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N.º15.

SESSÃO DE 24 DE FEVEREIRO.

1855.

PRESIDENCIA DO Sr. SILVA SANCHES.

Chamada: — Presentes 79 Srs. Deputados.

Abertura: — Ao meio dia.

Acta: — Approvada.

CORRESPONDENCIA.

OFFICIO. — Do Sr. Alvaro da Fonseca Coutinho, participando, que por incommodo de saude não póde comparecer á Sessão de hoje, e talvez a mais algumas. — Inteirada.

Tambem se mencionou na Meza o seguinte Requerimento. — Dos Officiaes das Secretarias de Estado, demittidos em 1833, a pedirem a execução do artigo 4.º da Convenção de Evora-Monte que lhes affiançou um subsidio.

O Sr. Santos Monteiro: — Mesmo por interesse dos requerentes, eu desejo que esse Requerimento fique demorado na Meza por tres ou quatro dias; por que se fôr a uma Commissão qualquer, hade acontecer o que tem acontecido nas Camaras passadas, isto é — não se fazer cousa alguma a este respeito — não haver resultado nenhum.

Eu estou compromettido a apresentar um Projecto de Lei sobre esse objecto; espero porem informações que talvez obtenha até segunda feira. Peço por tanto que o Requerimento fique demorado até então.

O Sr. Secretario (Rebello de Carvalho) — A apresentação do Projecto a que se refere o illustre Deputado, quanto a mim, não obsta a que se dê na Meza andamento a este Requerimento: uma cousa não prejudica outra.

O Sr. Santos Monteiro: — Mas a que Commissão vai o Requerimento?..

O Sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — Vai á Commissão de Fazenda.

O Sr. Santos Monteiro: — Bem; estou satisfeito — Eu tenho todo o interesse em que este negocio tenha andamento, e por isso espero certos exclarecimentos, e obtidos elles apresentarei um Projecto de Lei.

E propondo-se logo — se o Requerimento havia de ir á Commissão de Fazenda? — Decidiu-se affirmativamente.

SEGUNDAS LEITURAS.

Proposta. — « A Commissão de Fazenda, para com mais brevidade concluir os trabalhos do Orçamento de que se acha encarregada, propõe ser auctorisada a pedir directamente ao Governo os esclarecimentos de que precisar para esse fim. » — Palmeirim.

Foi admittida.

O Sr. José Estevão: — Desejo fazer um Additamento a esse pedido da Commissão de Fazenda, e é para que se faça extensivo a todas as Commissões. Já ha tempo que eu tinha tenção de propôr — que as Commissões da Camara fossem auctorisadas a pedir quaesquer esclarecimentos ao Governo ácerca dos negocios submettidos ao seu exame, mas a pedil-os sem preceder votação da Camara — Desejo que isto fique estabelecido como praxe constante recebida pela Camara. (Apoiados) E quero isto para evitar estas lendas lendas com que veem as Commissões quando fazem similhantes pedidos, com a discussão dos quaes ás vezes se gasta tempo immenso: o meu fim é livrar a Camara destas discussões, e destes incidentes, que transtornam sempre a ordem regular dos trabalhos. (Apoiados) — As Commissões têem o direito de se informarem; peçam todas as informações ao Governo que julgarem precisas para se esclarecerem ácerca dos negocios que lhes são submettidos — Portanto em Additamento ao pedido da Commissão de Fazenda, vou mandar para a Meza uma Proposta.

O Sr. Avila: — Pedi a palavra porque me persuadi que não eslava na Sala o meu nobre Amigo Relator da Commissão, senão teria deixado a S. Ex.ª o encargo de explicar o pensamento da Commissão de Fazenda.

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Sr. Presidente, a Commissão de Fazenda pediu unicamente auctorisação para se dirigir directamente ao Governo sobre todos os esclarecimentos necessarios para o exame do Orçamento; por consequencia o Additamento do illustre Deputado (creio que o está redigindo) para dar conhecimento delle á Camara e ser approvado, carece de ser concebido em maior generalidade; quero dizer — que.se dê tambem á Commissão de Fazenda mais auctorisação do que a que ella pediu na Proposta que mandou para a Meza. (Apoiados) A Commissão de Fazenda pedia ser auctorisada para exigir directamente do Governo os esclarecimentos que precisasse para o exame do Orçamento, porque a commissão de Fazenda deseja apresentar o mais depressa possivel o seu parecer sobre o Orçamento para ver se póde nesta Sessão satisfazer-se ao preceito constitucional, votando-se regularmente no Corpo Legislativo a Lei de receita e despeza; a Commissão de Fazenda não se atreveu a pedir a mesma auctorisação ácerca de outros negocios por que esses não tinham um caracter tão urgente como o Orçamento. Entretanto se a Camara quer alargar esta auctorisação que se pretende dar ás demais Commissões, á Commissão de Fazenda, creio que não haverá inconveniente em approvar o Additamento; ao contrario haverá muita vantagem. (Apoiados)

Leu-se logo na Meza a seguinte

Proposta. — «Proponho que a Camara vote que as suas Commissões possam pedir ao Governo quaesquer esclarecimentos respectivos aos trabalhos de que estiverem encarregadas, sem preceder auctorisação da Camara.» — José Estevão.

Foi admittida.

E pondo-se logo á votação a

Proposta da Commissão de Fazenda — Foi approvada.,:,

Proposta do Sr. José Estevão — 'approvada.

O Sr. Secretario (Rebello de Carvalho): — Hontem tambem a Commissão de Fazenda mandou para a Mesa um Parecer ácerca d'um Requerimento da Camara Municipal de Leiria, que pede o antigo edificio do convento de S. Francisco. Este Parecer da Commissão conclue pedindo esclarecimentos ao Governo: ora, segundo uma disposição addicional ao Regimento da Camara, todos os Pareceres de Commissões que concluem por pedir taes esclarecimentos, devem ser remettidos ao Governo pela Meza sem dependencia de votação da Camara. Nesta conformidade quando se apresentar algum Parecer pedindo esclarecimentos ao Governo, a Meza o expedirá, sem dar conta disso á Camara. (Apoiados)

O Sr. Cardoso Castello Branco: — Mando para a Meza um Requerimento de Dyonizio Caetano da Silva, demittido de Official de Secretaria em 1833, em que pede que a seu respeito sé tome a mesma decisão, que se tomar a respeito de outros Officiaes de Secretaria comprehendidos ou assignados no Requerimento apresentado ha dias nesta Camara pelo Sr. Deputado José Estevão. Peço a v. Ex. que mande dar a este Requerimento o mesmo destino que se deu ao outro que versava sobre objecto identico. Ficou para se lhe dar destino ámanhã. O Sr. Pinto de Almeida: — Sr. Presidente, fundado no artigo 16.º do Decreto de 30 de Setembro de 1852, vou mandar para a Meza uma Proposta, a qual peço que seja remettida á 1.º Commissão de Poderes para dar sobre ella o seu Parecer. Ficou para segunda leitura.

O St. — Costa e Silva: — Mando para a Meza um Requerimento, em que diversos Empregados da Provincia de Angola pedem, que a respeito dos vencimentos que lhes competem por Lei em moeda forte, lhes seja applicado o disposto n'uma Portaria do Ministerio da Marinha, que manda pagar aos Empregados da Commissão Alista em Loanda os seus ordenados pelo cambio actual daquella praça. Peço que este Requerimento seja remettido á Commissão do Ultramar.

Ficou para se lhe dar destino na Sessão seguinte.

O Sr. Maia: — Mando para a Meza a seguinte participação. (Leu)

«A Commissão Especial para o exame dos Decretos da Dictadura acha-se installada, e nomeou para Presidente o Sr. Silva Pereira, para Secretario o Sr. Alves Martins, e para Relatores Francisco Joaquim Maia, e Justino de Freitas.» — Inteirada.

O Sr. Julio Pimentel: — Peço ser inscripto para apresentar um Projecto de Lei.

Ficou inscripto.

O Sr. Presidente: — Devia entrar-se na ordem do dia, mas como senão acha presente nenhum dos Srs. Ministros, e para aproveitar o tempo vou dar a palavra a alguns Srs. Deputados que estão inscriptos para apresentarem Projectos de Lei. O primeiro é o Sr. Cardoso Castello Branco, que tem a palavra.

O Sr. Cardoso Castello Branco: — Vou mandar para a Meza o Projecto de Lei que prometti apresentar sobre morgados.

Ficou para segunda leitura.

(Entrou o Sr. Ministro da Fazenda).

O Sr. Conde da Louzã (D. João): — Mando para a Meza a seguinte communicação. (Leu)

«A Commissão Diplomatica acha-se installada, e nomeou para seu Presidente o Sr. Visconde de Monção, para Relator o Sr. Carlos Bento, e para Secretario o Conde da Louzã (D. João).» — Inteirada.

O Sr. Presidente: — Visto que já está presente um dos Srs. Ministros, vai entrar-se na

ORDEM DO DIA.

Continua a discussão do Projecto da Resposta ao Discurso da Corôa

O Sr. Vellez Caldeira: — Sr. Presidente, qualquer que seja a minha opinião em relação á Politica do Governo, entro nesta questão com toda a imparcialidade, e sem outro fim mais do que apresentar as minhas razões, e ver se faço com que os Srs. Ministros, de uma vez para sempre, não sáiam da carreira constitucional. Não tenho indisposição alguma contra os Srs. Ministros, porque S. Ex.ª como Ministros nada me têem feito, senão guerrear a minha candidatura pelo Circulo 28.º; mas longe de estar indisposto com S. Ex. por este motivo, ao contrario, lhes estou obrigado, porque deste modo deram logar a que a minha candidatura fosse approvada nas freguezias de Lisboa.

