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SESSÃO DE 10 DE JUNHO DE 1890

Presidencia do exmo sr. Pedro Augusto de Carvalho

Secretarios - os exmos srs.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Julio António Luna de Moura

SUMMARIO

Lêem-se na mesa os seguintes officios: do ministerio do reino, participando, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Marcellino Mesquita, que os documentos pedidos em sessão de 3 do corrente mez foram enviados a cata camara para satisfazer nina requisição do sr. deputado Ignacio do Casal Ribeiro; do mesmo ministerio, remettendo os documentos pedidos pelo sr. deputado Roberto Alves de Sousa em sessão de 20 de maio ultimo; do ministerio da justiça, remettendo 180 exemplares das contas da gerencia deste ministério, relativas ao anno económico de 1888-1889 e ao exercicio de 1887-1888: do tribunal de verificação de poderes, acompanhando o processo da eleição effeetuada no circulo de Margão (índia), julgada na sessão de 8 do corrente; do mesmo tribunal, requisitando, na conformidade do artigo 21.° do respectivo regulamento, e com approvação do tribunal, a quantia de 250$000 réis pura pagamento das despezas do expediente e serviço do mesmo tribunal.- Tem segunda leitura a proposta do sr. Eduardo Abreu, relativa às multas impostas aos srs. deputados pelas suas faltas às sessões.- O sr. Eduardo Coelho apresenta diversos requerimentos, e faz observações sobre o modo como foi inscripto para a discussão do bill e sobre a falta de remessa de documentos para o tribunal especial.- O sr. Xavier da Cunha requer esclarecimentos pelo ministerio das obras publicas. - Manda para a mesa tres representações o sr. Bernardino Pinheiro.- Apresenta um projecto de lei o sr. José Victorino.- O sr. Luciano Cordeiro justifica as faltas do sr. Carrilho. - Faz perguntas a respeito da encommenda de um vapor á industria ingleza o sr. José Maria de Alpoim. - Respondo-lhe, contestando a exactidão da informação, o sr. ministro da instrucção publica. - Dá tambem explicações por causa d'este incidente o sr. Luciano Cordeiro. - Manda para a mesa uma representação da camara de Soure o sr. Francisco Mattozo, e pergunta o que ha sobre a suppressão do n.º 10 de cavallaria e das obras necessárias no quartel de iufan-teria n.° 23- Replica o sr. presidente do conselho.- O sr. Figueiredo Mascarenhas apresenta uma representação do concelho de Silves.- Faz perguntas ao governo o sr. Albano de Mello.- Responde o sr. presidente do conselho.- Manda um requerimento para a mesa o sr. Cesario de Lacerda.
Na ordem do dia lê-se, e é admittida, a moção do sr. Dias Ferreira.- Defende o projecto e os actos do governo o sr. presidente do conselho.- Responde o sr. Baptista de Sousa, que fica ainda com a palavra reservada para a sessão nocturna.- O sr. presidente participa á camara que no dia 14 ha de realisar-se a sessão real do reconhecimento do Principe Real.

Abertura de sessão- Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 51 srs. deputados. São os seguintes: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Albano do Mello Ribeiro Pinto, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio Maria Cardoso, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Sergio da Silva e Castro, Augusto César Elmano da Cunha e Costa, Augusto da Cunha Pimentel, Augusto José Pereira Leite, Augusto Ribeiro, Bernardino Pereira Pinheiro, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Conde de Villa Real, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Feliciano Gabriel de Freitas, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Francisco de Castro Mattozo da Silva Corte Real, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João de Barros Mimoso, João Marcellino Arroyo, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Paiva, João Pinto Moreira, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José António de Almeida, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Julio Rodrigues, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Greenfield de Mello, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Monteiro Soares de Albergaria, José Paulo Monteiro Cancella, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Julio Antonio Luna de Moura, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luciano Cordeiro, Luiz Virgilio Teixeira, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Manuel Vieira de Andrade, Pedro Augusto de Carvalho e Roberto Alves de Sousa Ferreira.

Entraram durante a sessão os srs.: - Abilio Guerra Junqueiro, Adolpho da Cunha Pimentel, Agostinho Lúcio e Silva, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Alfredo César Brandão, Alfredo Mendes da Silva, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio de Azevedo Castello Branco, António Baptista de Sousa, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Fialho Machado, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Maria Jalles, Antonio Costa, Arthur Hintze Ribeiro, Augusto Maria Fuschini, Barão de Paço Vieira (Alfredo), Eduardo Abreu, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Eduardo José Coelho, Emygdio Júlio Navarro, Fidelio de Freitas Branco, Francisco António da Veiga Beirão, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco Severino de Avellar, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Ignacio José Franco, Jacinto Candido da Silva, João Alves Bebiano, João Cesario de Lacerda, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Simões Pedroso de Lima, João de Sousa Machado, Joaquim Germano do Sequeira, Joaquim Simões Ferreira, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José de Azevedo Castello Branco, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocínio de S. Francisco Xavier Pinto, José Dias Ferreira, José Domingos Ruivo Godinho, José Elias Garcia, José Estevão de Moraes Sarmento, José Frederico Laranjo, José Freire Lobo do Amaral, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria de Sousa Horta e Costa, Julio César Cau da Costa, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Manuel d'Assumpção, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Manuel Francisco Vargas, Manuel. Pinheiro Chagas, Marcellino António da Silva Mesquita, Matheus Teixeira de Azevedo, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro Victor da Costa Sequeira e Visconde de Tondella.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adriano Augusto da Silva Monteiro, Adriano Emílio de Sousa Cavalheiro, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, António José Arroyo, Antonio José Ennes, António Manuel da Costa Lereno, António Maria Pereira Carrilho, Antonio Mendes Pedroso, António Pessoa de Barros e Sá, Antonio Teixeira de Sousa, Aristides Moreira da Motta, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Bernardino Pacheco Alves Passos, Carlos Lobo d'Ávila, Carlos Roma du Bocage, Conde do Covo, Eduardo de Jesus Teixeira, Elvino José de Sousa e Brito, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Eugenio Augusto Ribeiro de Castro, Fortunato Vieira das Neves, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Henrique da Cunha Matos da

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Mendia, Jayme Arthur da Costa Pinto, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Pinto Rodrihues dos Santos, José da Alpoim de Sousa Menezes, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Latino Coelho, José Maria dos Santos, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz António Moraes e Sousa, Manuel Affonso Espregueira, Manuel de Arriaga, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio do reino, participando, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Marcellino Mesquita, que os documentos pedidos em sessão de 3 do corrente mez foram enviados a esta camara para satisfazer uma requisição do sr. deputado Ignacio do Casal Ribeiro.

Para a secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo os documentos pedidos pelo sr. deputado Roberto Alves de Sousa, em sessão de 20 de maio ultimo.

Para a secretaria.

Do ministerio da justiça, remettendo 180 exemplares das contas da gerencia d'este ministerio relativas ao anno economico de 1888-1889 e ao exercício de 1887-1888.

Para a secretaria.

Da tribunal de verificação de poderes, acompanhando o processo da eleição effectuada no circulo de Marção (India), julgada na sessão de 8 do corrente.
Para a commissão de verificação de poderes.
Do mesmo tribunal, requisitando, na conformidade do artigo 21.º do respectivo regulamento, e com approvação do tribunal, a quantia de 250$000 réis para pagamento das despezas do expediente e serviço do mesmo tribunal.
Para a commissão administrativa.

Segundas leituras

Proposta de renovação de iniciativa

Renovo a iniciativa da proposta de lei n.º 186-A, apresentada á camara dos senhores deputados, em sessão de 10 de julho de 1885, pelo sr. ministro da marinha, conselheiro Manuel Pinheiro Chagas, e cuja iniciativa tambem já foi renovada em sessão de 7 de maio de 1887, pelo sr. ministro da marinha Henrique de Macedo.
Sala das sessões, em 7 do maio de 1890. - José Estevão a e Moraes Sarmento.
Lida nu mesa foi admittida, e enviada á commissão do ultramar, ouvida a da fazenda.
Esta renovação refere-se á seguinte:

Proposta de lei

Senhores.- Quando o major da guarnição da província de Moçambique, José Ayres Vieira, antevia um futuro brilhante na sua carreira militar, por isso que aos trinta e quatro annos de idade e mais de vinte de serviço, sendo a maior parte deste prestado em Africa, tinha obtido aquelle posto peias suas distinctas informações e reconhecido zelo, demonstrado em muitas e importantes commissões por cujo desempenho mereceu louvores e mercês honorificas, quiz a fatalidade, que, sendo commandante da praça de S. Sebastião, da cidade de Moçambique, e tentando no dia 18 de fevereiro de 1883 impedir, como impediu, que um cabo do enquadra do batalhão de caçadores n.° 1, da dita provincia, commetesse o crime de assassinio contra o seu commandante, o tenente coronel João Antonio Fornazini, estando já com a carabina carregada e apontada, succedeu disparar ao o tiro, na lucta que José Ayres Vieira travou com o assassino, ficando esse infeliz official com o joelho direito esmigalhado, sendo necessario em seguida proceder-se á amputação da perna.
Por causa deste acto de valor teve o major Vieira de ser reformado em tão curta idade, vendo assim prejudicada a sua carreira militar, e recorreu ao governo pedindo que lhe fosse concedido o augmento de vencimento a que se refere a tabella n.° 1 da carta de lei de 18 de junho de 1863.
Não obstante dever ser considerado como um feito de valor militar o acto praticado por aquelle distincto official, não podia ser-lhe applicada a invocada disposição legislativa, visto como não fora em virtude de ferimento recebido em combate que elle só inutisára para o serviço.
Nenhum governo, porém, acharia justo abandonar a uma reforma, com vantagens inferiores á effectividade, um militar valente e distincto que, no serviço e por effeito d'elle, se sacrificou para salvar o seu superior, dando um exemplo de coragem mui louvável, em tal conjunctura a bem da disciplina; e em tanta consideração têem os poderes publicos os que perecem por effeito de ferimento ou de offensas corporaes contra os militares do exercito e da armada, e dos empregados da fiscalisação externa, que a lei de 24 de maio de 1884 providenciou justamente, auctorisando o governo a decretar pensões de sangue às familias dos militares e empregados aduaneiros fallecidos por effeito de acto praticado era serviço.
N'estes termos e profundamente convencido de que os poderes públicos praticarão um acto de inteira justiça beneficiando o tenente coronel reformado a que me refiro, com a applicação da salutar disposição da lei de 8 de junho de 1863; tendo ouvido os pareceres da junta consultiva do ultramar o do conselheiro procurador geral da corôa e fazenda, tenho a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° E o governo auctorisado a tornar extensivo ao tenente-coronel reformado da guarnição da provincia de Moçambique, José Ayres Vieira, a disposição do artigo 6.º da carta de lei de 8 de junho de 1863, com direito á pensão vitalicia a que se refere o n.° 5º da tabella n.° 1, annexa á mesma lei.
Art. 2.° Fica revogoda a legislação em contrario.
Secretaria da marinha e ultramar, 10 de julho de 1885.= Manuel Pinheiro Chagas,

Proposta

1.º Aos deputados que não estiverem presentes á abertura da sessão será imposta uma multa equivalente á metade do subsidio diário.
2.° O s deputados que faltarem a toda a sessão, e não justificarem a falta por documento, perdem o direito ao subsidio d'esse, dia. - Eduardo Abreu.
Foi enviada á commissão do regimento.

REPRESENTAÇÕES

Da camara municipal do concelho de Beja, pedindo que não sejam approvadas as propostas de lei n.° 113-H e 113-L, apresentadas pelo sr. ministro da fazenda.
Apresentada pelo sr. deputado Bernardino Pinheiro, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do concelho de Silves, pedindo que sejam elevadas percentagens a 75 por cento, a fim de

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poder concluir o edificio para os paços do concelho, tribunal judicial e mais repartições publicas.
Apresentada pelo sr. deputado Figueiredo Mascarenhas, enviada á commissão de administração publica, ouvida a de fazenda.

Da camara municipal do concelho de Soure, pedindo que não sejam approvadas as propostas de lei tendentes a augmentar os impostos.
Apresentada pelo sr. deputado Mattozo Corte Real, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Da mesa do comício realisado em Setúbal, no mesmo sentido.
Apresentada pelo sr. deputado Benardino Pinheiro, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

De proprietários, agricultores, negociantes, trabalhadores e representantes de varias artes e profissões liberaes, ao mesmo sentido.
Apresentada pelo sr. deputado Bernardino Pinheiro, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

Requeira que, pelo ministerio da justiça, seja enviada a esta camara copia da denuncia dada em juizo contra a prisão violenta e arbitraria do vice-presidente da commissão recenseadora Araújo Leite, e secretario da commissão Manuel Cardoso, certidão do corpo de delicto e declaração do estado do processo, não havendo inconveniente. = Eduardo José Coelho.

Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja enviada a esta camara copia de todas as providencias na correspondência trocada entre o governador civil de Bragança e o ministro do reino, relativamente á apprehensão violenta pela auctoridade administrativa do concelho da Alfandega da Fé, do recenseamento politico em revisão. = Eduardo José Coelho.

Requeiro que, com urgência, seja enviada a esta camara a copia de todos os telegrammas trocados entre os srs. ministros do reino e da justiça e o governador civil de Bragança, durante o período eleitoral que vae de 1 de março até 14 de abril d'este anno. = Eduardo José Coelho.

Requeiro que, pelo ministerio da guerra, e com urgência, se informe se ha instaurado processo contra o official de cavallaria n.° 1, José Maria Figueiredo Antas Júnior, pelas occorrencias do dia 30 de março findo na assembléa de Carção, concelho de Vimioso, districto de Bragança, por occasião da eleição de deputados e delegados municipaes, que ali teve logar sendo o dito alferes commandante da força encarregado de policiar o acto eleitoral, e caso affirmativo o estado desse processo, não havendo inconveniente. = Eduardo José Coelho.

