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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Sessão de 19 de maio de 1868
PRESIDENCIA DO SR. JOSÉ MARIA DA COSTA E SILVA
Secretarios — os srs.
José Tiberio de Roboredo Sampaio.
José Paria Pinho de Vasconcellos Soares de Albergaria.
Chamada — 74 srs. deputados.
Presentes á abertura da sessão — os srs.: Fevereiro, Agostinho de Ornellas, Alvaro de Seabra, Annibal, Braamcamp, Costa Simões, Ferreira de Mello, Villaça, A. de Azevedo, Bernardino de Menezes, Falcão de Mendonça, Correia Caldeira, Gomes Brandão, Silva e Cunha, Barros e Sá, Azevedo Lima, A. José de Seixas, Falcão e Povoas, Antonio Pequito, Magalhães Aguiar, Costa e Almeida, Torres e Silva, Montenegro, Barão da Trovisqueira, Belchior Garcez, Cunha Vianna, B. F. Abranches, Carlos Bento, C. Vieira da Mota, Conde de Thomar (Antonio), Pereira Brandão, E. Tavares, F. F. de Mello, Albuquerque, Couto, Silva Mendes, Francisco Dias Lima, Moraes Pinto, Rolla, Meirelles Guerra, Santos e Silva, Assis Pereira de Mello, João de Deus, Gaivão, Mendonça Cortez, João Manuel da Cunha, Pinto de Vasconcellos, Calça e Pina, Fradesso da Silveira, José Antonio Maia, Galvão, Bandeira de Mello, Correia de Oliveira, Pinho, Sousa Monteiro, Carvalho Falcão, Pereira de Carvalho, Costa e Silva, Achioli de Barros, Ferraz de Albergaria, Rosa, José de Moraes, Batalhoz, Tiberio, Levy, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Mota Veiga, Manuel José Julio Guerra, Aralla, Pereira Dias, Pedro Augusto Franco, Raymundo Venancio Rodrigues, Sabino Galrão, Thomás Lobo.
Entraram durante a sessão — os srs.: Rocha París, Alves Carneiro, Sá Nogueira, Ferreira Pinto, Antas Guerreiro, A. J. Rocha, A. José Teixeira, Arrobas, Faria Barbosa, Araujo Queiroz, Lopes Branco, Falcão da Fonseca, Augusto de Faria, Saraiva de Carvalho, Testa, Custodio Freire, Silva Cabral, Faustino da Gama, Coelho do Amaral, Francisco Manuel da Rocha Peixoto, Silveira Vianna, Van-Zeller, G. de Barros, Noronha e Menezes, Silveira da Mota, Innocencio José de Sousa, Freitas e Oliveira, Almeida Araujo, João Antonio Vianna, Mártens Ferrão, João Maria de Magalhães, Aragão Mascarenhas, Ribeiro da Silva, Joaquim Pinto de Magalhães, Gusmão, Pinto da Silva, Costa e Lemos, Mardel, Sette, Teixeira Marques, Frazão, José Maria Lobo d'Avila, Rodrigues de Carvalho, Menezes Toste, José Paulino, Pinto Basto, Ferreira Junior, Balthasar Leite, M. B. da Rocha Peixoto, Penha Fortuna, Lavado de Brito, Quaresma, P. M. Gonçalves de Freitas, Ricardo de Mello, Theotonio Bruges, Deslandes, Visconde dos Olivaes.
Não compareceram — os srs.: Antonio Luiz de Seabra Junior, Fernando de Mello, F. Luiz Gomes, Bessa, Gaspar Pereira, Blanc, Baima de Bastos, Judice, Ayres de Campos, Albuquerque Caldeira, Faria Guimarães, Joaquim Thomás Lobo d'A vila, Klerk, José Dias Ferreira, Lemos e Napoles, José Maria de Magalhães, Silveira e Sousa, Coelho do Amaral, Mathias de Carvalho, Sebastião do Canto, Scarnichia.
Abertura — Ao meio dia e um quarto. Acta — Approvada.
EXPEDIENTE
A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA
Officios
1.° Do ministerio das obras publicas, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Antonio Roberto de Oliveira Lopes Branco, diversos esclarecimentos relativos ao porto artificial em Leixões.
A secretaria.
2.° Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. Eduardo Tavares, uma nota das estradas, que relativamente aos concelhos de Almada, Seixal e Cezimbra foram classificadas, pela commissão de viação municipal, como estradas municipaes de 1.ª classe.
A secretaria.
Representação
De um cidadão da cidade do Porto, pedindo a alteração das disposições do codigo civil na parte que diz respeito á liberdade de testar.
A commissão de legislação.
Requerimentos
1.° Requeiro que pelo ministerio do reino sejam enviados a esta camara os esclarecimentos seguintes:
I Qual a somma dos donativos colhidos em subscripções publicas no reino e estrangeiros a favor da muito notavel villa da Praia da Victoria, por occasião da horrivel catastrophe que assolou a mesma villa em 15 de junho de 1841.
II Nata dos mesmos donativos, que foram remettidos á auctoridade respectiva no districto de Angra do Heroismo, ou á commissão central na ilha Terceira, para ali serem despendidos.
III Nota da despeza feita com a arrecadação, cobrança e remessa dos mesmos donativos. = Theotonio Simão Paim de Bruges = Menezes Toste.
2.° Requeiro que, pelo ministerio dos ecclesiasticos, seja enviada a esta camara uma relação dos ecclesiasticos e mais individuos, que servem as trinta e sete parochias que compõem o districto de Angra do Heroismo, com designação dos ordenados que recebem. = Bruges = Menezes Toste.
3.° Requeiro, que pelo ministerio do reino me sejam dados esclarecimentos sobre o numero de escolas de instrucção primaria, tanto de um como de outro sexo, existentes no Algarve, e igualmente se me dêem esclarecimentos sobre o numero das que se acham vagas por falta de professores. = O deputado por Loulé, Manuel Quaresma Limpo Pereira de Lacerda.
3.° Requeiro que seja enviada, com urgencia, a esta camara • copia das actas da commissão externa, encarregada de propor os alvitres convenientes para o melhoramento da fazenda publica. = Costa e Almeida = José de Moraes Pinto de Almeida.
5.° Requeiro que, pelo ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, seja enviada a esta camara a relação dos ecclesiasticos que, no bispado de Angra, accumulam prebendas, beneficios ou quaesquer empregos, e os respectivos ordenados, com designação da importancia de cada um destes. = Theotonio Simão Paim de Bruges = Menezes Toste.
6.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, se mande a esta camara uma nota indicando a distancia exacta do traçado definitivo da estrada de Murça para Mirandella pelo sul das serras da Ganaia e Santa Comba, declarando-se qual o dia em que foi aberta á exploração a estrada de Mirandella para Bragança. =. Augusto Cesar Falcão da Fonseca, deputado pelo circulo de Extremoz.
7.° Requeiro que, pelo ministerio dos negocios da guerra, seja remettido, com urgencia, a esta camara, um mappa com a declaração do numero das praças de pret de cada um dos corpos do exercito que sabem ler, escrever e contar, e o numero daquellas que ignoram absolutamente, eu em parte, estes elementos de instrucção primaria. = O deputado, Carlos Bento da Silva.
8.° Requeiro que, pela repartição competente, sejam remettidos a esta camara, com brevidade, os seguintes esclarecimentos:
I Nota dos predios situados em Lisboa, designando as ruas, cujo rendimento foi adjudicado á fazenda nacional para pagamento de dividas ao thesouro;
II Qual a divida primitiva, additando-lhe a importancia das custas das execuções até ao dia 31 de dezembro de 1867;
III Qual o estado d'essa divida em 31 de dezembro de 1867, com relação a cada um dos referidos predios;
IV Qual o anno em que começou o pagamento da amortisação;
V Qual o rendimento annual d'esses predios, singularmente, no 1.° anno da amortisação, e bem assim no anno de 1867. = O deputado por Extremoz, Augusto Cesar Falcão da Fonseca.
9.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja enviada a esta camara a nota seguinte:
I Quantos kilometros de estradas, com designação de ordens ou classes a que pertencem, se têem construido na ilha Terceira desde 1 de julho de 1859 até 30 de junho de 1867;
II Quaes as obras de arte na mesma ilha construidas, no mesmo lapso de tempo e logares aonde;
III Quaes as despezas feitas com as indicadas construcções, com o material e com o pessoal, designadamente em cada uma das obras de arte já construidas. = O deputado, Theotonio Simão Paim de Bruges.
10.° Requeiro que sejam remettidos a esta camara, pelo ministerio da justiça, • com urgencia, todos os documentos officiaes sobre a concessão feita á parochia de Santo André da villa de Mafra, da igreja do extincto convento dos Arrabidos da mesma villa; o que teve logar no anno de 1834 ou 1835; e bem assim quaesquer outros documentos que porventura existam conducentes a annullar aquella conces-
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são. = O deputado pelo circulo de Mafra, Sabino José Maltez dos Anjos Galrão.
11.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja remettida a esta camara, com urgencia, toda a correspondencia official, que houve ultimamente entre a camara municipal de Mafra, o governo civil de Lisboa e o conselho de saude, sobre a restituição do cemiterio da parochia ao seu antigo local, junto á igreja velha. = O deputado por Mafra, Sabino José Maltez dos Anjos Galrão.
12.° Requeiro que, pelo ministerio da guerra, se me informe:
I Quaes as obras que se têem feito na 2.ª divisão militar nos tres annos economicos ultimos, e no que vae correndo, dirigidas pelo respectivo engenheiro militar;
II Qual a importancia d'essas obras, ou o seu orçamento, não estando ainda concluidas;
III Quaes os vencimentos do respectivo engenheiro n'esse periodo, soldo, gratificação, ajuda de custo, forragens, etc... =Albuquerque Couto, deputado por Mangualde.
13.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, se me informe, com urgencia:
I Quantos requerimentos subiram do districto de Vizeu ao mesmo ministerio, nos annos civis de 1866, 1867, e no 1.° trimestre do corrente anno, pedindo licenças para construcção ou reedificação de casas e vedação de propriedades, junto ás estradas reaes;
II Em quantos houve divergencia entre as informações do respectivo director, e as resoluções que se tomaram;
III Quantos se acham ainda na respectiva repartição por falta de promoção dos requerentes. =Albuquerque Couto, deputado por Mangualde.
Foram remettidos ao governo.
Notas de interpellação
1.ª Requeiro que seja prevenido o ex.mo sr. ministro da justiça para responder, com urgencia, a uma interpellação sobre o regulamento do registo predial de 14 de maio de 1868. — A. A. Ferreira de Mello.
Mandou-se fazer a devida participação.
2.ª Tendo o sr. deputado Barros e Sá declarado, na sessão de 12 do corrente, que desejava interpellar o sr. ministro da justiça sobre a execução que tem sido dada ao decreto de 2 de janeiro de 1862, requeiro ser inscripto para tomar parte n'esta interpellação. =Faria Blanc.
Foi inscripto.
SEGUNDAS LEITURAS
Projecto do lei
Senhores. — Sendo certo que da limpeza e conservação do aceio das habitações muito depende a salubridade dos povos;
Vendo que em Lisboa alguns proprietarios, usufructuarios e adjudicatários são réprobos á execução das posturas da camara municipal, relativas á limpeza externa dos predios e canalisação parcial dos mesmos, em menoscabo de intimações feitas e multas applicadas;
E sendo por todos notorio o proficuo resultado obtido pela carta de lei de 16 de julho de 1863;
Tenho a honra de submetter á apreciação da camara dos senhores deputados, como additamento á referida carta de lei, o seguinte projecto:
Artigo 1.° E concedido á camara municipal de Lisboa o direito de mandar fazer, por sua conta, todas as obras de limpeza e canalisação de predios, cujos donos, usufructuarios e adjudicatários não as executem depois de intimados na conformidade das posturas.
Art. 2.° E igualmente concedido á mesma camara o direito do embolso das despezas, que fizer com taes obras, pelo rendimento dos predios que as houverem de ter.
Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala da camara, 18 de maio de 1868. = O deputado por Lisboa (circulo n.° 112), José Maria Frazão.
Foi admittida, e enviado á respectiva commissão.
O sr. Secretario (José Tiberio): — Estão sobre a mesa as contas da junta administrativa durante o intervallo da sessão, para serem remettidas á respectiva commissão.
Leu-se na mesa a seguinte
Proposta
Proponho que seja nomeada pela mesa uma commissão, composta de sete membros, com o fim de examinar as contas das differentes repartições do estado, que pelo governo são remettidas a esta camara. = O deputado, Carlos Bento da Silva.
Foi admittida e approvada sem discussão. Leu-se na mesa a seguinte
Proposta
Proponho que a camara resolva se convem recommendar ao governo que active o inventario dos bens sujeitos á desamortisação, e sobreesteja no annuncio da venda dos mesmos bens; com o fim de modificar vantajosamente as leis que regulam aquella desamortisação. = O deputado, Carlos Bento da Silva.
O sr. Carlos Bento: — Pedia a v. ex.ª que a proposta, que foi lida na mesa, e cujo andamento regular é ser remettida á commissão de fazenda, não seja tomada em consideração sem estar presente o governo, porque não queria de maneira alguma que, se os srs. ministros apresentassem quaesquer duvidas sobre a proposta, e eu ficasse convencido da sua procedencia, ella tivesse andamento.
O sr. Braamcamp: — Cabe-me a honra de remetter para a mesa a copia da acta, relativa á eleição do meu particular amigo, o sr. Mendes Leal.
Peço a v. ex.ª que a remetta á respectiva commissão, para quanto antes dar o seu parecer.
O sr. Henrique Cabral: — Mando para a mesa um projecto de lei tendente a alterar o codigo civil na parte relativa á faculdade de dispor de prazos e propriedade allodial, por parte do que tiver herdeiros necessarios, e por esta occasião peço licença para dizer duas palavras.
Reconheço que o codigo civil constitue um assignalado serviço feito ao paiz; mas é certo que as obras humanas não podem ser perfeitas, principalmente as de tão difficil composição e tão graves consequencias.
Entre varias innovações, fundadas umas nos" melhores principios da jurisprudencia moderna, e outras em incontestavel interesse publico, uma ha, que, sem poder abonar-se com algum d'esses titulos, veiu ferir os habitos, sentimentos e justos interesses de uma parte importante do paiz. Refiro-me ás alterações feitas na successão dos prazos.
Sr. presidente, deu-se ha pouco um facto na minha provincia, que é a bella, laboriosa e rica provincia do Minho, facto altamente significativo do profundo e geral desgosto, que causou tal innovação. No periodo decorrido entre a publicação e a promulgação do codigo civil rarissimos foram os proprietarios, chefes de familia, que não dispozeram dos seus bens, por testamento ou doação, e principalmente no ultimo mez; advogados e tabelliães trabalharam noite e dia n'esse serviço, e quasi não fizeram outro.
Opportunamente apresentarei uma estatistica comprovativa d'este facto, a qual convencerá da verdade da minha asserção; mas confio que os meus collegas comprovincianos não me negarão desde já o seu testemunho (apoiados). E sabe v. ex.ª porque era esse movimento e essa inquietação, e o que significavam? Era porque o codigo civil permitte que os prasos nomeados antes da sua promulgação conservem a mesma natureza em poder dos emphyteutas em quem estiverem nomeados; e significavam o desejo ardente de conservar indiviso o patrimonio da familia; significavam o receio de que uma modificação futura no codigo viesse encontrar esse patrimonio já desmembrado e talvez vendido; significavam a reacção natural dos direitos menoscabados de pae e proprietario.
Concorde com essas idéas e sentimentos, elaborei o projecto que mando para a mesa, e que peço a v. ex.ª mande remetter á illustre commissão de legislação, cuja attenção e solicitude peço sobre tão importante objecto.
O sr. Eduardo Tavares: — Pedi ha dias a v. ex.ª, sr. presidente, o favor de dar o devido destino a dois requerimentos que mandei para a mesa solicitando alguns esclarecimentos pelo ministerio das obras publicas, a fim,de me habilitar a fallar opportunamente com perfeito conhecimento de causa ácerca da questão, que reputo importante, da viação nos concelhos que constituem o circulo 107, que tenho a honra de representar n'esta casa.
Acabando de receber agora um d'esses esclarecimentos, que é uma nota das estradas dos concelhos de Almada, Seixal e Cezimbra, que foram classificadas como municipaes de 1.ª classe pela respectiva commissão de viação, nota de exiguas dimensões, peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se concede que tal documento seja incorporado na sessão e publicado, conseguintemente, no Diario de Lisboa.
