tribunaes, perdem todo o direito proveniente das quotas com que tiverem contribuido para a caixa nacional de aposentações, embora se tenham reservado o direito de as levantar quando por qualquer circumstancia houvessem de abandonar o serviço. Essas quotas revertem a favor do fundo da mesma caixa.

Art. 12.° Para a liquidação das pensões de aposentação, pagas pela caixa nacional de aposentações, ter-se ha tão sómente em vista o vencimento fixo, ou arbitrado nos termos do artigo 4.°, que o funccionario perceber ao tempo da sua aposentação, postos de parte os emolumentos ou gratificações do qualquer natureza que lhe estejam sendo pagos.

Art. 13.° As pensões de aposentação pagas pela caixa nacional de aposentações são, para os effeitos da penhora, equiparadas aos vencimentos da actividade.

Art. 14.° O fundo ou capital da caixa nacional de aposentações será formado pelas quotas deduzidas mensalmente dos vencimentos dos funccionarios, e pelas subvenções pagas pelo estado, juntas geraes de districto, camaras municipaes ou estabelecimentos publicos que tiverem administração propria, segundo a classe dos funccionarios.

Art. 15.° A subvenção do estado consistirá em uma quota igual á deducção feita no vencimento d'aquelles dos seus empregados, que se inscreverem na caixa nacional de aposentações, para os effeitos dos artigos 6.° a 9.° da presente lei. Identica subvenção será paga pelas juntas geraes de districto, camaras municipaes, e estabelecimentos publicos que tiverem administração propria, com relação ás classes de empregados a que concederem aposentação, e que nos termos d'esta lei quizerem ter direito a esse beneficio.

Art. 16.° A subvenção, com que o estado tiver a contribuir pelos seus funccionarios, sairá dos lucros liquidos da caixa geral de depositos e do rendimento das inscripções da junta do credito publico com pertence averbado ao fundo de amortisação creado pelo artigo 11.° da carta de lei de 10 de abril de 1876, já existentes, e das que ainda forem compradas com os lucros da mesma caixa. Se esses lucros e rendimento de inscripções não forem sufficientes, o estado contribuirá mensalmente com o saldo necessario para o pagamento da referida subvenção.

Art. 17.° Nas inscripções, com pertences averbados ao fundo de amortisação creado pelo artigo 10.° da carta de lei de 10 de abril de 1876, já existentes, e nas que venham a ser compradas com os lucros liquidos da caixa geral de depositos, será lançado o pertence seguinte - «pertence á caixa nacional de aposentações».

Art. 18.° O fundo ou capital da caixa nacional de aposentações será empregado na conformidade das prescripções que regem a applicação dos fundos da caixa geral de depósitos, e ainda em emprestimos hypothecarios.

§ unico. Os emprestimos hypothecarios não poderão em caso algum realisar-se por quantia superior a metade do valor da propriedade hypothecada, devidamente comprovado.

Art. 19.° A junta do credito publico dará annualmente conta ás camaras do estado da caixa nacional de aposentações, em relatorio com o desenvolvimento devido.

Art. 20.° Fica o governo permanentemente auctorisado a decretar os regulamentos provisorios necessarios para boa execução da presente lei, que serão convertidos em regulamento definitivo no prazo de dez annos, a contar da data da execução da mesma lei.

Art. 21.° Fica revogada a legislação em contrario. Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 28 de fevereiro de 1885. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.° 15-E

Proposta de lei n.° 4

Artigo 1.° A caixa economica portugueza é administra-la, e os fundos d'ella geridos, pela junta do credito publico, por intermedio da caixa geral de depositos.

Art. 2.° A caixa economica portugueza funcciona por meio da sua administração, das agencias e das sub-agencias escolares.

Art. 3.° São agencias da caixa economica portugueza:

1.° Nas sédes das comarcas ou bairros as respectivas recebedorias;

2.° Nas sédes de concelhos, que não forem cabeças de comarca, as delegações das recebedorias correspondentes;

3.° As estações telegrapho-postaes que para esse fim forem indicadas.

São sub-agencias da caixa economica portugueza todas as escolas officiaes de instrucção primaria, ou sejam para o sexo masculino ou feminino.

§ unico. São chefes das sub-agencias, os professores ou professoras respectivos.