Requeiro seja publicado no Diario das sessões da camara dos senhores deputados e no Diario do governo:
1.° A relação de todos os documentos que foram enviados para o tribunal de verificação de poderes relativo á eleição do circulo de Mirandella;
2.° Que se declare se houve alguns documentos que não foram enviados ao tribunal, e caso affirmativo quaes foram;
3.° Se o tribunal de verificação de poderes, antes de proferir a sua decisão, pediu ou requisitou a esta camara alguns documentos necessarios para proferir a sua decisão;
4.° Quem assignou o officio de remessa dos documentos e papeis concernentes áquella eleição para o tribunal de verificação de poderes;
5.º Se não foram enviados todos os documentos ao tribunal de verificação de poderes, qual a causa, e de quem é essa responsabilidade. = O deputado, Eduardo J. Coelho.

Requeiro, pelo ministerio das obras publicas, os seguintes esclarecimentos:
1.° Nota, por districtos administrativos do continente ou direcção de obras publicas, do numero de kilometros de estradas de primeira e segunda ordem que se acham construídas ou em conservação, extensão actualmente em construcção e numero approximado de kilometros de estradas ainda não começadas, separando-se a extensão já estudada d'aquella que o não for.
2.° Numero e importância das empreitadas geraes, arrematadas e adjudicadas até á presente data, em virtude da lei de 21 de junho de 1887, tambem por districtos administrativos.
3.° Numero de conductores auxiliares contratados, que estão actualmente ao serviço de cada direcção de obras publicas, distinguindo-se os que têem algum dos cursos de engenheria ou de conductor, d'aquelles que não têem curso algum.
4.° Numero de apontadores em serviço em cada uma das direcções de obras publicas, com a indicação da classe a que pertencem.
5.º Numero de mestres e guardas de 1.ª e 2.ª classe existentes em cada circumscripção hidraulica = Eduardo Augusto Xavier da Cunha, deputado pelo circulo n.° 60.

Requeiro que, pelo ministerio dos negocios da fazenda, sejam enviados a esta camara os seguintes esclarecimentos:
1.° Nota do rendimento do real de agua nos ultimos tres annos, por districtos administrativos e por espécies de generos tributados;
2.° Nota da liquidação do imposto do álcool, apurada durante o tempo que as respectivas fabricas estiveram sujeitas á fiscalisação;
3.° Copias das tabellas das condições de venda dos tabacos desde o estabelecimento da administração por conta do estado;
4.° Mappas da producção dos tabacos, por especies, nas differentes officinas, no primeiro semestre do anno economico corrente. = João Cesario de Lacerda.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PARTICULAR

De José de Miranda Abelha, official da secretaria do governo geral da provincia de Cabo Verde, pedindo que por lei se restabeleça o seu antigo ordenado de 500$000 réis, ou pelo menos que lhe fique garantido para quando venha a aposentar-se.
Apresentado pelo sr. deputado J. C. de Lacerda e enviado á commissão do ultramar, ouvida a de fazenda.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

Participo a v. exa. que o sr. deputado Manuel de Arriaga não tem comparecido às sessões por motivo de doença e que é provavel não poder comparecer nas sessões mais próximas por aquelle mesmo motivo. = José de Castro.
Da parte do nosso collega o exmo. sr. conselheiro Carrilho communico a v. exa. e á camara que elle tem faltado, e terá provavelmente de faltar ainda, a algumas sessão por incommodo de saude. - L. Cordeiro.
Para a secretaria.

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DECLARAÇÃO DE VOTO

Declaro que, se estivesse presente na sessão de sabbado, teria votado a moção de confiança ao governo e a genera lidado do bill de indemnidade. = Lourenço Malheiro.
Para a acta.

O sr. Eduardo José Coelho: - Mando para a mesa varios requerimentos, pedindo esclarecimentos, pelos ministérios da guerra, justiça e obras publicas.
Estes esclarecimentos são-me absolutamente indispensáveis para annunciar ao governo uma interpellação sobre a maneira por que elle se conduziu nas eleições geraes.
Por conseguinte confio em que v. exa. fará dar expediente a este meu pedido, com a urgência que o caso requer.
Ha um outro requerimento sobre o qual não posso dispensar-me de fazer a leitura d'elle, porque a aclaração da verdade sobre o assumpto envolve rosponsabilidades da presidência, da commissão de verificação de poderes ou seja de quem for.
Não posso deixar de insistir n'este ponto para que elle se esclareça quanto antes, com a rapidez que elle demanda, e sou levado a isto, não porque me faça mensageiro de noticias mais ou menos officiosas, porque não lhe dou importância, mas desde que na outra casa do parlamento se fizeram insinuações serias sobre este assumpto, é necessario que a luz se faça.
Não se póde ficar com meias palavras. Nada mais perigoso que as insinuações que podem prestar-se a interpretações diversas.
É preciso, portanto, que haja discussão n'esta camara sobre este assumpto, e eu hei de levantal-a muito brevemente.
Sr. presidente, calcule v. exa. a gravidade que o caso tem; consta que não foram apresentados ao tribunal de verificação de poderes alguns documentos importantes relativos a uma eleição e, o que e mais grave, é explicar-se isto, imputando-se a responsabilidade, a pessoa que não quero nomear.
N'essa imputação é que vae a insinuação que é preciso levantar.
Torno a dizer, aguardo que a mesa, com a presteza que o caso requer, satisfaça esta minha requisição e depois averiguarei quaes os documentos que deixaram de ser presentes ao tribunal de verificação de poderes, sem discutir a importância d'elles, por isso que pertence a outra instancia, o que não impede que indaguemos a responsabilidade do facto e a quem ella se devo exigir.
Sr. presidente, nunca me magoam as accusações desde que me seja permittida a liberdade de defeza e desde que eu possa apreciar os factos como elles são.
Fique v. exa. certo que a altaneria da insinuação ha de manter-se nos devidos termos. Em todo o caso não quero antecipar a discussão.
Como hontem disse a v. exa. que, se eu tivesse hoje a palavra, antes da ordem do dia, me havia de referir á ordem da inscripção dos oradores na especialidade do bill eu não posso deixar de dizer algumas palavras, ainda que poucas, sobre o assumpto.
Escuso dizer que o meu respeito por v. exa. é illimitado e professo de ha muito a opinião de que um corpo collectivo não se respeita quando não respeita o seu presidente.
Não conheço tambem posição mais elevada e nobre do que a de presidir aos representantes da nação, que é a posição official que v. exa. hoje occupa.
Posto isto, eu devo acrescentar que supponho ter havido erro na inscripção.
Eu pedi a palavra logo em seguida ao sr. conselheiro José Dias Ferreira e apenas podia haver duvida, quer-me parecer, em relação ao meu collega o sr, Roberto Alves, mas seja assim ou não, do modo mais delicado apresentei a. v. cx.:i as minhas duvideis sobre a ordem da inscripção, é preciso saber se as decisões da presidência silo supremas e infalliveis, ou se ha recurso, e qual é elle.
Não desconheço a difficuldade pratica de fazer uma inscripção pela ordem regular, em geral, quando muitos se juntam no pedir da palavra.
Não desejo accordo prévio, nem me refiro a elle, desde o momento em que a inscripção se fez eu estou inscripto. Repito a v. exa. que se eu estou em equivoco e não tenho rasão para fazer estas considerações, não sou movido a pronuncial-as por qualquer intuito de animosidade. Declaro mesmo que não acceitarei que se altere a inscripção, esteja ella como estiver feita. Não usarei da palavra senão na altura em que v. exa. me inscreveu. Creio, comtudo, que todas as vezes que v. exa. tenha de fazer uma inscripção, podia admittir as praxes que se observam na universidade a respeito da inscripção: De rebus universitatis quod est est.
E convencimento meu que o erro que v. exa. praticou foi devido á confusão que reinava na sala quando se pediu a palavra, por isso apenas me considero um pouco maguado, e com algum motivo faço esta reclamação, esperando será tomada na de.vida consideração, não pela minha pessoa, que não sou dado a vaidades, mas pelas prerogativas parlamentares, de que sou zeloso e para as quaes reclamo e reclamarei sempre o acatamento que merecem.
O sr. Presidente: - Com respeito aos documentos que foram para o tribunal de verificação de poderes sobre a eleição de Mirandella, tenho a dizer a v. exa. que por informação da secretaria me consta que não foram alguns documentos que tinham sido presentes á commissão de verificação de poderes. Vou mandar o requerimento que v. exa. acaba de apresentar a informar á secretaria, para poder depois dar conta á camara dessa informação e submetter o requerimento de v. exa. á sua apreciação e deliberação.
O sr. Eduardo Coelho: - Eu peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que esses documentos, logo que cheguem á mesa sejam publicados no Diario das camaras immediatamente, em logar de me serem remettidos.
O sr. Presidente: - Eu não posso consultar a camara sobre a publicação d'esses documentos, sem que haja informação da secretaria. Vou mandar immediatamente o requerimento a informar á secretaria, logo que venha essa informação, declararei que ella está sobre a mesa para os srs. deputados examinarem, se quizerem, os documentos, e, passados dois ou três dias, consultarei a camara sobre se ella permitte que esses documentos sejam publicados.
Com relação á segunda parte do discurso do illustre deputado, devo dizer que v. exa. me fez justiça, dizendo que procurei estabelecer a inscripção pela ordem que se me afigurou ser a do pedido dos srs. deputados.
Eu estava já prevenido de que muitos srs. deputados da opposição tencionavam increver-se sobre a especialidade do bill e muitos membros desta camara podem dar testemunho de que procurei, antes da sessão abrir, ver se os illustres deputados que desejavam usar da palavra combinavam entre si e me davam conhecimento da ordem por que devia fazer a inscripção, para não prejudicar no debate quem quer que fosse. (Muitos apoiados.)
Tenho a certeza de que o primeiro sr. deputado que pediu a palavra foi o sr. Dias Ferreira; os outros srs. deputados pediram a palavra quasi em chusma, (Muitos apoiados.) e eu fiz a respectiva inscripção, segundo a indicação que me deram os srs. secretários.
É certo que v. exa. me tinha avisado de que desejava inscrever-se na discussão da especialidade do BILL, e é tambem certo que, na altura em que v. exa. pediu a palavra ainda o seu nome não estava na lista, da inscripção. N'esta

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parte sou o primeiro a reconhecer o erro involuntário em que caí.
Tenho a dizer agora que por engano, foi duas vezes inscripto o sr. deputado Dias Costa e eu aproveitando esse engano, substitui o nome d'este sr. deputado pelo de, v. exa., de forma que v. exa. que até ali figurava como o decimo quarto ou decimo quinto, na ordem da inscripção, figura agora em nono logar.
Não sendo esta circumstancia, eu não me considerava auctorisado a alterar a ordem da inscripção, desde que dera conhecimento d'ella á camara.
Com respeito á pergunta que v. exa. me fez, direi que o regimento não inclue a hypothese da reclamação contra a inscripção; no emtanto estou persuadido de que ha pré cedentes nesse sentido. Não é defezo ao srs. deputados reclamar contra a ordem da inscripção. Quando a mesa lê os nomes dos srs. deputados inscriptos, aquelle ou aquelles que se julgam preteridos, podem reclamar e a mesa póde alterar a inscripção, no caso dos prejudicados com essa alteração, annuirem a ella; mas no caso dos prejudicados se opporem, só a camara póde resolver.
Se v. exa. apresenta a sua reclamação...
O sr. Eduardo Coelho: - Não, senhor; não reclamo.
O sr. Presidente: - N'esse caso nada mais tenho a dizer. (Muitos apoiados.)
O sr. Xavier da Cunha: - Mando para a mesa o seguinte requerimento:
(Leu.)
(Vae na secção competente a pag. 593).
A primeira parte do meu requerimento justifica-se pelo desejo que tenho de chamar a attenção do illustre ministro das obras publicas para um assumpto que já foi aqui tratado pelo illustre deputado e meu amigo o sr. Júlio de Vilhena, quando se referiu ao estado da viação no districto da Guarda. Eu desejo tratar deste assumpto mais largamente e desejo mostrar á camara o atrazo em que está a viação, não só no circulo que o sr. Júlio de Vilhena representa n'esta camara, mas em todo o districto da Guarda.
Desejo tambem chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para o estado desgraçado em que se encontra a classe dos apontadores de obras publicas, e por isso aguardo a remessa dos documentos que peço, para depois de elles serem enviados, eu tratar então d'estes assumptos.
O sr. Bernardino Pinheiro: - Tenho a honra de mandar para a mesa três representações, cuja publicação requeiro, contra as propostas de lei tributarias do governo. Uma é da Illustrada camara municipal de Beja, outra de trezentos e tantos cidadãos do concelho de Arraiolos, e outra é de um comício realisado em 8 do corrente em Setúbal, a que assistiram mais de duas mil pessoas.
As representações populares, quando motivadas e verdadeiras, são a expressão mais legal, mais directa e genuína da vontade e sentimentos do povo. (Apoiados.) Estilo perfeitamente neste caso as representações que apresento.
Não só os povos de Setúbal, como os do Alemtejo, estão luctando, sobretudo estes últimos, com uma crise agrícola profunda, e declaram que não podem pagar mais do que pagam; (Apoiados) que o aggravamento do imposto os póde lançar na miséria e na fome. E quando a miséria o a fome se accentuam, a tranquillidade desapparece. (Apoiados.)
Este assumpto é grave; peço a attenção do governo, e sobretudo do parlamento, para as numerosas representações populares que estão chegando de todos os pontos do paiz. (Apoiados.)
Nós temos aqui tratado de gravíssimas questões; mas a questão do aggravamento do imposto é de tal ordem, de tão dolorosa importância, de tal gravidade e perigo, que será bom que lhe prestemos a mais ponderada reflexão. (Apoiados.)
Peço a v. exa. que consulte a camara se permitte a publicação destas representações no Diario do governo.
Foi auctorisada a publicação.
O sr. José Victorino: - Mando para a mesa o seguinte projecto de lei:
(Leu.)
Este projecto é um pequeníssimo remendo na rota lei que regula as reformas e aposentações dos empregados do estado, lei que se acha crivada de desigualdades e injustiças, e que por isso reclama prompta reforma, que eu recommendo á camara e ao governo.
Na lei das aposentações ha anomalias extraordinárias. O funccionario a que me refiro no meu projecto póde servir de exemplo: foi conductor de obras publicas, logar que tom direito a aposentação, e é hoje um distincto chefe de repartição da junta geral de um districto, a quem a lei igualmente concede a reforma; pois se elle quizer, pelos muitos annos de bom e effectivo serviço e pela sua incapacidade physica conseguir a aposentação, a junta geral só lhe póde contar o tempo que está neste serviço, segundo o disposto no artigo 359.° do código civil. Os annos que serviu o estado nas obras publicas não lhe servem de nada! Ora, isto é uma injustiça, flagrante igual a outras a que o poder legislativo vae dando remédio quando os interessados recorrem a elle.
Este caso affecta só um indivíduo da sua classe, mas ha anomalias na lei que ferem classes inteiras e muito numerosas. Os empregados de fazenda são um exemplo. A todos os fuuccionarios do estado ou a quasi todos e contado para a reforma o tempo de serviço que fazem no exercito; aos empregados da fazenda não é esse tempo contado!
Consta-mo que esta classe já dirigiu uma representação ao actual governo, que lhe deu esperança de ser attendida e é de toda a justiça que o seja.
ha anomalias até engraçadas na lei das aposentações e nos processos que se empregam para as obter. Recordo-me, sendo já medico de um dos corpos da guarnição de Lisboa, ver apparecer na scena de um dos theatrus da capital duas loiras creanças, que polo seu pouco desenvolvimento physico e curta idade apenas podiam fazer o papel de pagens.
Separamo-nos porque eu fui para a província e elles cá ficaram em Lisboa; e hoje elles estão já aposentados com o soldo, não sei se tambem com as honras, de general de brigada, emquanto que eu, se me impossibilitasse para o serviço e quizesse reformar-me, reformava-me com o soldo de alferes! Verdade seja que figurar de rei, de príncipe ou de bispo para alguma cousa ha de servir, emquanto que eu tenho apenas umas cartas de medico e tenho tratado doentes nos hospitaes e fora d'elles, alem de todo o serviço que é inherente ao meu cargo.
Ora estas desigualdades, alem de muitas outras que não refiro para não roubar tempp á camara, é que devem acabar e hoje com mais rasão do que nunca, desde que os empregados públicos são obrigados a concorrer para a caixa de aposentações com quantias aliás importantes.
O que está é mau, é péssimo.
O sr. Luciano Cordeiro: - Mando para a mesa uma declaração de que o nosso collega Pereira Carrilho tem faltado e continuará a faltar a algumas sessões por motivos de saúde.
O sr. José Maria de Alpoim: - Comquanto não veja presente o sr, ministro da marinha, como está presente o sr. presidente do conselho de ministros, parece-me que posso fazer uso da palavra e dirigir a s. exa. algumas perguntas ácerca de uma noticia que VI hontem num jornal.
Dizia hontem o Diario popular que o governo contratara com uma casa ingleza a acquisição de um barco para o serviço das nossas colónias.
Não sei se isto é verdade, mas se o é, no estado das nossas relações com a Inglaterra, acho extraordinário que o governo portuguez, representante dos interesses do paiz, vá fazer em Inglaterra a acquisição do um barco para o