Por occasião das ultimas eleições concorreram á urna em Lisboa, o partido que se denomina Cartista, o partido Progressista, e o partido do Governo; e, no Circulo 28.º o Governo empregou todos os meios

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para guerrear a minha eleição, a eleição de um homem cujas opiniões constitucionaes são as mais moderadas, e bem conhecidas, de um homem que não quer mais do que ordem, justiça, e economia. Mas reunidos contra mim o Governo, as suas Auctoridades, e as pessoas que tinham necessidade, ou que de viam apoia-lo, apesar disso, na freguezia onde é morador o Sr. Presidente do Conselho, e que é tambem a minha, á excepção do Sr. José Ferreira Pinto Bastos que ía nas minhas listas, o meu nome foi o mais votado; e na-freguezia do Sr. Ministro do Reino ainda foi maior o numero de votos que obtive, sem que da minha parte fizesse a mais pequena diligencia para essa eleição, senão na minha freguezia remetter cartas impressas, como Presidente que era da commissão permanente progressista, nas quaes ía incluida a lista, em que nas reuniões anteriores das freguezias se tinha decidido que o partido progressista devia votar, e em que o meu nome ía incluido. E são estas as unicas diligencias que fiz na minha freguezia, e, nas outras, nenhumas fiz.

Perdôe-me a Camara esta digressão. Eu declaro que com ella não quero fazer offensa a nenhum dos Cavalheiros que compunham a lista do Governo naquelle Circulo, porque, ao contrario, a maior parte delles conhecia-os, e estimava-os; mas quiz aproveitar esta occasião para em publico poder mostrar o meu sincero reconhecimento aos Cidadãos, que me deram os seus suffragios, e mostrar os sentimentos de profunda gratidão que me acompanham pelo voto que me deram, voto que é tanto mais verdadeiro quanto independente, porque não lho pedi, nem pertendo tirar outro provento da cadeira de Deputado, senão concorrer com as minhas fracas forças para aquillo que intendo é a bem do Paiz. Não tenho pois indisposição alguma contra os Srs. Ministros, nem pertendo fazer-lhes opposição, porque estou persuadido que S. Ex.ªs não tomarão a caír nos erros em que tem caido, e até mesmo porque intendo que nas actuaes circumstancias seria muito difficil substitui-los. —

Sr. Presidente, é um principio constitucional consignado no artigo 13.º da Carta, que o Poder Legislativo está nas Côrtes com a Sancção do hei. Ora o Governo Constitucional para poder subsistir é necessario que todos o respeitem, que cada um pela sua parte faça o que estiver ao seu alcance para que elle seja respeitado, e a ninguem mais incumbe a obrigação de velar porque este respeito e decoro se verifique, do que ao ministerio; mas apesar disso, sendo como já disse um artigo constitucional, o artigo 13.º da Carla, e devendo cumprir-se o seu preceito, os Srs. Ministros arvoraram-se em Dictadores, e entraram a legislar por sua conta.

Não passarei a examinar cada um dos Decretos da Dictadura, nem o bom ou máo que elles têem no fundo, porque isso pertence á Commissão que foi nomeada para esse fim; mas é um ponto não controvertido que o simples acto de legislar na ausencia das Côrtes é uma transgressão constitucional. Bem sei que ha quem justifique as Dictaduras, mas ellas justificam-se pelo unico modo porque se podem justificar, que é quando o Governo se acha em circumstancias anormaes. Porém esteve o nosso paiz neste caso? Não, por certo. Tinha havido uma reunião de Côrtes, tinham funccionado regularmente, tinham sido dissolvidas por um acto regular do Poder Moderador, e como podia — então haver causa para o Governo assumir a Dictadura, a não se querer sustentar que deve haver Dictadura, quando houver dissolução de Côrtes?.. Não esteve o Governo 8 mezes em Dictadura no anno de 1851? Porque não apresentou então todos esses Decretos que veiu outro dia aqui trazer? Não estiveram as Cortes reunidas perto de 8 mezes, porque não trouxe então esses Decretos á approvação da Camara a fim de serem convertidos em Lei? Longe disso deixou estar a Camara quasi sem a concorrencia do Governo, apezar de ser composta de individuos muito conspicuos, como o mesmo Governo publicou, e depois das Côrtes dissolvidas, e achando-se o paiz em estado normal, assumiu a Dictadura, e começou a legislar.

Fallo com verdade e franqueza. Se não fizesse justiça aos sentimentos patrioticos dos Srs. Ministros, havia de dizer que S. Ex.ªs não tinham tido em vista outra cousa senão desacreditar o Systema constitucional, mostrando que se podiam fazer Leis sem a concorrencia das Côrtes; mas felizmente para se salvar a honra do Systema constitucional, nessas mesmas medidas adoptadas pelo Governo está a justificação da necessidade das Côrtes.

Sr. Presidente, vou fazer um exame muito rapido das diversas Leis da Dictadura.

Principiarei pelo Decreto com data de 21 de Junho, que foi publicado a 26 do mesmo mez.

Este Decreto, como devia ser, convocou as Côrtes para o dia primeiro de Dezembro proximo futuro, a fim de se satisfazer o preceito da Constituição, que diz — Immediatamente serão novas Côrtes convocadas. Mas como é que se cumpriu este immediatamente? A Lei Eleitoral só se publicou no primeiro de Outubro, tres mezes depois da dissolução das Côrtes, e logo nesse mesmo dia se publicou Um novo Decreto, alterando o dia da convocação das novas Côrtes, e designando o dia 2 de Janeiro, dia em que ou se havia de faltar á observancia da Constituição, ou ellas se deviam necessariamente reunir; mas ainda assim marcou-se na Lei um prazo tal, que as eleições primarias foram no dia 12 de Dezembro, e o apuramento dos votos no domingo seguinte; de maneira que não havia tempo para os Srs. Deputados das provincias se apresentarem na Camara.

O segundo Decreto é o que fixa a receita e despeza pública.

Esle Decreto é uma manifesta infracção da Constituição, e com especialidade do artigo 12.º do Acto Addicional, que os Srs. Ministros acabam de jurar, e isto depois de S. Ex.ªs lerem asseverado na Camara por differentes vezes, como v. Ex.ª, Sr. Presidente, deve estar lembrado, que não dissolviam a mesma Camara sem obterem a Lei dos meios, tendo-lhes de mais a mais a Camara offerecido fazer passar essa Lei, caso que S. Ex.ª precisassem della.

O outro Decreto é o que aboliu o monopolio do chá.,

Neste Decreto em nada se attendeu ás necessidades e utilidade das Provincias Ultramarinas. E para não cançar a Camara, mostrando que as Provincias do Ultramar não tem merecido a attenção dos Srs. Ministros, refiro-me ás considerações que apresentou o nobre Deputado por Macáo, o Sr. Pegado; o qual apesar de ter dito que fallava a favor da Resposta ao Discurso da Corôa, intendo que fallou contra,

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porque contra a Resposta não falla ninguem, mas sim contra às medidas adoptadas pelos Srs. Ministros.

Segue-se, outro Decreto da mesma data, tornando livre o commercio do sal em Setubal.

Esle Decreto era escusado, depois do Tractado com os Estados-Unidos; sendo comtudo para lamentar, que neste Decreto nem se attendesse aos interesses dos proprietarios, nem se tivesse em consideração, que este negocio tinha estado affecto a uma Commissão da Camara, que tencionava apresentar o seu Parecer no dia em que foi dissolvida; e além disso tambem se não attendeu devidamente aos Empregados da extincta Roda, que ficaram reduzidos á situação precaria das classes extinctas.

Depois deste vem o Decreto de 5 de Agosto, para se não admittirem mais no pagamento dos direitos de mercê os titulos das classes inactivas. — Tenho a notar a respeito deste Decreto que logo depois foi alterado.

O Decreto de 10 de Agosto, conteudo a Reforma Judiciaria durou pouco. — E só ha a admirar como a portas fechadas se fazem e suspendem Leis desta natureza e importancia

Seguiu-se a este o Decreto de 11 de Agosto. — Decreto urgentissimo — tracta da admissão do gêlo! Vem depois o Decreto de 18 de Agosto, que contém a reforma das Pautas — Decreto feito sem consultar ninguem, nem attender aos interesses creados, resultando dahi a necessidade de o alterar em 31 de Dezembro.

E deixando de parte outras medidas, para com o seu exame, ainda que rapido, não cançar a Camara, notarei que ha ainda o Decreto de 30 de Agosto, creando o Ministerio das Obras Públicas, Commercio e industria. — Sem entrar na conveniencia e necessidade da creação de similhante Ministerio, não posso deixar de notar a mão larga com que se augmentaram as despezas, e com que se crearam empregos com grandes ordenados.

Tambem não posso deixar de mencionar o Decreto da mesma data, decretando a, extincção do Fundo Especial de Amortisação. — Esle assim como outros que foram decretados, com o intuito de organisar a fazenda, peccam pelos sacrificios que impuzeram áquelles que por esses Decretos foram affectados nos seus interesses, e ainda que todos tem obrigação de concorrer para o Estado, e mesmo fazerem a bem delle os sacrificios necessarios, antes de se decretarem estas medidas era preciso que o Governo demonstrasse que tinha feito todas as economias possiveis, e que era por uma necessidade demonstrada, que impunha esses sacrificios, e mesmo assim era preciso que fossem distribuidos com igualdade, para haver justiça; mas o Governo nada disso fez.

Tambem na mesma data appareceu o Decreto para o caminho de ferro do Norte. Sobre isto faço votos sinceros, para que elle vá por diante; mas o que vejo é que não ha nada feito, porque não ha meios, e por tanto não havia urgencia nesta medida.

Seguiu-se a estes o Decreto que creou os dois Concelhos dos Olivaes e de Belem. A este respeito não sei que utilidade proveiu de similhante medida. Se por ventura a medida fosse para reunir povoações distantes, como Bucellas e outras para o Norte, a Concelhos que lhes ficassem mais proximos, ou formar dellas mesmas novos Concelhos, intendia-a; mas crear dois Concelhos ás portas de Lisboa, deixando as povoações desses mesmos Concelhos entregues aos mesmos vexames, que soffriam dantes, isso é incrivel; e foi tão mal calculada similhante medida, que ainda não pôde ser levada a effeito.