Art. 4.° O minimo do deposito na caixa economica portugueza é de 100 réis, e o maximo de 500$000 réis em cada anno economico. Se o deposito, em differentes annos economicos, se elevar a mais de 1:500$000 réis, o excelente a esta quantia não vencerá juros.

§ unico. Nenhuma quantia depositada poderá conter fracção de 100 réis.

Art. 5.° As caixas economicas, os monte pios, as associações de auxilio mutuo e de soccorros, os estabelecimentos de beneficencia e todos os de utilidade publica, já existentes, ou que venham organisar-se de futuro, são admittidos a depositar na caixa economica portugueza os seus saldos em cofre.

§ unico. O maximo do deposito permittido a cada uma d'essas instituições, será fixado pela administração da caixa economica portugueza.

Art. 6.° Os depositos poderão tambem ser feitos em sellos para esse fim fabricados na casa da moeda, e chamados sellos da caixa economica portugueza.

Art. 7.° A taxa do juro abonado pela caixa economica portugueza é de 3,60 ao anno. A liquidação e capitalisação dos juros tem logar duas vezes por anno: no dia 1 de janeiro e no dia 1 de julho. Fóra d'estas epochas, só se liquidam juros aos depositos que forem levantados na sua totalidade.

§ unico. Não vence juro qualquer deposito, ou fracção de deposito, inferior a 1$000 réis.

Art. 8.° Os depositos, feitos do dia 1 ao dia 10 de qualquer mez, começam a vencer juro no dia 11; os depositos, feitos do dia 11 até ao dia 20, começam a vencer juro no dia 21; os depositos feitos do dia 21 até ao ultimo do mez, começam a vencer juro no dia 1 do mez seguinte. Deixam de vencer juros, no dia 1, os que forem levantados de 1 até 10 do mesmo mez; no dia 11, os que forem levantados de 11 até 20; e no dia 21, os que forem levantados de 21 até ao ultimo do mez.

§ unico. No pagamento dos juros revertem a beneficio da caixa as fracções de juro inferiores a 5 réis.

Art. 9.° Todo o depositante, cujo credito for sufficiente para acquisição de um ou mais titulos do governo, ou acções ou obrigações de qualquer banco ou companhia nacional, poderá solicitar da administração que faça comprar nos limites do seu deposito, e averbar em seu nome, os titulos, acções e obrigações que indicar.

§ unico. A compra d'estes papeis de credito será feita em praça, por intermedio de corretor de numero.

Art. 10.° As sommas depositadas na caixa economica

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portugueza são, para todos os effeitos da penhora, equiparadas ás pensões a que se refere o n.° 9.° do artigo 815.° do codigo do processo civil.

Art. 11.° O depositante póde em qualquer epocha levantar parte ou a totalidade do seu deposito.

§ 1.° Não poderá comtudo levantar quantia inferior a 100 réis, ou que contenha fracção de 100 réis, a não ser era caso de saldo de conta, sendo a fracção proveniente de liquidação de juros.

§ 2.° Se a administração julgar conveniente, poderá exigir aviso previo, com antecedencia de dez dias, para levantamento de quantias de 20$000 réis a 100$000; de vinte dias para as de 100$000 réis a 500$000 réis; e de trinta dias para as que excederem 500$000 réis.

Art. 12.° No caso de fallecimento do depositante, os depositos até 200$000 réis serão entregues aos seus herdeiros, mediante habilitação feita perante a administração da caixa economica portugueza, nos termos que se acham estabelecidos pelas cartas de lei de 24 de agosto de 1848 e 5 de agosto de 1854, quanto ao averbamento de inscripções da junta do credito publico.

Art. 13.° Reverte a favor dos lucros da caixa:

1.° O credito do depositante que, durante trinta annos não interrompidos, não tiver tido movimento;

2.° O credito do depositante que não tenha herdeiros legitimos ou testamentarios.

Art. 14.° Os lucros liquidos da caixa economica portugueza formarão um fundo de reserva, especialmente destinado a occorrer ás perdas eventuaes da mesma caixa.

Art. 15.° Os fundos da caixa economica portugueza serão empregados em conformidade com as prescripções que regem a applicação dos fundos da caixa geral de depositos.

Art. 16.° O estado assegura, contra todos os casos de forca maior ou fortuita, a restituição dos depositos effectuados na caixa economica portugueza.