Visto que estou com a palavra, vou mandar para a mesa tres requerimentos pedindo diversos esclarecimentos ao governo.
Dois referem-se á exagerada percentagem da contribuição predial paga, em 1867, pelos contribuintes dos concelhos que me honraram com os seus suffragios. Desejo saber, sr. presidente, se em tal objecto, aliás importantissimo, foram devidamente zelados os interesses dos povos, cujo representante sou, ou se se deixou correr á revelia causa tão digna de ser tutelada por quem os devia e podia proteger.
O primeiro requerimento é o seguinte:
« Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja enviada com brevidade a esta camara uma nota da percentagem que, respectivamente á contribuição predial, pagaram os concelhos de Almada, Cezimbra e Seixal, em 1866 e em 1867.
« O mesmo com relação ao concelho de Lisboa.»
O segundo requerimento tem por fim collocar-me em circumstancias de poder devidamente aferir o grau de zêlo com que, por ventura, foram por muito tempo protegidos os interesses mais vitaes dos meus constituintes. Vou le-lo.
«Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja enviada a esta camara, com a possivel brevidade, uma copia da acta da sessão da junta geral do districto de Lisboa, em que se tratou definitivamente da distribuição dos contingentes da contribuição predial, relativos aos concelhos de Almada, Seixal e Cezimbra para 1867.»
O terceiro requerimento respeita a assumpto de uma natureza muito diversa, mas que reputo de muita importancia. Entendo que é importante tudo quanto prende com a questão economica. Refere-se tal requerimento a uma lei moderna sobre encarte dos donatarios dos bens da corôa e fazenda. Fallo da lei de 21 de abril de 1866, que prorogou por seis mezes a faculdade d'esse encarte. Desejo saber quaes os donatarios dos bens da corôa e fazenda que se aproveitaram do beneficio de tal lei, e quaes os bens e direitos dominicaes que têem sido incorporados nos proprios nacionaes, por não se terem os seus possuidores aproveitado do referido beneficio.
Este objecto não póde ser indifferente a uma camara que, de accordo com a fazenda publica, anceia por ver resolvida a questão de fazenda. Do fiel cumprimento da parte penal da alludida lei de 21 de abril de 1866 muitos valores podem vir para a fazenda nacional.
Eis o requerimento:
«Requeiro que, pelo ministerio dos negocios da fazenda, seja remettida, com a possivel brevidade, a esta camara, uma relação dos donatarios da corôa ou fazenda encartados posteriormente á lei de 21 de abril de 1866, e outra dos bens ou direitos dominicaes que, em virtude da mesma lei, tiverem sido incorporados nos proprios nacionaes por não se terem os seus possuidores aproveitado, dentro do respectivo praso, do beneficio que tal lei lhes facultou.»
Termino pedindo á camara que permitta a publicação da nota das estradas municipaes de 1.ª classe, relativas aos concelhos de Almada, Seixal e Cezimbra, estradas que a respectiva commissão de viação classificou como taes, como no-1'o informa a nota do ministerio das obras publicas, que tenho presente.
O sr. José de Moraes: — Quero tão sómente fazer uma declaração identica a outras por mim feitas n'esta casa desde que tenho a honra de ser deputado.
Vejo-me obrigado a impugnar os requerimentos para publicações no Diario, porque ellas trazem uma enorme despeza. Voto e hei de votar sempre contra taes publicações.
Os antecessores de v. ex.ª, sr. presidente, sabiam quanto tinham de pagar todos os mezes á imprensa nacional.
Os srs. deputados, quando pedem a publicação dos papeis que apresentam, dizem sempre que são poucas linhas, mas quando se recebe no fim do mez a conta da imprensa, é que se vê que não são poucas palavras, ou poucas linhas, porque a somma das despezas é grande e bem grande.
O sr. Eduardo Tavares: — Parece-me que as observações, que acabou de fazer o sr. José de Moraes, atacam mais o principio das economias do que a publicação do pequenissimo documento que desejo ver estampado no Diario de Lisboa; e, para que não faça impressão no animo da camara o que o illustre deputado acaba de dizer, advertirei que tal documento occupará, quando muito, trinta linhas da folha official.
Qualquer deputado, fallando n'esta camara cinco minutos, custa ao estado 12500 réis; a publicação da minha proposta custará apenas alguns vintens.
Dou muito valor a esse documento, porque elle o tem para os povos que me honro de representar aqui. A publicação d'elle será uma maneira facil de lhes fazer constar quaes as estradas, parte das quaes poderia estar feita, se diligencias e esforços bem dirigidos houvessem aproveitado em beneficio d'esses povos as disposições beneficas da lei de 6 de junho de 1864.
Os concelhos do circulo 107, no que toca a viação, têem sido completamente esquecidos, e em alguns d'esses concelhos não ha exemplo nem memoria de um auxilio qualquer, por parte dos cofres do estado, para qualquer obra de utilidade publica.
Não desejo tomar mais tempo á camara. Quero continuar a merecer a benevolencia do sr. José de Moraes, acatando o principio das economias. Decida a camara como quizer. Eu fiz o meu dever.
Posto o requerimento á votação foi rejeitado.
O sr. Costa e Almeida: — Pedi a palavra, logo depois de haver usado d'ella o meu collega e amigo o sr. Henrique Cabral, e a rasão foi porque tenho de mandar para a mesa uma representação assignada por 295 proprietarios e lavradores, pertencentes ao circulo que tenho a honra de representar n'esta casa, os quaes pedem a esta camara que altere as disposições do codigo civil no sentido que acabou de indicar o meu illustre collega.
Vou mandar a representação para a mesa e atrevo-me a acompanha-la de um projecto de lei, regulando esta materia. Não assignei o projecto do meu nobre amigo e collega o sr. Henrique Cabral, não por não estar de accordo com as idéas apresentadas por s. ex.ª, mas porque vou mais longe.
Peço licença a v. ex.ª para não ler os considerandos do relatorio, e lerei apenas os, ultimas disposições, que considero deverem ser submettidas á apreciação da illustre commissão de legislação, e depois á approvação d'esta camara; mas direi algumas palavras para mostrar a rasão d'esta representação e os fundamentos que tomei para me atrever a propor este projecto á camara.
V. ex.ª e a camara sabem que, pela jurisprudencia anterior ao codigo civil, o testador que tinha herdeiros necessarios, alem da faculdade que a lei lhe conferia de poder dispor da terça parte dos seus bens partiveis, podia designar quaes os bens do seu casal que deviam compor essa terça, comtanto que não fossem as melhores propriedades do casal.
Pela mesma jurisprudencia era costume nas terras de provincia, principalmente entre lavradores, o pae nomear todos ou parte dos bens immoveis do casal a um dos filhos, com obrigação de compor os outros a dinheiro.
Emfim pelas disposições anteriores ao codigo civil o pae que tinha herdeiros necessarios podia nomear os prazos de livre nomeação, salva a obrigação de conferencia do valor dos comprados, ou do valor das bemfeitorias nos bemfeitorisados, e nomea-los em um dos filhos, impondo ou deixando de lhe impor a obrigação de compor os outros a dinheiro.
Esta jurisprudencia foi em parte esquecida pela disposição do codigo civil, com relação á liberdade do testador designar quaes os bens que deviam compor a sua terça, e com relação á liberdade de nomear os seus bens de raiz a um dos filhos, salva a obrigação de dar tornas ou legitimas em dinheiro aos outros irmãos; porque não só me parece que em parte nada diz o codigo civil, mas tambem porque n'outra parte condemna esta doutrina nas disposições dos artigos n.ºs 1:784, 1:790, 2:126 e seguintes.
A repulsão d'estes direitos deixados aos paes pela antiga jurisprudencia não harmonisa com a disposição do artigo 2:107.°, que mostra um grande respeito pelas doações em vida, não a sujeitando, se quer, á obrigação da conferencia em substancia, mas esta em harmonia com as disposições positivas, pelas quaes o codigo tolhe aos paes a nomeação dos seus prazos de livre nomeação, designadamente nos artigos 1:662.° e 1:694.º
Ora, é contra este cerceamento da liberdade de testar que os povos do circulo, que tenho a honra de representar, vem representar a esta camara.
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Estou certo que muitas outras representações dos povos das provincias do norte virão acompanhar esta primeira representação, que tenho a honra de apresentar á camara. Já tenho esta representação ha muitos dias em meu poder, e te-la-ía já apresentado, se não desejasse ouvir sobre esta materia a opinião do sr. ministro da justiça, a quem particularmente preveni de que teria de apresentar esta representação, e communiquei as alterações que propunha, no meu projecto de lei, nos diversos artigos do codigo.
Que um pae não possa deixar a sua casa a um só dos filhos, deixando os outros na miseria, explica-se, porque é a lei lembrando ao pae os seus deveres, e erguendo uma barreira ao esquecimento d'esses deveres; mas que elle não possa escolher d'entre seus filhos aquelle que julgue mais apto para lhe succeder na administração de sua casa, com obrigação, já se vê, de dar as legitimas ou tornas aos outros irmãos, não se explica, não se justifica; e nada lucra com isso a sociedade nem a/familia, antes, pelo contrario, perde. Que lucra o estado em tolher este direito aos paes? Que lucra a sociedade em que, segundo as disposições do codigo civil, pelo que respeita ás licitações, o fallecimento do pae dê occasião a que se estabeleça um campo de batalha entre os filhos? Que lucra em que o amor paterno, a previdencia do pae, o amor á propriedade, o esforço pela sua conservação, seja extincto completamente no campo da licitação pelo seu fallecimento? Nada lucra com isto nem o estado nem a sociedade (apoiados).
A propriedade geralmente no Minho é essencialmente dividida; esta é uma condição que resulta não só da natureza geológica e orographica do solo, mas tambem da natureza da producção d'aquelle paiz. E alem de n'aquella provincia haver este grande defeito na constituição da propriedade, a pratica das doutrinas do codigo civil n'esta parte havia de mostrar-nos que as propriedades geralmente pequenas se haviam de tornar ainda mais divididas, levando comsigo todos os inconvenientes da excessiva divisibilidade da propriedade.
Por todas estas rasões, e tambem pela desharmonia que me parece haver entre as disposições do codigo civil e o respeito ás doações em vida (a que já alludi), proponho que seja permittido aos paes não só tomarem quaesquer bens da sua herança para constituirem a sua terça, disposição que já estava estabelecida na jurisprudencia anterior, mas tambem possam deixar todos ou parte dos bens immoveis a um dos filhos, salva a reposição do valor para inteirar as legitimas aos restantes. Até aqui são as idéas da representação que tenho a honra de mandar para a mesa, mas eu vou mais longe ainda.
Prende com estas disposições a que me refiro uma outra de uma grande importancia no Minho.
O artigo 1:140.° do codigo civil teve em vista segurar o dote da mulher constituido em dinheiro, para evitar que o dote seja simulado e phantastico, por não ser do marido nem da mulher o dinheiro, mas sim de um terceiro que o empresta só para fazer officio do corpo presente na escriptura. O codigo pois obriga a empregar esse dinheiro, tres mezes depois do casamento, na compra de bens immoveis, ou em inscripções de assentamento, ou em acções de companhias, ou dado a juros com hypotheca.
Porém deixa em duvida a redacção d'este artigo, se este emprego do dote em dinheiro, que a lei permitte seja destinado a acquisição de bens immoveis, comprehende tambem os bens immoveis que o marido já possuia; porque é possivel que o marido seja aquelle que, segundo o antigo costume no Minho, fique com* a casa, ficando obrigado a satisfazer as legitimas dos irmãos.
Por consequencia é preciso que este ponto fique completamente esclarecido, no sentido do marido se julgar auctorisado a empregar o dote da mulher em solver os encargos do seu casal.
Em vista da disposição do artigo 1:140.° do codigo, entra-se em duvida se aquella conversão em bens immoveis comprehende os bens que o marido já possuia, e é por isso que eu no meu projecto proponho uma alteração ao codigo para tirar todas as duvidas.
Sr. presidente, um codigo nunca póde ser uma transcripção dos puros principios da philosophia de direito, mas sim uma justa combinação d'estes principios com os usos e costumes dos povos, cujas relações elle é destinado a regular.
Além d'isso um bom codigo deve ter em vista principalmente a natureza da propriedade e do solo das diversas provincias, a sua agricultura e capacidade productora, porque todos sabem a differença que ha nos systemas de cultura e na constituição da propriedade; e para apontar exemplos não é necessario ir fóra do paiz, visto que os temos de casa. Basta comparar as propriedades das provincias do norte com as regiões do sertão e do sul, e examinar as condições geologicas e agricolas das diversas provincias, para se reconhecer a absoluta necessidade de se fazer alguma differença na constituição e modos de ser da propriedade d'essas diversas regiões.
A instituição emphyteutica na provincia do Minho tem sido considerada como uma das principaes causas da riqueza agricola d'esta região, da densidade da sua população, e dos habitos de trabalho, economia e industria, que contrastam até certo ponto com os habitos um pouco menos laboriosos e emprehendedores das populações do sul, habitos que em uns e outros são tambem resultantes da natureza do clima e do solo.
Eu estou de accordo em apoiar as doutrinas do codigo civil pelo que respeita á nova organisação dada á emphyteuse e á reducção d'ella a um typo geral, comtanto que as vantagens economicas e agricolas da emphyteuse não sejam completamente perdidas. Ha Um meio simples de conservar estas vantagens, e é isto que propõem os meus constituintes na sua representação e que eu tenho a honra de consignar no projecto de lei que vou mandar para a mesa.
Vou ler apenas as disposições principaes d'este projecto (leu).
Estive indeciso sobre se deveria pedir que esta representação e este projecto fossem enviados primeiramente á commissão externa de jurisconsultos, nomeada para propor as alterações que a experiencia fosse mostrando ser necessario fazerem-se no codigo civil. Fallei n'esta materia ao sr. ministro da justiça, que sinto não ver presente; mas a final entendi que não devia esperar por ouvir o parecer d'essa illustrada commissão e que devia enviar já a representação e o projecto á nossa commissão de legislação.
Aproveito tambem a occasião para mandar para a mesa algumas propostas de alterações a artigos do codigo civil, que não têem por objecto senão aclarar o seu sentido e tirar todas as duvidas e ambiguidades, que resultam da maneira como alguns artigos do codigo estão redigidos. Dispenso-me de as ler, porque estou certo de que a illustre commissão de legislação tomará estes alvitres na consideração que bem lhe merecerem.
Esta materia sobre que eu fallei é de um alto interesse para a provincia do Minho. Invoco o testemunho de todos os deputados, que pertencem áquella provincia, para que me digam se isto é ou não verdade, se estas alterações feitas no codigo civil não vieram produzir uma profunda revolução no modo de ser, gostos e habitos daquelles povos (apoiados). O codigo civil parece que não teve em vista considerar o modo de ser individual de cada provincia, mas olhou todo atravez de um só e unico prisma; não attendeu a que, se o systema agricola do Alemtejo exige as grandes herdades e a grande cultura, este systema e as suas vantagens estão plenamente realisados no Minho e nas mais provincias do norte pela emphyteuse, que é a colonisação em ponto pequeno, mas a colonisação antiga; e eu estou convencido, mesmo historicamente fallando, de que a origem da emphyteuse acha-se na colonisação. Não foi senão um arrendamento a longo praso, e que depois a interpretação dos jurisconsultos veiu tornar obrigatorio, e com a obrigação da renovação.
Concluo chamando a attenção da illustre commissão de legislação sobre esta materia, que é importantissima e de um alto interesse para os povos, que eu tenho a honra de representar, e geralmente para toda a provincia do Minho (apoiados).
O sr. Bernardino de Menezes: — Mando para a mesa a seguinte nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas (leu).
A estrada de que trata a minha interpellação foi decretada em fevereiro de 1859. Houve então um emprestimo da companhia Utilidade publica para ser applicado ás obras da estrada, o governo recebeu alguns contos de réis, distrahiu-os e até hoje nem um millimetro foi construido.
O sr. Almeida e Araujo: — Mando para a mesa uma proposta renovando a iniciativa de um projecto de lei (leu).
Peço á illustre commissão de fazenda que dê o seu parecer a respeito d'este projecto com a maior brevidade possivel, porque é indispensavel a concessão de que trata o projecto para se levarem a effeito obras importantes no concelho, a que o mesmo projecto se refere.
O sr. Carlos Bento: — Mando para a mesa um requerimento.
O sr. Fradesso da Silveira: — Por parte da commissão de commercio e artes mando para a. mesa dois requerimentos, pedindo algumas informações de estatistica.
O sr. Carlos Testa: — Pedi a palavra para remetter para a mesa um requerimento de Filippe Roberto da Silva Stockler, que se julga offendido no seu direito de propriedade a titulo de utilidade publica.