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serviço e defeza das nossas colónias, e que mande para lá o dinheiro portuguez!
E isto é tanto mais extraordinário quanto me consta que para a construcção de quatro cruzadores, o governo foi tambem convidar algumas casas inglezas!
Portanto, pergunto ao governo: é verdade que vae adquirir um barco tropedeiro em Inglaterra.
E a este respeito não posso deixar de me referir á opinião de um cavalheiro que não póde ser suspeito para a maioria; é o sr. Luciano Cordeiro.
Vou dizer á camara o que diz o sr. Luciano Cordeiro. num artigo de onde resalta uma noticia importante.
«E dois.- O Diario popular, transcrevendo uma noticia de nova encommenda a inglezes feita pelo ministerio da marinha e ultramar, tem exclamação adequada, às quaes, a fallar a verdade, sentimos impetos de fazer coro, e pede aos jornaes do governo que digam do caso. Nós que nos contentámos com ser de nós próprios, mas que naturalmente o collega inclue na qualificação, nada podemos informar senão que nos incluímos a dizer com elle:
«Não, não póde ser. A noticia é manifestamente inexacta, não é crivei, não seria admissível, não consentiria o decoro nacional...
«E dahi quem sabe? Têem-se visto tantas cousas.»
Aqui está o que escreve um dos deputados da maioria, um dos homens mais importantes do partido regenerador. Portanto peço ao sr. presidente do concelho que me diga o que ha de verdade a respeito desta noticia que vem num jornal, e pedia a v. exa. que se dignasse dar-me a palavra para responder ao sr. ministro, se isso for necessário.
O sr. Ministro de Instrucção Publica (Arrojo): - Levanto-me para responder ao sr. deputado em logar do sr. presidente do conselho. Pela circumstancia de eu ter gerido a pasta da marinha e de ter conhecimento mais especial do facto a que se referiu o sr. deputado, parece-me estou em circumstancias de melhor o informar.
Devo mesmo agradecer ao sr. José Maria de Alpoim, por isso que s. exa. me forneceu ensejo de declarar no seio do parlamento, o que ha de verdade relativamente ao boato de que hontem se fez echo uma das folhas da capital.
O governo de que tenho a honra de fazer parte não contratou em Inglaterra, nem em paiz algum, desde o seu advento ao poder, a construcção de qualquer barco para o serviço colonial.
Ha na verdade um vapor destinado á África oriental, e a que eu tive a honra de por o nome, é o Limpopo. Este vapor Limpopo foi contratado era Inglaterra na casa Thames Iron Works, tendo sido a sua compra approvada em conselho de ministros de 30 de dezembro de 1889.
Foi assignado o contrato pelo sr. Teixeira Guimarães, chefe de repartição do ministerio da marinha, na qualidade de representante do governo portuguez, e que tinha previamente negociado em Londres a acquisição do navio.
Foi, como disse, resolvida a acquisição deste barco em conselho de ministros de 30 de dezembro de 1889, e o governo de que tenho a honra de fazer parte é de 14 de janeiro de 1890. (Vozes: - Ouçam, ouçam.)
Creio que estas explicações satisfarão completamente o sr. José Maria de Alpoim e a camara; mas estou prompto a usar novamente da palavra se a camara assim o julgar conveniente.
O sr. José Maria de Alpoim: - Eu peço a v. exa. que consulte a camara sobre se me permitte usar novamente da palavra.
Vozes: - Falle, falle.
O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camara, tem o sr. Alpoim a palavra.
O sr. José Maria de Alpoim: - Quando o sr. ministro da inscrucçào publica declarou que havia um barco cuja construcção tinha sido contratada em Inglaterra em 1889, a maioria disse: «ouçam, ouçam.
Não é, porém, nenhuma cousa extraordinaria o contratar-se a aquisição d'este navio antes do ultimatum. (Apoianos.) O que se tornava extraordinário era contratar-se esta compra depois do ultimatum. (Apoiados.) Por consequência não tenho necessidade de fazer outras reflexões a esto respeito. (Apoiados.)
Não quero negar, nem era capaz de o fazer, o que disse o sr. João Arroyo; em todo o caso encontro no Diario popular de hoje, que me fornece agora o meu collega, uma noticia, a qual me parece que é dada pela casa a que me tenho referido, a casa H. Parry & Son, a qual parece que, achando-se maguada com o que este jornal tinha dito, vem fazer a sua queixa.
Os que sabem o que são jornaes, os que sabem ler nas entrelinhas, comprehendem o que isto quer dizer.
Diz este jornal:
«Somos informados de que a firma H. Parry & Son, com quem o governo contratou a construcção de um vapor para o serviço dos torpedos, está ha muitos annos estabelecida em Lisboa, tendo o seu estabelecimento no Ginjal e officinas de caldeiras no Aterro, onde emprega bastantes operários portuguezes.»
Portanto brigam as palavras do sr. João Arroyo com isto que aqui está. Em todo o caso, creio que s. exa. disse a verdade, nem eu era capaz de avançar o contrario. O que quero dizer apenas é que estou convencido de que esta informação foi fornecida pela firma H. Parry & Son.
Desejo ainda fazer uma reflexão com relação às palavras do sr. João Arroyo.
O sr. Luciano Cordeiro, no seu jornal, diz: nova encommenda.
Portanto um jornal que tem o caracter semi-official, um jornal que é redigido por um membro da maioria.
(Apartes.)
O sr. Luciano Cordeiro: - Peço a palavra.
O Orador: - S. exas. disseram muitas vezes que as Novidades, o Correio da noite, o Diario popular eram jornaes semi-officiaes, e, portanto, parece-me que deve ter alguma importância essas classificações de então para o caso actual. De resto, o nobre deputado da maioria o sr. Luciano Cordeiro deve privar com os srs. ministros, e é natural que esteja ao corrente dos acontecimentos que se dão em relação á vida ministerial.
Em todo o caso tenho sempre ouvido dizer que o Jornal da noite, é uma folha governamental e effectivamente assim o creio, porque o sr. Luciano Cordeiro, deputado da maioria, não ha de estar aqui a votar com o governo e a escrever no seu jornal contra esse mesmo governo.
Isso era impróprio do seu caracter e do seu talento. (Apoiados.)
Nestas condições não posso deixar de chamar a attenção do sr. presidente do conselho, para esta extraordinária nota do jornal nova encommenda.
S. exas. asseveram que não ha nada, tenho obrigação de acreditar e acredito, mas em todo o caso faço esta observação á camara para que a tome na devida conta.
O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): - Declaro ao illustre deputado, que nem eu, nem o sr. Júlio de Vilhena mandámos adquirir barco algum a Inglaterra.
Esta declaração terminante posso reiteral-a perante a camara, certo de que fallo a verdade.
O sr. José Maria de Alpoim: - Nem v. exa., nem o sr. Júlio de Vilhena ?
O Orador: - Nem eu nem o sr. Júlio de Vilhena fizemos encommenda alguma de qualquer barco para Inglaterra.
Relativamente às observações que fez o sr. Alpoim sobre o jornal que tem a honra de redigir o meu illustre

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amigo e digno membro do partido regenerador, o sr. Luciano Cordeiro, tenho a dizer, em primeiro logar, que nós, membros do partido regenerador, e o governo muito em especial, têem a máxima consideração, a máxima estima por s. exa. o sr. Luciano Cordeiro; em segundo logar, que não está nas tradições do partido regenerador nem nas tradições do governo, exigir que os jornalistas seus amigos, seus partidários, não possam exercer a critica livre e desassombradamente sobre os actos do governo. (Apoiados.)
Se esses jornaes são órgãos da imprensa periódica e se esses jornalistas tomaram sobre si a missão do esclarecer ao publico do que se passa na administração do paiz, creio que o governo terá mais a lucrar com a critica desapaixonada que elles façam dos seus actos, do que com o espirito de subserviência, que lhes tiraria a auctoridade. (Apoiados.)
Esta é a forma como o governo entende e aprecia a conducta dos jornalistas que fazem a honra de lhe conceder o seu apoio, e tenho muitíssimo prazer n'este momento de poder declarar, que nuca foram mais cordiaes nem de maior estima e amisade os sentimentos que o partido regenerador e o governo em especial professam pelo sr. Luciano Cordeiro.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Luciano Cordeiro: - Direi simplesmente duas palavras, para agradecer as considerações extremamente amáveis, em grande parte iminerecidas, com que me liou-rou o nosso collega o sr. Alpoim e com que acaba de distinguir-me o meu antigo amigo e correligionário o sr. Arroyo, digno ministro da instrucção publica e bellas artes.
Eu aqui sou deputado; não respondo, pois, pelo que se escreve nos jornaes em que eu collaboro ou tenho a honra de redigir. (Apoiados.)
E não ha subtileza nesta declaração; parece me que tenho dado na minha vida publica provas bastantes de que sou o mesmo em qualquer campo onde tenho de tratar quaisquer questões políticas; aqui como ia fora, no parlamento como no jornal, não preciso renovar, creio eu, a minha profissão de fé positivamente regeneradora, nem de que me prezo e honro de servir o partido regenerador. (Apoiados.)
Eu não sirvo homens, nem governos, sirvo o partido em que milito, sirvo-o por dedicação e crença para com ou meus princípios, que eu livremente adoptei, e sigo-o e acompanho-o por dever de consciência e por convicção própria.
E parcce-me que ha um equivoco em que laboram simultaneamente o digno deputado o sr. Alpoim e s.exa. o sr. ministro da instrucção publica.
O barco de que se trata não é positivamente aquelle a que s. exa. o ministro alludiu, e hoje mesmo das declara coes do Diario popular resalta a elucidação sufficiente.
O sr. Alpoim trata de um barco para serviço de torpedos, que foi encommendado a um estaleiro inglez que está ha longo tempo estabelecido em Lisboa.
Effectivamente a primeira noticia que correu levantou a apprehensão de que se fizera a encommerida a uma casa estabelecida em Inglaterra, mas, como disse, foi elucidada no jornal que primeiro publicou a noticia.
A esse respeito tenho opinião definida; nem o meu partido exige que eu as abdique, nem em boa consciência podia exigir, que eu as calasse.
Na situação e nas circumstancias presentes é fácil comprehender quaes são essas idéas definidas que tenho ácerca de qualquer recurso novamente á industria ingleza.
Ha uma noticia que o sr. Alpoim leu da referencia da qual s. exa. tirou a declaração de que alguma encommenda ou algum facto diverso d'aquelle apontado se teria passado.
Se v. exa. me permitte, em relação a isso, deixo a hypothese no mesmo campo em que ella foi posta e por isso não me refiro a ella aqui.
O sr. Francisco Mattozo: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Soure, contra as medidas tributarias.
Peço a v. exa. que consulte a camara se concorda que se publique no Diario do governo esta representação.
Devo acrescentar, que o sr. presidente da camara municipal declara que na representação não ha o menor intuito político, o seu fim e de toda a camara é unicamente attender aos interesses dos seus munícipes.
Faço esta declaração para que se não julgue que é movida por intuitos políticos.
Como está presente o sr. ministro da guerra, desejo fazer a s. exa. algumas perguntas. Primeiramente desejo saber se ha da parte do governo alguma idéa de suppressão do regimento de cavallaria n.° 10, que está em Aveiro.
V. exa. não imagina o sacrifício que fez aquella, cidade e districto para se construir ali um magnifico quartel, no qual está actualmente aquelle regimento.
Principiaram ha tempo a correr rumores de que cavallaria 10 era supprimida. Isto foi em epocha anterior â ultima eleição de deputados. A camara municipal e differen-tes cidadãos daquella localidade dirigiram-se ao governo e a sua Magestade. Foram tranquillisadoras as respostas recebidas n'aquella occasião.
É certo, porém, que a imprensa repete agora a noticia, de que effectivamente aquelle regimento será supprimido.
Pedia a v. exa. em nome do governo, me declarasse o que ha de verdade a este respeito. E sobre este assumpto nem mais uma palavra tenho agora a dizer.
Passo a fazer uma outra pergunta ao sr. ministro da guerra, a propósito do quartel do regimento de infanteria n.° 23, aquartellado em Coimbra. Aquelle regimento está aquartellado no antigo convento da Graça, que nenhuma commodidade offerece para quartel, succedendo haver muitas vezes maior numero de soldados com baixa ao hospital do que os que estão em serviço.
Tanto se reconheceu isto que em 1880 fizeram sair do convento de Sant'Anna umas pobres educandas que estavam ali ha muitos annos. Fez se isto ha cinco ânuos, repito, porque era urgentíssimo fazer obras no quartel, o queria-se aproveitar esse convento.
ha pouco tempo fiz eu n'esta casa um requerimento pedindo nota das despezas que se tinham feito com as obras no quartel em Sant'Anna.
Devo declarar francamente a v. exa. que imaginava que já se tinham ali feito obras e obras importantes.
Recebo hoje esta informação:
(Leu.)
Devo declarar a v. exa. com toda a franqueza que, só não soubesse pela experiência, como correm os negócios públicos nas nossas repartições, esta informação surprehender-me-ía. Pois despedem-se ha cinco annos d'aquelle convento umas pobres educandas, para se fazer obras immediatamente, e no fim deste tempo não se fez cousa nenhuma?
Não posso deixar de chamar a attenção do sr. ministro; pedindo a s. exa. que se digne providenciar para que este mal cesse e cesse quanto antes. Informe-se s. exa. e saberá que poucos regimentos estarão em Portugal tão mal aquartellados, como o regimento de infanteria n.° 23, em Coimbra.
Espero, portanto, que s. exa. tomará as providencias necessárias para que a obra comece quanto antes.
O sr. Ministro da Guerra: - (Serpa Pimentel): - Emquanto á primeira pergunta que me dirigiu o illustre deputado, direi a s. exa. que a questão da reorganisação do exercito está sendo estudada, por isso não posso responder se tal regimento fica em tal ou tal local. Isto é uma questão a estudar.
O que posso affirmar ao illustre deputado é que, seja