Por outro Decreto reuniu-se a Alfandega das Sete Casas com o Terreiro Publico. A este respeito observarei unicamente, que se compare o Projecto de reforma das Sete-Casas, que esta Camara fez na Sessão passada, com a reforma feita pelo Governo, para se conhecer qual dellas será mais vantajosa para os povos.

Em 18 de Setembro decretou-se a abolição da companhia dos vinhos do Alto-Douro. Sabia-se que havia reclamações de uma Potencia, Estrangeira para se verificar esta abolição; mas o Governo não quiz trazer á Camara passada similhante objecto; e depois della dissolvida publicou a medida. Se por ventura ella é boa ou má, o tempo o mostrará: muito desejo que não tenha consequencias perigosas.

Em 30 de Setembro appareceu o Decreto Eleitoral. Depois do que já disse sobre elle, só accrescentarei, que se observe, se as suas disposições estão conformes com as do Acto Addicional, que tão recentemente tinha sido publicado.

Houve tambem Decreto ordenando que os Prelados do Ultramar fossem para as suas respectivas Dioceses.

Qual era a urgencia que levou o Governo a decretar o abono das despezas que o Estado tem a fazer com o processo das habilitações dos Arcebispos e Bispos do Ultramar, assim como dos seus transportes para as respectivas Dioceses, sem se declarar, se nesses abonos entram os seus familiares e comitiva?

Apparecem depois ainda dois Decretos, por um dos quaes o Governo não só é legislador, mas agraciador, perdoando rendas; e por outro permittindo a encampação dos prasos da Corôa, o qual não sei como póde-se levado a effeito.

Appareceu ainda o Codigo Penal. E com quanto eu saiba que um Codigo não póde ser feito em Côrtes, com tudo estou certo de que deve ser approvado nellas por meio das suas Commissões. O Codigo estava ha muito entregue a uma Commissão de Jurisconsultos respeitaveis; não havia pois inconveniente em prolongar a sua approvação até á reunião proxima das Côrtes.

Finalmente appareceu o Decreto para a contribuição directa. Apesar do Sr. Ministro ler declarado hontem, que elle protegia os pobres contra os ricos, parece-me que sendo elles influentes nas suas localidades, hão de sempre proteger-se a si primeiramente. Além de que não ha os dados necessarios para esta Lei produzir os seus devidos effeitos; e além disso não a acho ião urgente, que não podesse esperar pelas Côrtes, para se examinar e discutir, antes de ser decretada.

Sr. Presidente, tudo isto tende a mostrar que longe de se provar que são vantajosas as medidas tomadas na ausencia das Côrtes, são pelo contrario prejudiciaes ao Paiz, e que se offenderam os principios, sem d'ahi resultar beneficio algum. Por isso vou mandar para a Mesa uma Emenda ao § 4.º da Resposta ao Discurso da Corôa, para que a Camara mostre o sentimento que tem, por terem os Ministros assumido Poderes extraordinarios na ausencia das Côrtes.

E a seguinte

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Emenda. — « Camara sentindo que os Ministros de Vossa Magestade assumissem Poderes extraordinarios, examinará, com tudo, com imparcialidade as medidas promulgadas pelo Governo.» — Vellez Caldeira.

Foi admittida.

O Sr. Arrobas: — Sr. Presidente, eu não tencionava tomar tempo á Camara, fallando sobre a Resposta ao Discurso da Corôa: e até mesmo me admiro como esta discussão tem progredido por tanto tempo, chegando ás dimensões em que se acha. Pela minha parte não dou a esta peça a importancia que lhe tem querido dar alguns Oradores, encarando-a debaixo do ponto de vista, em que elles a querem collocar, isto é, em relação aos actos do Governo durante a Dictadura.

No meu modo de intender, Sr. Presidente, a Resposta ao Discurso da Corôa está redigida como convém ás circumstancias em que as cousas se acham. A Camara é legisladora, mas desta vez ella é tambem chamada a julgar sobre actos da maior importancia: sobre Decretos que feriram grandes interesses creados; sobre objectos a respeito dos quaes ahi estão energicas reclamações: e por isso intendo que sem quebra da dignidade da Camara não podemos agora, antes do exame do processo, antes de ouvidas as partes, e apreciadas as peças documentaes, lavrar sentença, antecipar um juizo.

Sr. Presidente, a todas estas condições satisfaz completamente a redacção da Resposta que se discute. Ella deve convir a todos os lados da Camara. Nada ha mais innocente, do que o que alli se diz.

Na verdade, Sr. Presidente, cada lado da Camara póde adopta-la como expressão das suas idéas. A direita póde ver nella a paz de um profundo respeito, e sincera gratidão pelo Chefe do Estado, um sentimento por não poder emittir nem-uma expressão de approvação pelos actos do Governo, aguardando-se para condemnar depois de ouvido como réo de lesa nação.

Uma parte do centro poderá ver em relação ao Governo com quem sympathisa, manifesto o desejo de justifica-lo das violações da Lei Fundamental, justificação tal que lhe dê o prazer de poder continuar a prestar-lhe o seu apoio.

A outra parte do centro póde vêr na Resposta que se discute, um completo estado de duvida em relação á avaliação dos actos do Governo, e que a Camara declara decidir-se com imparcialidade a respeito de cada um, depois de ouvir as rasões allegadas pelo Governo.

A esquerda póde ali ver a expressão de rejeição para alguns actos, approvação para outros, e que a Camara quer avaliar o comportamento do Governo, quando se discutirem os Actos da Dictadura.

A Camara considerada como um só corpo collectivo, sem attenção ás parcialidades politicas em que está dividida, não póde deixar de ver ali a expressão da maior dignidade, que em Parlamentos em taes circumstancias se tem demonstrado. A Camara, depois do que se tem provado, não se decide a dar o seu apoio ao Governo, nem a condemna-lo, sem ouvir a sua justificação. Ella não quer que o coração decida: vae consultar a rasão, e pronunciar-se-ha pelo que fôr justo.

E não se diga, Sr. Presidente, que é agora que se deve julgar o Governo, por ser practica em todos os paizes o discutir-se, na occasião da Resposta ao Discurso da Corôa, a sua Politica.

Essa practica segue-se era tempos ordinarios, por ser a unica occasião em que então se discute a Politica do Governo, no intervallo das Sessões. Mas agora as circumstancias são muito differentes; agora tem a Camara nomeado uma Commissão para dar o seu parecer sobre os actos da Dictadura; agora que é necessario responder já ao Discurso da Corôa, e que se precisa muito tempo para se examinarem com conhecimento de causa os Actos da Dictadura, não é occasião de avaliar esses actos. Seria ter a Camara nomeado uma Commissão para informar sobre um objecto, que ella ao mesmo tempo decidia.

Mas ainda que eu, como venho de dizer, achasse esta a mais digna Resposta que uma Camara em taes circumstancias podia dar, tinha resolvido limitar-me a votar por ella simultaneamente, por não querer pela minha parte demorar, uma discussão, que só serve para fazer perder tempo á Camara: sendo certo que tudo quanto alguem disser a favor, ou contra o Governo e suas medidas, é completamente deslocado e perdido. Os illustres Oradores hão-de ter o trabalho de o repetir, quando se discutirem os Actos da Dictadura: tendo assim o dobro em despeza, e muito menos em lucro, porque então, na occasião propria para produzir o effeito, já são repetições, cauzam muito menos impressão.

Desejando eu pois, Sr. Presidente, que se poupasse agora tempo para o dispender convenientemente na discussão detalhada do Orçamento, e dos Actos da Dictadura, não pude com tudo eximir-me de pedir a palavra, como Relator da Commissão de Marinha, para dizer alguma cousa sobre a Substituição do Sr. Cegado.

Começo por me felicitar com os meus Collegas da Commissão, de Marinha, por termos a fortuna de se associar aos nossos esforços um campeão, que sendo dotado de tanto talento e instrucção, está tão possuido de enthusiasmo pelo desenvolvimento e elevação da nossa Marinha Militar, sem a qual não é possivel termos colonias, nem grande commercio, nem mesmo sermos por muito tempo uma nação independente.

Mas, Sr. Presidente, não é por um voto na Resposta que se discute, que eu me persuado se salve a nossa Marinha: não dou a esse voto a importancia que lhe quer attribuir o meu illustre Collega. Desde que ha Camaras, que se fazem votos pelo respeito á Carla: pela organisação da fazenda, e boa administração, e cada vez mais a Carta é rasgada; cada vez as finanças mais longe estão da sua organisação, e cada vez mais o paiz é mal administrado.

A expansão da nobre alma do meu Collega, e o fogo do seu poetico enthusiasmo, — parece-me terem vindo alguma cousa deslocados. Não é aqui a occasião de o patentear.

Um excesso de zelo compromette muitas vezes a melhor causa — Uma grande idéa antecipada é muitas vezes uma verdadeira decepção.

O que o meu Collega pretende é o mesmo que todos os outros seus Collegas — a prosperidade da Marinha Milhar — mas será aquelle o meio de o conseguir? Parece-me que não. A Marinha depois de consignado o voto a seu favor, ficaria no mesmo estado, ou talvez peior, porque o tempo não respeita os votos emittido, na Resposta que se discute. Os na

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vios arruinados, não se fabricando, perder-se-iam de todo. O nosso pessoal e material de Marinha estacionado, em quanto marcham os das outr.is Marinhas da Europa, cada vez mais retirados e inferiores ficariamos.

Sr. Presidente, a Commissão espera em tempo opportuno provar á Camara que não é a Marinha, que absorve o dinheiro que se vota para aquelle Ministerio, mas sim o que á sombra della está organisado.

A Commissão espera attrahir a attenção da Camara para que fixe e declare quaes as necessidades que o paiz tem a satisfazer com a nossa Marinha. Militar, para que dê todas as vantagens economicas que della se devem tirar.

Depois pediremos que se fixe a importancia do material maritimo para satisfazer a essas necessidades; e-proporemos os meios de o conseguir — E só então que o nosso Arsenal, e o pessoal da Marinha se podem determinar e organisar com conhecimento de causa, e em proporção de nossa Armada.

Pediremos mais, que se fixe o pessoal de fazenda, em proporção da grandeza da Armada, e não como se ainda estivessemos no tempo em que tinhamos 20 náos.