Como acho o requerimento fundado em rasões de justiça, recommendo-o á attenção da camara, e peço que seja remettido á commissão competente.
O sr. Sá Nogueira: — Mando para a mesa uma nota de que desejo interpellar o sr. ministro das obras publicas sobre a administração do caminho de ferro do sueste e sobre a continuação da sua construcção.
ORDEM DO DIA
CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO DO PARECER SOBRE A ELEIÇÃO DO 2.º CIRCULO DE ANGOLA
O sr. Presidente: —Na sessão antecedente tinha pedido a palavra para um requerimento o sr. Falcão da Fonseca.
O sr. Falcão da Fonseca: — O requerimento que eu queria fazer hontem era para a prorogação da sessão a fim de se votar o parecer da commissão; mas como não póde ter logar, esta prejudicado.
O sr. Presidente;—- Então tem a palavra o sr. Levy.
O sr. Levy (na tribuna): — No estado em que se acha esta discussão não subo a este logar para cansar por muito tempo a attenção da camara, nem me sobram recursos oratorios que podessem compensar a extensão que eu desejaria, visto a importancia do assumpto, dar ás considerações que sou obrigado a fazer.
Conto com a benevolencia que mais de uma vez me tem dispensado a camara, e, promettendo ser breve e conciso, entro, sem divagar, na questão que nos occupa, apresentando os argumentos produzidos contra esta eleição, e dando as respostas que na minha intelligencia parecem concludentes.
Servirão ao mesmo tempo as considerações que passo a expor á camara como de um resumo do estado da questão.
Os argumentos contra a eleição do 2.º circulo de Angola reduzem-se a cinco; e vou expo-los na sua nudez.
Não houve eleição (primeiro argumento); mas quando a houvesse, era tudo 'nullo, e porque? Segundo argumento: porque não houve commissão de recenseamento; e porque, quando a tivesse havido (terceiro fundamento), todos os seus actos eram nullos, porque não tinha sido presidida pelo chefe militar do districto, a quem o decreto de 11 de janeiro de 1853 dá a presidencia d'essa commissão. Não houve recenseamento (quarto argumento); mas quando o houvesse estava mal feito (quinto fundamento), porque se incluíram n'elle muitos individuos que n'elle não podiam figurar.
Este ultimo argumento desenvolve-se em tres, que são as rasões produzidas para mostrar que o recenseamento tinha mais gente do que devia ter.
a Porque é impossivel haver na assembléa de Ambaca 3:981 eleitores (que tantos votos teve o deputado eleito).
Porque só ha em Ambaca 1:160 individuos que paguem 1$000 réis de dizimos.
e Porque a população de Ambaca não comporta tantos eleitores, e nem é possivel haver lá tal numero de individuos que saibam ler e escrever.
Para provar a legalidade e validade d'esta eleição não é preciso mais do que ter por um lado a lei, e pelo outro os proprios documentos impressos no folheto espalhado por quem impugna a eleição, e que são copias exactas dos que se acham juntos ao processo eleitoral.
Examinemos esses documentos, e comparemo-los com a lei que rege o acto eleitoral; nada mais é preciso.
Vamos ao primeiro argumento.
«Não houve eleição» disse o sr. Belchior José Garcez; tudo isto foi uma farça; imaginou-se uma eleição que nunca se fez, etc...
A prova de que houve eleição esta nos documentos, 'de que o sr. Pinto de Magalhães hontem citou alguns trechos, e a que hoje juntarei outros.
Aqui esta o documento n.° 7, a pag. 12. E o recibo de Candido Gonçalves do Espirito Santo, que aceitou o protesto.
Este nome de Espirito Santo serviu aqui antes de hontem para fazer espirito, mas eu não irei para esse terreno; uma discussão, cujo resultado é dar ou tirar direitos a um individuo, é uma cousa muito grave e séria (apoiados). Este documento n.° 7, que é, repito, o recibo passado pelo cidadão que tinha aceitado aquelle protesto, esta reconhecido por tres protestantes.
Quer a camara saber o que elles dizem: «Reconhecemos verdadeira a assignatura supra, por termos d'ella verdadeiro conhecimento, a qual foi feita na nossa presença, quando o sr. Agostinho dos Santos e Costa o entregou (o protesto) na mesa eleitoral para a eleição de deputados, a que se achava proceãenão na casa, etc...»
Logo este documento n.° 7, produzido por quem combate a eleição, mostra:
1.° Que havia mesa eleitoral constituida.
2.° Que na occasião em que se estava procedendo á eleição é que foi entregue o protesto.
O documento n.° 9, a pag. 14, comquanto seja uma carta particular, não tenho duvida em fazer uso d'elle, porque é de um eleitor que combate a eleição, e produzido pelo auctor do folheto; se não fosse esta circumstancia, eu não me serviria d'ella.
-Diz essa carta: «... por ora nada sei do apuramento, porque hoje continua a eleição, etc...»
Resulta d'este documento, fornecido pelos proprios protestantes, que a eleição se fez, e que tendo começado no dia 4 de agosto, continuara no dia 5; e com effeito continuou por mais. tres.
Temos mais o documento n.° 10, a pag. 15 do folheto, que é outra carta, em que se lê o seguinte:
«O sr. Barreto (é o chefe do districto)... estava doente, e mandou para fazer as suas vezes (na eleição) o famulo do Mendes, etc...»
São pois os proprios impugnadores que se encarregam de mostrar que não só se fez a eleição, mas que o chefe militar do presidio mandou um seu delegado, nos termos da lei, assistir a ella.
Ha outro documento mais curioso, que é o n.° 12 a pag. 17, e este vem mostrar que os argumentos aqui apresentados contra a eleição são contradictorios e por isso são falsos. E uma carta de um individuo de Ambaca para outro de Loanda; não diz que não se fez a eleição, diz que se fez, mas que houve coacção. Eis como elle se expressa:
«... não antecipei o conveniente dos meus amigos, pois embora te-los mandado chamar não conto com elles a tempo... Além d'isso, consta-me que os eleitores que lá existem reunidos foram coagidos com poder pelos commandantes das divisões, etc...»
Note a camara estas circumstancias. Por um lado diz-se e repetiu-se aqui =não houve eleição = =; por outro lado diz-se que a houve, mas que se empregou coacção. Qual das duas asserções é verdadeira? Nenhuma, porque ambas se contradizem.
E note-se mais: disse-se que a eleição era nulla por não ter intervindo a auctoridade militar, e no documento que acabei de ler sustenta-se a nullidade allegando-se que a auctoridade militar andou a arrebanhar os eleitores!
Que serie de contradicções!! Os documentos pois dos proprios protestantes demonstram até á evidencia a falsidade do primeiro argumento, isto é, que realmente houve a eleição.
A segunda accusação consiste em que não houve commissão de recenseamento.
A isto tambem respondem esses documentos do protesto. Elles mostram que existia a commissão de recenseamento, que o seu presidente era Mendes Machado, e que essa commissão mandou em tempo copia d'elle para o governador geral.
Quer a camara ver onde esta a prova de que existia a commissão de recenseamento?
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1.° No documento n.° 3 a pag. 7, que é o despacho já lido pelo sr. Pinto de Magalhães. O chefe militar mandar sempre requerer á commissão de recenseamento.
2° No edital (documento n.° 4) a pag. 8, afixado á porta da casa do chefe militar e assignado pelo presidente da commissão de recenseamento.
3.° No proprio requerimento dos protestantes a pag. 8, onde elles dizem: «Dizem os abaixo assignados, cidadãos eleitores d'este concelho, constando-lhes que se acha assignado na porta da residencia d'este commando um edital em nome da commissão de recenseamento, assignado pelo presidente da mesma Manuel Mendes da Conceição Machado, etc...»
Elles proprios dizem que estava na porta da casa da administração o edital da commissão do recenseamento assignado pelo seu presidente. Como negar pois que existia commissão de recenseamento? Accresce tambem o despacho a pag. 9 do folheto dado pelo chefe a este requerimento que é d'este teor:
«O chefe não tem auctoridade de ordenar á commissão do recenseamento que a eleição seja feita n'este ou n'aquelle logar podem requerer á mesma commissão.»
Mas diz-se (fez-se muita força n'este argumento que é o 3.°) «todos os actos da commissão (se a houve) foram nullos, porque segundo o decreto de 11 de janeiro de 1853, que modificou n'esta parte a lei commum, a commissão, por ser na provincia de Angola, devia ser presidida pelo chefe do districto.
Este argumento, que á primeira vista póde illudir, para nada presta.
Confesso que não foi a auctoridade militar (apesar d'esse decreto), quem presidiu á commissão de recenseamento. Querem saber por que? Por varias rasões que vou adduzir; e talvez ainda haja mais, mas devo ser conciso.
A primeira rasão é porque desde que se publicou esse decreto de 11 de janeiro de 1863, que manda que a commissão de recenseamento fosse presidida nos presidios de Angola pelos chefes militares, entendeu-se, e muito bem, que tal disposição não podia ter applicação nas localidades que não fossem verdadeiros presidios militares, e onde houvesse camaras municipaes que podiam proceder á instituição das commissões do recenseamento (apoiados).
Nas localidades pois onde, como em Ambaca, houvesse camaras municipaes em que se podia dar execução ao decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, que era a lei commum, não se considerou este decreto em vigor. E porque? Por um motivo, que não póde ser desconhecido a todos os homens que são liberaes; porque é muito mais liberal que as commissões de recenseamento sejam presididas segundo o direito commum, que é o decreto de 30 de setembro de 1852, do que pela auctoridade militar(apoiados). Ninguem quereria, penso eu, adoptar para o continente o principio das commissões de recenseamento serem presididas pelo administrador do concelho, ou pela auctoridade militar (apoiados).
A intelligencia, que se deu em Angola ao decreto de 11 de janeiro de 1853, foi confirmada subsequentemente por esta camara, porque approvou sempre desde 1853 até hoje todas as eleições, não sendo as commissões de recenseamento presididas pelo chefe militar.
Esta jurisprudencia constantemente seguida pela camara, e que é a mais notavel, constitue uma interpretação authentica; o salvo o respeito a que nunca sei faltar aos meus collegas, seria um contrasenso, ou antes absurdo, o annullar a eleição por esse fundamento (apoiados).
Mas não é só isto; ha mais ainda. O decreto de 11 de janeiro do 1853, que dava a presidencia das commissões de recenseamento em Angola aos chefes militares dos presidios, foi publicado pelo governo em virtude da auctorisação concedida nó artigo 118.° do decreto eleitoral do 30 de setembro de 1852, o qual permittia ao governo fazer no decreto de 30 de setembro as alterações exigidas pelas circumstancias especiaes das provincias ultramarinas; mas sujeitou ao mesmo tempo o governo a vir dar conta ás côrtes d'essas alterações. Ora o decreto de 11 de janeiro de 1853 nunca foi sujeito á approvação das côrtes, nunca teve sancção legislativa.
Mas ainda quando esse decreto a tivesse tido havia, quanto a mim, caducado em 1859, porque a lei de 23 de novembro d'esse anno é uma lei que regula as eleições, tanto no continente como no ultramar (apoiados), e que revogou todas as disposições geraes ou especiaes anteriores em opposição a ella (apoiados); e essa lei, em materia de recenseamento, considera em vigor, com algumas alterações, o que estava disposto anteriormente no decreto de 30 de setembro de 1852, sem excepção alguma, e com referencia ao decreto de 11 de janeiro de 1853. Portanto, ainda quando tal decreto tivesse tido sancção legislativa, ficou revogado pela lei de 23 de novembro de 1859 (apoiados).
A lei de 23 de novembro de 1859 fez mais, retirou ao governo a faculdade que lhe tinha dado o artigo 118.° do decreto com força de lei de 30 de setembro de 1852, e apenas no seu artigo 27.° lhe permitte fazer a divisão dos circulos eleitoraes nas provincias ultramarinas. Nada mais. E isso mesmo com a condição de a submetter ao corpo legislativo.
Foi por isso que, mandando o governo por decreto de 28 de novembro de 1859 proceder á eleição de deputados em Angola, disse n'esse decreto que se observassem o decreto de 30 de setembro de 1852 e a lei de 13 de novembro de 1859, com referencia ao decreto de 13 de janeiro de 1853.
Mas o sr. Garcez não admitte para Ambaca o direito commum, porque affirmou que lá não havia camara municipal, nem julgado. Não é exacto. O concelho de Ambaca estava fazendo parte da circumscripção municipal do Golungo Alto.
Foi d’ahi desannexado, e ficou constituindo municipio independente, pela portaria do governador geral de 26 de novembro de 1857 (Boletim, n.° 635), approvada pelo governo da metropole em portaria do ministerio da marinha e ultramar de 30 de janeiro de 1858 (Boletim, n.° 663).
Camaras ou commissões municipaes têem sido successivamente nomeadas em Ambaca desde então até hoje. Para não cansar a camara, limitar-me-hei a indicar as portarias dos governadores de 26 de novembro de 1857 (Boletim, n.° 635), de 13 de janeiro de 1860 (Boletim, n.° 745), de 28 de dezembro de 1861 (Boletim, n.° 848), etc...
Além d'isto foi tambem creado em Ambaca um julgado por decreto de 30 de agosto de 1862, que vem na collecção de legislação.
— Mas não houve recenseamento — (quarto argumento dos adversarios). O recenseamento ali esta (apontando para o processo eleitoral), e tanto existiu que para infirmarem o seu valor dizem ser defeituoso.
Esse recenseamento (dizem) esta mal feito, porque comprehende maior numero de eleitores do que devia comprehender, e é este o quinto argumento.
Não admitto nem se póde admittir esse modo de argumentar (apoiados). Nos termos do artigo 104.° § unico do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, a camara não é tribunal de recurso para conhecer do recenseamento.
Os impugnadores, tão habeis em arranjar protestos, tinham a porta aberta para todos os recursos, recorressem em tempo d'esse recenseamento (apoiados). E nem se diga que o recenseamento foi arranjado á ultima hora, por isso que o certificado do chefe do districto, a pag. 7 do folheto, mostra ter sido remettida copia do recenseamento ao governador geral da provincia, em maio, isto é, tres mezes antes da eleição!
Mas eu não fujo da questão mesmo n'esse terreno, e lá vou ataca-la.
Porque tem o recenseamento gente de mais? Porque ha uma certidão do escrivão deputado da junta de fazenda de Loanda, a pag. 13 do folheto, a qual mostra que em Ambaca apenas 1:362 individuos pagam 1$000 réis de dizimo, d'onde deduzem ser por isso impossivel haver 3:981 eleitores.
O sr. Pinto de Magalhães já respondeu triumphantemente a este argumento com o resto da informação do escrivão da junta de fazenda, que o sr. Garcez não leu; mas eu acrescentarei ainda mais alguma cousa.
1 Não se póde argumentar contra o recenseamento com o lançamento da contribuição do dizimo:
1.° Porque no decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, artigo 27.° n.° 1, admitte-se clara e positivamente a hypothese do individuos não figurarem no lançamento, e deverem, apesar d'isso, ser incluidos no recenseamento.
2.° Porque no ultramar em vista, finalmente, do artigo 112.° d'aquelle decreto, são os eleitores apurados não só com respeito ao lançamento da decima, mas tambem em attenção ao dizimo, e a outra qualquer contribuição, ou sómente com respeito á renda presumivel, não havendo contribuição que a demonstre.
É assim devia ser, dando-se no ultramar o abuso (que aliás deve ser fulminado) de haver muita gente que paga contribuições sem figurar no lançamento, com grave prejuizo da fazenda publica.
3.° Porque, alem da contribuição do dizimo, ha as contribuições municipaes, ha as congruas do parocho, ha as passagens do Lucalla, etc.. que não são de tão pouca importancia.
Quer a camara fazer uma idéa do que valem no sertão as contribuições municipaes? A camara do Golungo Alto, limitrophe de Ambaca, foi, ainda não ha muito, mandada metter em processo pelo facto de ter distrahido da receita municipal mais de 3:000$000 réis; e note-se que não era a totalidade da receita municipal, era apenas uma parte d'ella.
Querem tambem saber o que vale o dizimo em Ambaca? Eu vou dize-lo com referencia a epochas em que andava arrematado:
No triennio de 1847-1848 produziu 17:200$000 réis
No de 1851-1853................... 22:040$000 »
No de 1856-1858................... 22:040$000 »
4.° Finalmente, porque não é licito concluir da não inclusão no lançamento para a exclusão do recenseamento.