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qual for a organisação do exercito, como ella não diminue o que existe, póde estar certo que as povoações que hoje têem força publica, regimentos do infanteria, de cavallaria ou artilheria, hão de continuar a tel-a. Não digo que as que hoje têem um batalhão não possam ter dois e que aquellas que têem dois não possam ter um, as que têem um batalhão de infanteria seja mais conveniente ter um corpo de cavallaria ou uma bateria de artilhem; o que posso, repito, e affirmar ao illustre deputado que todas as povoações que têem hoje força militar hão de continuar a tel-a.
Emquanto á segunda parte, o illustre deputado diz que ha uma lei votada ha cinco annos.
É claro que eu não posso responder senão por cinco mezes, o que é pouco em relação a cinco annos.
Era bom que se tivesse feito alguma cousa. Mas a resposta que mandou a secretaria da guerra é correcta.
Nós temos uma lei votada o anno passado que auctorisa o governo a despender certa somma com os quartéis. Ha muito onde gastal-a, porque não é só o quartel da Graça que está em estado deploravel. O illustre deputado sabe que se trata agora de estudar tudo isso e se nós começarmos a fazer reparações em edifícios, e alguns dos quaes não servem para quartéis, porque na maior parte são conventos, e conventos não servem senão para conventos, o resultado seria gastar muito dinheiro inutilmente.
O ministerio da guerra entendeu, e entendeu bera, que valia mais a pena fazer obra nova do que adaptar esses edificios a quartéis.
De resto s. exa. sabe bom que essas obras, sendo auctorisadas por uma lei do anno passado, eu não tive envolvida n'ella a minha responsabilidade. Em todo o caso eu tomarei em attenção as considerações do illustre deputado.
Eu já tencionava apresentar á camara uma proposta do lei, que é o complemento da lei do anno passado, que tem por fim auctorisar as expropriações por utilidade publica, porque póde não convir que alguns d'esses quarteis sejam reconstruídos e outros precisarão ser alargados. Mas para isso é necessario haver alguns meios. É para isso que tinha tenção de apresentar uma proposta para a expropriação por utilidade publica.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Francisco Mattozo: - Eu peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permute que eu diga duas palavras em resposta ao sr. presidente do conselho.
Vozes: - Falle, falle.
O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camara, tem a palavra o sr. Francisco Mattozo.
O sr. Francisco Mattozo: - Começo por agradecer á camara o favor que acaba de dispensar-me, e ao sr. presidente do conselho a sua resposta. Mas, preciso dizer a s. exa. que em relação a Aveiro a replica do sr. presidente do conselho não me satisfez.
O que mais tem sobrosaltado aquella povoação é o dizer-se que o quartel de cavallaria passa a ser substituído por um parque.
Eu devo disser a s. exa...
O sr. Presidente do Conselho: - Não ha nada decidido.
O Orador: - Sei que não ha nada decidido. Mas o que venho pedir a s. exa. é que interceda com a sua grande auctoridade para que não só tire de Aveiro o regimento de cavallaria n.° 10, porque poucas localidades serão tão próprias para ter um regimento de cavallaria, como Aveiro.
Creio que n'este ponto todos que me ouvem, todos que conhecem Aveiro, sabem que eu digo a verdade. (Apoiados. )
Diz-se que nada só póde fazer sem que a commissão apresente os typos de quartéis.
Pois durante cinco annos não tem havido tempo para isso?
Eu não censuro o sr. ministro da guerra actual, porque procuro ser justo com os homens politicos, qualquer que seja a posição partidaria em que se encontrem; mas é para lamentar que se tenha gasto tanto tempo para se adoptarem os typos de quartéis.
Peço, portanto, ao sr. ministro da guerra que empregue todos os seus esforços para que esto negocio tome o seu verdadeiro caminho.
O sr. Figueiredo Mascarenhas: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Silvos, pedindo que se faça uma pequena alteração na proposta do governo que fixa as percentagens lançadas pelas juntas geraes.
O sr. Albano de Mello: - Dirigiu varias perguntas ao governo ácerca da lei de recrutamento, e mandou para a mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja remettida á camara copia do officio do procurador geral da corôa e fazenda, escripto em maio ultimo, e em que se sustenta a doutrina de que o governo não póde renovar os prasos para as operações dos recenseamentos eleitoraes. se essas operações se não poderem completar ate ao dia 30 do junho de cada anno. - Albano de Mello.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): - A minha resposta é muito simples. O regulamento não está ainda feito.
O sr. Albano de Mello: - Não é o regulamento, é a lei nova.
O Orador:- Ha um decreto dictatorial que auctorisou o governo a reformar o recrutamento, e é essa reforma que ainda não está feita. Está-se estudando, e n'ella hão de ser completamente respeitados, não direi os direitos adquiridos, mas os interesses adquiridos, sendo o mais benevola possível, porque se trata do imposto de sangue. Está-se estudando, repito, e o illustre deputado do certo não quer que eu venha para aqui discutir uma reforma que está sendo elaborada.
O sr. Albano de Mello: - O que eu desejava era saber qual é o pensamento do governo a este respeito.
O Orador: - Não posso dizer agora ao illustre deputado senão que tomo em muita consideração a maneira como o illustre deputado encara esses dois pontos, mas não posso acrescentar mais nada.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão, na especialidade, do projecto de lei n.º 109 (bill de indemnidade)
Foi lida e admitida á discussão a moção de ordem do sr. Dias Ferreira.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (António de Serpa): - Começa por mandar para a mesa duas propostas de lei.
Rerferindo-se ao discurso feito na sessão anterior pelo sr. Dias Ferreira, disse que as disposições dos decretos dictatoriaes relativos ao direito de reunião, á liberdade de imprensa e às representações theatraes já existiam na legislação do paiz.
Os decretos dictoriaes não tinham feito mais do que concretisar estas disposições.
O governo queria que o povo tivesse o direito de se reunir, mas queria que este direito fosse devidamente regulamentado.
E não era de estranhar isto, porque tambem o povo não exerce o seu principal direito, que é o de eleger os seus representantes, senão em certas condições marcadas na lei.