Art. 17.° As despezas da caixa economica portugueza, até que das suas operações resultem lucros liquidos, continuarão a sair, por adiantamento reembolsavel e gratuito, dos lucros correntes auferidos pela caixa geral de depositos.

Art. 18.º As cadernetas, contratos de emprestimos e todos os documentos relativos a depositos ou emprestimos, emanados da caixa economica portugueza, são isentos do imposto do sêllo.

Art. 19.° Toda a correspondencia dirigida pelos depositantes da caixa economica portugueza á administração, e por esta áquelles, é isenta de porte postal.

Art. 20.° Fica o governo permanentemente auctorisado a decretar, ouvida a junta do credito publico, os regulamentos geraes e especiaes necessarios para a execução da presente lei.

Art. 21.° Fica revogada a legislação em contrario, e todas as disposições da carta de lei de 26 de abril de 1880, não contidas na presente lei.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 28 de fevereiro de 1885. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.º 15-F

Proposta de lei n.° 3

Renovo a iniciativa da proposta de lei n.° 3, apresentada na sessão legislativa de 28 de fevereiro de 1884.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 28 de fevereiro de 1885. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.º 15-G

Proposta de lei n.° 6

Artigo 1.° A despeza extraordinaria do estado, no exercicio de 1884-1885, é fixada em 4.940:700$000 réis, segundo o mappa annexo a esta lei e que d'ella faz parte; a saber:

.° Ao ministerio dos negocios da fazenda 116:000$000 réis;

2.° Ao ministerio dos negocios do reino 50:000$000 réis;

3.° Ao ministerio dos negocios da guerra 300:000$000 réis;

4.° Ao ministerio dos negocios da marinha e ultramar 460:700$000 réis;

5.° Ao ministerio das obras publicas, commercio e industria 4.014:000$000 réis.

Art. 2.º Para occorrer á despeza de que trata o artigo antecedente, fica o governo auctorisado a levantar, pelos meios que julgar mais convenientes, até á somma acima mencionada de 4.940:700$000 réis.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, em 28 de fevereiro de 1885.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

Mappa da despeza extraordinaria do estado para o exercicio de 1885-1886 a que se refere a proposta de lei datada de hoje

[Ver mapa na imagem]

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574 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

Ministerio das obras publicas, commercio e industria

[Ver tabela na imagem]

Ministerio dos negocios da fazenda, em 28 de fevereiro de 1885. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

Proposta de lei n.° 15-H

Renovo a iniciativa da proposta de lei n.° 54-B de 31 de março de 1884, na parte que auctorisa o governo a reembolsar os credores das provincias ultramarinas da Africa, por dividas que oneram os respectivos cofres com encargos de juro e amortisação.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 28 de fevereiro de 1885. = Manuel Pinheiro Chagas.

Representação apresentada pelo sr. João Arroyo e mandada publicar n'este Diario

Senhores deputados da nação portugueza. - A conferencia pedagogica do Porto, composta dos professores primarios do primeiro circulo da segunda circumscripção escolar, resolveu, em sessão publica, representar aos poderes do estado expondo-lhes os inconvenientes que na execução da

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SESSÃO DE 28 DE FEVEREIRO DE 1885 575

lei de 2 de maio de 1878 têem sido evidenciados. A mesma conferencia elegeu uma commissão para executar aquella resolução.

É no cumprimento d'esse mandato que os signatarios têem a honra de vir expor os principaes inconvenientes das ultimas leis do ensino primario, e indicar os topicos culminantes ou cardinaes de uma reforma da instrucção popular que seja perfeitamente exequivel e garanta ao professorado uma situação que o livre da miseria.

Srs. deputados da nação. - A descentralisação rapida, e sem transicção gradual, que a lei vigente do ensino primario decretou, passando de um systema profundamente centralisador a outro rasgadamente descentralisador, veiu trazer um estado de cousas ao ensino e ao professorado primario, que não póde nem deve prolongar-se, sob pena de aniquilar n'este paiz uma instituição de que depende, carinhosamente amparada, a felicidade publica. Sc exceptuarmos honrosas excepções, podemos asseverar que as corporações administrativas para quem a lei transferiu os encargos e a parte mais importante da administração do ensino primario, não haviam ainda chegado áquelle estado de illustração indispensavel para que, das importantes attribuições conferidas pela lei, fosse feito o conveniente uso.