Se eu tivesse sido excluido do recenseamento pela commissão, e, pagando 30$000 réis de decima, me apresentasse com o meu recibo na occasião da votação na assembléa eleitoral, admittiam-me o voto? Não.
Ora assim como estando incluido no lançamento me não admittem a votar se não estiver recenseado, tambem estando incluido no recenseamento me hão de admittir a votar, embora não esteja incluido no lançamento.
«Congruas de parochos!» O sr. Garcez, e ía-me esquecendo isto, insurrecionou-se contra esta idéa, dizendo que não havia lá nem igrejas nem parochos. A asserção é inexacta. Póde não existir de pé a igreja, porque os governos têem descurado esse negocio; mas se não ha bellos templos, ha duas barracas onde se celebram os officios divinos, e ha duas freguezias, a de Nossa Senhora da Assumpção, e a de S. Joaquim de Maluca.
E impossivel, instam ainda os contrarios, que em Ambaca haja tres mil e tantos eleitores, quando não ha circulo eleitoral no reino com tal numero de eleitores! A rasão, por que não ha circulo no reino que tenha esse numero de eleitores, é porque não ha circulo eleitoral no reino que tenha a população de Ambaca, e que tenha a extensão daquelle concelho, que abrange um territorio superior a metaãe do continente de Portugal!
Acha-se extraordinaria a população de 60:000 almas, e não o é Se a estatistica official fosse feita depois da eleição do sr. Antonio Julio, poderia haver suspeita; mas é anterior, e confeccionada pelas anteriores.
Concorda com a de Lopes de Lima no Ensaio estatistico sobre Angola, publicado em 1846; concorda com a de Sousa Monteiro, no Diccionario geographica do ultramar, publicado em 1849; concorda finalmente com os calculos dos escriptores e viajantes estrangeiros.
O sr. Arrobas leu hontem o que a este respeito diz o celebre dr. Livingstone; o celebre viajante inglez, que não é muito affecto a Portugal, procura sempre apoucar-nos por todos os modos, e cujo testemunho é por isso insuspeito n'este ponto. Livingstone, fazendo a viagem de Moçambique para Angola, esteve em Ambaca; diz = que é o districto mais povoado da provincia de Angola, que tem 70:000 habitantes, e que os pretos ali são os mais instruidos de toda a provincia, sendo excepção haver um que não saiba ler e escrever. Explica este facto, attribuindo-o aos serviços dos capuchinhos, que em tempo estiveram estabelecidos na missão de Caenda, onde fizeram muitos serviços á religião e a Portugal. Depois da extincção das ordens religiosas, diz Livingstone, e diz a verdade, porque o affirmam todos os que têem transitado por aquellas regiões, os negros, que sabem, ensinam os que o não sabem a ler e escrever; individuos que ali têem andado dizem que os carregadores até os momentos de descanso para isso aproveitam.
Mas alem de Livingstone temos mais. Vogel, escrevendo ha poucos annos sobre Portugal e suas colonias, diz a pag. 547:
«Un de leurs établissementsprincipaux (dos capuchinhos), étaitceluide Cáhenda, aunord de Ambaca. Livingstone parte de la reconaissance vive et áurable que ce district a gardée pour les bienfaits des peres, grâce aux quels (note-se bem) tout le monde y sait lire et écrire, les habitants continuant de se l’apprendre mutuellement.»
Não citarei outros testemunhos, como o de Hoefer, que em 1819 calculava perto de 40:000 almas a Ambaca, e invocarei os de casa.
Manuel Alves de Castro Francina, no Itinerario de uma jornada de Loanda ao districto de Ambaca, em 1846, publicado nos Annaes do conselho ultramarino (parte não official, serie 1.ª, de fevereiro de 1854), escreveu o seguinte:
«O povo de Ambaca é talvez o mais civilisado dos nossos districtos e presidios, pois (note-se bem) e raro o preto ambaquista que não saiba ler e escrever, ainda que mal, ou pelo menos assignar o seu nome.»
Temos mais o decreto de 20 de agosto de 1862 que creou o julgado de Ambaca, em cujos considerandos se diz:
«Achando-se determinado pelo artigo 8.° § unico do decreto com força de lei de 30 de junho de 1862, que seja immediatamente constituido em julgado todo o presidio ou districto da provincia de Angola dos administrados pela auctoridade local militar, apenas se mostre reunir as condições necessarias;
«Considerando que o districto de Ambaca é um dos maiores d'aquella provincia, e que, como consta pela informação dada pelo conselheiro presidente da relação de Loanda em 7 de janeiro d'este anno, tem numero mais que sufficiente de pessoas aptas para o exercicio dos cargos municipaes e de julgado e que (note-se bem) quasi todos os seus habitantes sabem ler e escrever:
«Hei por bem determinar que o mencionado districto seja constituido em julgado.»
Temos pois a opinião de auctoridades nacionaes e estrangeiras, a de particulares insuspeitos, e documentos officiaes.
Não era eu obrigado a tratar a questão n'este terreno, porque não póde a camara decidir sobre se os recenseamentos estão bem ou mal feitos; mas como a questão fugiu para esse campo, não quiz deixar do combater o que se disse, porque é inexacto.
Houve ainda um outro argumento que é insignificante, e reduz-se a ter sido a eleição feita em casa de um particular e não na do chefe. A rasão é porque a casa do chefe é um albergue que nada vale, e sem capacidade; escolheu-se por isso a casa do cidadão Mendes Machado, em que sempre se tem feito a eleição, como consta dos respectivos processos eleitoraes.
O sr. Carlos Pacheco Bettencourt, digno juiz de uma das varas da comarca de Loanda, no Relatorio da correcção judicial aos julgados, feita este anno, e agora impresso em Loanda, fallando da casa do chefe de Ambaca, explicou-se por este modo (pag. 20):
«A residencia é uma cubata com mui poucos commodos, já bastante velha, mas reparada bastante pelo actual chefe.»
Queriam que a eleição se fizesse n'uma cubata? Seria ridiculo.
Não devo cansar mais a attenção da camara. Tenho respondido a todos os argumentos, mas peço ainda licença para acrescentar algumas considerações que em minha consciencia entendo serem verdadeiras. Não quero justifica-las com documentos officiaes; podia produzi-los, mas não quero.
Nas outras assembléas eleitoraes do 2.° circulo fizeram-se todos os esforços para que saísse eleito o cavalheiro a quem o resultado da eleição não foi favoravel.
Empregaram-se ainda mais esforços em Ambaca, mas foram inuteis, porque ha ali individuos que arrastam os eleitores, como succede no continente, onde o prestigio moral e a influencia de certos individuos faz decidir da eleição, e esses individuos eram menos affectos ao candidato vencido.
Fez-se a eleição em Ambaca. O portador das actas a custo chegou com ellas a Loanda, porque a sua vida consta-me que perigou, e deve te-la salvo ao haver sido avisado e prevenido, tomando caminho desviado no mato!
Se houve nullidades, foi nas assembléas em que foi votado o candidato Calheiros; mas não influiram no resultado da eleição, porque Ambaca, onde tudo correu regularmente, constitue grande maioria.
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Em Malange, por exemplo, foi um verdadeiro simulacro de eleição; ahi, onde nunca teve mais de 70 recenseados, como se prova por todas as mais eleições, appareceu votado o candidato vencido com 687 votos!! O que succedeu em Malange, succedeu tambem em Dombe Grande, no Duque de Bragança, em Pungo Andongo, etc...
E porque? Porque n'elles fez-se a votação com soldados dos destacamentos ou companhias, e porque no ultramar ha tambem uma especialidade pela qual o sr. Garcez de certo não morre de amores; refiro-me ás ambulancias eleitoraes, que já tivemos no reino em 1845.
Vou concluir para terminar um debate de que a camara já esta fatigada. Entendo porém que esta discussão não tem sido inutil, porque serviu para mostrar que não se podem impunemente fazer asserções completamente inexactas em relação ao estado das nossas colonias.
Comquanto ellas não estejam em grande estado de civilisação, não são todavia tão atrazadas, que não tenham direito a terem representantes n'esta casa, direito que lhes contestou o sr. Costa e Almeida, meu antigo amigo, mas cuja asserção eu lastimei ver formulada n'esta casa poum homem da sua intelligencia e conhecimentos.
Persegue-nos uma triste fatalidade. Quando os estrangeiros mostram vontade de copiar o que temos de bom, é quando fazemos diligencias para acabar com o que elles querem imitar! Estranha-se que tenhamos deputados coloniaes, teve-os a França no tempo da republica, honra lhe seja; acabou com o imperio, mas os homens conscienciosos, quando n'esse paiz escrevem a respeito das colonias (c lá têem elles algumas menos adiantadas do que as nossas), fazem votos por que chegue o dia em que possam tomar parte na representação nacional. Isto prende mais alto, liga com os principios da verdadeira economia e administração colonial. Quem for um pouco lido sobre este assumpto, sabe que esta sciencia tem quatro principios fundamentaes, de um dos quaes deriva a admissão das colonias na representação nacional.
Esses quatro grandes principios são: união politica, solidariedade de interesses, assimilação progressiva, e como termo final, a emancipação administrativa; mas o primeiro passo para a união politica é a existencia dos seus representantes na representação nacional (apoiados).
Tenho dito.
(O orador ao descer da tribuna foi comprimentado por muitos srs. deputados).
O sr. Seixas: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se julga esta materia sufficientemente discutida.
Julgou-se discutida.
O sr. Presidente: — A camara sabe que, em virtude de uma disposição do regimento, esta votação tem de ser secreta.
O sr. Costa e Almeida: — Já que me tiraram a palavra sobre a ordem, uso d'ella sobre o modo de propor, para fazer a seguinte proposta, que póde ser considerada como questão previa (leu).
O sr. Seixas: — Peço o cumprimento do meu requerimento e suas consequencias, do contrario tambem peço a palavra sobre o modo de propor.
O sr. Belchior Garcez: — Sinto que a camara na sua alta sabedoria desse por discutida a materia, quando havia ainda algumas reflexões a fazer sobre os ultimos argumentos produzidos a favor do parecer; mas permittam-me os illustres deputados que tomaram parte na discussão...
O sr. Arrobas: — Se isto esta em discussão, peço tambem a palavra sobre o modo de propor.
O Orador: — Vou já terminar. De tudo quanto se disse concluo eu que, alem das irregularidades que se deram na assembléa de Ambaca, houve muitas outras, por assim dizer, que...
Vozes: — A materia já esta discutida.
O Orador: — Peço a v. ex.ª a permissão de mandar para a mesa a seguinte proposta (leu).
Procedeu-se á votação por espheras, e tendo entrado 126 espheras, foi o parecer approvado por 71 espheras brancas contra 65 pretas.
O sr. Alves Carneiro: — Mando para a mesa os pareceres da 1.ª commissão de poderes ácerca das eleições dos circulos n.ºs 165 (Villa Franca do Campo), 164 (Ribeira Grande), 163 (2.° de Ponta Delgada) e 162 (1.° de Ponta Delgada).
Mando tambem o diploma do sr. deputado eleito o sr. Mendes Leal.
Peço a v. ex.ª que, visto não offerecerem duvida alguma estes pareceres, tenha a bondade de consultar a camara sobre se dispensa a sua impressão, para entrarem desde já em discussão.
O sr. Presidente: — Os srs. que dispensam o regimento, para que entrem já em discussão estes pareceres, tenham a bondade de se levantar.
Foi approvado.
Entrou em discussão o seguinte
Parecer
Senhores. — A vossa 1.ª commissão de verificação de poderes examinou com a devida attenção os seguintes processos eleitoraes:
CIRCULO N.° 165 (VILLA FRANCA DO CAMPO)
Compõe-se este circulo de tres assembléas; a saber: Villa Franca, Villa da Povoação e Villa do Nordeste.
Entraram na urna da assembléa de Villa Franca do Campo 550 listas.
O cidadão Adriano Antonio Rodrigues de Azevedo obteve........................... 549 votos.
Houve n'esta assembléa uma lista branca. Entraram na urna da assembléa da Villa da Povoação 412 listas.
O cidadão Adriano Antonio Rodrigues de Azevedo obteve......................411 votos:
Houve tambem n'esta assembléa uma lista branca. Entraram finalmente na urna da assembléa de Villa do Nordeste 419 listas.
O cidadão Adriano Antonio Rodrigues de Azevedo obteve...........................417 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes.. 2 »
Foi portanto o numero real dos votantes n'este circulo eleitoral 1:379; maioria absoluta, 690.
O cidadão Adriano Antonio Rodrigues de Azevedo obteve......................... 1:377 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes 2 »
Em vista pois d'este resultado, e considerando que este processo eleitoral correu com regularidade e regulares se acham as actas das assembléas primarias e de apuramento geral;
Considerando mais que das mesmas actas não consta que houvesse protesto ou reclamação alguma de que deva tomar-se conhecimento;
Considerando finalmente que o cidadão Adriano Antonio Rodrigues de Azevedo obteve a maioria absoluta do numero real dos votantes de todo o circulo, é por isso a vossa commissão de parecer que esta eleição deve ser approvada e o mesmo cidadão proclamado deputado da nação, visto que apresentou o seu diploma em fórma legal.
CIRCULO N.° 164 (RIBEIRA GRANDE)
Compõe-se este circulo de quatro assembléas; a saber: Divino Espirito Santo, Nossa Senhora da Estrella, S. Pedro da Ribeira Secca e Senhor do Bom Jesus.
Entraram na urna da assembléa do Divino Espirito Santo 277 listas.
O cidadão Frederico Carlos da Silveira Estrella
obteve n'esta assembléa.................144 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes.. 133 »
Entraram na urna da assembléa de Nossa Senhora da Estrella 245 listas.
O cidadão Frederico Carlos da Silveira Estrella
obteve..............'................. 240 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes.. 3 »
O cidadão Francisco Manuel Raposo Bicudo Correia.................................. 2 »
Entraram na urna da assembléa de S. Pedro da Beira Secca 283 listas.
O cidadão Frederico Cardos da Silveira Estrella
obteve...............................281 votos.
Houve n'esta assembléa duas listas brancas.
Entraram emfim na urna da assembléa do Senhor Bom Jesus 262 listas.
O cidadão Frederico Carlos da Silveira Estrella
obteve.............................198 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes.. 64 »
Foi portanto o numero real de votantes em todas as assembléas d'este circulo 1:063; maioria absoluta 533.
O cidadão Frederico Carlos da Silveira Estrella
obteve............................... 863 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes.. 200 »
O cidadão Francisco Manuel Raposo Bicudo Correia.................................. 2 »
Em vista pois d'este resultado, e considerando que o acto eleitoral correu com toda a regularidade, e que as actas, tanto das assembléas primarias como de apuramento geral, se acham legaes e em devida fórma;
Considerando que das mesmas actas não consta de protesto ou reclamação alguma que devesse tomar-se em consideração;
Considerando emfim que o cidadão Frederico Carlos da Silveira Estrella obteve a maioria absoluta do numero real dos votantes de todo o circulo, e que elle tem a capacidade legal para ser eleito:
Por estas rasões é a vossa commissão de parecer que esta eleição deve ser approvada, e proclamado "deputado da nação o referido cidadão, quando apresente o seu diploma em fórma legal.
CIRCULO N.º 163 (2.° DE PONTA DELGADA)
Compõe-se este circulo de cinco assembléas; a saber: Nossa Senhora da Assumpção da Villa do Porto, S. Sebastião dos Ginetes, S. Sebastião da Matriz, Nossa Senhora da Saude dos Arrifes, e S. José.
Entraram na urna da assembléa de S. Sebastião dos Ginetes 107 listas.
O cidadão José da Silva Mendes Leal obteve.. 103 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso Menezes..... 4 »
Entraram na urna de S. Sebastião da Matriz 230 listas.
O cidadão José da Silva Mendes Leal obteve.. 198 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes
Guimarães............................ 29 »
O cidadão Francisco Manuel Raposo Bicudo
Correia.............................. 2 »
O cidadão Clemente Joaquim da Costa...... 1 »
Entraram na urna da assembléa de Nossa Senhora da Saude dos Arrifes 65 listas.
O cidadão José da Silva Mendes Leal obteve.. 49 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso' de Menezes
Guimarães.......................... 25 »
O cidadão Frederico Carlos da Silveira Estrella 1 »
Entraram na urna da assembléa de S. José 225 listas.
O cidadão José da Silva Mendes Leal obteve.. 205 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes
Guimarães............................ 19 »
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes.. 1 »
Quanto á assembléa de Nossa Senhora da Assumpção da Villa do Porto encontra-se uma irregularidade ou antes falta essencial de tal ordem, que não póde asseverar-se com segurança qual fosse a votação n'esta assembléa.