Proporemos uma Lei de inscripção maritima e recrutamento. Uma Lei de instrucção e adiantamento para os Officiaes de Marinha, dividindo-os em differentes classes, de modo que os promptos para embarque não sejam impedidos nas suas carreiras pelos que só servem de fazer numero.

Não queremos uma brilhante Marinha, poderosa desde já (Uma voz: — Queremos nós). Não peço o impossivel para não comprometter o possivel. — Desejamos que nos votem uma Marinha proporcionada ás nossas forças; aquella que é essencial para satisfazer ás nossas necessidades. Mas que seja bem organisada: em que cada um dos vasos tenha toda a perfeição da época actual; em que o pessoal seja o conveniente e de tal modo disciplinado e instruido que qualquer navio de guerra novo possa bater-se com vantagem com um navio de igual força de uma nação estrangeira.

Depois mais tarde as nossas colonias desenvolvendo-se com o apoio da Marinha que proporemos, mas que não existe, nos pagarão uma brilhante Armada, como já n'outro tempo nos aconteceu.

E assim, Sr. Presidente, que havemos pedir á Camara um voto a favor da elevação da nossa Marinha. Mas agora tudo o que se disser, vem fóra de tempo. A Camara rejeita a Substituição como eu rejeito; não é porque não queira a elevação da Marinha, porque dizendo-se na Resposta que se quer a prosperidade, e desenvolvimento das colonias e commercio, é claro que se quer desinvolver e elevar a Marinha; mas lá fóra póde-se julgar que a Substituição foi rejeitada, porque a Camara não quizesse o desenvolvimento da nossa Marinha.

Além disso se a Substituição veiu para captar a benevolencia da Camara para um ramo de serviço publico ha tanto esquecido, não me parece ter sido para isso o melhor meio. Sobre tudo fallar tanto tempo nas meias comedorias dos Officiaes embarcados em navios que estavam no Tejo, poderia produzir na Camara um effeito desagradavel, por parecer que se pertendia elevar a Marinha com se pagarem as meias comedorias.

Concluo votando contra a Substituição, e a favor da Resposta tal qual ella se acha redigida, e não se pronunciando a Camara por em quanto a respeito do Governo.

O Sr. Barão de Almeirim: — Sr. Presidente, hontem, quando eu tive a honra de fallar nesta Casa, o Sr. ministro da Fazenda pediu a palavra para responder ao que eu disse, e parece-me que o Sr. ministro do Reino tinha tomado tambem alguns apontamentos; e é natural que S. Ex. quizesse dizer alguma cousa sobre a parte do meu discurso que se referia ás medidas da ultima Dictadura promulgadas pelo -seu Ministerio. Eu estimaria muito poder fallar depois que o Sr. ministro respondesse á parte do meu discurso, que corresponde á sua Repartição; e por isso pedia a v. Ex.ª que me reservasse a palavra para depois do Sr. ministro. Se a Camara intende que eu devo fallar já, estou prompto, mas muito desejaria que me ficasse reservada para depois de S. Ex.ª fallar, e por isso pedia a v. Ex.ª que consultasse a Camara a este respeito. (Vozes: — Não póde ser).

O Sr. Presidente: — Eu pela minha parte não posso dar a palavra senão no logar competente; mas consulto a Camara. V

O Sr. Barão de Almeirim: — Como o Regimento me não permitte fallar senão duas vezes sobre a mesma materia, tendo eu fallado já uma vez, por isso desejava fallar a segunda vez quando estivesse presente o Sr. ministro do Reino.

O Sr. Presidente: — O que posso fazer e consultar a Camara.

Vozes: — Falle no seu logar.

O Sr. Barão de Almeirim: — Então eu fallo agora, e depois pedirei outra vez a palavra.

(Continuando): — Sr. Presidente, hontem quando eu acabei de fallar o Sr. Ministro da Fazenda começou o seu discurso dizendo que o Governo queria O Systema Representativo, que o Governo respeitava a discussão parlamentar, e que a prova evidente disso era o discurso que a Camara acabava de me ouvir pronunciar, era a existencia desta Camara aqui reunida. Sr. Presidente, tudo isto são palavras, mas quando as palavras não estão em conformidade com os factos, as palavras não provam nada. O que é certo, Sr. Presidente, é que os actos deste Governo todos provam que elle despreza o Systema Representativo, e sobre tudo a discussão parlamentar, porque este Governo ainda não soube governar senão em Dictaduras; durante a época em que tem estado reunido, o Parlamento debaixo da administração deste Gabinete, o Gabinete tem sido esteril completamente, e na ausencia da Representação Nacional nenhum Gabinete ainda apresentou tantas e tão extraordinarias medidas como este. Depois destes factos embora venham as palavras em contrario, não se póde acreditar nessas palavras, porque os factos as destroem. Ainda não houve exemplo, Sr. Presidente, de nenhum tyranno, de nenhum Usurpador deixar de victoriar a ordem estabelecida até no momento que elle acha proprio para destruir essa mesma ordem. Estar aqui a Camara reunida é uma prova de que o Governo quer o Systema Representativo? Reunida estava uma Camara, uma Camara livremente o anno passado, e de um momento para o outro essa Camara foi dissolvida, e foram mandados embora os eleitos do povo; hoje póde acontecer o mesmo. O que o

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Sr. Ministro disse são apenas palavras, e o que eu acabo de dizer são argumentos, são provas, são factos.

Passando depois a responder ás observações que eu tinha feito sobre os caminhos de ferro, referiu-se S. Ex. a um Requerimento meu que tinha sido remettido á Secretaria para o satisfazer, e disse S. Ex.ª que esse meu Requerimento não podia ser satisfeito; porque isso podia prejudicar de alguma fórma o contracto que estava em andamento. Mas, Sr. Presidente, parece-me que era mais proprio da dignidade do Governo, que era mais proprio da dignidade desta Camara ter-se respondido ainda mesmo nesse sentido do que não dar resposta alguma; embora eu não mereça essa consideração, posto que estava revestido do caracter de Representante do Povo, ella comtudo era devida á Representação Nacional, á Camara em geral que tinha dado andamento ao meu Requerimento; além, disso, Sr. Presidente, no meu Requerimento havia diversas partes, havia algumas que não podem prejudicar de fórma alguma contracto nenhum, que não podem prejudicar o contracto que está em andamento, e pelo menos nessa parte o Governo parece-me que devia ter satisfeito o meu Requerimento.

Disse mais o Sr. Ministro que eu atacava o Governo dizendo que as medidas promulgadas por elle tinham produzido o descredito, e que de certo o Governo faltando ás condições com que tinha contractado com a Empreza que tomára o caminho de ferro chamado de leste, não augmentaria o credito, antes pelo contrario cahiria em maior descredito. Mas, Sr. Presidente, pelo estado em que se acha este negocia, parece que o Governo não tem faltado, parece que quem tem faltado é a Empreza; e a prova mais evidente é que o Governo lhe concedeu 40 dias de moratoria para ella poder preencher as condições do seu contracto que até agora não tem preenchido, não tem podido preencher. Daqui o que se vê, é que ha um favor da parte do Governo, ou então que o motivo pelo qual a Companhia não tem podido preencher as condições do seu contracto, é um motivo alheio a ella, é um motivo que não póde explicar-se senão pelo descredito que o Governo merece dentro e fóra de Portugal, descredito que tem produzido todos os embaraços que a Companhia tem achado para poder passar as suas Acções, e para poder preencher todas as condições do seu contracto.

Disse eu, Sr. Presidente, tractando das medidas de Fazenda promulgadas pela ultima Dictadura, que o Decreto de 30 de Agosto era uma espoliação; o Sr. Ministro disse que eu não q tinha provado, que tinha sido uma méra asserção. E facto, mas eu tambem digo a S. Ex.ª que intendo que ainda não é o momento de analysar em todas as partes essa medida da ultima Dictadura; mas repito hoje e repetirei sempre que alli existe uma espoliação. Que outro nome se póde dar ao facto de o Governo se appropriar daquillo que está em nome de terceiro? O Governo appropriou-se do Fundo de Amortisação de que estava de posse o Banco de Portugal, e o Governo não estava investido dos poderes legaes para o fazer; por consequencia aqui dá-se uma verdadeira espoliação; esta espoliação poderá talvez vir a justificar-se de algum modo pelas necessidades publicas: mas até hoje ainda não se justificou; por consequencia o nome que eu lhe appliquei, é o verdadeiro nome, e o resultado deste acto extraordinario todos nós o sabemos, é aquelle que infallivel, que necessariamente se havia de seguir de uma medida desta natureza.

O Sr. Ministro respondendo ás minhas observações sobre este ponto, referiu-se ao Decreto de 30 de Agosto, quiz mesmo que eu tivesse referido a elle tambem o descredito em que o Governo caíu lá por fóra; mas não é assim, Sr. Presidente, esse descredito proveiu do Decreto de 18 de Dezembro, e o Sr. Ministro teve o cuidado de não se referir a esse Decreto, porque a declaração expressa e formal do Stock-Exchange é um facto que não se póde destruir, e esse facto existe, esse facto desgraçadamente ha-de por muito tempo influir nos destinos das nossas finanças.

Não direi mais sobre este objecto, porque como o Sr. Ministro intendeu que não podia tractar delle, os meus argumentos a esse respeito estão em pé, e por consequencia eu não tenho precisão de dizer mais nada sobre este assumpto.

Passando a responder sobre a promulgação da Lei de imposto de repartição, S. Ex.ª fez uma declaração, declaração muito transcendente, uma declaração que deve desde já por em receios, em cuidados todos os contribuintes deste Paiz. Sr. Presidente, S. Ex. começou dizendo que o Governo não podia deixar de promulgar esta medida, porque ella era a unica laboa de salvação para as nossas finanças; S. Ex. disse que os nossos tributos em geral eram falliveis, eram precarios, de um momento para o outro podiam deixar de existir, e que a unica laboa de salvação era o imposto de repartição. Isto, Sr. Presidente, o que significa? Significa que a elasticidade deste imposto não só se estenderá a cobrir o deficit que por ventura sobrevenha em qualquer dos rendimentos do Estado; mas tambem será levado até onde as necessidades publicas o exigirem e sabe Deos mesmo se até onde o exigirem os caprichos dos Srs. Ministros actuaes, e futuros.