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Emquanto às representações theatraes, diria que não se devo ter apenas em conta o auctor que escreve o drama ou a comedia; e preciso não esquecer que existe o emprezario, que mira apenas ao interesse e que, quando não seja escrupuloso, póde especular com o escandalo, quando o escândalo attrahia maior concorrência ao theatro.
Pelo que respeitava á liberdade de imprensa, sustentou que o decreto respectivo não tinha por fim coarctar aquelle direito, mas sim tornar effectiva a responsabilidade.
Dissera o sr. Fernando Palha que dos abusos da liberdade de imprensa não adviria mal algum. Não era, porém, assim. De taes abusos sempre provinha algum mal, porque iam prevertendo o espirito publico.
O governo não aspirava à máxima responsabilidade, já se comentava com alguma responsabilidade, e na verdade, depois da publicação do decreto, já se nota differença no estylo dos jornaes.
Dissera o sr. Fuschini que havia no paiz um partido reaccionário e de aulicos, e que o governo, tendo dito que a dictadura fora motivada pelos acontecimentos de janeiro, só um mez depois publicara os primeiros decretos.
Diria a este respeito que no paiz ha de certo reaccionários, mas não formam um partido, e que na epocha em que se publicaram os decretos davam-se as mesmas circumstancias de 14 de janeiro, havendo mais quem pretendesse especular com os acontecimentos.
Tinha o sr. Fernando Palha observado, referindo-se a algumas palavras do orador, que a paixão patriótica é cega, na verdade, mas faz os heroes, e que o governo se devia collocar á frente do movimento gritando: aqui d'El-Rei.
Observaria que n'aquella occasião o paiz não precisava de heroicidade, porque não queria a guerra; do que o paiz precisava era de quem negociasse diplomaticamente. Também diria que, se alguém devia ter gritado: aqui d'El-Rei era o partido progressista na occasião do ultimatum.
Com respeito á guerra commercial á Inglaterra, a sua opinião era que não se devia attender apenas ao facto de se poderem adquirir em outros paizes os productos que vamos buscar aquelle paiz; era preciso não esquecer que ella nos comprava tambem productos que eram objecto de um commercio importantíssimo.
Depois de fazer outras observações em resposta ao sr. Fernando Palha e a outros srs. deputados, o orador declarou que a única cousa que em sua consciência justifica as dictaduras são as circumstancias em que cilas se dão, e sustentou que as circumstancias em que o governo publicara os decretos dictatoriaes eram as mais graves e angustiosas que se têem dado em Portugal na segunda metade d'este século.
Fora em virtude de taes circumstancias que o governo assumira a dictadura, e não por interesse partidário, porque effectivamente o partido regenerador não tirara vantagem dos actos dictatoriaes.
(O discurso de s. exa. será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando for restituído.)
As propostas de lei mandadas para a mesa pelo sr. presidente do conselho de ministros vão publicadas no fim da sessão.
O sr. Baptista de Sousa: - Sr. presidente, não me tendo chegado a palavra na discussão da generalidade do projecto do bill, tencionava agora, aberto o debate na especialidade, circumscrever-me ao exame e critica de varias disposições dos decretos dictatoriaes, como me era imposto pela boa ordem dos trabalhos parlamentares, respeitando assim a significação das propostas combinadas, que no principio apresentaram os srs. Marianno de Carvalho e Pinheiro Chagas, e a camara approvou.
Mas desde que o sr. presidente do conselho, a quem me sigo no uso da palavra, respondendo em breve discurso ao sr. Dias Ferreira, que iniciou o debate, voltou á generalidade do projecto e renovou com pouca prudência a questão política não sou eu, sr. presidente, que altero aquella boa ordem de trabalhos deixando de lhe sacrificar os justíssimos reparos, que provocam as affirmações que s. exa. acaba do fazer neste momento. (Apoiados.)
Com assombro, talvez de todos, permittiu-se o sr. Serpa a ousada declaração, de que, a par de quaesquer defeitos ou peccados da dictadura, havia a virtude d'ella não haver sido destinada por acto algum ao conseguimento de qualquer interesse partidário!
Quando o seu conjuncto e o fim immediato das providencias decretadas, e ainda mais a execução por meio de nomeações do pessoal das múltiplas auctorisações, que o governo a si proprio concedeu, não protestassem contra tão estranha affirmativa, s. exa. nunca poderia explicar por motivo alheio aos interesses partidários o decreto que revogou a lei de 24 de julho do 1885, na parte relativa á ingerência por ella conferida às juntas geraes de districto e camaras municipaes na eleição de delegados aos collegios dos eleitores em segundo grau dos pares do reino electivos. (Apoiados.)
Por muito que eu e os meus collegas da opposição tenhamos consideração e tributemos respeito, como nos cumpre, ao sr. presidente do conselho, tantas vezes quantas o primeiro ministro affirmar aquella innocencia política, quantas a contestaremos. (Apoiados.)
O governo se não recorresse ao suffragio directo, e mandasse, depois do injustificável acto da dissolução das cortes nas condições especiaes em que se encontravam os partidos, proceder á eleição dos pares conforme era regulado por aquella lei, não teria incontestavelmente maioria na camara alta.
Ora, sr. presidente, um acto dictatorial, que tem por único fim assegurar maioria parlamentar a um governo, é o que ha de mais característico de serviço partidário. (Apoiados.)
Supponho que s. exa. não se quiz referir a interesses illicitos, porque, ninguém o tendo accusado disso, seria um pregão inútil de moralidade governativa.
Bera sei, e não me esqueço, de que approvei com o meu voto em 1887 a dictadura feita pelo ministerio progressista, e de que essa não foi isenta de interesse partidário.
Mas então não houve este commentario hypocrita, que agora só faz á dictadura de 1890. (Apoiados.)
Os ministérios regeneradores, presididos ou inspirados por Fontes Pereira de Mello, tinham durante longo tempo estabelecido com premeditacão o desequilibrio dos partidos, e chegara a crear-se e cultivar-se a lenda, de que o partido progressista estava definitivamente condemnado a ostracismo perpetuo. (Apoiados.)
Quando o grande perigo dessa insensata política começara a sentir-se, vieram as reformas políticas e com ellas a própria lei de 1885, que um governo regenerador agora desfez, tendo a referenda e responsabilidade de outro governo igualmente regenerador. (Apoiados.)
Mas subindo ao poder o partido progressista encontrou adversarias as corporações administrativas e, em geral, o funccionalismo.
O código administrativo de l886, publicado em dictadura, ao mesmo tempo que melhorava notavelmente a administração em harmonia com antigas, doutrinas progressistas, e dava, note se bem, representação às minorias, resolvia difficuldades eleitoraes em ordem a ter meios de governar quem ao governo fora chamado.
Mas isso não o dissimulou o governo, que fora presidido pelo sr. Luciano de Castro. (Apoiados.)
Muito ao contrario n'esta camara e na dos dignos pares as declarações do chefe progressista foram francas e claras, como é próprio do seu conhecido caracter sincero, de que a dictadura fora uma necessidade política ou de defeza da situação. (Apoiados.)
Nesta camara votou-se uma moção do sr. Eduardo José Coelho formulada com igual franqueza. (Apoiados.)
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E, ha poucos dias, defendendo essa dictadura, o sr. Beirão assumiu aqui nobremente e pelos mesmos motivos a sua responsabilidade e do seu partido. (Apoiados.)
Tive então ou em 1887 necessidade do votar essa dictadura, como agora tenho o prazer de desapprovar a do corrente anno.
Vota a, e já approvou a generalidade, a maioria, e, certo de que nisso não terá a mínima satisfação, não lho levo a mal.
No meio das recriminações, que mutuamente se fazem todos os partidos em Portugal, ha a virtude da cohesão nos graves momentos políticos.
Mas, creio bem, sr. presidente, que a maioria muito teria estimado que o governo, que apoia, houvesse procedido não hypocritamente, mas com a franqueza com que se houve o ministerio progressista. (Apoiados.)
A sua violência seria pouco maior do que a da opposição, se esta, vendo diante de si um governo arrastado pela necessidade confessada de usurpar as attribuições do parlamento para remover dificuldades políticas attendiveis, por muito que ha dias o sr. Pinheiro Chagas mal estranhasse a franqueza progressista, recusasse a sua absolvição a esse governo, ficando a desculpal-o no parecer intimo da sua consciência. (Apoiados.)
E não houve só a occultação do interesso partidário.
O governo tambem occultou a sua fraqueza sob a apparencia de força, e sonega ao conhecimento das curtes ou do paiz os enormissimos encargos da dictadura, a pretexto, como se algum podesse haver, de só se ter auctorisado a gastar! (Apoiados.)
Por um decreto dictatorial dissolve a camara municipal de Lisboa, e por outro, próximo das eleições geraes, restabelece os antigos concelhos do Sobral Monte Agraço e da Arruda dos Vinhos.
Estes factos, que parecem alheios um ao outro, toem, todavia, intima connexão para a sua critica política.
Vê-se do relatório, que precede o primeiro d'estes decretos, que o governo, porque suspeitou que a camara de Lisboa viria talvez a resistir á dissolução, se a houvesse, e a qual podia ser, fora do caso de dictadura, um acto do poder executivo, que por illegal não merecesse ser obedecido, dissolveu-a effectivamente.
O sr. José Júlio Rodrigues já comparou muito bem o caso com o da lenda de uma prisão em Coimbra pelo motivo do preso ter parecido querer tentar arrombar um bombo. (Riso.)
E do relatório, que precede o segundo decreto, bem como do parecer da illustre commissão do bill, resulta a informação segura de que os povos dos dois antigos concelhos não pagavam accintosamente contribuições, desrespeitavam as leis, escarneciam das auctoridades, e se mantinham, por isso, num estado prejudicial á administração o ordem publica.
Era a resistência perfeita e proclamada às determinações do poder e a falta de cumprimento dos deveres cívicos.
Pois o governo, porque a camara de Lisboa pareceu querer vir a resistir a um acto mental do mesmo governo, castigou a, e porque povoa da antigos concelhos resistiam realmente a leis existentes, premiou-os!
Bello acto de forca, não ha duvida! (Apoiados.)
Tem tambem um contraste frisante com o proceder do ministerio progressista.
Lembrâmos-nos bem todos da greve, em que se constituiram os negociantes de vinhos de Villa Nova de Gaia por causa ou em ódio á creação da companhia vinícola do norte.
Illustres deputados da opposição nesse tempo favoreciam e animavam essa greve com inventivas violentas e quotidianas na camara para constranger o governo a dar rasão aos grevistas e annullar o contrato feito com aquella companhia, do qual parecia depender a sua existência.
O mal era realmente grave, e a desordem podia alastrar.
Pois o sr. José Luciano de Castro, e esse é que foi um forte, respondia aqui serena mas resolutamente, que era quanto os commerciantes de Villa Nova de Gaia não mudassem de rumo entrando na ordem e na legalidade, porque na reforma penal do sr. Lopo Vaz de 1884 a greve foi um facto incriminado, elle presidente do gabinete por decoro do poder nem transigia, nem sequer os podia ouvir. (Apoiados.)
(Pausa.)
Mas, sr. presidente, desviado como fui para a questão política pelas affirmações extraordinárias e provocadoras do nobre presidente do conselho e ministro do reino, nem pude ainda ler a minha moção, que sou obrigado a apresentar por me ter inscripto sobre a ordem.
Já agora, porém, peço a v. exa. e á camara, que me permitiam, antes da leitura da moção e de começar a seguir o caminho das considerações que me tinha proposto fazer, completar o que se me offerece dizer sobre os dois decretos dictatoriaes, de que principiei a occupar-me.
No relatório do decreto da dissolução da camara municipal de Lisboa
reconhece-se, que a cidade está oneradissima do encargos tributários, e o facto é muito verdadeiro.
Como se desculpará, pois, a proposta de fazenda do governo de um novo addicional de 6 por cento sobre todos ou a maioria dos impostos geraes, directos ou indirectos, quando, alem da base iniqua para todos os cidadãos, mais especialmente affectará os minicipes de Lisboa e d'entre estes os menos favorecidos da fortuna ?! (Apoiados.)
Acrescenta-se ali haver necessidade da revisão da lei especial de 18 de julho do 1885, que rege o município do Lisboa, e que vem juntar-se á lei eleitoral do pariato como obras em menos de cinco annos renegadas pelo próprio partido que as fez.
Confessa o governo, que apenas tencionava propor às camaras legislativas a reforma dessa lei, mas diz em seguida, que factos recentes, porém, impõem o dever de tomar uma resolução immediata.
Parecerá a toda a gente, que vem logo immediatamente decretada essa reforma.
Pois sr. presidente, o que o decreto, a que pertence tal relatório contem e ... a dissolução da camara municipal e os nomes dos cidadãos nomeados para a substituir.
A reforma ficou adiada para quando o governo quizer em dictadura por tempo indeterminado decretal-a, e depois é que será designado dia para serem eleitos novos vereadores!
De sorte que foi dissolvida a camara em nome dos defeitos de uma lei, e fica uma commissão a reger o município segundo os preceitos d'essa mesma lei! (Apoiados.)
Isto faz lembrar a conhecida anedocta do charlatão curandeiro, que fazia uzo indistincto do um formulário, que collccionára.
Com o mesmo medicamento morreu um carpinteiro e conservou a vida um sapateiro.
O charlatão annotou logo a respectiva receita: boa para carpinteiros e má para sapateiros. (Riso.)
Applicando o conto, a lei de 1885, na opinião do governo, vae fazendo as delicias dos lisboetas nas mãos da commissão nomeada, e causaria a ruina da capital executada pelos vereadores, que ella elegeu! (Apoiados e riso.)
Mas o que não é para rir, sr. presidente, é o revoltante attentado constitucional, que o facto envolve.
E da lei fundamental do paiz que a administração económica dos municípios pertence a vereadores eleitos. (Apoiados.)
Não nego que o poder executivo possa dissolver as camaras municipaes, dados certos requisitos.
Não nego ainda, que em dictadura ou assumindo funcções legislativas, que o parlamento viesse a validar, o governo podesse desattender os requisitos legaes.

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SESSÃO DE 10 DE JUNHO DE 1890 601

Mas nego, que tivesse poderes até extraordinários para suspender indefinidamente o exercicio dos direitos políticos dos cidadãos de Lisboa. (Apoiados.)
Dissolução de uma camara municipal, que não seja seguida immediatamente da convocação dos eleitores para em dia próximo elegerem novamente a sua vereação, já não é acto que vise a reformar abusos de administração, porque se converte na absoluta privação de direitos dos collegios eleitoraes. (Apoiados.)
A suppressão de um empregado publico por tempo indefinido, dizia o fallecido procurador geral da corôa Ottolini num seu parecer ao governo, é inadmissível, porque, equivalendo á demissão, é uma cavillação da lei. A doutrina é por maioria de rasões applicavel. Aqui tem o governo, dado por um illustre jurisconsulto que dos governos foi consultor, o nome do acto que praticou: foi uma cavilação da lei! (Apoiadas.)
Nobre e edificante exemplo, que um da altos poderes do estado dá do respeito devido às leis e aos direitos dos cidadãos!
Ao menos fizesse o governo eleger cortes constituintes para terem poderes de o relevar desta responsabilidade.
O decreto, que por um mesquinho interesse eleitoral e como prémio á resistência restabeleceu dois concelhos, que haviam sido annexados, como no relatório se confessa, para formar um em condições económicas de vida autónoma mais desafogada e robusta, é, por isso mesmo, alem de tudo, um erro de administração.
Está nas tradições do partido regenerador, pela reforma administrativa do sr. Mártens Ferrão em 1867, embora abortada, e pelos desejos manifestados em 1878 por António Rodrigues Sampaio, constituir os concelhos comarcas ou de grandes áreas, pois só assim terão qualidades resistentes aos indispensáveis encargos locaes.
Que bella occasião perdida, agora que por uma desgraça nacional o partido progressista não podia ser ponto do apoio a resistências para derrubar uma situação, de em vez do que foi feito, se executar um plano de reducção do numero de concelhos!
Pois o governo nem contou, ou hypocritamente inculca como motivo o de não confiar, em que os povos do Sobral e da Arruda afrouxassem na resistência, elle que pelo nobre ministro dos negócios estrangeiros fazia sentir a lord Salisbury, que esperava que acalmasse a agitação de todo o povo de Lisboa e de Portugal, e lhe pedia, ao ministro, que nos afrontara para toda a vida com o insólito ultimatum de 11 de janeiro, que o ajudasse a remover as difficuldades internas!
Muito triste é tudo isto! (Apoiados.)
É tempo, porém, de regularisar o uso que estou fazendo da palavra, apresentando a minha moção de ordem.
Hei de justifical-a com o exame dos vários decretos dictatoriaes, mas como me demorarei especialmente sobre o que regula o uso da liberdade de imprensa, e até tenho de apresentar um contra-projecto de sua inteira substituição, principiarei por esse, posto que altere a ordem por que se encontram na publicação distribuída com o projecto do bill, pois se me faltar tempo ou se vir que abuso da attenção da camara, prefiro preterir a apreciação de quaesquer dos outros.
A minha moção é a seguinte:
«A camara, reconhecendo que as providencias de caracter legislativo publicadas pelo governo não foram devidamente estudadas por falta de tempo, e que, a par da deficiência de preceitos, carecem de unidade e harmonia; convida a coinmissão a, de accordo com o governo, rever todos os decretos dictatoriaes e substituil-os por projectos, cujo exame o parlamento possa fazer com o indispensável conhecimento não só de doutrina e de fim, a que tem de se subordinar a confecção das leis, mas ainda dos encargos que advenham para o thesouro, e que as circumstancias financeiras obrigam a ponderar cuidadosamente.»
«Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 10 de junho de 1890.= O deputado, António baptista de Sousa.»
Começando, para justificar a minha moção, por me occupar do decreto relativo ao uso da liberdade de imprensa, eu peço desde já desculpa a v. exa. sr. presidente, e á camara, da fadiga que lhes causarei, ou do muito que irei abusar da sua attenção, pela demora ou largueza a que o assumpto me obriga, embora me esforce para ser breve.
Sendo esse decreto um dos que mais impressionaram o publico, e que mais póde affirmar ou negar princípios liberaes, estudei-o com particular cuidado para me habilitar a bem cumprir, em negocio tão momentoso, o meu dever como membro do parlamento.
Não vi o assumpto pelo lado commodo para o trabalho e vistoso para o effeito; e nem esse tem sido o modo de eu me desempenhar do mandato popular.
Com meu desproveito talvez prefiro ser útil a todos e a tornar-me agradável a muitos.
Agradou-me desde o primeiro momento a prohibição da declinatoria do editor para o auctor do escripto. (Apoiados.)
Era isso que a opinião justamente reclamava para acabar com os testas de ferro, que em geral eram pessoas taes, que os offendidos tinham do desprezar com asco ou de abandonar com dó.
Desconfiei, porém, logo da complicação emmaranhada do decreto, tanto estou prevenido contra a perfeição dos estudos, que não offereçam soluções simples.
Não me enganei. Deduzi do decreto as consequências absurdas das suas disposições; procurei os erros de que estava eivado; confrontei os princípios oppostos a que sacrifica; e pude determinar as causas dos seus defeitos para tentar eliminal-as no contra-projecto, que terei a honra de apresentar á camara.
No que digo, não vae, sr. presidente, a mínima desconsideração para o auctor do decreto, o sr. ministro da justiça Lopo Vaz, de quem, ainda quando eu não fosse um dos mais velhos amigos de s. exa., nada podia dizer que não fosse para me associar ao geral reconhecimento da justa reputação do seu privilegiado talento. (Apoiados.)
Mas s. exa. não teve tempo para fazer obra menos precipitada do que a dos mais decretos, dominado como estava o governo pelo pensamento de com uma dictadura á pressa querer mostrar força e suffocar aã mais apreciáveis liberdades publicas. (Apoiados.)
Principia o decreto por attribuir sempre ao editor do periódico e ao auctor da matéria, cuja publicação for incriminada, como incursos na disposição do artigo 20.° n.°1.° do código penal, a responsabilidade criminal e civil com ella connexa por abuso de liberdade de imprensa periódica.
Mas o decreto reconhece que póde não haver editor com imputação, ou que póde não ser encontrado.
Nestes casos passa a responsabilidade para o dono ou administrador da officina.
Mas o decreto reconhece mais, que póde não ser conhecido o estabelecimento, em que se haja feito a impressão ou estampagem.
Para essa hypothese passa a responsabilidade para quem fizer a exposição á venda, ou de qualquer outro modo haja concorrido sciente e voluntariamente para a divulgação do periódico.
Termina aqui a escala da responsabilidade subsidiaria, ou dos supplentes do editor!
Com relação ao auctor reconhece é decreto que elle póde não ser conhecido, e então substitue a sua falta considerando réus de mais outro crime, do de desobediência, o editor ou algum dos seus supplentes, ou seja d'elles o que for accusado!
A própria apresentação do editor como auctor ao mesmo tempo do escripto incriminado é facto que o decreto per-

