SESSÃO DE 29 DE FEVEREIRO DE 1888 645
Solicito, pois, de v. exa. o favor de fazer este pedido ao, sr. presidente do conselho.
O sr. Arroyo: - Disse que desejava dirigir algumas perguntas ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, motivadas no que se lia em alguns telegrammas, publicados nos jornaes de hoje.
Diziam estes telegranmas que no parlamento inglez fôra chamada a attenção do governo para o caminho de ferro de Lourenço Marques e para a conveniencia de se adquirir por compra esse caminho; esses telegrammas, publicados pela agencia Havas, eram importantes.
Parecia lhe que o sr. ministro dos negocios estrangeiros devia ter recebido informações do nosso ministro ali, e por isso perguntava-lhe se recebeu alguma communicação do nosso ministro em Londres ácerca d'este assumpto, e, no caso de a ter recebido, se tinha duvida em dar d'ella conhecimento á camara.
(Quando o sr. deputado restituir o seu discurso será publicado em appendice a esta mesma sessão)
O sr Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barros Gomes): - Recebi effectivamente do nosso ministro de Londres a continuação do que se passára na camara dos lords e que foi fielmente noticiado pela agencia Havas.
É certo que lord Rosebory, em tempo ministro dos negocios estrangeiros no gabinete Giadstone, perguntou o que havia com respeito a Lourenço Marques, e que o conde de Onslow, snb secretario d'estado do ministerio das colonias, affirmou nos termos os mais correctos, que era de um grandissimo interesse para o conmercio d'aquella região africana, tão importante pela sua riqueza mineira, agricola e industrial, o caminho de ferro de Lourenço Marques; mas que a Inglaterra, respeitadora, como sempre o tem mostrado os seus governos, da sentença arbitral que nos garante á face do mundo a posse legitima de toda a bahia de Lourenço Marques e conhecedora, como estava por mais de uma via, que era intenção firme de Portugal não ceder de parte alguma do territorio a que tem direito, não pensam nem podia pensar na adopção de qualquer dos alvitres que tenham apparecido manifestados em órgãos importantes da imprensa inglesa, no sentido de adquirir qualquer territorio n'aquella região, por meio de pressão, ou sequer de accordo a exercer ou negociar com Portugal.
Acrescentou tambem que se tinha examinado a possibilidade de adquirir o caminho de ferro pela forma unica por que se podia adquirir.
O raminho de ferro está hoje nas mãos de uma companhia portugueza essa companhia representa o valor da linha por acções de obrigações, essas acções são transimissiveis e podem ser adquiridas por toda e qualquer corporação ou individuo que tenha para isso os recursos necessarios, os meios de pagar pelo preço que os actuaes proprietarios exigirem, e dentro dos termos e condições da constituição da mesma companhia, tal qual foi creada pelo governo portuguez, e v. exa. sabe perfeitamente os termos em que a companhia foi creada Mas esse mesmo meio de acquisição da linha repugnou ao governo inglez. Que aliás adoptaria um expediente sinilhante com respeito ao canal de Suez, porque não havia precedentes desse adquirir para o estado uma linha ferrea que estava toda em territorio estrangeiro, e destinada a servir em paiz estrangeiro.
Acrescentou lord Onslow, e isto não me diz o ministro de Sua Majestade em Londres, mas dil-o o telegramma da agencia Havas, que as colonias do Natal e do Cabo estarão estudando alguma proposta similhante de acquisição de acções.
Em tudo isto, o que é certo e posso affirmar ao illustre deputado, é que na camara dos lords como nas communicações de governo para governo, o procedimento do governo inglez ácerca d'esta questão tem sido sempre perfeitamente correcto e digno d'aquella grande nação e de uma potencia amiga e alliada de Portugal (Apoiados.)
É o que posso affirmar ao illustre deputado, e isto tem para nós toda a importancia O governo inglez nem um só instante tem hesitado em reconhecer e confessar a obrigação que mais do que a nenhum governo lhe assiste de respeitar os resultados da sentença Arbitrai do marechal Mac-Mahon.
N'estes termos, e de certo com estes principios se apresentam as declarações do sub secretario de estado perante a camara dos lords não me parece, portanto, haver motivo para quaesquer reparos da parte do governo português. (Apoiados) As relações officiaes com o governo inglez são aquellas que a lealdade sempre inspira, e os actos do governo que preside áquella grande nação, e á frente do qual se encontra um estadista tão recto e vavalheiroso como o é lord Salisbury, garantem-nos que serão devidamente respeitadas as colonias de um paiz amigo e alliado.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Presidente: - Os srs deputados Francisco José Machado e Serpa Pinto tinham pedido a palavra para antes de se encerrar a sessão, e como deu a hora, vou consultar a camara.
Foi lhes concedida a palavra.
O sr. Francisco José Machado: - V. Ex.a. e a camara ouviram as palavras que o sr. Ferreira de Almeida pronunciou n'esta casa antes de se encerrar a sessão. S. exa. referiu-se a um membro d'esta casa, e a um correspondente de um jornal A provincia. Esse correspondente sou eu, e esse deputado sou eu. Preciso dizer a v. exa. que eu n'esta casa respondo unicamente pelos actos praticados como deputado, e como jornalista e como homem respondo pelos meus actos lá fóra. (Apoiados.) Estou prompto a dar inteira e cabal satisfação a todos os meus collegas. (Apoiados) Preciso dizer também a v. exa. que, tendo sido sempre esta a praxe segunda a esta casa, não desejo afastar-me d«ella nem um momento.
Em 1881 com o governo progressista e subiu o governo de uma situação regeneradora. A camara de então queria votar a ler de meios para habilitar o governo a cobrar os impostos. O governo d'essa epocha não acceitou.
Um jornalista dos mais distinctos n'este paiz, um dos homens cuja perda o paiz mais lamenta, dizia n«um jornal com respeito á camara d'esse tempo, que ella era uma camara avinhada.
A camara de então era das mais serias, das mais illustradas que têem vindo ao parlamento, e nenhum dos seus membros se lembrou de n'ella levantar essa phrase.
Eu respeito por igual todos os meus collegas; tenho por elles a mais subida consideração; e não foi meu intuito desconsiderar ninguem. Preciso de levantar outra phrase que pesa sobre mim com bastante mágua.
O sr. deputado Ferreira de Almeida duvidou da legalidade do meu diploma.
Creia v. exa. sr. Ferreira de Almeida, que eu tenho a hombridade necessita e a dignidade precisa para que, se me conveniente de que não estava aqui legalmente, não pozesse aqui os pés.
Não desejo alargar essa ordem de considerações, mas não podia deixar terminar a sessão sem levantar de sobre mim accusações que reputo immerecidas.
Eu serei n'esta casa o membro mais infimo dos que aqui estão, em illustração e saber; mas d'isso não tenho eu culpa, mas em dignidade posso pôr-me a par dos mais dignos.
Repito a v. exa. dentro d'esta casa só respondo pelos meus actos como deputado, fôra d'aqui estou pronto a responder pelos outros actos lá fõra praticados.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O sr. deputado não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Serpa Pinto - (quando o sr. deputado restituir o seu discurso será publicado em appendice a esta mesma sessão).
O sr. Ministro do Negocios Estrangeiros (Barros Gomes) - Creio o illustre deputado que nas suas preocupações não é desacompanhado pelo governo que tem n'este momento a responsabilidade do poder.