Sr. Presidente, a natureza deste imposto é ser sempre variavel e sugeito a uma oscillação constante conforme as precisões do Estado; e por conseguinte, quando elle se estabelece sem ao mesmo tempo se estabelecer uma percentagem certa, ninguem póde saber onde elle ha-de chegar. Além disto, Senhores, no estado em que o Paiz se acha, sem ler regra alguma fixa para se poder lançar e distribuir este imposto, elle ha-de infallivelmente pesar com muita desigualdade sobre as differentes classes dos contribuintes. Disse mais S. Ex.ª que, o Ministerio promulgando esta medida, tinha ido favorecer os pobres contra os ricos, porque os ricos não pagavam nada, ou quasi nada. Se S. Ex.ª quando apresentou esta insinuação se quiz dirigir a mim, declaro-lhe que a rejeita... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Não tive lai intenção) E emprazo a S. Ex. para ver os lançamentos feitos nos Districtos, e em todas as localidades onde tenho propriedades, e não receio que S. Ex.ª encontre collectas que me sejam favoraveis: neste ponto, posso fallar alio e claro, porque entrego toda a minha vida tanto publica como particular, á disposição do Sr. Ministro e do Publico. Não tenho medo que se examine o meu modo de viver, e estou sempre prompto a responder a insinuações como esta, se S. Ex. teve intenção de m'a dirigir... (O Sr. Ministro da Fazenda: — Já declarei que não faço insinuações.)

Disse o Sr. ministro: que queria favorecer os pobre contra os ricos as Leis não se fazem para fa-

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Vorecer classes: as Leis fazem-se para distribuir justiça; as Leis não devem dar desfavor nem contra uns, nem contra outros; devem pezar-se na balança da justiça para favorecer pobres, e ricos; e esta não faz nada disto, desfavorece a todos. Eu vou fazer uma profecia, e espero que o tempo me hade fazer justiça. Esta Lei promulgada nas circumstancias em que o foi, sem existirem os trabalhos preliminares que são indispensaveis sem as matrizes, sem cadastros longe de produzir os effeitos beneficos que se esperam, hade pelo contrario ser causa de se aggravarem os males que já existem Os pobres hão de continuar a ser vexados mais terrivelmente do que ale aqui, porque o mal não está na quantidade das contribuições, mas sim no modo porque são lançadas e arrecadadas. Os ricos e os poderosos leiu sempre meios para alcançarem favor» e os pobres, os pequenos, esses é que são sempre vexados (Apoiados). Sr. Presidente, eu tenho a satisfação de me persuadir que não ha nesta Camara quem mais do que eu pertenda favorecer as classes pobres: tanto pode ser, mas mais ninguem, e appello para todos os que me conhecem, e para todo o meu districto, o qual ainda ha pouco acaba de me dar um testimunho irrefragavel da sua confiança e do bom conceito que faz de mim, elegendo-me seu Representante, contra a vontade do Governo expressada por todos os modos.

O Sr. Ministro da Fazenda faria um grande bem o um grande serviço ao seu paiz, se propozesse uma medida pela qual as contribuições fossem lançadas de outra forma, e pela qual se arrecadassem de outra maneira; mas disto, Sr. Presidente, e que senão cuida, e S. Ex. faria ainda um grande favor a este paiz, se se occupasse como devia, e como todas as necessidades publicas o reclamam, de diminuir as despezas do listado, e de economisar quanto fosse possivel; mas as economias não estão no reportorio das medidas deste Governo; pelo contrario o que se vê, é augmentar as despezas em todas as repartições do Estado, e isto acontece n'um paiz, onde se diz que se quer favorecer os pobres. Favorecer os pobres e promover os meios delles pagarem o absolutamente necessario: é promover a prosperidade publica por meios possiveis, e estes meios são seguramente os melhoramentos materiaes do paiz, mas os melhoramentos materiaes do paiz não se podem executar sem haver meios para isso, e esta Administração não os pode obter, porque não tem credito,

Sr. Presidente, parece-me que tenho respondido sufficientemente ás observações que o Sr. ministro da Fazenda fez ao meu discurso, e peço á, Camara que me desculpe se lhe tenho tomado tempo de mais, mas intendi que é a do meu dever responder para não deixar passar as asserções, do, Sr. Ministro sem uma resposta cabal.

O Sr. Ministro da Marinha, (Jervis d'Atouguia) — Fui informado pelo meu Collega, que já se respondeu alguma cousa ás observações hontem apresentadas pelo Sr. Deputado por Macáo ácerca da reducção das comedorias, dadas aos Officiaes que estão no porto de Lisboa. Sinto ter que dizer ainda sobre este ponto, porque será cançar a Camara o repetir argumentos já produzidos; comtudo rapidamente farei algumas considerações ao meu nobre amigo o Sr. Deputado por Macáo, por isso que não estou d'accordo com o que S. Ex. disse.

Começarei por um ponto que me foi assaz desagradavel. O illustre Deputado querendo mostrar quanto a medida foi mal calculada, e quanto era prejudicial ao serviço da Marinha, a reducção que se tinha feito nas comedorias dos Officiaes embarcados dentro do Tejo, apresentou esse embarque como um serviço relevante, como uma applicação da sciencia que estudam os Officiaes de Marinha, como... que direi eu? Como fazendo estes Officiaes abordo dos navios no Tejo serviços taes que toda a consideração o pouca para com elles.

Ora, Sr. Presidente, faço justiça ao meu nobre amigo, acreditando que algum Official de Marinha o informou mal, se lhe disse que os seus serviços eram relevantes dentro do Tejo; mas eu peço a S. Ex. que me não diga o seu nome; porque para mim fica desconceituado. Ao Official de Marinha que me viesse apontar os serviços que practica dentro do Tejo, havia de responder — “ Troque a espada pela roca. — “ No meu conceito está só um furo acima daquelles que passeiam nas ruas de Lisboa.

Sr. Presidente, o nosso porto reconhecido na Europa como um dos melhores, um daquelles onde podem vir com mais segurança os navios de todo o Mundo, foi apresentado pelo illustre Deputado como não sei que,.', o Cabo Tormentoso!.. Basta que é preciso arrear os mastaréos!.. Mas permitta-me o nobre Deputado lhe diga que — arrear os mastaréos é uma cousa ordinaria, que fazem todos os dias os navios de guerra no alto mar, e se esta manobra se faz no Téjo, não é só em consequencia do máo tempo, é mesmo no estado ordinario. Não ha muito que eu estando a bordo de um navio Inglez, n'uma reunião conviva!, esta foi interrompida só para se fazer essa manobra.

Disse mais o Sr. Deputado — Que grande serviço se faz em salvar vidas — e apresentou esse serviço como relevante. A isto observarei, que houve aqui uma occasião de prestar esse serviço, e foi que achando-se um navio francez desalvorado fóra da barra, mandei saír logo um vapôr, mas nem o seu Commandante, nem os seus Officiaes (ornaram isto por um serviço penoso e relevante: honra lhes seja feita.

Sr. Presidente, S. Ex. ao mesmo tempo que desejava que em todas as nossas colonias se veja tremular a bandeira Portugueza, intende que — em Angola nada se aprende, e que era melhor retirar os navios que alli estão — Eu queria que fosse por muito pouco tempo a demora que alli tem os nossos navios de guerra, mas além da conveniencia que ha de em todas as nossas colonias estar uma embarcação de guerra, dá-se de mais a mais a obrigação que temos com a Inglaterra, por causa da escravatura, de sustentar naquelle porto um certo numero de navios de guerra.

Quanto a dizer S. Ex. que os marinheires que daqui saiam para as provincias do Ultramar ficavam desgraçadamente atrazados nos seus pagamentos, e que os seus mantimentos não eram bons, foi exacto, e até agora assim tem acontecido pelo principio sempre aqui intendido, que desde o momento que chegavam a provincia, esta é que pagava. S. Ex.ª estava bem informado desta circumstancia, aliás geralmente conhecida; mas não o está de certo, em quanto ao ultimo navio que saiu. para esses mares; não sabe que pelo brigue Moçambique mandei o pagamento de dois mezes em peças de oito mil réis para serem dadas nesse pagamento, por oito mil réis. Não tem pois

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logar a observação de S. Ex. a respeito da differença da moeda, e dos prejuizos della resultantes aos Officiaes da Armada; porque para, acabar com esses prejuizos, e serem pagos em dia estou eu tractando de mandar por Lodos os navios, que para alli partem, uma quantia prompta. E o mesmo que acontece a respeito dos navios que vão para a Ilha da Madeira; enviam-se os pagamentos em letras ou dinheiro; mas

S. Ex. sabe muito bem que ha mais facilidade em mandar dinheiro para a Ilha da Madeira, do que para Angola.

Sr. Presidente, acceito o conselho que S. Ex.ª me dá, de fazer nomeações para os diversos governos do Ultramar, de Officiaes de Marinha; acceito-o como conselho; mas com a condição de mandar tantos Officiaes de Terra, como do Mar, e não com exclusão de uns, ou com exclusão de outros. Assim como o Official de Marinha, tambem o Official de Terra póde ser muito bem Governador no Ultramar. Mas em quanto a este ponto, tive pouco tempo para fazer esses exames: no Orçamento de Marinha entraremos nelles; comtudo parece-me, se me não engano, que hoje os Governadores do Ultramar são, o maior, numero, Officiaes de Marinha. Não o assevero, não faço disto questão.