Examinada a respectiva acta encontra-se n'ella unicamente a acta da eleição da mesa, seguindo-se depois duas folhas de papel em branco, sem que n'ellas se ache lavrada a acta da eleição de deputado, nem se encontra em nenhum dos papeis que acompanharam o processo eleitoral.
Ao mesmo tempo que não existe a acta d'esta assembléa primaria, observa-se da acta do apuramento geral que n'ella se faz menção haver comparecido Leandro Joaquim Ferreira e Manuel Germano de Sousa, portadores da acta original da Villa do Porto, da ilha de Santa Maria, dando o apuramento em resultado o obter:
O cidadão José da Silva Mendes Leal....... 820 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes
Guimarães............................ 67 »
O cidadão Francisco Manuel Raposo Bicudo
Correia.............................. 2 »
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes.. 1 »
O cidadão Clemente Joaquim da Costa....... 1 »
O cidadão Frederico Carlos da Silveira Estrella 1 »
Do caderno do apuramento dos votos que obtiveram para deputados aquelles cidadãos nas differentes assembléas do circulo, consta que o cidadão José da Silva Mendes Leal obteve na assembléa da Villa do Porto, 265 votos, e do caderno das descargas da mesma assembléa vê-se que houve igual numero dellas, porque compondo-se esta assembléa de quatro freguezias, Senhora da Assumpção, Senhora da Purificação, Santa Barbara, e S. Pedro, encontram-se 123 descargas na 1.ª, 87 na 2.ª, 31 na 3.ª e 24 na 4.ª, perfazendo o mesmo numero de 265, e parecendo assim que todos estes votos recaíram no mencionado cidadão José da Silva Mendes Leal.
Isto porém não é bastante para assegurar o facto da eleição n'esta assembléa, cuja acta se não lavrou em seguida á da eleição da mesa, nem existe em todo o processo eleitoral.
Por esta rasão e por analogia do disposto no artigo 88.° do decreto de 30 de setembro de 1852, é a vossa commissão de parecer n'esta parte que ao numero total de 820 votos apurados ao cidadão José da Silva Mendes Leal se devem descontar aquelles 265 votos que se encontram descarregados no caderno da mesma assembléa de Nossa Senhora da Assumpção da Villa do Porto, e fazer-se o apuramento sómente pelas votações das quatro restantes assembléas, cujo resultado conhecido é o seguinte:
Numero real dos votantes das assembléas de S. Sebastião dos Ginetes, S. Sebastião da Matriz, Nossa Senhora da Saude dos Arrifes e S. José, 627 votos; maioria absoluta 314.
Obtiveram
O cidadão José da Silva Mendes Leal....... 555 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes
Guimarães............................ 67 »
O cidadão Francisco Manuel Raposo Bicudo
Correia.............................. 2 »
O cidadão Clemente Joaquim da Costa....... 1 »
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes.. 1 »
O cidadão Frederico Carlos da Silveira Estrella 1 »
Considerando portanto que o numero de 265 votos descontados ao cidadão José da Silva Mendes Leal não influe no resultado geral da eleição, que sempre venceria, quando mesmo lhe fosse contraria toda a votação da assembléa, da Villa do Porto;
Considerando que as actas das outras assembléas primarias se acham em fórma legal o que o mais processo correu com a devida regularidade;
Considerando que das mesmas actas e da do apuramento geral não consta de protesto ou reclamação alguma que invalide a eleição:
Por estas rasões é a vossa commissão, a final, de parecer que a presente eleição deve ser approvada e proclamado deputado da nação o cidadão José da Silva Mendes Leal, que apresentou o seu diploma em fórma regular e legal.
CIRCULO N.º 162 (1.° DE PONTA DELGADA) Compõe-se este circulo de tres assembléas; a saber: Villa da Lagoa, S. Pedro, e Nossa Senhora da Apresentação da Villa das Capellas.
Foi o numero real dos votantes 958; maioria absoluta 480. O cidadão Francisco Manuel Raposo Bicudo Correia obteve............................ 788 votos.
O cidadão João Rebello Cardoso de Menezes Guimarães............................... 166 »
O cidadão José da Silva Mendes Leal........ 2 »
O cidadão Henrique Ferreira de Paulo Medeiros 1 »
O cidadão Jacinto Fernandes Gil........... 1 »
Em vista d'este resultado, e considerando que tanto as actas das assembléas primarias como a do apuramento geral se acham regulares e em devida fórma, e se cumpriram a respeito de todas ellas as prescripções legaes;
Considerando que não appareceu protesto ou reclamação alguma contra o acto eleitoral, que tenha de apreciar-se;
Considerando finalmente que o cidadão Francisco Manuel Raposo Bicudo Correia obteve a maioria absoluta do numero real de todos os votantes do circulo:
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Por estas rasões é a vossa commissão de parecer que a presente eleição deve ser approvada, e proclamado deputado da nação o referido cidadão Francisco Manuel Raposo Bicudo Correia, quando apresente o seu diploma em fórma legal.
Sala das sessões da commissão, 19 de maio de 1868. = Antonio Pequito Seixas de Andrade = Francisco de Albuquerque Couto = José Carlos Mardel Ferreira = Ignacio Francisco Silveira da Motta = Antonio Alves Carneiro.
Posto a votos este parecer, foi approvado sem discussão, e em seguida proclamados deputados os srs. José da Silva Mendes Leal, Adriano Antonio Rodrigues de Azevedo e Antonio Julio Castro Pinto de Magalhães.
O sr. Ferreira de Mello: — Participo a v. ex.ª que se reuniu e se acha constituida a commissão de legislação, tendo nomeado para presidente o sr. Antonio José da Rocha, a mim para secretario, e reservando-se nomear relatores especiaes para cada um dos negocios que lhe forem distribuidos.
Leu-se e entrou em discussão o seguinte Parecer 11.° I' - V OH
Senhores. — A primeira commissão de verificação de poderes examinou com a devida circumspecção o processo eleitoral do circulo n.° 47 (Vinhaes) e todos os papeis que lhe foram enviados, relativos ao mesmo processo, e tem a honra de submetter á vossa illustrada consideração o resultado do seu exame.
Este circulo é composto das assembléas de Donai, Penhas Juntas, Vinhaes e Santalha.
Da acta da assembléa do apuramento consta que o numero total dos votantes das tres primeiras assembléas foi de 2:285, apparecendo uma lista branca na de Vinhaes.
Obtiveram os cidadãos:
Francisco Pinto Coelho de Athaide......... 1:444 votos
Antonio Joaquim da Veiga Barreira........ 839 »
Balthasar Ferreira Sarmento.............. 1 »
Na assembléa de Donai entraram na urna 581 listas: Obtiveram os cidadãos:
Antonio Joaquim da Veiga Barreira........ 297 votos
Francisco Pinto Coelho de Athaide......... 284 »
Contra a eleição d'esta assembléa não apparece protesto, nem reclamação alguma.
Na assembléa de Penhas Juntas entraram na urna, segundo na acta se declara, 736 listas.
Obtiveram os cidadãos:
Francisco Pinto Coelho de Athaide,........ 458 votos
Antonio Joaquim da Veiga Barreira........ 280. »
Balthasar Ferreira Sarmento.............. 1 »
A somma total dos votos obtidos pelos mencionados cidadãos n'esta assembléa foi de 739, emquanto que o numero total das listas entradas na urna se declara ter sido de 736, do que resulta haver uma differença de 3 votos a mais.
Na acta diz-se a tal respeito, que no fim do apuramento se acharam 3 listas a maior por estarem dentro de outras, e que foram contadas uma ao dr. Athaide, outra ao bacharel Barreira, e que a outra continha o nome de Balthasar Ferreira Sarmento Pimentel, já mencionado na mesma acta.
Foi apresentado á mesa um protesto, que ella aceitou, e que vem junto á acta, assignado por tres eleitores, os quaes protestam contra a eleição por se terem distribuido listas á bôca da uma, distribuição feita pelo abbade da freguezia na qualidade de agente da auctoridade, e porque tendo-se confrontado as listas que entraram na urna com as descargas lançadas nos cadernos, verificando-se terem entrado 736 listas, appareceram publicados no edital como apurados 739 votos.
Na acta, na parte em que se menciona este protesto, declara-se, quanto ao primeiro fundamento, que á mesa não constou que se desse esse caso (o da distribuição das listas), e quanto ao segundo (os 3 votos a mais), já na dita acta ía declarado, entendendo a mesa que não havia motivo de nullidade.
Na assembléa de Vinhaes entraram na urna 965 listas, verificando-se que as descargas feitas tinham sido 963, isto é, menos 2 do que as listas.
Obtiveram os cidadãos:
Francisco Pinto Coelho de Athaide...........702 votos.
Antonio Joaquim da Veiga Barreira..........262 »
E foi encontrada uma lista branca.
A acta d'esta eleição não menciona nem protesto, nem reclamação alguma; mas á junta preparatoria foi apresentado um protesto assignado por cinco cidadãos contra áquella eleição, fundando-se em que não tinha havido liberdade na urna, e especialmente, para o provar, os seguintes factos. Que nos dias anteriores aos designados para a eleição, o administrador Pedro Vicente de Moraes Campilho percorreu alguns povos daquella assembléa, acompanhado por dois homens que, extrajudicialmente, consta estarem pronunciados sem fiança, solicitando os eleitores e ameaçando-os.
Que na madrugada do dia 22 de março (dia da eleição) mandou depositar grande numero de armas na casa palheiro do cabo de policia José Prada, contigua ao adro da igreja onde havia de reunir-se a assembléa. Que o irmão do mesmo administrador, Antonio Annibal de Moraes Campilho, primeiro official da alfandega de Chaves, foi, acompanhado de outros empregados, esperar muitas povoações fóra, da villa, e trazendo os eleitores incommunicaveis até á assembléa, ahi estava o administrador com grandes massos de listas, distribuindo-as abertas á bôca da uma aos eleitores, pela ordem da chamada, e muitos d'elles entregavam-n'as assim abertas ao presidente da mesa, votando muitos individuos não recenseados por eleitores que não compareceram. Que se fizeram reclamações contra estes abusos, mas que não foram attendidas, e que o delegado da comarca, Agostinho José da Fonseca Pinto, membro da mesa eleitoral, exaltando-se, observou que entregava elle proprio as listas assim, se o administrador o não queria fazer, e que os regedores insistiam na identidade dos eleitores.
Que á contagem das listas levantaram grande tumulto e vozerias no adro e ás portas da assembléa varios empregados e agentes do administrador, todos armados de machados, paus, fouces roçadouras e bacamartes, armando-se 'o proprio administrador com uma fouce roçadoura, e seu irmão, o primeiro official da alfandega de Chaves, com um grande facalhão.
Que se deram morras á opposição, chegando o delegado da comarca a romper no excesso de dar dois murros na mesa, e levantar-se em altos gritos, de que haviam de morrer ali todos os da opposição, e ainda por cima havia de querelar d'elles, exclamando para o primeiro official da alfandega de Chaves, que onde s. s.ª morresse, morreria elle tambem e muita gente.
Depois de algumas considerações sobre o procedimento das auctoridades, que fazem ou consentem que se façam eleições por tal modo, declaram os signatários do protesto que era na acta da eleição que elle devia ser lançado; mas que reclamando contra as irregularidades da mesma eleição, foram desattendidos, e que, apresentando no fim d'ella o seu protesto, lhes fôra dito que voltassem no dia seguinte ás nove horas da manhã, em que se haviam de lavrar as actas, e no dia seguinte não se reuniu a mesa na assembléa eleitoral, e respondeu se-lhes que se lhes não podia receber protesto algum, porque já estavam lavradas as actas.
Terminam os signatarios declarando que se o protesto, por não ir no seu logar, for desattendido, oxalá se garanta ao menos de futuro aos eleitores do circulo de Vinhaes a liberdade de votar, como esta escripta na lei, e sirva o mesmo protesto para que os srs. deputados da nação portugueza conheçam como so administra e se fazem eleições em Vinhaes.
Foi mais apresentada á junta preparatoria, e examinada pela commissão, uma participação assignada por um cidadão que, segundo elle declara, teve uma perna partida na desordem que houve na assembléa de Santalha, participação na qual se dá conhecimento ao procurador regio do Porto, alem" de outros factos, dos que ficam tambem mencionados no sobredito protesto, e se nomeiam testemunhas para os provar, a fim de que o mesmo procurador regio, em observancia do artigo 45.° da lei de 23 de novembro de 1859, faça promover devidamente os competentes processos contra os delinquentes.
Na eleição da assembléa de Santalha deram-se acontecimentos lamentaveis e extremamente graves. E se, pelo que diz respeito aos factos supramencionados, relativos á eleição da assembléa de Vinhaes, fallecem as provas no processo eleitoral e nos documentos adjuntos, já assim não é quanto aos que occorreram n'aquella assembléa, os quaes constam de um officio que, no dia immediato ao da eleição (23 de março), foi dirigido ao presidente da commissão do recenseamento de Vinhaes pelo presidente da mesma assembléa de Santalha, e que veiu junto ao sobredito processo, e bem assim de um protesto apresentado á junta preparatoria e examinado pela commissão, o qual veiu acompanhado de um dos cadernos dos eleitores da dita assembléa, de uma folha de papel em que se acham escriptos os votos que parece tivera o candidato Barreira, em numero de 435, e de meia folha de papel em que se encontram escriptos os nomes dos individuos que, segundo se infere, compunham a mesa; caderno, e papeis manchados de sangue, que os protestantes affirmam ter sido derramado dentro da propria igreja quando ali se estava procedendo á eleição. O referido protesto é assignado por 71 individuos, que se dizem eleitores da assembléa de Santalha, e os nomes de quasi todos effectivamente se acham incluidos no sobredito caderno. Grande parte das assignaturas é feita de cruz, e são reconhecidas por Silvestre Nunes o Paulo Pires, de Seixas, e por Manuel Rodrigues, de Vinhaes, sendo a assignatura d'este ultimo reconhecida pelo tabellião d'esta villa, Flaviano Antonio de Seixas, e ignorando-se a qualidade em que aquelles individuos reconhecem as assignaturas dos outros. Encontram-se tambem ali indicados para testemunhas' differentes individuos do Penso, Santalha e de Seixas.
Constam igualmente os mesmos factos da supramencionada participação ao procurador regio do Porto, na qual se nomeiam tambem testemunhas para deporem sobre elles.
Da reflectida leitura e exame de todos estes documentos parece á commissão poder concluir-se que, na assembléa de Santalha, começára a eleição e progredira até o apuramento dos votos, praticando-se differentes irregularidades. Os protestantes affirmam, por exemplo, no seu protesto, que aquelle apuramento continuou, sendo já noite; e n'esta circumstancia concorda o presidente da mesa no officio já citado. Os protestantes affirmam que se fez a chamada geral, e que, sem decorrerem as duas horas, nem haver contagem das listas, que se achavam na urna, e confrontação do seu numero com as notas das descargas postas nos cadernos do recenseamento, nem se publicar por edital, affixado nas portas da casa da assembléa, resultado algum, como prescreve o artigo 67.° do decreto de 30 de setembro de 1852, se passou logo ao apuramento. O presidente da mesa declara que esta esteve coacta, durante o acto eleitoral, por causa da excitação dos animos, da attitude imponente e das phrases pouco comedidas do bando opposicionista, a ponto de não poder evitar que o candidato do mesmo bando, não recenseado naquella, nem em qualquer outra assembléa do circulo, arrogasse a si as atribuições da mesa, fazendo a chamada dos eleitores, discutindo sobre a sua identidade, e intromettendo-se na direcção dos actos eleitoraes. E prosegue, declarando que, finda a votação, foi a mesa forçada a proceder ao apuramento, e a continua-lo até o concluir já de noite; acrescentando que n'esta operação usurpou o candidato opposicionista as attribuições da mesa, contando as listas e lendo os nomes dos votados; e que a mesa teve de ceder á pressão dos eleitores que em torno d'ella se apinhavam, a ponto de que alguns dos membros nem sentados podiam estar, e outros tiveram de carregar com o peso daquella enorme massa. Segundo o mesmo presidente declara, achou-se em resultado terem sido votados Antonio Joaquim da Veiga Barreira com 412 votos e Francisco Pinto Coelho de Athaide com 362, havendo por consequencia a maioria de 50 votos a favor do primeiro.
A este ponto tinham chegado os actos eleitoraes n'esta assembléa, quando se deram os factos a que acima se allude, e que não podem referir-se sem tristeza e sem horror. A commissão julgou conveniente, para mais cabal informação, transcrever tanto do officio do referido presidente, como do protesto e participação já citados, os periodos em que taes factos se referem, pois que, não obstante conhecer-se do contexto d'esses documentos, que o auctor do primeiro diverge dos auctores dos outros quanto ás causas que produziram os mesmos factos, todos os descrevem de maneira que dá bem a conhecer quanto foram atrozes e abomináveis.