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mitte que se julgue simulado, e incrimina mais gravemente como falsa declaração.
Digam-me, antes de mais nada, se póde ser consistente uma doutrina, que admitte ou cria supplentes ou substitutos de criminosos, como se se tratasse assim de cargos, como de vereadores ou jurados?! (Apoiados.)
Digam-me se não é por os delictos serem exclusivamente actos pessoaes, que a constituição determina entre as garantias dos direitos civis e políticos, que a pena nunca passará da pessoa do delinquente? (Apoiados.)
Substitutos de criminosos!
Isto é idéa em que o espirito humano possa demorar-se um segundo sem um sentimento invencível de repulsão?! (Apoiados.)
Bem sei que na lei da imprensa de 1866 o já noutras havia uma escala de responsáveis subsidiários, mas o que mais estranho por isso mesmo, é que vinte e quatro annos depois um melhor estudo não tenha acabado com aquelle,... ia a dizer disparate, a que dá origem a falta de distincção fundamental entre imprensa regular ou habilitada e irregular ou clandestina.
Os últimos dos substitutos são os vendedores dos jornaes, e assim o numero dos criminosos chega quasi á pulverisação e póde constar só de irresponsáveis, como são pelo código penal os que constituem essa multidão de menores de dez annos, que fazem em Lisboa a venda avulsa dos jornaes.
E não é tudo. Supponhamos que são accusados e condemnados os vendedores na falta do dono ou administrador da officina, ou qualquer destes na falta do editor que não foi encontrado.
Se depois apparece o dono ou administrador, ou apparece o editor, ou apparecem todos, que acontece, que se faz?!
São ou não perseguidos criminalmente?!
Mantem-se a condemnação dos substitutos, quando têem comparecido os effectivos?!
Dá-se ou não aos que já hajam cumprido a pena a rehabilitação e indemnisação dos prejuízos, como concede o ultimo código penal ?!
O decreto a nada d'isto responde, e no direito commum tambem é inútil procurar a resposta, porque nunca cuidou de taes estravagancias.
Tudo vem, e é o que por ora quero consignar, de se tornar dependente, não de acto próprio, mas de acto ou omissão alheia, e até de capricho, favor ou acaso, a innocencia ou a culpa.
Não póde ser. Se o facto de ser dono, ou administrador ou vendedor de determinado periódico ou do um seu numero qualquer e um crime, sei o-ía sempre, ainda que o editor fosse encontrado, e, se o não é, não o começará a ser por se não encontrar o editor.
Fora d'isto não ha consistência alguma. (Apoiados.)
Vou agora referir-me simplesmente às primeiras três linhas do § 1.° do artigo 3.° do decreto.
São só três linhas, ar. presidente, mas sobrariam para a censura de todo o decreto.
Diz-se ahi: na falta de editor susceptível de imputação, ou quando não for encontrado, a responsabilidade, de que trata este artigo, pertence ao dono ou administradores da officina...
Ora, sr. presidente, o artigo 1.° tinha declarado, que era assegurada a liberdade de imprensa e permittida a publicação de qualquer periódico nos termos da legislação em vigor.
Subsiste assim na parte não revogada pelo decreto a que se encontra nas leis anteriores da imprensa, isto é: na lei de 22 de dezembro de 1834, de 10 de novembro de 1837, de 18 de outubro de 1840, no decreto dictatorial de 22 de maio de 1851, que revogou a chamada lei das rolhas, de Costa Cabral, de 3 de agosto de 1800, e que teve sancção parlamentar por ser comprehendido na approvação do
bill da lei do 1 de junho de 1853, o qual abrangeu os decretos legislativos desde o principio de maio de 1851 até 31 de dezembro de 1852, e finalmente na, lei de 17 de maio de 1866.
A ultima destas leis prohibe a publicação de qualquer periódico sem que tenha editor habilitado, ou seja, que haja provado simultaneamente perante o administrador do concelho ou bairro, e perante o delegado do procurador régio respectivo, que é maior ou emancipado, e que está no goso dos seus direitos civis e políticos.
Como é, pois, que o decreto diz «na falta de editor susceptível de imputação», quando pelo código penal só não são susceptíveis de imputução os menores de dez annos e os loucos sem intervallos lúcidos, e pela lei de 1866 nenhum menor ou louco póde ser editor?! (Apoiados.)
A pressa da dictadura explica ainda esta irreflexão.
A lei de 1836 diz, que pelos crimes de abuso de liberdade de imprensa é responsável o editor emquanto não fizer reconhecer o auctor, se este for susceptível de n'elle recair a imputação criminal.
Esta exigência para o auctor do escripto comprehende-se, porque não se póde obrigar qualquer pessoa, que possa escrever para os jornaes, a tirar carta de escriptor, e póde por isso um periódico publicar escriptos de um irresponsável.
A pressa de fazer um decreto para amordaçar a imprensa, para comprimir era vez de regular a liberdade do pensamento, fez com que se copiasse ou applicasse mal o que estava na lei de 1866, e onde esta dizia auctor, ficou no decreto editor, susceptivel de imputação, (apoiados.)
Se não foi isto, e a alteração é intencional para prevenir o caso de haver editor não habilitado ou insusceptível de habilitação, então o decreto mais uma vez confunde, em vez de distinguir para diversamente as considerar, a imprensa regular e a clandestina, considerando-se clandestina aquella cujo editor, embora bem conhecido, não seja habilitado.
O decreto considera depois a hypothese do editor não ser encontrado para desde logo, ou to por esse facto, passar a responsabilidade para o dono ou administrador da officina.
A primeira cousa, que disto deriva, é que o editor, ainda quando devidamente habilitado, nunca póde ser julgado á revelia?
Se não for encontrado chama-se immediatamente o substituto!
Exigira a lei a habilitação do editor para ser o responsável pelos abusos do jornal, e o editor zomba da lei, e faz ficar a scismar o administrador do concelho e o delegado do procurador régio no préstimo que tem o processo, que guardam, da habilitação, só for passar a casa de um vizinho o dia em que o procurem para o citar!
Com o dono ou administrador da officina ou oficinas, quer seja da imprensa, typographia, lithographia ou estabelecimento análogo, já assim não acontece: esses são julgados á revelia, porque no decreto não ha para elles a restricção de serem encontrados.
Apenas quando não e conhecido o estabelecimento é que a responsabilidade passa para os substitutos, os vendedores; o que é cousa differente de ser conhecido o dono ou administrador, mas não ser encontrado.
A parti; a impossibilidade de explicação satisfactoria d'esta differença, os effeitos podem ser importantes
Attente-se no caso, que nem raro é fora de Lisboa e Porto, e bastava que fosse possível para dever considerar-se, de o dono da officina ser ao mesmo tempo o editor.
E accusado como editor e não apparece: não se julga á revelia.
Passa-se a accusar o dono, que é a mesma pessoa, e é julgado na ausência!
Mas condemnado como editor logo á primeira reincidência, que, se verifica dentro de dezoito mezes e não confiar-

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me o disposto na lei geral, ou havendo accumulação de tres bdeterminados
crimes o jornal é supprimido e condemnado, como dono, o jornal continua e não soffre a pena da supressão!

Tem isto tambem alguma consistencia?!

E não pára aqui. O decreto diz que a responsabilidade pertence ao dono ou aos administradores da officina ou officinas.

Que são substitutos no mesmo grau de um criminoso effectivo vejo eu.

Que o não são conjuncta mas só separadamente tambem não offerece duvida.

Mas que rasão determina, que para cada caso venha a ser responsável um d'elles é que me parece não poder descobrir-se.

Nem sequer se diz que é o que ter encontrado mais depressa.

Pôde escolhel-o o official encarregado da citação!

E se houvesse mais do que um dono, como acontece para alguns, jornaes, que pertencem a emprezas e até a sociedades regularmente constituídas?

Responde o gerente ou respondem todos os comdominos?

Ora, sr. presidente, uma lei que deixa para a jurisprudência dos tribunaes a resposta às perguntas, que tenho feito, em vez de as prevenir devidamente, só póde ser origem de males sociaes. (Apoiados)

Mas por mais perfeita que fosse, seria sempre odiosa por sor entregue á execução de juizes singulares. (Apoiados.)

Nem a magistratura devia ser submettída a tão terrível prova.

Diz a lei de 1866 era disposição não revogada, que não «ao prohibidos os meios de discussão e critica das disposições tanto da lei fundamental do estado como das outras leis, com o fim de esclarecer e preparar a opinião publica para as reformas necessárias pelos tramites legaes.

Será por vezes missão melindrosa a de encontrar a raia, que separa essa critica permittida da aggressão injuriosa, que é incriminada, ao systema representativo fundado na carta e nos seus actos addicionaes; e os juizes dos tribunaes communs são sempre e naturalmente participantes das preoccupações do poder central.

O governo, sr. presidente, quiz evidentemente subtrahir ao jury a applicação do seu decreto, mas nem sequer teve coragem de o dizer. (Apoiados.)

O plano revela-se, porém, em toda a evidencia.

Por aquelle decreto baixou as penas, e por outro da mesma data de 29 de março levantou a jurisdicção dos juizes de direito em processo de policia correccional e no novo processo chamado correccional intermediário entre aquelle e o de querella ou ordinário.

É a isto que respeita a explicação meramente allusiva, que se encontra no relatório, onde se lê - Pensa o governo que pelo conjuncto destas providencias e de outras, que aqui não se mencionam, mas que estão consignadas no projecto n.° 1, será melhorada a punição dos crimes por abuso de liberdade de imprensa.

Mas a suppressão do jury é até aNti-constitucional, porque a carta diz que o poder judicial é composto de juizes e jurados, assim no cível como no crime, e no cível, como se sabe, é ainda hoje permittido, sendo obrigatório nos processos commerciaes e nos de querella.

Acerca dos crimes de abuso de liberdade de imprensa então o julgamento por um jury é garantia acceita como dogma por todos os homens liberaes. (Apoiados.)

Não canso a camara com citações, bastando-me chamar-lhe a attenção para as que foram aqui feitas em 1886, discutindo 6 projecto convertido na lei de imprensa desse anno, pelo então deputado e notável jurisconsulto Levy.

Ahi se vê, que os publicistas, jurisconsultos e homens de estado de maior auctoridade não julgavam compatível a existência da liberdade de imprensa com a suppressão em França, um projecto de lei de imprensa, e ahi se ouviram estas palavras de M. Pelletan:

«A republica póde ter algum interesse em attentar contra a liberdade de imprensa? Parece-me, realmente, estar a sonhar, quando ouço dizer que a submissão da imprensa á jurisdicção correccional nada attenta contra a sua liberdade! Depois do excellente discurso de M. Deschanel que poderei eu dizer a este respeito? Lede a historia de todas as grandes luctas políticas deste século, e vereis, que todos os liberaes, desde os radicaes até aos mais tímidos, até ao próprio M. Emile Ollivier, têem sempre estado de accordo em repellir, ácerca da imprensa, a jurisdicção correccional; que todas as reacções a têem restabelecido; e que todas as revoluções liberaes a têem supprimido.»

E o projecto de lei foi rejeitado por 347 votos contra 189!