Taes corporações, em geral, consideram essas attribuições; que em paiz mais adiantado em civilisação seriam tidas como apreciaveis regalias, um encargo oneroso, pesadissimo e incommodo sem compensação nem utilidade. Lançou-se a semente á terra sem que esta se houvesse preparado. Deveria primeiramente ter-se educado a população para em seguida descentralizar este de todos o mais importante ramo de serviço publico; isto é, deveria educar-se para descentralizar, e não descentralisar para conseguir a educação. Começou a lei por onde deveria ter acabado.

D'aqui tem resultado essa enorme perturbação nos assumptos da instrucção primaria, toda essa miseria em que vive o professorado, succedendo que muitos de seus membros se têem encontrado na dolorosa situação de mendigar pelas das o pito da caridade!

A imprensa por mais de uma vez tem dado conhecimento d'esta vergonha. Frequentemente têem esses infelizes recorrido aos poderes a quem a lei confiou os seus destinos, mas nem são attendidos, nem encontram no recurso ás instancias superiores remedio para os seus males, nem reparação da injustiça com que são tratados.

Os seus insignificantissimos salarios, ou não são pagos, como succedo em numerosos concelhos, ou são-no com tal irregularidade, que a miseria e a fome são os companheiros do professorado e d'aquelles que se encontrem sob a sua protecção.

A deshumanidade e a injustiça têem chegado ao ponto de em muitos concelhos serem processadas e pagas regularmente as folhas dos empregados municipaes, e aos professores responder-se durante muitos mezes successivos que no cofre do municipio não ha dinheiro para lhes pagar!

Nos provimentos das cadeiras não e menor a injustiça com que são tratados os direitos dos professores, constantemente preteridos até por individuos estranhos ao magisterio.

Ha honrosas excepções que já salvaguardámos, e nós que vivemos no Porto, devemos especialisar o municipio portuense, e com este outros em todo o paiz, mas constituem, infelizmente, honrosas excepções.

Ao passo que se exige cada vez maior somma de conhecimentos ao professorado, o que seria justo e é necessario, deixa-se que elle vegete na maior miseria, sem carreira, sem estimulo de nenhuma especie, sem futuro; e para cumulo de injustiça cerceou-o a lei de uma tal multidão de olheiros parochiaes e municipaes, que acabam de aggravar a situação da escola e a do professor pela falta de comprehensão que taes entidades têem das suas attribuições na escola.

Desde o estabelecimento do systema constitucional n'este paiz que todos os partidos politicos e todas as escolas economicas proclamavam a organisação do ensino popular em bases que fossem garantia á educação do povo e á carreira do magisterio primario. Todavia, cincoenta annos decorridos, promulgou-se uma lei que collocou o professorado e o ensino em peior situação economica e social do que o estivera durante esse largo periodo!

Os clamores são geraes. E os signatarios, em nome da assembléa pedagogica que os commissionou, recolhendo esses clamores, é forçada a perguntar: em que opinião será tido perante o mundo civilisado um paiz, que assim deixa em uma indiferença esmagadora estiolar-se de fome e de desespero uma classe, que por todo o mundo é considerada como a mais util, a mais digna de auxilios e considerações, que ha cincoenta annos reclama inutilmente protecção e justiça dos poderes do estado?

Só a consciencia publica poderá responder.

Entretanto é esta a realidade. E d'ella resulta que a desordem e o arbitrio se manifestam por toda a parte, e que o professorado se encontra prejudicado nos seus direitos, ferido nos seus limitadissimos salarios e vergando sob o peso de uma fatalidade que nem honra o paiz, nem permitte que a instrucção popular progrida e prospere, como evidentemente se torna necessario para os progressos economicos e moraes da nação.

Em uma reforma do ensino primario, que tenha por sinceros intuitos fomentar desassombradamente a educação popular e garantir ao professorado uma situação que o livre da miseria e da vergonha, entende a commissão signataria que deverão adoptar-se como principios fundamentaes os seguintes:

1.° As juntas geraes dos districtos occorrerão ás despezas da instrucção primaria incluindo o pagamento ao professorado.

2.° As juntas de parochia pagarão as despezas da casa escolar e de habitação do professor, cujas condições devem ser bem definidas na lei, mobilia, utensilios e livros da escripturação escolar, sem que por isso tenham attribuições de nenhuma especie em nenhum dos serviços escolares.