«Então (logo em seguida ao apuramento dos votos), diz o presidente da mesa, o bando opposicionista prorompeu em ruidosa demonstrações contra os partidarios da auctoridade, e nomeadamente contra os eleitores da freguezia de Moimenta, naturalidade do deputado governamental, e a este e áquelles cobriu de chufas e improperios. Esta virulenta provocação deu causa a um terrivel conflicto; opposicionistas e governamentaes travaram ferida luta, uns e outros invadiram o templo, onde o combate se tornou sanguinolento, resultando grande numero de ferimentos, e desapparecendo a uma, as listas, os cadernos das descargas o os mais documentos relativos á eleição. Os membros da mesa poderam a custo, por meio da fuga, salvar as suas vidas, e, aterrados com tão tristes scenas, não tornaram a reunir-se, em virtude do que resolvi levar ao conhecimento de V. s.ª as occorrencias que deixo relatadas.»
Os protestantes exprimem-se nos termos seguintes: «Ao terminar esta irregularissima operação (a do apuramento dos votos) uma horda de selvagens da Moimenta, armados de paus ferrados e fouces roçadouras, invadiu o templo, sem respeito pela religião, nem consideração pela vida dos seus concidadãos, quebrou para cima de trinta cabeças, havendo mais de cem ferimentos e muitos braços fracturados. A igreja ficou inundada de sangue, sendo ensanguentadas as toalhas e os proprios altares; sacras imagens de santos e crucifixos foram despedaçados. A uma foi posta em estilhas no meio de vivas ao candidato Francisco Pinto Coelho de Athaide, a outros personagens da sua parcialidade e a Moimenta, interrompidos apenas por blasfemas obscenidades. A mesa eleitoral desappareceu, e não volveu a constituir-se, e os cadernos das actas e dos eleitores sumiram-se n'este abysmo de immoralidades. Portanto não se concluiu a eleição nem se lavraram as actas.»
Continuam, fazendo differentes considerações sobre a impossibilidade de se apurarem os votos na assembléa do apuramento, e sobre a nullidade da eleição do circulo de Vinhaes, e terminam assim o seu protesto: «Agora, senhores deputados, querem a prova dos attentados contra a religião do Crucificado, contra a uma e contra as pessoas dos eleitores da assembléa de Santalha? Ahi esta sellada com o sangue das victimas n'esse caderno dos eleitores, n'esse rascunho dos membros da mesa, e n'essa numeração de votos de um dos votados, que depois appareceram entre os estilhaços da uma, das cadeiras e da mesa, que servira para a eleição. As provas espantam pelo horror, mas são claras e concludentes para mostrar aos srs. deputados como se administra e se fazem eleições em Vinhaes.»
Na participação, a que acima se faz referencia, dirigida ao procurador regio do Porto, diz o participante o seguinte: «que effectivamente no dia 22 á tarde, finda a eleição em Santalha, pelas sete horas da tarde, fôra invadida a igreja de Santalha por uma grande multidão de homens armados do logar de Moimenta, havendo muitos e graves ferimentos feitos por elles, entre os quaes teve o supplicante uma perna partida, e é voz geral, que esses homens de Moimenta iam ás ordens do reitor de Santalha, que é tambem de Moimenta, e os foi esperar fóra de povo quando vinham armados, tendo-os todo o dia em sua casa, até que votaram, e depois até á tarde, que fizeram a desordem, e que esses homens iam armados por ordem que lhes deu o regedor de mando do administrador, e sendo averiguado que esses homens eram todos pelo candidato Athaide, nem este nem o reitor, nem outro algum dos chefes e agentes do administrador n'esta assembléa, impediu ou tentou impedir esse tumulto; regressando depois os desordeiros para casa do reitor, que fugiu de noite com elles, assim como os outros chefes por parte da auctoridade, etc...»
Tal é a exposição dos factos occorridos na assembléa de Santalha, segundo constam do processo eleitoral e dos documentos ao mesmo adjuntos. Como fica referido, não se lavrou acta da eleição, e na assembléa do apuramento não se apuraram os votos daquella assembléa, sendo proclamado deputado o cidadão Francisco Pinto Coelho de Athaide, por haver obtido nas outras tres assembléas do circulo 1:444 votos de 2:285 listas que entraram nas urnas das mesmas assembléas. Contra esta proclamação é que é feito o protesto, fundando-se em que a eleição da assembléa de Santalha esta nulla, e que nulla esta por isso a eleição de
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todo o circulo, acrescentando-se que á assembléa de Santalha, na actual conjunctura, decide da eleição de todo o circulo, porque conta 1:020 eleitores, e o cidadão Francisco Pinto Coelho de Athaide não chega a reunir a maioria de 600 votos nas assembléas do circulo.
Quanto á nullidade da eleição da assembléa de Santalha, a commissão entende que ella é evidente. E que basta essa nullidade para se dever annullar a de todo o circulo, tambem lhe parece que ha no protesto eleitoral e nos documentos adjuntos provas e rasões para o poder affirmar sem hesitação. 1
Entre os papeis salpicados de sangue o juntos ao protesto encontra-se um caderno dos eleitores da assembléa de Santalha. Os protestantes dizem que esse sangue foi do que se derramou dentro do templo na occasião da eleição, e que o caderno, com os outros papeis que juntaram, foi encontrado entre os estilhaços da uma, das cadeiras O da mesa, que serviu para a eleição.
E possivel que aquelle sangue não seja do que ali se verteu, ainda que este infelizmente chegaria para manchar muito maior numero de papeis; mas o que parece certo é que o referido caderno foi um dos que serviu para se fazer a chamada, pois que alem de se encontrarem n'elle feitas com o appellido «Braga» (infere-se que era um dos escrutinadores, e como tal vem o seu nome escripto no outro papel adjunto, entre os nomes dos membros da mesa) 777 descargas de eleitores, tem todos os caracteres de authenticidade. Encontram-se n'elle os competentes termos de abertura e encerramento assignados pelos membros da respectiva commissão de recenseamento (a de Vinhaes), e todas as folhas rubricadas pelos mesmos membros; e confrontando-se as letras das assignaturas e rubricas com as dos cadernos dos eleitores das assembléas de Vinhaes e Penhas Juntas, conhece-se, sem a minima duvida, que são perfeitamente identicas. Ora n'esse caderno encontram-se inscriptos para poderem votar nas assembléas de Santalha 1:023 eleitores, e descarregados 777, salvo erro, e no officio do presidente da mesa declara-se que o candidato Barreira fôra votado com 412 votos (435 lhe dá a nota d'elles, junta ao protesto, e que parece ter servido na mesa), e o candidato Pinto Coelho de Athaide com 362.
Tendo portanto votado nas restantes tres assembléas do circulo 2:285 eleitores, dos quaes o ultimo candidato (Pinto Coelho) obteve 1:444 votos, e o primeiro (Barreira) 839, é incontestavel, pela comparação de todos estes numeros, que a eleição da assembléa de Santalha, feita em condições normaes, e na conformidade das leis, poderia alterar essencialmente o resultado da eleição nas outras tres assembléas, e que por isso, annullada aquella, não póde deixar de annullasse a de todo o circulo.
É este, em virtude de tudo o que fica exposto e ponderado, o parecer da commissão; e bem assim entende ella que devem ser remettidos ao governo todos os documentos relativos á eleição da assembléa de Santalha, e o protesto contra a da assembléa de Vinhaes, a fim de que, observando-se o que determinam os artigos 143.° do decreto de 30 de setembro de 1852 e 45.° da lei de 23 de novembro do 1859, sejam processados e punidos nos termos das leis os que se mostrarem criminosos pelos factos atrozes que ali foram praticados, e com os quaes tão insolitamente foi offendida a liberdade do voto, um dos mais importantes direitos politicos do cidadão.
Sala da commissão, 25 de abril de 1868. = José Maria da Costa e Silva = Antonio Pequito Seixas de Andrade = Ignacio Francisco Silveira da Mota = José Carlos Mardel Ferreira = Antonio Alves Carneiro.
O sr. Falcão da Fonseca: — Sinto ter de occupar ainda hoje a attenção da camara, quando já nas duas sessões antecedentes roubei tanto tempo aos seus trabalhos; mas tendo dito n'uma das sessões passadas que entraria na discussão d'este parecer, vejo-me por coherencia forçado a tomar a palavra.
Como se vê do officio que v. ex.ª acabou de mandar ler, o sr. deputado eleito pelo circulo de Vinhaes, unicamente por motivo de doença, não póde comparecer n'esta camara para defender a sua eleição; e diz que entrega á illustração d'esta camara e aos seus sentimentos de justiça a sua causa. Não podia entregar a sua causa a melhor patrono.
Não posso deixar de me congratular com a camara pelo facto de ter dispensado tanta attenção e deferencia para com o illustre deputado eleito o sr. Pinto Coelho de Athaide. E eu, que tenho agora de defender a sua eleição, não posso deixar de em seu nome agradecer a esta assembléa a deferencia que para com elle teve.
N'uma das sessões passadas tinha pedido á camara que se dignasse votar um adiamento de quatro dias, o qual houve por bem approvar. E agora, para fundamentar novamente esse pedido, repetirei que o fiz em vista de uma carta que tinha presente n'essa occasião, que era assignada pelo administrador do concelho de Vinhaes, na qual se me declarava, que se estavam colligindo certos documentos que eram necessarios para a defeza d'esta eleição.
Confesso que um dos motivos que me obrigou a pedir a palavra para impugnar o parecer da illustre commissão de verificação de poderes foi sem duvida o enunciado do parecer onde vi quasi trasladado um protesto, que se tinha apresentado n'esta casa, protesto que não tinha sido apresentado, como a lei ordena, nas respectivas assembléas, como era a assembléa do apuramento, e como não tivesse apparecido senão esse protesto, da parte contraria e por consequencia da parte suspeita, a commissão reproduziu exactamente os fundamentos d'esse protesto no seu parecer.
Esses fundamentos, a camara que tem á vista o parecer de que trato, não póde deixar de reconhecer que são uma serie do accusações ás diversas auctoridades daquelle circulo, ao administrador do concelho de Vinhaes, a seu irmão, que é primeiro official da alfandega de Chaves, ao delegado do procurador regio daquella comarca e ao respeitavel reitor da freguezia de Santalha.
Como já disse á camara, tive a honra de representar aqui aquelle circulo, e Conhecendo por consequencia todas as pessoas aggredidos fortemente no protesto que deu entrada n'esta casa, não posso deixar de levantar a minha debil voz a favor d'esses individuos, que julgo serem indevidamente atacados, e de uma maneira que não me atrevo a classificar.
Não pretendo fazer a apologia d'esses individuos; mas devo fazer conhecer á camara quem são as pessoas que são accusadas no protesto.
O administrador do concelho de Vinhaes, o sr. Pedro Vicente de Moraes Campilho, é um homem digno de todos Os respeitos, não só porque administra aquelle concelho ha dezoito annos, sem interrupção e sempre com satisfação de todos os seus administrados, como se prova de documentos competentes que existem no ministerio do reino, mas porque já foi aqui deputado, e esta qualidade julgo que vem em meu auxilio para mostrar aos meus collegas que esse cavalheiro é muito respeitavel pela inteireza de seus principios, pela sua intelligencia e sentimentos de justiça e conciliação.
Tambem se falla no benemerito delegado daquella comarca, dirigindo-se-lhe accusações graves que elle não merece.
Devo dizer á camara que o nome do sr. Fonseca Pinto esta superior a todas essas tristes arguições que se lhe fazem no protesto. X
O sr. Fonseca Pinto é delegado do procurador regio ha mais de dez annos, e o seu comportamento, a sua intelligencia e o seu caracter honrado dizem de sobejo que é infundada a accusação que se lhe faz no protesto e no parecer. O sr. Fonseca Pinto era incapaz de commetter similhantes excessos, é uma injustiça que se lhe faz.
Da mesma fórma se aggride de uma maneira inconvenientissima o benemerito primeiro official da alfandega de Chaves, Annibal de Moraes Campilho; e eu, que tenho a honra de o conhecer ha muitos annos, assim como alguns dos srs. deputados que estão presentes, não posso deixar de avaliar quanto são injustas e falsas as accusações que tambem se lhe fazem n'este protesto.
Igualmente reputo falsas e injustas as accusações que se fazem contra o benemerito reitor da freguezia de Santalha, homem que eu conheço ha muito tempo, que é incapaz de praticar violencias de especie alguma, que merece o respeito não só da sua freguezia, mas de todos os povos circumvizinhos que têem a fortuna de o conhecer.
Eu poderia não ter pedido a palavra para protestar contra estas accusações falsas e injustas, ainda que ellas tivessem existido, se o protesto tivesse ficado no archivo da illustre commissão, porque emfim, nem todos teriam conhecimento dellas; mas logo que a commissão julgou conveniente, para tirar a sua conclusão, reproduzir quasi textualmente os fundamentos do protesto, fundamentos que eu julgo mais que injustos, logo que se deu tão grande publicidade a esses falsos argumentos do protesto, eu não podia deixar de levantar a minha voz para impugnar o parecer da illustre commissão, especialmente n'esta parte.
Fazem-se accusações á maneira por que se houve o administrador do concelho de Vinhaes. Devo dizer a v. ex.ª e á camara que o administrador daquelle concelho, segundo era do seu dever, assistiu unicamente á eleição que teve logar na cabeça do concelho, isto é, em Vinhaes, e não podia por consequencia apparecer na eleição da assembléa de Santalha. Já se vê pois que os factos horrorosos, que se deram n'esta assembléa, não podem servir de accusação ao digno administrador do concelho de Vinhaes.
E cabe aqui dizer que a pessoa delegada pelo administrador para presidir aos trabalhos d'aquella eleição, o sr. Justiniano Antonio da Silva, é pessoa que eu conheço, homem de muita bondade, com espirito conciliador, e que certamente não podia deixar, no desempenho do seu dever, de fazer todos os esforços compativeis com as circumstancias para que houvesse todo o socego nos trabalhos da eleição, e de certo não podia este cavalheiro ser responsavel por similhantes desordens.
Quero dizer com isto que o delegado do administrador do concelho de Vinhaes não merece censura alguma. O seu caracter esta superior a todas as accusações que se lhe queiram fazer. Nada póde evitar porque a luta estava preparada.
Já tive occasião de dizer aqui na camara que presto toda a homenagem de respeito e consideração a todos os membros que compõem a illustre commissão de verificação de poderes, e, se me é licito especialisar, ainda que de todos sou amigo e a todos respeito, não posso deixar de manifestar o meu elevado respeito e sympathia pelo illustre relator d'este parecer, o 'sr. dr. Pequito.
Não faço com isto um favor a s. ex.ª nem é lisonja; esta não a permitte o meu caracter. A camara, elevando-o a cargo de vice presidente, deu bem a conhecer o apreço em que tem os dotes e qualidades de tão illustre cavalheiro.
Porém, á parte o respeito que tributo aos membros da commissão de poderes, não posso deixar de impugnar o parecer em discussão; é isso do meu dever, e sou forçado a proceder assim pelos dictames da minha consciencia.
Entrando mais de perto na questão tomarei por these a conclusão do parecer da illustre commissão de poderes; é o seguinte:
«Tendo portanto votado nas restantes tres assembléas do circulo 2:285 eleitores, dos quaes o ultimo candidato (Athaide) obteve 1:444 votos, e o primeiro (Barreira) 839, é incontestavel, pela comparação de todos estes numeros, que á eleição da assembléa de Santalha, feita em condições normaes o na conformidade das leis poderia alterar essencialmente o resultado da eleição' nas outras tres assembléas, e que por isso, annullada aquella, não póde deixar de annullasse a de todo o circulo.»
Se a illustre commissão apresentasse o seu parecer, annullando unica e succintamente a eleição da assembléa de Santalha, ainda poderiamos estar de accordo; mas querer a commissão, pelo simples facto de annullar a eleição d'aquella assembléa, annullar toda a eleição do circulo, parece-me ser uma conclusão um pouco erronea, salvo o respeito devido aos seus membros, e portanto não posso concordar de maneira alguma com o seu parecer.
Diz a illustre commissão na conclusão que tira (leu).
Este é que é o grande ponto da questão', e que eu desejo ver esclarecido pelo meu nobre amigo o digno relator da commissão.