Quanto ás Legações estranhou S. Ex.ª, que fossem nomeados Addidos militares, e se excluissem Officiaes de Marinha. Ora, Sr. Presidente, a idéa, se o illustre Deputado a tivesse apresentado, e eu aceitaria, idéa que não perco de vista, era o fazer com que os nossos Officiaes de Marinha vão practicar a bordo dos navios inglezes, mas manda-los como Addidos ás differentes Capitaes da Europa, cuja situação pela maior parte não é em portos de mar, declaro que discordo de S. Ex.ª Officiaes militares Addidos ás differentes Legações, vão para as de Pariz, Berlin Madrid, Inglaterra, é Russia. Estes Officiaes, Sr. Presidente, teem em todas estas Capitaes, todos os elementos para poderem informar bem o Governo dos melhoramentos, e do estado da disciplinado Exercito desses paizes, a fim de que nós possamos copiar o que nelles houver de melhor. Foi este o principio que se leve em vista; e no entanto o Sr. Ministro da Guerra ainda não tem. recebido credito para, esse effeito, e por ora ainda não estão, nem podem estar, nomeados nenhuns desses Officiaes, Mas eu torno a dizer, Sr. Presidente, se o estado das nossas, finanças o permittir, eu estou muito de accordo com S. Ex.ª, se quizer vir a esse terreno, em mandar os Officiaes practicar a bordo dos. navios de guerra inglezes, aprendendo-não só a disciplina, mas os diversos melhoramentos, que são muitos, e de que tanto carece a nossa Marinha.

Agora, Sr. Presidente, o illustre Deputado talvez ainda o não examinasse, porque se visse, o, quadro que nós effectivamente temos da nossa Marinha, havia de reconhecer que não se póde fazer mais do que se tem feito, a fim de apparecer o pavilhão portuguez em todos os mares. Mas permitta S.. Ex. lhe diga, que á excepção da França e Inglaterra, não se veem geralmente os pavilhões das outras nações em ioda a parte onde ha portos de mar.

Sr. Presidente, dentro desses fracos meios que temos, o anno passado, se me não engano, esteve em Macáo um navio de guerra; este anno está em Gôa um navio de guerra; lá temos em Angola um navio de guerra; temos na Ilha da Madeira.um navio de

guerra; agora mesmo antes de fallar o Sr. Deputado tinha ido uma corveta para as Ilhas dos Açôres, a fim de prestar algum serviço que fôr necessario; em Cabo Verde temos um navio de guerra; e tivemos ainda ha pouco tempo um navio de guerra nas provincias de Solor e Timor, que está em viagem para Lisboa.

Houve uma circunstancia de que infelizmente não se tirou o resultado que todos os portuguezes tanto desejavam, que foi a que levou Sua Magestade a Imperatriz desta Capital para a Ilha da Madeira. Sua Magestade Imperial annunciou ao Governo a vontade de partir para ali em poucos dias. O Governo está persuadido que em relação á Marinha que tem Portugal, Sua Magestade Imperial teve um transporte que não deshonrava o paiz que ali lhe dava destino. Mandou-se uma fragata prompta tanto em pessoal, como em todos os aprestes necessarios em relação ás Augustas Personagens que conduzia; mandou-se um vapor, e uma corveta; e lá estava outra corvela.

Ora, Sr. Presidente, se nós formos a examinar a verba do Orçamento da Marinha, se percorrermos os Orçamentos de todos os tempos e de iodas as outras nações com relação á Marinha, podemos ler algum jubilo e até orgulho — de que com tão pouco não se póde fazer mais; (Apoiados) nem em parte nenhuma se faz tanto. (Apoiados)

Sr. Presidente, posso assegurar a v. Ex.ª e á Camara, que não se faz uma só despeza na repartição a meu cargo que eu não examine muito de perto: — as que não são em conformidade da Lei, nenhuma se faz. E se puder durante algum tempo, como ainda hoje se está practicando, acabar com algumas dividas de exercicios passados, estou persuadido que algum desenvolvimento mais se poderá dar á nossa Marinha: algum já se tem dado desde que nós entrámos para o Ministerio. (Apoiados)

«Temos disse o illustre Deputado, umas poucas de embarcações que só existem em nome, mas incapazes de navegar» effectivamente mui poucas ha no Téjo em estado de saír a barra para fóra. Porém compraram-se 3 Vapores; e tenho esperança de trazer, a Camara uma Proposta de Lei, logo que esteja decidido e estabelecido um principio mais economico, para, por meio do vapor, dar o movimento aos barcos, essa invenção que altera o machinismo até hoje usado, e que se, chama Helice digo logo que este principio fôr reconhecido, pedirei á Camara que o Governo seja auctorisado a mandar fabricar uma fragata a vapor, pois que precisamos della absolutamente. (Apoiados)

Tenho esperança tambem de mandar construir uma corvela, debaixo de melhor plano, o qual já tenho e veiu de Inglaterra. E fazendo o pagamento regular, como espero poder fazel-o, não perco as esperanças de que a nossa. Marinha seja levada a melhor pé, e então seja sufficiente para as colonias que nós temos: ficando desta forma satisfeitos os desejos do illustre Deputado que são tambem os meus e os do Governo.

O illustre Deputado tambem disso, e disse uma verdade absolutamente fallando — que os Officiaes de Marinha portugueza tinham diante de si, e diante de suas familias um futuro pouco lisongeiro de interesses e de vantagens. — Eu peço desde já licença para offerecer ao illustre Deputado-um livro que

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sae todos os mezes em Inglaterra, aonde S. Ex-ª verá que lá tambem se queixam, e não pouco, e com alguma razão. — Permitta me S. Ex. lhe diga, e isto está notado no livro a que me refiro, que o primeiro Almirante hoje da Marinha Ingleza era Capitão de Mar e Guerra em 1795, chegou ao posto de Primeiro Almirante só depois de 60 annos de serviço; só depois de ter decorrido todo este tempo é que chegou ao posto de Almirante!... Ali ha Tenentes de Marinha com este posto desde 1797, e só agora é que entraram na escala para o respectivo accesso, porque o seu exercicio começou em 1821. — Ha 1:117 Tenentes; acham-se em estado de embarcar 380, outros estão em alguns navios em differentes costas, e 400 não tem serviço nenhum.

Agora ainda a respeito de vantagens. Nesse mesmo livro o illustre Deputado ha de vêr, que alli as vantagens de um Almirante não são superiores de certo, relativamente fallando, são até inferiores ás dos nossos. Não quero dizer que, absolutamente fallando, os nossos Officiaes tem grandes vantagens; mas a verdade é que o futuro que os Officiaes militares quer de mar quer de terra, tem diante de si em toda a parte é o mesmo; quero dizer — Estas classes vivem mais da honra, e não absolutamente de interesses. (Apoiados)

Peço tambem ao illustre Deputado, porque é um sentimentalismo que vem aqui muitas e repelidas vezes, que note o que se diz nesse livro a respeito de pensões — Saiba o illustre Deputado, que a maxima pensão que póde ler a viuva de um Almirante, é de 120 libras, e é preciso ler ficado em circumstancias de carecer della; é preciso que não receba mais nada do Estado; e quando receba algum outra coisa por algum outro titulo é descontada esta arte, não se lhe admitte receber duas quantias.

Ora, Sr. Presidente, se entre os inglezes o homem que para chegar a Almirante, depois de ser Capitão de Mar e Guerra gasta 60 annos, prestando ao Estado seus serviços e, quando morre, deixando uma familia, ou uma viuva, se dão a esta familia ou viuva só 120 libras, não se póde dizer que nós somos menos generosos que elles. (Apoiados) Lá está a tabella, lá se designam as circumstancias em que se podem pedir e conceder as pensões. Lá não se dá á viuva de um Tenente mais que 50 libras! Aqui entre nós proporcionalmente as pensões que nós damos, são superiores ás que se dão na Inglaterra onde a despeza não excede a receita, e que é considerada bem, porque realmente o é, a rainha dos mares!..

Sr. Presidente, o illustre Deputado referiu-se a um serviço, que fez favor de me indicar, que fazem as nossas lorchas em Macáo. Morreu alli um Official muito valente; e os piratas dão bastante que fazer ao Governador daquella parte da Monarchia portugueza: mas ha alli um joven portuguez, filho de um ancião que nós todos conhecemos, nosso companheiro em todos os trabalhos da liberdade, que, honra lhe seja feita, e digo o aqui em vista e presença de seu pai, fallo do Sr. João da Silva Carvalho, pelo atrevimento com que ataca os -piratas e desempenha as commissões de que tem sido encarregado, mostra a coragem de verdadeiro portuguez, e pelo seu digno comportamento a todos os respeitos prova que é bello Official. Alli só existem essas lorchas, mas eu espero que não decorrerá muito tempo que lá não tremule uma bandeira em navio portuguez de mais alto bordo.

Acabarei, Sr. Presidente, por uma expressão que disse o illustre Deputado «Esquivam-se ao serviço os Officiaes de Marinha.» Sr. Presidente, esquivam-se ao serviço, é verdade. Mas qual é a corporação que não tem bons e máos!.. Os bons não se esquivam ao serviço. (Apoiados) Tenho a bordo alguns que, vendo que outros procuram fugir do serviço — do pior que é o de ír para Angola — se offerecem para ír. Mas diz o illustre Deputado faça-se uma escala, e mandem-se por força. Até certo ponto póde ser, absolutamente fallando não é possivel fazer-se a escala. Mas está presente o Chefe militar da Marinha, e S. Ex. póde dizer se eu por mais de uma vez não tenho lembrado, que para aquellas estações que eram as peores, fossem mandados por turno os que não tivessem ainda ido para tal serviço. (O Sr. Barão de Lazarim: — É verdade) Ha alguns Officiaes que se esquivam ao serviço, mas são raros. Estas nossas dissenções politicas, no,estado em que a nossa Marinha tem estado, para assim dizer, em pouca actividade, tem feito com que um ou outro Official se desacostume da vida do mar, e então naturalmente procuram ficar em terra. Ha mesmo o exemplo recente de um Official que fugiu o mais possivel de cumprir as ordens, apesar de repelidas, que recebeu de embarcar para Angola: háde pagar por isso; hade entrar em conselho de guerra, já está preso, e hade fazer-se a respeito delle o que as Leis militares disserem.