3.° Em cada districto haverá uma commissão escolar, administradora de todos os serviços de instrucção, incluindo o pagamento, a nomeação e collocação dos professores, e será composta de entidades que representem o estado, o districto e o ensino normal.

Só esta commissão e a inspecção official terão ingerencia nos assumptos escolares.

4.° Estabelecer-se-hão categorias no professorado, sendo pelo menos tres, a que correspondam os vencimentos de 150$000, 216$000 e 300$000 réis, para os professores de ensino elementar, independentemente da categoria das terras em que sirvam. A categoria devo ser inherente ao professor e não á terra em que exerça o magisterio. Só em Lisboa e Porto os seus vencimentos serão de 250$000 réis na 1.ª categoria, 316$000 réis na 2.ª o 400$000 réis na 3.ª

Deverão constituir a 2.ª categoria 30 por cento dos professores em cada districto, e a 3.ª 20 por cento.

Extinguir-se-hão as gratificações de frequencia, estabelecendo as gratificações de exames da seguinte maneira: - Por cada alumno approvado com a qualificação de sufficiente receberá o professor 2$000 réis, com a qualificação de bom 3$000 réis e com a qualificação de distincto 4$500 réis.

5.° Todos os professores ao encetar a carreira do magisterio entrarão na 1.ª categoria, qualquer que seja o seu grau pedagogico. E todos os annos haverá concurso publico documental perante a commissão escolar do districto para se effectuar a promoção. Nenhum professor será promovido de uma e outra categoria superior, sem ter, pelo menos, tres annos de serviço na anterior.

Em igualdade de bons serviços, serão preferidos nas pro-

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moções do professores do 1.° grau os que tiverem diploma de 2.° grau.

6.° Os professores jubilar-se-hão com o vencimento por inteiro da categoria em que estiverem, logo que tenham trinta annos de bom serviço, sem outras condições a satisfazer.

7.° O ensino normal será ministrado em quatro escolas normaes de cada sexo, todas de igual categoria, com as sedes em Lisboa, Porto, Evora, Açores ou Madeira.

Os districtos que forem sédes das escolas normaes ministrarão casa, mobilia comais utensilios do ensino e subsidiarão annualmente dez pensionistas de cada sexo. Os outros districtos da circumscripção normal subsidiarão em cada anno obrigatoriamente quinze alumnos de cada sexo do seu districto. Uns e outros pagarão a importancia dos livros de estudo fornecidos aos seus pensionistas. A pensão mensal será pelo menos de 10$000 réis.

O tempo passado na escola normal, com aproveitamento, conta-se para a jubilação do professor. O curso normal do 1.° grau será de tres annos, e o do 2.° do mais um anno. Só passarão á matricula do 2.° grau os que houverem feito o 1.° com a qualificação do bom ou distincto no seu exame final.

Os que tiverem o curso do 2.° grau terão o titulo de bachareis em pedagogia.

8.° Em cada concelho, ou em cada dois reunidos segundo a sua importancia escolar, haverá um delegado escolar, com vencimento, nomeado em concurso pela commissão escolar do districto, o qual será auxiliar da inspecção do estado e d'aquella commissão.

9.° Os professores terão sempre preferencia para os cargos seguintes:

I. Escrivães das juntas de parochia;

II. Officiaes do registo civil.

10.° As conferencias pedagogicas deverão ser de tres em tres annos em cada circumscripção escolar, e não nos circulos, e de quatro em quatro annos deverá reunir-se um congresso escolar, cujas resoluções orientem o governo nos assumptos do ensino popular.

11.° Deverão estabelecer-se durante os primeiros seis annos cursos ambulantes para o aperfeiçoamento e educação profissional dos professores existentes.

12.° Quatro annos depois de estabelecidas as escolas normaes não haverá outro modo de habilitação para o magisterio.

13.° Os logares de sub-inspectores; de professores das escolas normaes, de inspectoros e do officiaes da direcção geral de instrucção publica serão providos por accesso exclusivamente dentro do quadro do professorado primario.

A commissão signataria, representando uma parte importante do professorado portuguez, ao desempenhar-se do mandato que lhe conferiram, solicita dos senhores deputados da nação, e dos outros poderes do estado, a sua protecção para este importantissimo assumpto, de que pependem os progressos moraes e economicos do paiz.

Porto, 25 de fevereiro de 1885. - (Seguem as assignaturas.)

Redactor. = Rodrigues Cordeiro.

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