Mas note a camara, o decreto de 30 de setembro de 1852, no artigo 88.°, diz o seguinte:
«Quando por qualquer caso imprevisto deixar de ser apresentada á assembléa de apuramento alguma acta original ou alguma das copias a que se referem Os artigos antecedentes, far-se-ha o apuramento pelas que apparecerem.»
Esta é a verdade; em vista d'este artigo é que a assembléa do apuramento devia regular os seus trabalhos como regulou, e parece-me que a junta preparatoria ou a camara dos senhores deputados teem necessariamente do se dirigir igualmente pela doutrina do mesmo artigo.
Eu que sou leigo em tudo, e especialmente n'esta materia, tendo lido este artigo, pensava que realmente se podia approvar uma eleição, não obstante n'uma ou n'outra assembléa não ter havido escrutinio, ou não tendo corrido a eleição regularmente, se apurassem comtudo os votos, como teve logar na assembléa de Santalha.
Tambem vejo no artigo 103.° o seguinte (leu).
E em presença da disposição d'este artigo 103.°, sendo a camara competentissima para resolver todas estas duvidas, acho que, dadas as circumstancias especiaes d'esta eleição, a camara a deve approvar.
Ora, sr. presidente, como eu disse, a eleição de Santalha teve logar, e chegou a reconhecer-se qual o numero de votos que pertenceu a cada candidato; e por consequencia como nas tres assembléas de Donai, Penhas Juntas e Vinhaes correram as cousas regularmente e se apuraram a favor do sr. Athaide 1:444 votos e do sr. Barreira 839, parece-me que provado fica que o resultado da eleição de Santalha não podia de fórma alguma influir no resultado final.
E tanto se chegou a apurar os votos n'aquella assembléa, que diz a propria commissão que teve presente um caderno de recenseamento; um tal caderno ensanguentado de que tanto se fallou aqui, e que não só em vista d'elle, mas de outros apontamentos fornecidos pelo proprio presidente daquella assembléa, se havia verificado terem concorrido á uma de Santalha 797 eleitores, resultando, segundo confessam os protestantes e o proprio presidente, que o sr. dr. Barreira obtivera 435 votos e o sr. dr. Athaide 362.
Ora o que eu desejo provar é que effectivamente chegou a apurar-se de uma maneira evidente a votação, e n'este caso parece-me que o -candidato o sr. Athaide veiu a ter em todo o circulo 1:806 votos e o sr. Barreira 1:274.
E quando mesmo tivessem ido á uma os 246 eleitores que faltaram, pegando n'esses votos o dando-os todos ao sr. Barreira, ainda assim este senhor ficava com 1:520 votos, ao passo que o sr. Athaide ficava com 1:806, e por consequencia com mais 286 votos que o primeiro candidato.
Por isso eu pedia a esta illustre assembléa que prestasse toda a sua attenção sobre este ponto, pois me parece que vae estabelecer um precedente novo n'esta casa, um precedente, quanto a mim, bem injusto.
Diz-se que houve apuramento, é a propria commissão que o diz, embora não tivesse vindo a competente acta e o caderno do recenseamento. O caderno do recenseamento não veiu, é verdade, pela via legal, mas veiu juntamente com o protesto que foi presente á commissão.
A commissão diz no seu parecer que effectivamente se chegou a conhecer o resultado da eleição na assembléa de Santalha: toda a questão versa pois se havemos de tomar em conta os votos que se apuraram ou não.
Se devemos apurar esses votos, a eleição não póde deixar de ser approvada. Esta é a conclusão que eu tiro, e não outra; este é o ponto mais importante da questão, que desejo ver rebatido com rasões fortes e convincentes pelo illustre deputado o sr. Pequito.
Tenho pena, como disse ainda agora, de roubar tempo á camara; mas estes negocios entendo devem merecer toda a attenção da camara. Todos os negocios que vem a esta casa a devem merecer, mas estes de eleições parece-me ser objecto bastante melindroso, e deve ser especialmente attendido.
Diz a illustre commissão no seu parecer o seguinte (leu).
Quer dizer, tudo que ha aqui de criminalidade não pertence a esta camara resolver nem apreciar, isso pertence á alçada do podér judicial. Essa não é a nossa questão. Mas visto tocar-se n'isto, permitta-me a camara que a esclareça sobre a validade que póde ter esse protesto feito por Guilherme Domingos, do Penso, e assignado a seu rogo pelo sr. dr. Barreira.
Este homem que protestou, queixa-se de que o povo de Moimenta lhe quebrara uma perna, mas convem advertir que essa desgraça procurou elle por suas mãos! Quem o mandou subir ao telhado da igreja para apedrejar os eleitores lá do alto? Elle é que, resvalando do telhado, veiu caír cá á rua. Não carregue pois o pobre povo de Moimenta com esta culpa ou crime que não commetteu.
O que vejo é que tocou a rebate no campo do sentimentalismo, e não se perde circumstancia alguma, ainda que
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desfigurada, para vir influir na eleição e no animo dos homens que têem de julgar a questão que se debate.
Nem por sombras quero fazer a menor censura á respeitavel ôommissâo; pondero só que é preciso estarmos precavidos contra este expediente que facilmente so avalia.
Depois, sr. presidente, para mim é dogma que, quando se legisla ou se julga, não se deve escutar o coração, deve Ouvir-se tão sómente a consciencia; esta só, e mais nada.
Negocios publicos, negocios d'esta ordem, é necessario velos, encara-los e julga-los a sangue frio; de outro modo onde nos levariam todas estas discussões?
Diz mais o parecer: « Os protestantes exprimem-se nos seguintes termos = ao terminar esta irregularissima operação (a do apuramento de votos) uma horda de selvagens de Moimenta, armados de paus ferrados e fouces roçadouras, invadiu o templo, quebrou para cima de trinta cabeças, havendo mais de cem ferimentos e muitos braços fracturados. A igreja ficou inundada de sangue, etc.» =.
Note a camara, são os homens que assim protestam pessoas insuspeitas, que declaram que o apuramento se chegou a realisar, e declarando mais que tudo so sumiu, mesa, uma e papeis, são elles que juntam ao seu protesto mm dos cadernos do recenseamento.
O apuramento fez-se, e só depois de contadas as listas o que tiveram logar os conflictos, como se prova pelo documento que mando para a mesa, assignado pelos membros que compozeram a mesa eleitoral d'aquella assembléa.
Podia ler muito mais á camara, mas isso era abusar da sua paciencia; ficarei por aqui.
Parece-me que a commissão se impressionou um pouco com as nodoas de sangue que vem no caderno do recenseamento. Eu tambem me impressiono, é verdade, mas lembre-se a illustre commissão que não esta provado que fosse sangue das victimas! Quando eu sei que um pobre rapaz para se livrar do recrutamento teve a coragem de cortar um dedo, não me admiraria pois que para produzir effeito se tingissem as folhas de sangue; mas ainda assim resta provar se é sangue humano...
(Interrupção que não se ouviu.)
Eu não quero contestar que realmente o sangue seja de corpo humano, não senhores; mas se isso entrasse em duvida requeriam-se as provas; é possivel, é mesmo natural, mas tem a commissão essas provas?
Diz mais o protesto a que a commissão deu tanto valor: «As provas espantam pelo horror, mas são claras e concludentes para mostrar aos srs. deputados como se administra e fazem eleições em Vinhaes».
Protesto, sr. presidente, contra tão calumniosa asserção. Desde que ha systema representativa em Portugal, creio bem que em Vinhaes nunca se derramou sangue perante a uma. É esta a primeira vez que tal succede!
(Interrupção que não se ouviu.)
Muito bem; mas n'esse caso digam então no protesto: «Olhae vós como se fizeram as eleições de Vinhaes em 1868.» Mas virem dizer á camara e ao paiz que é este o modo de fazer ali as eleições, isso não posso eu admittir sem protestar muito solemnemente contra similhante asserção.
Tudo leva a crer que o apuramento chegou a concluir-se; pois o que diz o parecer? (Leu.)
Os grandes tumultos, a grande desordem e scenas sanguinosas, começaram depois de realisado esse acto, era isso mesmo natural. Só depois d'essa operação, conhecidos o vencedor e o vencido, é que principiaram os despeitos, as chufas, e tudo o mais que infelizmente se seguiu.
E eu digo a v. ex.ª como as cousas se passaram.
Os eleitores de Moimenta, sendo a penultima freguezia a votar, quando vieram para fóra da igreja, e sabendo-se que o vencedor era o sr. Barreira, os de outras freguezias quê haviam votado n'este candidato, victoriosos como estavam, jogaram algumas chufas e apodos aos do Moimenta, dizendo-lhes que = fossem para a serra fazer carvão com o seu deputado =.
Estes ficaram feridos nos seus brios tradicionaes, e aqui começou a luta e „as horrorosas scenas que temos todos a lamentar, resultando essas cabeças partidas, braços fracturados e tantas outras cousas horriveis que se passaram.
Porém, note a camara, eu apenas relato o que me consta, lastimando profundamente as desgraças que deplorâmos. Não pretendo escandalisar o cavalheiro que ficou Vencido; ao contrario, declaro que me prezo de ser muito amigo do sr. dr. Barreira, moço de elevada intelligencia, e que tem feito uma brilhante figura no fôro de Bragança. Assim como sou tambem amigo do sr. dr. Athaide, moço de muita instrucção, dignissimo a todos os respeitos e que em nada concorreu para o desgraçado desfecho que teve logar.
E que é para admirar, sr. presidente, que depois de tão grande conflicto, depois de, acirrados os animos houvesse a lamentar tão ferida luta? E necessario conhecer o povo de Traz os Montes. O povo transmontano é docil, pacifico e bondoso, custa-lhe a saír, mas quando sáe é de vez e de veras. Eu conheço a sua indole porque tenho estado muito em Traz os Montes e honro-me de ter costella transmontana.
E um povo sóbrio, humilde e laborioso, queixa-se ás vezes e com rasão.
Já o disse n'esta casa por mais de uma vez. Elle tem rasões de sobra para se queixar amargamente dos poderes publicos, não é de hoje nem de hontem, é de ha muito tempo.
Pois os poderes publicos deviam attende-los, porque elles têem sido sempre pontuaes em tudo que respeita a contribuições, já pecuniarias, já de sangue. São pontualissimos em satisfazer ao recrutamento, e com tão flagrante injustiça da parte dos poderes publicos, sr. presidente, que quando faltam soldados nos corpos das outras provincias, passa-se uma especie de cheque para Traz os Montes, e diz-se;
«Venham tantos soldados (apoiados)». Quer dizer, os corpos de guarnição de Traz os Montes, que se podem vangloriar, não digo de ter os melhores soldados do nosso exercito, mas se não são os melhores, os melhores hão de ser como elles, são uma especie de viveiro para os outros corpos, e quando já estão disciplinados, quando já estão soldados feitos é que se vão buscar a esses corpos tão bons soldados como aquelles.
Vem pois os soldados de Traz os Montes preencher as lacunas que existem em outros corpos, lacunas que existem porque a lei do recrutamento não se cumpre nas outras provincias, salvas raras e honrosas excepções, o por este modo castiga-se o innocente e premia-se o culpado.
Os povos da provincia de Traz os Montes têem effectivamente sobeja rasão para se queixarem amargamente. Aquella provincia esta desherdada relativamente de todos os melhoramentos publicos, de tudo (apoiados). Ainda não ha uma só estrada concluida (apoiados). Se quero ir, por exemplo, d'aqui da capital ao fim da provincia, á raia da Galliza, não o posso fazer porque ainda essa estrada que conduz a Chaves não esta concluida e sabe Deus quando o estará. As outras provincias, como nós sabemos, têem caminhos de ferro, têem bellissimas estradas, têem rios e algumas têem o oceano; mas a provincia de Traz os Montes não tem caminhos de ferro, não tem estradas, não tem rios, não tem absolutamente nada (apoiados).
Peço desculpa de ter aberto este parenthesis nas minhas observações; quiz sómente ponderar á camara, depois dos successos que tiveram logar, qual é a indole do povo transmontano. É humilde e paciente, como disse, mas é altivo quando o deve ser, especialmente quando vê que os poderes publicos não lhe fazem a mesma justiça que fazem aos outros povos. Eu sou contra tudo que se chama anarchia, e se alguma vez posso transigir com ella, é quando vejo um povo de ha muitos annos supplicando de mãos postas que lhe façam justiça, e os poderes publicos fazendo ouvidos de mercador, e não tratam de attender ás suas justas reclamações.
Vou fechar o parenthesis e pouco tempo levarei agora tratando da eleição de Vinhaes.
O ponto importante da questão, como disse, é se a camara dos senhores deputados, á vista de documentos irrefragaveis que se acham juntos ao processo, se devem ou não apurar os votos que houve na assembléa de Santalha. Se a camara entende que devem apurar se esses votos, segue-se que a eleição tem de ser approvada; se entende o contrario resolverá então como entender melhor. Mas lembro á camara a disposição do decreto eleitoral, no seu artigo 88.°, que manda apurar, as votações das assembléas onde os trabalhos correrem regularmente.
E pelo que respeita á assembléa de Santalha entendo que nem ao illustre relator da commissão nem á camara deve merecer duvida o apuramento d'esta assembléa, porque convem notar que o candidato o sr. Barreira esteve presente desde o principio até ao fim a todos os actos eleitoraes.
O sr. Ferreira Pontes: — Mas no fim pagou as custas.
O Orador: — Sinto-o deveras.
O sr. Ferreira Pontes: — Depois ficou inhabilitado.
O Orador: — Portanto não me parece que se deva rejeitar o apuramento que se fez d'esta assembléa.
Ora, sr. presidente, eu vejo que a camara deve estar cansada de me ouvir e por isso vou concluir.
Finalmente, eu entendo que por outras muitas rasões a illustre commissão de poderes devia tirar uma conclusão differente, porque no fim de tudo, sr. presidente, nós annullando esta eleição Vamos castigar em primeiro logar todos os eleitores das outras tres assembléas onde a eleição correu regularmente e tambem o deputado eleito. Depois para mim é ponto de fé que cada eleição que se faz n'este paiz, como já disse aqui outro dia, é um desgraçado passo que se dá no caminho da desmoralisação; as eleições, sr. presidente, servem para muito, mas servem tambem para desmoralisar os povos mais do que estão.
Além de que, sr. presidente, convem notar: n'aquelle circulo, presentemente, é grande a animosidade; os animos estão exaltadíssimos, e qual será o resultado que vamos tirar repetindo se a eleição? Como é possivel querermos remediar o mal, aggravando-o? Se os povos estão irritados, annullando-se a eleição vamos dar logar a que essa irritação augmente, e o resultado póde ser fatal!
E depois, sr. presidente, nós não sabemos a que ponto esta reduzido o prestigio da auctoridade? Nós não sabemos qual a força de que a auctoridade póde dispor para fazer manter a ordem publica? Com pezar o digo, mas esta é a verdade e é forçoso confessa-la n'esta occasião.
Pense bem a camara, não vamos nós com a repetição d'esta eleição dar logar a mais funestos acontecimentos.
Não influa no nosso animo o sentimentalismo se, sem ferir a lei, podemos approvar a eleição d'este circulo; approvemo-la e contribuamos por esse modo para acalmar os animos que estão irritados, e esfriar as paixões.
Emfim por minha parte cumpri com o meu dever, sendo grato áquelles povos que já me fizeram a honra de eleger seu representante.
A causa do deputado eleito esta entregue á illustração da camara, e ella em sua alta sabedoria, guiada pelos nobres sentimentos da justiça a que jamais soube faltar, resolverá como entender, e a mim só me resta obedecer á resolução que tomar.
O sr. Montenegro: — O parecer da 1.ª commissão de verificação de poderes, sobre o processo eleitoral do circulo de Vinhaes, esta fundado em bases tão solidas, em rasões tão seguras e tanto em harmonia com os principios de respeito ás instituições liberaes, que não julgava que elle fosse impugnado n'esta casa. Comtudo, a defeza apresentada pelo illustre deputado e meu particular amigo, o sr. Falcão da
Fonseca, não me surprehendeu nem surprehendeu de certo quem o conhecer. E esta mais uma prova do seu elevado cavalheirismo, da nobreza do seu caracter, e da sua dedicação por amigos, que elle vê gravemente compromettidos nos acontecimentos que tiveram logar em Santalha.
Respeito a sua dedicação, mas parece-me que ella o illudiu um pouco na apreciação dos factos, apreciação que eu não julgo contraria aos dictames da sua consciencia para satisfazer os deveres de verdadeiro amigo.