Entre nós as leis de 1834, 1837 e 1840, e até a própria lei das rolhas de 1800, estabeleciam jury para a imprensa, e não só especial ou qualificado, mas com jurisdicção tão ampla, que julgava do facto, do crime e da applicação da pena!
A Suécia não tinha jury, mas estabeleceu-o para a imprensa.

A Hespanha, que ensaiou e supprimiu o jury, não confere, todavia, a juizes singulares os julgamentos de alguns crimes de imprensa, mas a três juizes, tendo nas cidades, como Madrid e Barcelona, aonde é maior o numero dos jornaes, agentes especiaes do ministerio publico para a imprensa.

E havemos de supprimil-o nós, tirar á classe superior dos escriptores a garantia de um tribunal especial e collectivo, conservando-o, e como foro de classe, aos commerciantes, militares, magistrados e membros do poder legislativo?! (Apoiados. - Vozes: Muito bem.)

Eu não quero para a imprensa o jury commum, como tambem já disse o sr. Emygdio Navarro. Quero, e proponho no meu projecto, um jury de classe, havendo no continente só dois tribunaes, um em Lisboa e outro no Porto, sob a presidência do presidente da respectiva relação e com oito vogaes eleitos annualmente pelos editores habilitados dos jornaes de cada districto judicial respectivamente. Confio nos tribunaes assim organisados, e em todo o caso valeria a pena experimentar.

Revogasse embora o governo em dictadura a lei, conhecido o seu mau resultado.
Vejo que o jury commercial, ao menos em Lisboa, cujas decisões, por dever de cargo, conheço ha seis annos, e em muitas das quaes intervenho com voto consultivo, julga, geralmente, de modo quasi infallivel.

Contra a suppressão do foro privativo de classe, sendo os tribunaes collectivos, dos militares, magistrados e legisladores não tem havido reclamações. (Apoiados.)

Nos seus julgamentos têem esses tribunaes interessado o seu próprio decoro e não só a defeza da sociedade.

Os tribunaes da imprensa, para não serem relegados para o juizo criminal commum honrariam a instituição com as suas decisões.

E, alem de tudo, sr. presidente, o que a opinião publica pedia para acabar com a relaxação a que tinha chegado o poder, diante do desbragamento de alguns jornaes, que attingira intoleráveis limites, não era a suppressão do jury, porque para a maior parte dos casos já estava banido pela lei de 1866, que nesta parte e a outros respeitos condem-no como o actual decreto. (Apoiados.)

No relatório, que precede o decreto, diz o governo:

«É certo que seria em these preferível transferir a responsabilidade penal, que deriva da publicidade pelo periódico, do editor para o director da redacção, porque sobre este incide com frequência a respectiva responsabilidade moral... Merece este assumpto que se estude e discuta;

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quando a opinião publica se pronuncio favor de uma disposição que obrigue os periódicos a ter um empregado responsável pela administração, e, alem disso, um director responsável pela redacção, haverá opportunidade para fazer com applauso publico as alterações correlativas na lei penal.»
O governo, que poz do parte o seu ideal, ou desattendeu a sua preferencia confessada, para apenas sor opportunista, diga-me se a opinião reclamava a não existência do jury! (Apoiados.)
A prohibição do editor declinar em quem só mostrasse, de ordinário com falsidade ou supposição de nome, auctor do escripto incriminado, era, de facto, reclamada. (Apoiados.)
Aqui dentro todos nisso estamos de accordo, governo, maioria e opposição. (Apoiados.)
A policia correccional para vadios e ratoneiros como para jornalistas, substitutos de criminosos, e toda a complicação e desharmonia do decreto é que a opinião nunca reclamou. (Apoiados.)
E já que é a opinião geral e não a sua própria, que o governo quer seguir, quando mais alguma cousa lhe cumpria fazer, que era ir levantando os factos e baixando os princípios, como é missão da sciencia política, bom é saber-se, ou melhor lembrar, em que condições da opinião ou do espirito publico se tem legislado para a imprensa.
Ha n'isso grande ensinamento para o presente e ao mesmo tempo a revelação do erro capital, a que o decreto subscreve para confundir e equiparar cousas differentes e até contrarias, e que a bem diverso regimen devem sujeitar-se.
É o direito uma creação social, porque as leis, no dizer conceituoso de Montesquieu, exprimem as relações das cousas e não podem, por isso, existir antes dessas relações.
Os phenomenos jurídicos têem, por isso, a sua génesis e evolução, e alteram-se e substituem-se na transformação continua, embora muitas vezes lenta, das condições da vida social.
Emquanto as leis não attimgem a simplicidade, as relações das cousas estilo ainda mais ou menos indeterminadas.
São como as religiões, que da mais grosseira rusticidade passam para a multiplicação dos deuses, depois para o mytho, e crystalisam no monotheismo.
A meio do caminho ainda o espirito humano não explica as cousas singelamente; tudo é complicado e offerece aspectos vários.
A sujeição da imprensa a preceitos legaes, que lhe sejam próprios ou adequados, tem estado n'este caso, como era de necessidade fatal.
Quando a imprensa appareceu não havia, de certo, direito creado para ella.
Hoje os que primeiro escreveram em jornaes, se resuscitassem e lessem qualquer lei da imprensa vigente na Europa ou na America não a entenderiam.
Até ha menos de trinta annos a imprensa era completamente differente do que é hoje no seu bom ou mau uso.
Era por assignatura, com artigos e noticias locaes; com poucos leitores, que na sua illustração tinham o correctivo para muitos erros e excessos; e com tiragem feita por prelos manuaes.
Hoje vende-se avulsa a milhares de pessoas; dá noticia das principaes occorrencias do mundo acontecidas no própria dia; e a tiragem dos jornaes faz-se por machinas a vapor.
Pouca gente dantes sabia ler, e menos ainda tinha direitos políticos, e agora é relativamente pequeno nos grandes centros o numero dos analphabetos, e temos quasi o suffragio universal, que inteiramente o seria, cumprida que fosse a lei que torna a instrucção primaria obrigatória.
O alarma social ou o mal publico produzido pela imprensa, que abuse, não se póde hoje comparar com o que ora em tempos passados, posto que não muito remotos.
E por outro lado as leis da imprensa de um paiz mal podem, em geral, servir de modelo, sem receio de falsear o juizo, para as de outro qualquer.
São de direito interno exclusivo com feição própria, como especial for a maneira de proceder e até da organisação particular dos jornaes.
Em França, por exemplo, onde os artigos são ordinariamente assignados, a lei não deverá ser igual á dos paizes em que os artigos publicados são anonyinos.
Por isso não compararei o decreto com as varias leis estrangeiras, que conheço polo menos desde 1872 por se encontrarem nos volumes do Annuario publicado pela sociedade de legislação comparada de Paris, e da qual, ha annos, sou sócio.
Referir-me-hei só á nossa historia legislativa ácerca da imprensa, e fácil me é o trabalho com o subsidio que encontro no artigo publicado em 1853 pelo que foi distincto jurisconsulto, Marcellino de Matos, no primeiro numero da Revista de Jurisprudência, do Porto.
A nossa lei de 22 de dezembro de 1834 está na sua structura e fim explicada por estas palavras do conde da Taipa, proferidas na sessão da camara dos pares de 18 de agosto d'esse anno:
«No estado presente a primeira cousa de que devemos tratar é da liberdade de imprensa. No fim de uma crise tão extraordinária devemos conhecer a opinião publica para guiarmos nossos trabalhos legislativos. Em presença de uma administração, montada mais pelo espirito de facção do que pelo zelo e vontade de promover o bem publico, devemos buscar meios de conhecer os abusos e os excessos, que se têem commettido, para os cohibir e castigar. As relações particulares dos membros do corpo legislativo não bastam para conhecimento dos factos; é preciso um meio de communicação largo e extenso entre os representantes e os representados, e este meio só póde ser a liberdade de imprensa. Em geral, dignos pares, a liberdade da imprensa é essencial á natureza de um estado livre: sujeital-a a uma commissão de censura é submetter a liberdade das opiniões e dos pensamentos aos prejuízos de meia dúzia de homens e instituil-os juizes arbitrários e infalliveis em todos os pontos de controvérsia em matéria de sciencia e de governo, e tirar ao povo a garantia mais efficaz da segurança de seus direitos.»
Por um fim da occasião ficou a lei sem exigências de habilitações nem imposição de deveres especiaes aos editores ou gerentes dos periódicos.
«Este erro, diz Marcellino de Matos no artigo, a que me referi cedo começou a fazer sentir seus maus resultados. As tendências da imprensa periódica são essencialmente destruidoras. Aonde esta estranha potência se sentir sem peias, para logo se tornará licenciosa, pervertendo os costumes e pondo a ordem publica em perpetuo risco de ser alterada. O jornalismo, depois de minar até aos fundamentos todas as instituições sociaes, empregou-se na vil tarefa de desacreditar todos os caracteres. A falsidade foi elevada á categoria de systema político, a torpeza e o vicio tiveram as honras da apotheose, a propaganda da revolta fez-se abertamente pelos meios ignóbeis da mentira e da calumnia. E na máxima parte estas immoralidades e estes crimes ficavam impunes (vejam-se entre outros documentos officiaes a portaria do ministerio da justiça de 9 de junho de 1837 e o Diario das cortes constituintes do mesmo anno, vol. 1.° pag. 422 e seg. e vol. 2.° pag. no e seguintes). As penas da lei, sobre serem excessivamente suaves, nunca se applicavam. Alem disso, os artigos e correspondências incriminadas eram de ordinário anonymas. Os periódicos ou não tinham editores, ou apresentavam como taes em juizo homens tão miseráveis, que o jury
compadecia-se d'elles e absolvia-os.»
A estes males quiz prover de remédio o congresso cons-

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tituinte de 1837 por meio da lei de 10 de novembro desse anuo, mas não o conseguiu, porque para evitar a impunidade foi tão imprevidente como a lei de 1834.
Nem podiam esperar-se providencias que não fossem timidas, pouco mais que doutrinarias ou insufficientes, desde que, trabalhando a commissão de legislação no projecto já desde 27 de março, alguns dos seus membros declaravam na sessão de 21 de abril, que não podiam apresentar o resultado dos seus trabalhos por se não entenderem uns aos outros.
Os defeitos dessa lei e ao mesmo tempo, por isso, os motivos da reacção contra elles e do estabelecimento de novos preceitos, encontram-se tão claramente expostos no parecer da commissão de legislação sobre o projecto convertido depois na lei de 1840, que me parece útil lel-o á camara. Diz o parecer:
«Com effeito, por menos que se analysem e meditem estas leis (as de 1834 e 1837), P se conheça a historia do nosso foro nos processos e julgados por abuso de liberdade de imprensa, que é mais do que uma longa e nunca interrompida serie de absolvições em todos os casos por mais escandalosos e criminosos que sejam, não póde deixar de ter-se por sem duvida, que dois grandes e capitães defeitos ha nestas leis, donde, se não inteiramente, ao menos em grande parte deriva esta certa e constante impunidade, a saber - a qualidade dos editores responsáveis, e a má organização do jury. A lei de 10 de novembro de 1837 nos artigos 1.° e 2.° requer, é verdade, que os editores responsáveis dos periódicos sejam cidadãos portuguezes, maiores de vinte e cinco annos, ou como taes havidos em direito, que tenham a livre administração de suas pessoas e bens, senão tambem que em juízo depositem a quantia de 1:200$000 réis, ou a ella dêem fiadores idóneos, ou tenham bens que a possam segurar; porém, sobre não estabelecer o modo, nem o logar, nem a auctoridade particularmente incumbida de fiscalisar a verificação destes requisitos, nem prescrever a necessidade de ser previa, deu claramente a entender no artigo 4.º, que tal verificação ao menos previa não era indispensável, quando suppoz e quiz prevenir o caso d'elles não terem todas ou algumas destas qualidades.»
«D'aqui nasce que senão todos, ao menos quasi todos os editores responsáveis deixam de estar no caso da lei, e sobre não terem feito este deposito, ou dado fiadores ou hypothecas á sua importância, são menores, faltos de bens, rústicos, ignorantes e com o sêllo da feme e da miséria impresso no rosto. A sua apparição nos tribunaes e perante o jury, ainda que por acaso bem composto, desafia sim a indignação contra os desconhecidos, de quem são testas de ferro, e que tão escandalosamente abusam da sua pouca idade, inexperiência, ignorância e indigência, mas não póde deixar de excitar a seu favor sentimentos de dó e compaixão. Daqui vem necessariamente a sua absolvição.
«Nem se diga que nestes casos a lei torna subsidiários os impressores, as imprensas e os tutores, porque estes a maior parte das vezes não existem ou não têem bens; as imprensa» desarranjam-se ou desapparecem facilmente e muitas vezes pouco ou nada valem, e os impressores estão sempre ou quasi sempre nas mesmas, senão em peiores circumstancias que os editores; nem uns nem outros temem as cadeias, porque sabem certo serem lá sustentados por aquelles de quem são agentes e dependentes.
«O remédio que ha a oppor contra tão grandes inales e abusos é prohibir que seja editor responsável de periódicos quem pelos seus rendimentos verificados pela decima ou conjunctamente pela sua posição social não offerecer garantias de ordem e respeito às leis ou effectividade de suas penas; é tornar reaes e effectivas as disposições dos citados artigos 1.° e 2.° da lei de 10 de novembro de 1837 mandando verificar e comprovar antes da publicação de algum periódico as qualidades indispensáveis do seu editor responsável. É a isto precisamente que se dirige o projecto nos oito primeiros artigos.»
Publicada a lei, nenhum periódico se póde publicar sem a habilitação previa do editor, o qual devia ser hábil para ser jurado nos crimes de liberdade de imprensa, para que o jury não era geral mas especial e muito qualificado.
A publicação sem editor habilitado constituía crime de bastante gravidade.
Mas o editor era obrigado a assignar um termo, em que se responsabilisasse por tudo quanto apparecesse no periódico 6 por todas as penas que da publicação podessem resultar, tendo o pagamento das multas sido garantido com caução de 2:400$000 réis.
D'aqui por diante não houve mais responsáveis subsidiários.
O direito commum foi abandonado na parte em que ainda se encontrava misturado com as disposições próprias do regimen da imprensa.
Todos quantos podessem ter responsabilidade por abuso da liberdade de imprensa foram substituídos pela única entidade do editor, creada como uma fição legal, que resolvia as difficuldades da imputação e era igual para todas as hypotheses.
Com muita propriedade, por isso, o distincto jurisconsulto, que ascendeu ao ponto mais culminante da magistratura do ministerio publico, Almeida e Brito, chamava na Gazeta dos Tribunaes, (tomo XIII), ao editor responsável o pára-raios da imprensa periódica.
Isto é um systema lógico ou com base segura.
Em todo o caso, sr. presidente, é differente ou até opposto ao direito commum.
Pelo código penal os agentes do crime são auctores, cúmplices ou encobridores, e, para só fallar dos nuctores, a lei considera taes: os que executam o crime ou tomam parte directa na sua execução; os que por ajuste, dadiva, promessa, ordem ou pedido determinaram outro a commetter o crime; os que aconselharam ou instigaram outro á pratica do crime, se sem isto não for perpretado; os que concorreram directamente para facilitar a execução, etc.
Ora, o editor, que póde simplesmente saber fazer ou pintar a sua assignatura, porque a lei de 1866 não lhe exige outra prova li iteraria para a habilitação, e que póde não ser dono nem administrador da officina, difficilmente se encontrará em alguns dos casos pré vistos no código penal para ser considerado um dos agentes ou co-réus do crime de abuso de liberdade de imprensa. (Apoiados.)
Mera creação da lei, para evitar as difficuldades praticas da imputação pessoal, de ordinário invencíveis se os delinquentes nestes crimes procedem com fraude e astúcia, o editor foi destinado a ser sempre a pessoa certa, mas única, sobre quem houvesse de recair a responsabilidade por outros dispersa.
Veiu a lei de 1866, e considerando ainda o editor como uma ficção legal, entendeu que a devia manter, mas ao mesmo tempo substitui-la pela realidade, quando esta se mostrasse. Assim foi, sr. presidente, que sendo por essa lei chamado á responsabilidade o editor, este ia em paz, livre de toda a culpa, eis que fizesse reconhecer o auctor do escripto.
Todos sabemos, como em geral, os auctores se ficaram escondendo atrás dos testas de ferro desprezíveis, signatários dos autographos exhibidos em juízo. (Apoiados.)
Mas isto, sr. presidente, era tambem systema intermédio, embora imperfeito por imprevidente e incompleto, e que se comprehendia no meio de qualquer dos outros dois extremos, o do direito commum, em que todos os agentes seriam responsáveis desde o auctor do escripto ao distribuidor do periódico, e o do direito peculiar e descoberto pela necessidade de attender às condições da imprensa, em que só era responsável o editor.
O que, porém, se não comprehenda é o regimen do da-