Concluo dizendo que redusidas como foram as comedorias aos Officiaes de Marinha que se acham no Tejo, ainda assim tem muita vantagem aos que estão em outro qualquer porto. (Apoiado) A Ilha da Madeira, minha patria ou terra natal, considera-se bom porto 9 mezes no anno; pois eu por mim declaro que quero antes estar 15 mezes no Tejo, do que 15 dias no porto da Madeira no tempo das levadias. (Apoiados)

Por tanto Sr. Presidente, posso asseverar ao illustre Deputado que eu pela minha parte não hei-de augmentar, em quanto estiver á tesla da repartição de Marinha, as comedorias dos Officiaes embarcados em navios dentro do Tejo, persuadido como estou de que comparativamente fallando tem mais do que os que se acham em qualquer porto fóra de Portugal. (Vozes: — Muito bem.)

O Sr. Carlos Bento: — Sr. Presidente, quando pedi a palavra, declarei a v. Ex.ª que era para fallar a favor do Parecer que estava em discussão, tendo com tudo de apresentar algumas considerações contra as inducções atirar de alguns de seus parágrafos; espero que a Camara me não tache de contradictorio por eu, tendo-o assim declarado, me não fizesse inscrever, como tendo de fallar a favor do Parecer. Eu, respeitando muito as determinações da Camara, não posso comtudo deixar de dizer ser este um modo de inscripção, que ás vezes violenta muito os Deputados, mas eu que sou sempre submisso ás decisões da Camara, que não distingo mesmo quando me são favoraveis ou contrarias, sujeito-me a essas disposições, e embora pareça agora contradictorio no modo porque pedi a palavra e vou fallar, declaro á Camara que o não serei.

Sr. Presidente, eu voto pelo Parecer da Resposta ao Discurso do Throno, porque o acho_ conveniente

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mente elaborado, e porque, pela maneira de adiamento com que está redigido, prehenche completamente todas as condições das circumstancias em que nos adiamos, e não admira isto se attendermos aos distinctos Cavalheiros que fazem parte da Commissão, encarregada deste trabalho. (Apoiados)

Esle Parecer limita-se a reconhecer a necessidade da adopção de uma medida, em virtude da qual nós entrámos as portas da Camara, e ninguem dirá que é demasiado em concessões o Parecer que reconhece a necessidade da existencia de uma nova Lei Eleitoral, quando effectivamente estava alterado o principio eleitoral que anteriormente existia; e por esta occasião devo dizer que os illustres Deputados que se tem feito cargo de dirigir severas asserções á actual Administração, porque dissolveu a Camara anterior, na minha opinião, peço perdão para lhes dizer, que não tem razão, porque essa Camara se dissolveu a si virtualmente desde o momento em que votou uma nova base de eleição; desde o momento em que alterou a condição essencial, a base da eleição, decretou a sua dissolução, e essa Camara era logica, e tinha abnegação bastante para conhecer que a alteração do principio eleitoral era a sua morte politica. (Apoiados) Por consequencia peço licença para dizer aos illustres Cavalheiros que censuram o Ministerio por ter dissolvido a Camara transacta, que as suas asserções são a meu ver mal cabidas, porque essa Camara não devia existir depois de ter alterado a base principal da eleição. (Apoiados)

Mas ha mais; respeitando, como devo, as cinzas dos corpos politicos que deixaram de existir, não posso deixar de declarar que não me cumpre a mim, que tive a desgraça de ser minoria naquella Camara, minoria a respeito de algumas questões importantes, de questões economicas e financeiras; não posso eu de boa fé lamentar sinceramente a falla daquella Camara; os illustres Deputados que apoiam os principios economicos para os quaes parecia ter tendencia a Camara passada, estão no seu terreno lamentando que aquella Camara se separasse, e não tivessem tido as consequencias necessarias os principios economicos que alli eram sustentados; não assim eu; pelo contrario, tendo combatido idéas que então foram apresentadas, confesso, que concorri quanto pude; logo que se estabeleceu uma collisão entre a Camara e o Governo, fui dos que mais fiz para que fosse a Camara a que ficasse mal; não me envergonho de o dizer, assim como se não devem envergonhar os illustres Deputados que tinham opiniões diversas, de as sustentar; concorri o mais que pude para que fosse a Camara quem ficasse em peor situação no conflicto que se estabeleceu entre ella e o Governo; e não fui só eu, era impossivel que com as minhas fracas forças podesse conseguir um resultado desta importancia; muitas outras causas concorreram para isso; nem isto imporia a menor censura aos homens distinctos que faziam parte da Camara passada, com a amizade de muitos dos quaes me honro.

Mas, Sr. Presidente, diz um distincto Publicista Montesquieu, que se tem visto mais de uma vez Assembleas compostas das maiores illustrações commetterem os maiores desacertos; e de certo ninguem ignora que essa Camara reunia em si homens dos mais respeitaveis do Paiz, com a amizade dos quaes todos se devem honrar, e todos devem respeitar. (Apoiados)

Mas, Sr. Presidente póde alguem ignorar tambem que se houve já mais uma dissolução auctorisada pelas circumstancias, foi a da Camara passada? Tem-se visto Camaras votarem contra actos ministeriaes, e Os Ministerios, ou modificarem a sua Politica, ou a si proprios, ou abandonarem completamente o Poder; mas o que ainda se não viu, foi que havendo idéas desencontradas do Governo, e apresentadas por quasi todas as fracções de uma Camara, o que quer dizer, que todos os homens que pertenciam a essas opiniões, tinha n systemas seus, que reciprocamente reputavam os melhores, n'uma discussão de 23 dias nenhum desses systemas podesse alcançar os votos necessarios para o seu triunfo. Desde que se apresentam factos desta natureza a dissolução é o unico recurso a tomar. (Apoiados)

Ouvi dizer, Sr. Presidente, e acredito que se não disse como condição desvantajosa para a Camara actual, mas ouvi dizer — 'dissolveu-se a Camara mais livremente eleita neste Paiz; — Se se quiz com esta asserção estabelecer a presumpção de que não póde haver neste Paiz Camara alguma livremente eleita, peço licença para não acreditar na sinceridade deste principio, e a Camara passada alterando a base principal da eleição, foi ella a propria que reconheceu que havia melhor systema de eleições do que aquelle pelo qual ella tinha sido eleita.

Sr. Presidente, os meus principios economicos são muito antigos, são velhos, e cada vez me parecem mais inflexiveis. Ei na Camara passada combati principios economicos cuja applicação me parecia inopportuna, forçada e inconveniente e por consequencia neste ponto não lamento a ausencia da Camara passada, porque as minhas ideas estavam então em minoria; acredito que ellas tenham a seu favor a razão. Eu declaro que, em these, não gosto de Dictaduras; e creio que ninguem, verdadeiramente amante do Systema Representativo, poderá gostar dellas; entretanto, desgraçadamente em todas as épocas tem havido Dictaduras; quasi todas as nossas Leis são Leis dictatoriaes.

Devo ainda advertir, se eu vir que desgraçadamente as circumstancias favorecem n'um ponto, por exemplo sobre finanças, a adopção de medidas dictatoriaes, e ha uma Camara que não póde vir a um accôrdo com o Governo, eu declaro que nem ainda assim serei de opinião que se estabeleça a Dictadura. Vou explicar a minha idéa. Supponha-se que na occasião de ser dissolvida a Camara passada, debaixo da impressão de que essa Camara sustentava principios que não eram convenientes, (financeiramente fallando) e que assustavam de alguma maneira os capitaes, que era conveniente aproveitar-se da impressão debaixo da qual essa Camara acabava de ser dissolvida, attenuando-se, por meio de uma qualquer medida, os effeitos que o Decreto de 3 de Dezembro tinha produzido; que era conveniente mesmo estabelecer uma reacção contra as idéas que poliam ser exaltadas em finanças; eu intendo que se ganhava muito mais estabelecer uma Camara debano destes auspicios, do que recorrer á Dictadura (Apoiados).

Ha alguns amigos meus, que formam parte do actual Ministerio, que sabem perfeitamente que as minhas idéas não eram para a Dictadura. Eu não julgo esta occasião amais propria para levantar questões politicas, se não quando fosse demonstrado que da parte dos Srs.: Ministros havia um proposito firme

VOL – II – FEVEREIRO – 1853

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de abusar das attribuições extralegaes que assumiram, para augmentarem a influencia do seu poder, em despeito das attribuições que competem aos outros Poderes do Estado; se isto fosse demonstrado, então ninguem podia recuar diante da necessidade.de dirigir accusações aos Srs. Ministros pelos actos que haviam praticado; principios desta ordem quando fossem offendidos, não podiam deixar de reclamar em seu auxilio ioda a força da parte daquelles que intendem, que o Systema Constitucional é o melhor dos Systemas.