Na exposição dos factos não me referirei a pessoas, como fez o illustre deputado que me precedeu, e não o farei porque, com a máo na consciencia, declaro que não desejo nem levemente ferir pessoa alguma. O meu unico intento é elucidar a camara, e declaro com toda a franqueza que não conheço a maior parte dos cavalheiros a quem se refere este processo, e que foram envolvidos n'estes acontecimentos. O que eu desejo é que a camara vote com perfeito conhecimento de causa, para que não entrem n'esta casa senão os legitimos representantes do paiz, aquelles que representem sómente a vontade livre e desembaraçada dos seus constituintes (apoiados).
O illustre deputado disse que os votos da assembléa de Santalha não influem no resultado final da eleição; mas eu lembro a s. ex.ª que, se aos 2:285 votos das outras assembléas se juntarem os 1:023 votos da? assembléa de Santalha, temos uma cifra total de 3:308 votos, cuja maioria são 1:655: e como o candidato protegido pela auctoridade teve só 1:444 votos, segue-se que não teve maioria absoluta. Mas o illustre deputado provavelmente não quer que se conte a votação de Santalha, e eu acompanho-o n'esta opinião; mas n'este caso esta nulla a eleição, porque n'um circulo onde ha 3:308 eleitores póde desprezar-se a votação de uma assembléa que tem 1:023 votantes, isto é, a terça parte do numero total dos votantes, e de votantes que não prescindiram do seu direito de eleger quem os representasse n'esta casa, mas cujos votos foram annullados pelo emprego brutal da força, praticando-se para com elles um dos attentados mais sanguinolentos e mais revoltantes de que ha memoria nas eleições do paiz!
Mas, sr. presidente, nas outras tres assembléas tambem' ha nullidades insanaveis. Não cansarei a v. ex.ª nem á camara com a exposição dos factos praticados em Vinhaes, porque elles estão largamente descriptos no parecer da commissão; mas pelo exame das actas vê-se que nas assembléas onde venceu a auctoridade se encontraram listas a mais, listas que não vinham por acaso dentro de outras, mas que se via perfeitamente que foram ali mettidas muito de proposito e por meio da fraude.
O sr. Falcão da Fonseca: — Em Vinhaes appareceram só tres a mais.
O Orador: — Tres ou trinta pouco importa, porque em todo o caso revelam a existencia de fraude, e eu tenho aqui um documento que vou apresentar, pelo qual se vê que effectivamente houve fraude em Donai. E a publica fórma de um exame de corpo de delicto, feito perante o juizo de direito de Bragança, no qual se prova, por meio de uma inquirição de testemunhas, que em Donai não se fez uso da uma de que era costume, mas sim de uma nova, onde havia dois repartimentos que se prestaram á fraude.
N'esta uma foram introduzidas pelo abbade de Donai cento e tantas listas, e foram introduzidas com tão pouca cautela que saíam da uma aos massos. Emquanto se fazia a contagem das listas, o abbade de Donai tomou o livro do recenseamento, levou-o para a sacristia, e ali fez as descargas á sua vontade, e depois ainda este bom pastor foi, para as ruas de Bragança, gabar-se d'estas proezas. Este documento esta assignado e reconhecido pelo tabellião Antonio Joaquim Garcia.
O sr. Falcão da Fonseca: — Porque não protestaram?
O Orador: — V. ex.ª sabe perfeitamente os motivos por que não protestaram quando deviam; eu não queria fallar em pessoas, e declarei isto mesmo no principio do meu discurso, por consequencia quero apenas relatar os factos como elles se deram.
Uma eleição onde se deram estas violencias e estas fraudes não póde de modo algum ser approvada por uma assembléa que respeita as instituições liberaes.
Ouvi dizer, não sei se ao illustre deputado (referindo-se ao sr. Falcão da Fonseca), que = tinha havido uma provocação, e que foi em virtude d'ella que se deram as scenas de Santalha =. Em resposta a este ponto direi que a provocação não auctorisa o crime (apoiados).
Mas vou mostrar que não houve provocação alguma. A eleição de Vinhaes correu com toda a placidez; não houve um unico protesto, uma unica reclamação contra a legalidade da eleição, e até durante a votação os dois candidatos passearam juntos e fizeram combinações para empregarem a sua influencia mutua, a fim de retirarem d'aquella localidade alguns influentes que suppunham promoverem desordens.
(Interrupção que se não percebeu.)
Esta asserção não é gratuita, consta de um artigo publicado pelo proprio candidato, o sr. Athaide, no Jornal de Porto. Os dois candidatos combinaram tambem em que não corressem as duas horas antes do escrutinio, e que logo se procedesse a elle, a fim de o acabarem no mesmo dia...
O sr. Falcão da Fonseca: — É verdade.
O Orador: — Diz o illustre deputado que é verdade, e eu estimo.
Mas como é possivel combinarem-se estas relações de amisade, esta boa harmonia durante a eleição, quando se apresenta a idéa de que as mesas estavam opprimidas, e que houve provocações?!...
Disse tambem o illustre deputado que = o candidato da opposição invadira as attribuições da mesa, que assentara os votos e não sei que mais! =
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Á commissão foi apresentado o livro do recenseamento, e foi tambem presente um outro papel onde eram lançados os votos, que foi encontrado na igreja no meio dos estilhaços da uma, manchado com o sangue das victimas sacrificadas ao furor dos partidos. Mas nem no livro do recenseamento nem n'esse apontamento de votos existe uma unica letra do candidato Barreira.
Diz mais o officio do presidente da mesa que = o candidato Barreira tivera 412 votos =; mas no papel que foi apresentado a commissão encontram-se 435, e não sei se estava concluido o escrutinio.
Esta differença revela um espirito de facção; este officio é cheio de inexactidões, e por consequencia não merecem credito algum as asserções da mesa.
Mas digo que esta desordem, não foi provocada, porém premeditada.
O povo de Moimenta foi logo pela manhã para casa do reitor de Santalha de quem o meu illustre amigo acabou de fazer uns grandes elogios, conservou-se ali por bastante tempo até ser chamado para votar, e n'essa occasião...
(Interrupção que se não percebeu).
Tenho aqui outro documento, que hei de apresentar no fim; mas agora vou ler uma pequena parte d'elle: é uma inquirição de testemunhas, que diz o seguinte (leu).
Além d'isso nota-se uma circumstancia singular. É que havendo quatro assembléas, não houve desordens senão unicamente naquellas em que perdeu a auctoridade, não obstante haver na assembléa de Vinhaes exactamente os mesmos preparativos, pois se estabelecêra um arsenal, e correram ás armas na occasião do espaço das duas horas, dando vivas á auctoridade e morras á opposição.
Em Moimenta houve desordens, quando justamente se soube, pelo resultado do escrutinio, que a auctoridade tinha perdido por uma grande maioria, e rebentou a desordem ao signal de um tiro de pistola dado á porta da igreja.
Visto que estou defendendo uma causa justa, cumpre-me fazer justiça a todos.
Estou intimamente convencido de que o governo foi completamente estranho a estes factos (apoiados), assim como as auctoridades superiores.
O sr. ministro do reino deu uma prova de que queria que se mantesse illeza a liberdade e se fizesse justiça a todos, mandando proceder a uma nova syndicancia dos factos de Vinhaes.
Conheço as auctoridades superiores. Uma dellas é um cavalheiro respeitavel e de reconhecida probidade, a outra é um militar distincto e valente que verteu muitas vezes o sangue no campo onde foi hasteado o pendão da liberdade, e um homem que praticou taes actos não podia approvar as scenas vandalicas de Santalha.
Vou apresentar uns documentos. Em primeiro logar uma correspondencia assignada pelo proprio sr. Campilho, administrador de Vinhaes. Leiu apenas um periodo (leu).
Aqui tem V. ex.ª qual era a pressão da mesa. A mesa fazia o que queria e mandava chamar quem queria. E o proprio sr. Campilho que o diz.
Esta aqui um outro documento, que é uma publica fórma de um processo instaurado, onde se fez a inquirição de varias testemunhas.
Este documento esta assignado pelo padre Francisco Antonio de Azevedo e reconhecido pelo tabellião Antonio Joaquim Garcia. Em virtude d'este documento já foram suspensos cinco padres. Um d'elles é o digno reitor de Santalha, que o meu amigo tanto elogiou, e outro é um encommendado de Moimenta, ambos de Moimenta, d'onde é tambem natural e onde habita o candidato protegido pela auctoridade.
Tenho aqui outros documentos relativos á syndicancia; mas como não se fallou n'ella, não faço uso d'elles.
Julgo que cumpro um dever fazendo a descripção d'estes factos, porque sendo esta assembléa composta de homens liberaes, quando se apresentam factos d'esta ordem, não póde deixar de protestar, pela voz de um de seus membros, embora a menos auctorisada e a mais humilde, contra estes factos, em nome da moralidade offendida, em nome da liberdade atacada (apoiados).
Conheço que para a gravidade d'este protesto é pequena a minha voz; mas acima da minha voz esta o sangue das victimas sacrificadas ao furor dos partidos; acima da minha voz estão ainda as lagrimas das familias dos desventurados, que hoje choram a sua desgraça e pedem a esta camara justiça.
Unindo a essas lagrimas a minha humilisssima voz, eu peço a esta camara um exemplo de moralidade e justiça, e ao governo castigo para aquelles que, não respeitando as instituições liberaes, mancharam com o sangue de seus irmãos o estandarte da liberdade.
Vozes: — Muito bem, muito bem.
(0 orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)
O sr. Pequito: — Começo por agradecer ao illustre deputado e meu amigo, o sr. Falcão da Fonseca, as expressões de benevolencia que me dirigiu, e que eu não mereço. Da minha parte não ha senão sinceros desejos de corresponder ao bom conceito com que me honra a sua amisade, e pelo qual lhe tributo o mais profundo reconhecimento.
Principiou s. ex.ª por dizer que o candidato, o sr. Athaide, entregava á justiça da camara a sua causa. E eu acrescento que a entrega muito bem; a camara ha de fazer justiça não só a elle, mas tambem ao candidato o sr. Barreira, porque o que esta assembléa deve sobre tudo desejar, e deseja, é que não entre aqui nenhum deputado que não traga um titulo que mostre devidamente a legitimidade do seu mandato.
Foi animada d'estes desejos, e guiada por estes principios, que a commissão formulou o seu parecer; teve e tem a maior deferencia por um e outro candidato; mas abstrahindo de pessoas, só tratou de ser justa, como era do seu rigoroso dever.
O illustre deputado, o sr. Falcão, disse que a commissão tinha dado muita importancia ao protesto que se apresentou contra a eleição na assembléa de Santalha, talvez sem attender a que a maior parte d'estes protestos são feitos por pessoas até certo ponto suspeitas, e que por isso não merecem grande credito. Ora eu asseguro á camara que a commissão procurou com todo o empenho, e parece-me que o conseguiu, ser o mais exacta possivel na exposição dos factos e na sua apreciação, e basta ler com attenção o parecer, para adquirir a certeza da imparcialidade com que procedeu. A commissão não teve só em vista aquelle protesto, para chegar á conclusão de que se deve considerar nulla a eleição da assembléa de Santalha; mas teve, e principalmente, em consideração, o officio do proprio presidente da assembléa de Santalha, que não "deixa duvida alguma sobre a existencia dos factos atrozes e das irregularidades que invalidaram todos os actos eleitoraes praticados n'aquella assembléa.
Peço licença á camara para ler um trecho d'este officio, para que se veja a imparcialidade com que a commissão se houve n'este negocio (leu).
Já se vê pois que se a commissão não desprezou o protesto, tambem não foi só por elle que se guiou; foi antes porque o supracitado officio e o protesto, com quanto inspirados visivelmente por opiniões e idéas oppostas, concordavam em geral sobre a existencia dos factos e irregularidades que se mencionam, e em que a commissão assentou o seu juizo.
E não conhece a camara toda, pela leitura e confrontação d'estes dois documentos, a gravidade dos acontecimentos occorridos n'aquella assembléa?
Póde facilmente admittir-se que os protestantes dessem um colorido escuro e carregado á linguagem que empregaram na exposição de taes acontecimentos; mas o que a camara não póde deixar de reconhecer é que houve naquella eleição nullidade insanavel de que os mesmos acontecimentos foram causa.
N'estas circumstancias a commissão não cuidou em averiguar quaes foram os auctores daquelles factos, que são graves crimes; não era essa a sua missão, o dever de descobrir e punir os criminosos pertence a outro poder na sociedade.
Não sei se esses auctores foram os agentes da auctoridade, ou se foram os que trabalhavam em sentido contrario; mas se foram aquelles, não posso suppor nem acreditar que o administrador do concelho de Vinhaes, o sr. Campilho, que me parece ser o mesmo cavalheiro que já foi membro d'esta camara juntamente commigo, lhes desse de modo algum taes ordens ou instrucções.
Creio que elle foi estranho a taes acontecimentos, e julgo que não faço senão completa justiça, declarando que tenho para mim que os dois illustres candidatos que se combateram foram não só alheios aos mesmos acontecimentos, mas que até os reprovaram com indignação, devendo elles attribuir-se unicamente á animosidade dos partidos e á exacerbação das paixões que sempre se exaltam n'estas lutas.
Mas, como disse, a commissão não tinha por missão examinar quem tinham sido os auctores d'estes acontecimentos; o fim da commissão era examinar se effectivamente elles se tinham dado ou não, e o grau de gravidade de que estavam revestidos.
O exame de quem foram os auctores de tudo o que succedeu pertence a outro poder, e é por esta rasão que a commissão no seu parecer diz que se remettam ao governo todos os documentos para que, pelas auctoridades competentes, se averigue quem foram os criminosos, afim de que sejam punidos.
E n'estes termos póde porventura haver duas opiniões sobre a nullidade da eleição de Santalha? Não. Ninguem póde duvidar de que aquella eleição esta nulla, e a eleição de Santalha, por consequencia, é como se não tivesse existido; não exprime cousa alguma, para os effeitos legaes não houve ali eleição.
(Interrupção que não se ouviu.)
N'estas circumstancias a consequencia que d'aqui se tira é que 1:023 eleitores d'aquelle circulo ficaram sem poderem exprimir o seu voto.
Ora, se 1:023 eleitores de um circulo onde votaram apenas 2:285 não podem alterar o resultado da eleição, então tem rasão o sr. Falcão da Fonseca; mas é claro, para todas as luzes, que 1:023 eleitores podem alterar, e alterar essencialmente, o resultado da uma eleição em que apenas votaram 2:285.
Não desejo prolongar a questão, e por isso vou terminar já, mesmo porque a camara deve estar cansada da discussão; mas aproveito ainda alguns momentos para declarar ao sr. Falcão da Fonseca que, se apenas não posso concordar com as idéas que s. ex.ª apresentou, não posso deixar de protestar contra as ultimas expressões de que s. ex.ª se serviu.
Diz s. ex.ª que a auctoridade esta ali sem força, que os odios estão exacerbados, que os rancores são profundos, e que por consequencia se se mandar proceder n'uma conjunctura d'estas a outra eleição é possivel que haja maior derramamento de sangue, e que tenhamos mais crimes a lamentar e castigar.
Eu não concordo com esta doutrina, porque o que importava isto? Ratificar uma illegalidade com receio de que houvesse outra de maior importancia. E o mesmo que dizer «não se puna um crime, porque com a punição d'elle póde praticar-se outro maior» (apoiados). Era a consequencia a que nos levava este principio. Pois porque umas eleições foram feitas illegalmente, havemos sancciona-las com receio de que essas illegalidades se repitam?! Esta doutrina é subversiva da ordem social, e o illustre deputado de certo a não quer sustentar.
Estas illegalidades são criminosas, e os crimes não podem deixar de se punir só pelo receio de que se commettam outros maiores. É necessario que os poderes publicos attendam á segurança publica, e empreguem os meios necessarios para que se respeite a liberdade (apoiados).
Eu não tenho receio, até certo ponto, de que estas scenas se repitam, porque entendo que em Vinhaes comprehendem o que é liberdade; e se póde haver um ou outro individuo que não possua os sentimentos generosos que ella inspira, a maioria dos seus habitantes não esta n'este caso. Espero pois que na eleição de Vinhaes, a que se deve proceder, se esta for annullada, como entendo que não póde deixar de ser, se não hão de repetir os crimes que estamos lamentando (apoiados).
Eram estas as considerações que tinha a apresentar á camara; outras podia ainda adduzir, mas a camara esta cansada, e o illustre orador que me precedeu, parece-me que esgotou a materia, por isso termino aqui o que tinha a dizer.
Vozes: — Muito bem.
O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da discussão d'este parecer, e mais os das eleições de Cabeceiras de Basto, Celorico do Basto e Salsete.
Esta levantada a sessão.
Eram quatro horas da tarde.