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creto dictatorial, que assenta na base de serem sempre simultaneamente responsáveis o auctor e o editor, ou do coexistir a realidade e a ficção! (Apoiados.)

Para isso, sr. presidente, invoca o nobre ministro da justiça no seu relatório, o direito commum ou o n.° 1.° do artigo 20.° do código penal, esquecido de que o editor não seria entidade responsável por esse código, e que só o foi por mera creação de direito ou lei especial.

Mas, indicado o direito commum, porque e que o decreto limita a sua applicação ao auctor, quando outros agentes do crime haveria sempre, segundo esse direito?!
Que harmonia é esta que mistura ou liga a ficção á realidade, e aquella inteira e esta incompleta?!

D'aqui por diante o decreto não póde seguir a linha recta da justiça, como não póde ser direita a sombra de um objecto torto.

O decreto confundiu a imprensa regular, ou com editor habilitado, com a irregular ou clandestina, e considerando a existência do crime e a possível não existência de editor começou a procurar responsáveis.

D'ahi a serie de substitutos de criminosos, a que já me referi, e a sujeição de todos ao juizo correccional, que, em verdade, é admittido, e bem, em varias leis para a imprensa clandestina, mas que é de inqualificável oppressão para a imprensa regular. (Apoiados.)

Contra os intoleráveis abusos causados pela imprevidente lei de 1886, o governo não teve outra cousa que oppor!

Parece, sr. presidente, que o governo está ainda convencido do erro de Tocqueville na sua conhecida obra, De la Democratie en Amerique, de que ácerca do regimen da imprensa não póde haver meio termo entre a licença e a escravidão.

Pois ha, e não tanto pelas incriminações da lei, como pela maneira da sua execução.

No meu projecto não está, certamente, o melhoramento desejado, nem poderia estar, em vista das minhas pequenas forças intellectuaes e pouca illustração, mas está apenas mais um elemento para o estudo dos competentes.

Depois do que tenho dito pouco acrescentarei para o fundamentar.

Faço n'elle a distincção completa da imprensa regular ou habilitada e da irregular ou clandestina.

Não me vejo assim em difficuldades para a imputação, attribuindo-a toda ao editor da regular e a cada agente do crime da irregular, dando áquelle um tribunal de classe e remetttendo estes para o juizo correccional.

A pena do editor será sempre só de multa, pois que, não esquecendo que é uma ficção da lei, elle representa a empreza, e que, sendo interessados n'esta directa ou indirectamente os auctores dos escriptos, os donos e administradores da offcina e até os vendedores, nunca a prisão, mas só a pena pecuniária pelos seus effeitos de repercussão para toda a empreza, affectará todos os interessados. (Apoiados.)

Exijo porém, caução de 4:000$000 réis, perfeitamente conhecedor de quanto a exigência é impopular e anthipathica.

Mas não descubro outro meio de tornar effectiva a responsabilidade, que deve corresponder á vantagem do tribunal de classe e ao direito de excepção para a imprensa regular.

Para ensinar instrucção primaria exigimos garantias ou habilitações aos professores, e para doutrinar o publico nenhuma cautela se havia de estabelecer para os abusos?

De 4:000$000 réis é a caução dos despachantes da alfândega, e havia de ser menor a dos periódicos, que podem trazer perdas e damnos para o bom nome do offendido de uma indemnisação ainda maior?

Mas como, alem da hypotheca ou deposito, admitto a canção por fiança, não aggravo a exigência do decreto que dando preferencia á multa sobre quaisquer créditos até privilegiados, creando assim um o que singular sobre as officinas, reconhece a existência segura de valores, que da-rãof o credito a quem os possuir.

É preciso nunca esquecer, sr. presidente, que qualquer lei de imprensa é feita em favor dos offendidos. Para só favorecer a imprensa o meio consistiria em nenhuma lei fazer para ella, nem geral nem especial.
Permitto ao editor a faculdade de exhibir ou não o autographo, e se o inculcado auctor for reconhecido pelo tribunal, a pena d'aquelle será attenuada, mas soffrerá este na sentença condemnatoria, e depois de ouvido, a censura publica do tribunal da imprensa e ficará temporariamente inelegivel para esses tribunaes.

Esta pena, toda moral, será talvez a mais temida por algumas pessoas, que para a evitarem e o seu nome não ser revelado pagarão particularmente a multa.

Alem de que, essa pena moral é a mais consentânea para os crimes contra a honra, como o mostra o sentir dos homens pundonorosos, que só em casos muito especiaes se desforçam pelo meio da policia correccional.

Estabeleço tambem uma prescripção especial para os crimes da imprensa.
O decreto, talvez por descuido, não falla disso, e deste modo esses crimes prescreverão conforme as regras geraes de direito, segundo as quaes o praso é de quinze annos, se lhe for applicavel pena maior, de cinco annos, se lhe for applicavel pena correccional, e de um anno, se lhe for applicavel pena, que caiba na alçada do juiz em matéria correccional.

É, porém, reconhecido, que aos crimes da imprensa deve pertencer uma prescripção de curto praso.

A própria lei de 1800, chamada das rolhas, estabelecia até para os crimes de querela publica a prescripção de um anno.

Nas leis estrangeiras ha prescripções de seis mezes e dahi para baixo até quinze dias.

A sociedade e os indivíduos nada lucram em que muito tempo depois da publicação offonsiva, passados quatro annos ou mais, se recorde e avive o conhecimento do facto por meio da discussão forense. (Apoiados.)

Ha no meu projecto um artigo destinado á creaçao de um periódico ou jornal official em cada districto, em que seja publicado tudo que aos districtos, municípios e parochias interessa e que ahi especifico, incluindo os recenseamentos político ou eleitoral, do recrutamento militar, e do jury commum, começando a correr os prasos das reclamações só depois de ultimada a publicação respectiva.

Isto é um efficaz meio de fiscalisação dos serviços, que evita injustiças e educa o povo na administração publica e local. (Apoiados.)

Mas não e por esse lado que tal creação se liga com o regimen da imprensa.

Como entre as publicações obrigatórias do jornal districtal incluo a dos annuncios judiciaes e outros officiaes das comarcas, julgados e concelhos, cessa para os jornaes da província uma importante fonte de receita, sem que augmente a despeza dos cidadãos ou das estações publicas, porque a publicação apenas substituo a que a lei manda fazer num jornal da localidade.

É de notar que, sendo a escolha do jornal da localidade á vontade do interessado, este opta ou pelo que lhe convém conforme quer que o facto seja mais ou menos sabido, ou pelo que quer favorecer.

Já por isto, sobretudo para as pessoas ausentes dos districtos, onde tenham interesses, e que basta assignarem o jornal districtal para terem segura a informação que a lei quer publica, o jornal districtal é utilíssimo.

Mas acabando a principal receita de alguns jornaes da província, que d'ella vivam e não do mérito dos seus redactores, termina uma causa de má educação publica e da perturbação do boro viver local. (Apoiados.)

Estimo muito os apoiados que até partiram de alguns deputados da maioria. (Apoiados.)

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E que, sr. presidente, conhecem tambem os factos que me abstenho de mais pôr em relevo. (Apoiados.)

Fui jornalista na província por alguns annos, e conheci que em muitas localidades póde haver jornaes, que pela sua seriedade e selecção de escriptores se mantenham sem a receita dos annuncios judiciaes. (Apoiados.)

A esses não faz mal o projecto, e antes bem, supprimindo uma concorrência que, prejudicando-os, prejudicava igualmente as letras e os costumes. (Apoiados.)

O sr. Presidente: - Deu a hora. Como hoje ha sessão nocturna, v. exa. tem que ficar com a palavra reservada.

O Orador: - Eu desejava bem ter concluído nesta sessão, mas, como não pude, reserve-me v. exa. a palavra para a sessão nocturna.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado por muitos srs. deputados.)

O sr. Presidente: - Tenho a participar á camara que está fixado o dia 14 para a sessão real do reconhecimento do príncipe real.

A ordem da noite é a continuação da que estava dada.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Propostas de lei apresentadas n'esta sessão pelo sr. presidente do conselho de ministros

Proposta de lei n.° 124-B

Senhores. - Em 8 de agosto de 1889 foi decretada a creação na cidade de Lisboa de um curso theorico e pratico de pathologia e clinica ophtalmologica, contendo o respectivo diploma varias disposições que necessitam da sancção legislativa. Toem por isso a honra de submetter á vossa illustrada apreciação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E relevado o governo da responsabilidade em que incorreu pela promulgação do decreto de 8 de agosto de 1889, que creou na cidade do Lisboa um curso theorico e pratico de pathologia e clinica ophtalmologica.

§ único. Continuarão em vigor, emquanto não forem por lei alteradas ou revogadas, as disposições do mencionado decreto.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Presidência do conselho de ministros, 9 de junho de 1890.= Antonio de Serpa Pimentel = Lopo Vaz de Sampaio e Mello = João Ferreira Franco Pinto Castello Branco = Júlio Marques de Vilhena = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Frederico de Gusmão Corria Arouca = João Marcellino Arroyo.

Proposta de lei n.° 124-C

Senhores.- A carta de lei de 11 de setembro de 1861, que auctorisou o governo a fortificar as cidades de Lisboa e Porto, preceituou que as expropriações a fazer, para as obras de fortificação, fossem declaradas de utilidade publica.

Também a carta de lei de 21 de junho de 1880 considerou de utilidade publica a expropriação dos terrenos necessários para o estabelecimento de carreiras de tiro regimentaes e de guarnição.

Na carta de lei de 26 de junho do anno próximo passado, que auctorisou o governo a contrahir um empréstimo até à quantia de 2.700:000$000 réis, para applicar á construcção de novos quartéis e hospitaes e mais edifícios militares, ou acabamento dos que se achavam em coustrucção e às modificações e grandes reparações dos restantes, não se acha contida, sem duvida por lapso, análoga disposição.

Em virtude de tal lacuna muito difficil será, senão impossível, usar convenientemente da auctorisação concedida na carta de lei de 26 de junho, em vista das demoras, das difficuldades e dos entraves, por vezes insuperáveis, que hão de encontrar os encarregados das expropriações necessárias para a execução dessas obras. Bastará a má vontade ou o capricho de um só proprietário para que seja inutilisado o plano mais bem concebido, ou impedida a construcção de mais reconhecida urgência.

São tão óbvios e claros os inconvenientes que resultam da falta de uma lei de expropriação por utilidade publica, applicavel às construcçôes militares, que seria da minha parte fazer pouca justiça ao bom critério, á illustração a ao patriotismo dos representantes da nação, entrar em mais desenvolvidas considerações ácerca deste importante assumpto.

Tenho, pois, a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E considerada de utilidade publica a expropriação, nos termos da legislação especial que regula esta matéria, dos terrenos e edifícios necessários para a construcção de novos quartéis, hospitaes, campos de
instrucção e mais estabelecimentos militares, para o acabamento dos que se acham em construcção, e para ampliação dos restantes.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negócios da guerra, em 9 de junho de 1890.= António de Serpa Pimentel.

Foram enviadas às commissões respectivas.

O redactor = Barbosa Colen.

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