SESSÃO DE 29 DE FEVEREIRO DE 1888 639
do contribuinte, porque não espero de prompto remedio para esse mal, remedio aliás bem facil.
Mas que lhe não poupo a vida, unicamente para se sustentar no poder, é o cumulo da iniquidade para lhe dar o nome mais doce!
E cumpre me ainda acrescentar em honra do povo portuguez, que, segundo as narrações dos jornaes, unico meio de ter noticias, porque o governo nunca sabe nada a respeito dos gravissimos factos de ordem publica que occorrem no paiz, (Apoiados) em parte nenhuma houve desordens senão quando se apresentavam os delegados do governo escudados com a força armada! (Apoiados) Em quanto o povo estava só, em quanto a auctoridade publica, delegado directo do governo, se não apresentava nas reuniões populares, tudo corria pacificamente.
Eram as ostentações de força e as provocações da auctoridade, que promoviam os tumultos, para a mesma auctoridade praticar depois actos de repressão que envergonham a nossa civilisação, e nos inculcam á Europa, como povo selvagem, e não como povo pacifico e laborioso, que apenas precisa de governo que faça economias e boa administração. (Apoiados).
Póde a opinião ser mais benevolente com ministros que não andaram a solicitar o a reclamar o poder, e que por força das evoluções naturaes da politica se viram forçados a exercel-o.
Mas os actuaes ministros não têem direito ao mais pequeno favor da opinião.
Elles julgavam-se os unicos capazes de bem governar, e, sem escolha de meios, nem de caminho, o que queriam era empolgar as cadeiras do poder.
Cumpria lhes, portanto, em vez de cargas de bayoneta e de descargas de fusilaria sobre o povo, resolver pacificamente as graves questões, que estão assoberbando a fazenda publica. (Apoiados.)
Não quero passar adiante sem dizer á camara a rasão por que não fui ao congresso apesar de ter recebido a honra, do convite para esse fim.
Para mim é ponto capital na administração dos negocios publicos que o paiz não póde pagar mais, e que o estado deve gastar menos. (Apoiados.)
Por isso, sem discutir n'este momento a vantagem ou desvantagem de uma providencia fiscal, economica e financeira, para onerar o trigo estrangeiro por fórma que o lavrador portuguez possa vender o seu genero por 600 réis o alqueire, devo declarar do modo mais terminante que me é indifferente vender o alqueire de trigo por 600 réis, se a cultura me consumir 300 réis, e as contribuições para o estado, para o districto, para o municipio, e para a parochia, me levarem e resto!
Não discuto pois agora a vantagem ou desvantagem de qualquer alteração na pauta, relativamente aos cereaes, que me pareceu ser a preoccupação espacial do congresso. De mais eu estou persuadido de que a questão financeira não se resolve sem a questão politica, e ás questões de politica entre os diversos agrupamentos, que ahi ha constituidos, era, e devia ser estranho o congresso, porque para a politica já nós temos duas assembléas, a camara dos deputados e a camara dos pares.
Não sei mesmo o que produzirão os congressos de natureza do que tem estado a funccionar em Lisboa, sem o paiz começar por eleger representantes, que venham advogar os interesses dos povos, e só os interesses dos povos, d'onde sáiam ministros, que prestem homenagem ao sentimento publico, e cuidem apenas da prosperidade nacional.
Mas a mim não me surprehendem estas manifestações de desgosto da parte dos povos contra a administração do governo. (Apoiados.) Esperava-as. Vieram todavia mais cedo do que eu contava.
Pois que querem que faça o povo, todos os annos vexado com elevadissimos impostos, a que não escapam nem os generos mais necessarios á vida, sendo a agricultura a final de contas que principalmente paga todas estas custas e caprichos da governação e que na occasião em que devem reputar-se quasi exgotadas as faculdades tributarias. É esmagado com uma carga de addicionaes como não ha memoria no paiz! (Apoiados).
Transforma o governo os beneficios economicos, que ao povo promettêra, n'um saque á bolsa do contribuinte, e ainda estranha que o paiz revele por isso os seus justos resentimentos) (Apoiados.)
Sr. Presidente, v. exa. que vive n'uma região agricola, e onde predomina a cultura dos cerceaes, sabe de certo as difficuldades com que estavam lictando os lavradores, e que elles mal podem com as contribuições que já os oneram, quanto mais com a nova e pesadissima carga dos addicionaes.
Não discuto agora se os addicionaes foram bem ou mal lançados, nem se a lei, que os decretou, obedeceu ou não não aos bons principios de direito.
Limito me n'este momento a descrever a importancia dos addicionaes lançados ao paiz, para a camara apreciar os effeitos d'esta nova imposição, principalmente a algumas localidades, que já não podem nem com a contribuição predial que actualmente pagam.
Não sei se o governo sabe, ou se se importa com saber que a agricultura está definhando por fórma, que n'algumas partes estão os rendeiros pedindo diminuição nas rendas, sob pena de entregarem as terras aos senhores, e que os proprietarios já preferem deixar algumas terras deposto a cultival-as por sua conta. (Apoiados.)
Esta é que é a triste realidade dos factos (Apoiados.}
Os srs. ministros vivem tão enganados ácerca d'este assumpto, têem tão falsa idéa da situação em que se acha a industria agricola no paiz, que no seu relatorio de fazenda, tanto do anno passado, como d'este anno, declaram do modo mais positivo que é da contribuição predial que esperam o necessario para todos os imprevistos!
Pois creiam que não ha dinheiro mais mal empregado do que esses 115:000$000 réis, ou o que é, descriptos no orçamento do futuro anno econimico para a continuação das matrizes, porque se o governo as não inutilizar pacifica e legalmente, hão de inutilisal-as tumultuaria e revolucionariamente os povos. (Apoiados.)
A revisto das matrizes tem obedecido, não só á necessidade de explorar o contribuinte, mas tambem a fins eleitoraes. (Apoiados.}
Aproveitou-se, até o logar de secretario das commissões das matrizes e o cargo de louvado para grangear votos nas ultimas eleições de deputados (Apoiados.) Um serviço de matrizes assim feito, não ha paiz, por maio pacifico, que o acceite.
Eu esperava, pois, a agitação popular na Madeira, em Pombal, em Cautanhede, e em quasi todos os pontos do paiz, mas mais tarde; vem mais cedo do que eu contava.
Está marcada pela natureza das cousas uma insurreição geral, para a abertura dos cofres em virtude das novas matrizes que n'alguns pontos accusam um valor collectavel quatro ou cinco. vezes superior ao producto bruto.
Ora contra essa manifestação gravissima que mais cedo ou mais tarde ha de chegar, é que não valerão, nem as cargas de bayoneta, nem as desgraças de fusilaria, porque não ha armas efficazes para abafar a voz da fome (Apoiadas.)
Os srs. ministros deviam saber que o povo portuguez ainda se resigna com as más praticas administrativas, com os augmentos de despeza, e mesmo com esbanjamentos, mas que diante de impostos, que possam pôr em perigo a sua subsistencia, se insurge immediatamente, sendo-lhe indifferente cair varado pelas bayonetas dos soldados, ou ex-extenuado pela penuria e pela fome!
Por isso o governo, com o augmento exorbitante dos impostos, não organisa a fazenda, organisar a anarchia; e