Eu declaro, com quanto intenda que não seja esta a occasião propria para levantar questões politicas, que quando se não dêem os dois motivos que acabei de indicar, como circumstancias attenuantes, hei-de combater vigorosamente as Dictaduras com tudo supponho que uma Camara não deve julgar-se presa a uma situação politica, e á adopção de quaes quer medidas, que os factos demonstrarem que não preencheram os fins que se tinha em vista: quando se demonstrar que os bons desejos não correspondem á efficacia dos resultados, digo que nenhum Parlamento póde tomar sobre, si a responsabilidade de approvar essas medidas; digo mais, os Cavalheiros que adoptaram taes medidas, logo que vejam que com ellas não conseguiram os seus fins, hão de ser os primeiros a reconhecer que essas medidas não podem deixar de serem modificadas. Digo mais, não vejo em nenhum dos actos dos Srs. Ministros, a menor tendencia para abusar das faculdades de que se investiram, em proveito exclusivo das suas pessoas, ou dos seus interesses como agentes de um Poder determinado; não vejo para accusar os Srs. Ministros, nem que eles promovessem os seus interesses particulares, nas medidas que adoptaram, nem que mostrassem desprezo intencional pelo Systema Constitucional; vejo pelo contrario, até certo ponto, da parte dos Cavalheiros que se sentam naquellas cadeiras, uma especie de abnegação t) os seus proprios interesses; porque tendo algumas pessoas accusado o Ministerio por parecer não estar, em alguns pontos, de accôrdo com os principios, chegando até a negarem intelligencia ao Sr. Ministro do Reino em tres medidas importantes em que apparece o nome de S. Ex.ª em todas ellas os seus interesses particulares são altamente offendidos. (Apoiados)

Vejo tambem outra cousa; vejo que ha modernamente uma escola peste Paiz. que reputo altamente perigosa, porque é composta de homens de talento e de bons dezejos, e porque pertende e exige cousas que é impossivel adoptarem-se sempre em todos os tempos e em todas as circumstancias. Essa escola tem rasão quando se queixa de não se ter adoptado, ha mais tempo, certas medidas; essa escola tem rasão quando se queixa da nação que se conserva a respeito de alguns pontos, e da, falla de direcção e attenção para outros objectos de interesse publico; mas não tem rasão a respeito de puros pontos, para fazer exigencias que não podem ser satisfeitas sem comprometter gravemente os interesses do Paiz. Por isso intendo, que essas exigencias apresentadas brilhantemente e sustentadas com todo o talento fundado nos melhores dezejos, explicam, até certo ponto, que se adoptaram medidas, que não são convenientes. Digo por conseguinte, que nas exigencias, dessa escola se encontra a explicação da adopção de medidas que o Governo tomou. A respeito de algumas medidas publicadas pelo Sr. Ministro da Fazenda, acho a explicação dellas no sentimento de obter gloria: o sentimento de adquirir gloria é, sem duvida nenhuma, o mais nobre de todos os sentimentos; e se procurarmos, no Sr. ministro da Fazenda, este sentimento, de certo o encontramos em gráo elevado; mas esta nobre carreira leiu perigos, e traz comsigo inconvenientes; e a meu ver trouxe comsigo grandes inconvenientes nas circumstancias actuaes. E certo que algumas dessas medidas não produziram bons effeitos; não é por ellas que S. Ex. chegará ao fim que teve em vista; S. Ex.ª provavelmente quer conseguir o que os outros não conseguiram, quer chegar aonde os outros não chegaram, quer reformar o que os outros não reformaram; porém é fóra de duvida que ha certas medidas, que com quanto seja reconhecida a sua necessidade, nem sempre é occasião propria de se adoptarem: e muitas vezes acontece, que podendo ellas produzir optimos effeitos adoptados a tempo, trazem terriveis resultados adoptados fóra da occasião opportuna. Collocadas as questões neste ponto, parece-me que nos achamos mais desembaraçados, e que é muito facil avaliar se as medidas adoptadas prehencheram os fins que tiveram em vista os seus auctores. Não vou analysar os Actos da Dictadura, nem tractar do Bill de Indemnidade, mas vou tractar de um ponto importante de que falla a Discurso da Corôa, porque me parece impossivel deixar de tocar neste ponto quando nelle falla o Discurso da Corôa. Este ponto a que me refiro, é o que diz respeito aos melhoramentos materiaes do Paiz.

Mas, Sr. Presidente, eu não posso deixar de dizer em approvação da Resposta ao Discurso da Corôa que me associo inteiramente ás demonstrações que esta Camara dá de deferencia para com o Augusto Chefe do Estado, As circumstancias extraordinarias porque o meu particular amigo o Sr. Ministro da Fazenda tem sido accusado, fazem mais do que nunca reflectir sobre a necessidade que temos de acatar aquelle Poder Superior a estes interesses, que trazem este desencontro de opiniões politicas de todos os dias, e que mostram a necessidade de haver alguem superior a esse espirito de paixão que nos domina, e a cuja distancia elevada só alcança o sentimento de imparcialidade e de justiça.

Sr. Presidente, eu já disse, na minha opinião, o que era conveniente para fixar a opinião no que diz respeito aos desenvolvimentos materiaes do Paiz. Eu disse ainda agora que havia uma escola moderna que reputo perigosa neste Paiz a muitos respeitos per ser composta de homens de talento e consideração. Essa escola tem rasão em muitas das suas propostas e de se não terem adoptado ha mais tempo certas medidas. Essa escola tem rasão quando se queixa da inacção conservada por muito tempo a respeito de alguns que em outras se podia ler adoptado: essa escola tem rasão quando se queixa da falla de direcção e attenção para objectos de immensa importancia. Mas, Sr. Presidente, parece-me que o ter rasão a respeito de alguns pontos não dá direito para se fazerem exigencias que não podem ser satisfeitas sem que se compromettam os dezejos que se tem em vista nos grandes, interesses do Paiz. Querem-se os melhoramentos materiaes do Paiz. — Tambem eu os quero —.Quem poderá pôr em duvida um ponto de tanta importancia? Quem pode dizer que ha discordancia a este respeito, que a discussão possivel neste campo? To

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dos estuo accordes em querer os melhoramentos materiaes do Paiz. Mas não se tracta só disso. Peço licença a v. Ex.ª e á Camara para afizer que se na Resposta ao Discurso da Corôa se manifestam dezejos a esse respeito, não são esses dezejos que eu combato. Mas entre a manifestação desses «dezejos, e o indicar os meios de os realisar ha uma distancia immensa.

Os fundamentos desses dezejos não posso pol-os em duvida — a excellencia dos meios que se indicam para se pôr em practica o fim que se tem em vista, e o objecto da discussão, a este é o ponto de que eu pertendo tractar.

Se acaso se puder mostrar que não podem ser satisfeitos esses desejos porque os meios empregados não chegam ao fim proposto, não podem deixar de estar de accôrdo comigo os que querem que o Paiz chegue a. um estado de prosperidade. Mas esta fórma de vontade é um tanto difficil de cumprir. Não basta só querer, e preciso poder e saber. Acho mais facil a maxima de um filosofo inglez Lord Bacon — O homem póde tanto quanto sabe.' — Agora digo mais — é impossivel saber tudo quando de quasi tudo nos occupamos. É impossivel tractar de tudo quando ha tantas medidas que eu conheço, cuja necessidade até certo ponto era reclamada pelas circumstancias, mas que não se podem tractar de uma vez. E preciso saber o tempo em que ellas se devem adoptar, porque o melhor zelo não póde impôr os limites á condição da humanidade. E peço licença ao Sr. Ministro da Fazenda cujo talento, e capacidade eu reconheço, para lhe notar que me parece que S. Ex.ª foi adoptar medidas que não me parecem muito convenientes; quer dizer muito convenientes nas tendencias, mas que não podem chegar ao fim que se tem em vista com quanto seja justo e optimo o fim a que se dirigem. Os meios para lá chegar indicados nessas medidas é que não são os melhores nem os mais convenientes.

Não são opiniões minhas. Nestas circumstancias já um homem da Tribuna franceza disse — Não queremos nem homens que não fazem nada, nem homens que fazem tudo. — É preciso distinguir — querer fazer tudo significa muito bons desejos — mas no fim desses bons desejos, para os realisar encontra-se esterilidade, desta esterilidade em que nos collocamos sem se começar pela adopção de uma só medida.

Não é por um Ministro qualquer adoptar muitas medidas a respeito de muitos e variados objectos que se immortalisa. Muitos Estadistas celebres se tem immortalisado com uma só medida. Robert Peel é immortal pelo se» Bill a favor da liberdade de commercio. Na nação visinha o Ministro Mons immortalisou-se pelo seu systema de repartição do imposto; Bravo Murillo por um rigoroso systema de contabilidade. E, Sr. Presidente, cada um destes homens tem uma posição distincta na Europa, tem um nome na historia do seu paiz. Não ha homens que atacassem de frente tantas instituições como elles, mas que tem dado bons resultados. Bem sei que se póde dizer mas o nosso Paiz não está tão adiantado em reformas como estão os outros. Tambem os outros careceram no seu principio de desenvolvimento nas suas reformas para Chegarem ao estado em que hoje se acham. E tambem não é exacto que nas outras nações não haja muito que reformar. Muitas vezes para elogiar os outros calumniamo-nos a nós proprios. Ninguem dirá que a Inglaterra não seja uma nação que não ame muito a reforma. E por ventura não têem os inglezes-muito que reformar? Por ventura não se indicaram ainda ha pouco naquelle paiz importantes reformas a effeituar? Pois a necessidade dessas reformas não data de, pouco tempo. Pois não acaba Lord John Russell de indicar que ía apresentar ao Parlamento um Bill que facilitasse a permutação dos bens? Bill ião necessario no paiz onde se exige o praso de 60 annos para se demonstrar que a propriedade é livre?

E já que se fizeram observações a respeito da nossa Marinha, e que eu acho em parte justas; direi ao Sr. Ministro da Marinha, que eu leio todos os dias terriveis accusações contra esse Tribunal do Almirantado inglez: não ha muito que uma não modelo leve de voltar a toda a pressa para Inglaterra, achando-se o mar mediocremente agitado, isto era uma não modêlo; quero eu dizer com isto que não nos calumniemos para fazer elogios aos outros. (Apoiados) Nas outras nações tambem ha muito que reformar; agora o que eu confesso é, que no nosso Paiz ha muita mais difficuldade para estudar as questões, do que em outras nações: é de absoluta necessidade conhecer primeiro quaes são os pontos, que carecem de reformas, e ser aquelle ponto que mais propria é opportunamente, e com mais vantagens e bons resultados, se póde reformar, ao contrario não é andar muito prudente, é andar com precipitação, e a precipitação nestes pontos é synonimo de demora.

O Sr. Presidente: — Sinto ter de interromper o illustre Deputado, porque deu a hora para se passar á Sessão secreta.

O Orador: — Nesse caso eu peço a v. Ex.ª que me reserve a palavra para a Sessão seguinte.

O Sr. Presidente: — Fica-lhe reservada. A Camara vai formar-se em Sessão secreta em virtude da disposição do artigo 10.º do Acto Addicional á Carta.

Sendo quasi quatro horas tornou-se a Sessão publica.

O Sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que vinha para hoje. Está levantada a Sessão. — Eram quatro horas da tarde.

O 1.º REDACTOR

J. B. GASTÃO

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