394 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
ções da camara; as votações da maioria não as commento, e muito menos as censuro. Não lhes desconheço o valor, eu que tenho em muito a honra de ter logar n'esta casa. Mas permitta-me v. exa. que eu apresente alguns factos dos que se têem aqui passado em relação á questão de instrucção publica, e que, me parece, denotam um certa contradicção entre as palavras do sr. ministro do reino e os actos por elle praticados, e entre os applausos que ouvi aqui na camara, quando a este respeito fallou o sr. ministro, e a votação com que foi abafada a discussão da minha proposta. Sr. presidente, o sr. ministro do reino tinha mandado dizer á commissão de instrucção publica que desejava ter com ella algumas conferencias sobre o decreto que havia reformado a instrucção; a commissão prestou se a esta conferencia, e o sr. ministro, de certo pelos seus affazeres, não pôde comparecer no logar e hora que tinha combinado. Nunca mais tornou a convidar a commissão.
Repetiu aqui s. exa. que desejava muito esta conferencia, e, se ella não tinha tido logar, não tinha sido por culpa d'elle, mas que esperava tirar grande proveito do voto auctorisado da commissão. Eu propuz á camara que desse um certo caracter official a esta conferencia, convidando a commissão a dar o seu parecer sobre a reforma, e a camara entendeu na sua alta sabedoria que não precisava do voto auctorisado da commissão.
Postas as cousas n'este ponto, eu não lhes farei commentarios. Pedi hoje a palavra unicamente para insistir com v. exa., sr. presidente; rogando lhe o favor de mandar outra vez para o ministerio do reino a copia da minha interpellação sobre este objecto.
O sr. ministro do reino, quando fallou outro dia aqui sobre este assumpto, já eram passados muitos dias, depois da apresentação da nota da interpellação, disse que não tinha recebido participação alguma. É possivel que se extraviasse pelo caminho a copia que a mesa de certo enviou immediatamente, e por consequencia pedia a v. exa. que mandasse nova copia e nova insistencia para que a interpellação se realise.
Desejei sempre e desejo ainda hoje tratar as questões de instrucção publica da fórma que menos possa maguar o sr ministro do reino, por quem tenho sincera estima.
Apenas cheguei a Lisboa na abertura d'esta sessão, disse a s. exa. que me parecia que ainda se podia remediar grande parte do mal que provinha da sua fórma, visto que pouco estava em execução. Continuei a insistir com o sr. ministro para que ouvisse a este respeito a commissão de instrucção publica, que se prestava do melhor grado a isso. s. exa. não annuiu a este pedido.
Creio que estamos nas vesperas de se realisarem os grandes inconvenientes que hão de apparecer com a execução do decreto da reforma de instrucção publica; porque vi annunciado n'um jornal que dentro em poucos dias apparecerão os regulamentos de que ainda dependia a execução do resto do decreto.
O sr. ministro do reino disse na outra camara que o tinha obrigado a fazer aquella reforma o conhecimento de algumas corruptellas e de certas mercancias que se faziam no professorado.
Não sei d'essas corruptellas, nem d'essas mercancias, mas o que sei é que havia um lyceu que sendo de 2.ª ciasse, precisava todos os annos de ser inspeccionado na epocha dos exames. Os motivos que determinaram o governo a fazer isto devem estar archivados no ministerio do reino.
Para cohibir esta corruptella e estas mercancias a que se referiu o sr. ministro do reino, provavelmente este lyceu de 2.ª classe, com a mesma organisação e com o mesmo pessoal, foi elevado á categoria de 1.ª classe. Se a reforma foi decretada para que as corruptellas e mercancias se evitem, d'esta fórma não a comprehendo.
Desejava que o sr. ministro do reino declarasse positivamente onde existem estas corruptellas e mercancias. É este um pedido que tenho direito a fazer como professor de um estabelecimento scientifico, e que faço tambem não só em nome dos meus collegas d'aquelle estabelecimento, mas de todos os outros que não aceitam por fórma alguma esta accusação que não merecem e que offende o seu caracter, e que se não póde mesmo fazer em relação a um ou a alguns, sem documentos authenticos que a justifiquem.
Proponho-me discutir na occasião de verificar a minha interpellação a reforma da instrucção publica, sem tomar sobre mim a responsabilidade de algumas das accusações que se têem levantado contra ella. Não sei se atrás da maior parte dos artigos da reforma está um individuo que se quiz beneficiar, ou um que se quiz prejudicar. Não sei se na classificação dos lyceus se lembrou o sr. ministro só de uma certa localidade para se esquecerem todas as outras. Não tomo sobre mim a responsabilidade d'estas accusações. Hei de discutir os artigos pelo que elles dizem e não por fórma alguma pelo que alguem tem dito contra elles. (O sr. Luiz de Campos: - Peço a palavra.)
O nobre deputado e meu collega por Vizeu creio que tomou para o lyceu d'aquella localidade uma parte do que eu disse.
Não faço censura aos professores do lyceu de Vizeu, não discuto a importancia da terra, e se porventura disse que havia um lyceu n'este paiz, que sendo de 2.ª classe e precisando ser inspeccionado na epocha dos exames, foi agora elevado a lyceu de 1.ª classe com o mesmo pessoal e sem modificação nos seus estudos, e porque me parece mo uma cousa pelo menos extravagante. Não vi os documentos da secretaria, dos quaes consta a necessidade da inspecção, e não sei quaes os motivos que levaram os governos a mandarem ali os inspectores. Noto só o facto.
Não me parece que dando-se essa necessidade, sem nova organisação e sem novo pessoal, devesse o lyceu de Vizeu ser elevado de 2.ª classe á 1.ª simplesmente por um telegramma. Por um telegramma, sr. presidente.
Como os argumentos da epocha são os dos algarismos, direi a v. exa. que o lyceu de Vizeu, sendo de 2.ª classe, tem de receita, segundo uma nota que vi publicada ha pouco, em cada anno 978$278 réis pouco mais ou menos e faz despeza 3:587$390 réis.
O lyceu de 1.ª classe mais económico que temos tem despeza de 4:060$000 réis. Este argumento não é meu, é da epocha, é d'este governo pelo menos.
Por consequencia, não sei como á luz dos algarismos, d'este argumento tão frisante da actualidade, se possa defender a elevação do lyceu de Vizeu da classe em que estava para aquella que lhe dá a reforma.
Ainda ha mais. O districto de Vizeu, note v. exa., o de Vizeu, é o unico contemplado com dois lyceus, um de 1.ª classe e outro de 2.ª, quando quasi todos os outros districtos ficam sem nenhum.
Por esta reforma até a vasta provincia do Alemtejo não merece a contemplação de se lhe conservar um lyceu de 1.ª classe.
Previno estes factos, mas declaro que não é sobre elles só que quero fundamentar todas as minhas duvidas, todas as minhas desconfianças acerca da importancia da reforma da instrucção publica. Peço a v. exa. que tenha a bondade de convidar o sr. ministro do reino a vir á camara responder á minha interpellação, e n'essa occasião hei de discutir placidamente e na maior altura que poder a reforma da instrucção publica, não porque tenha a esperança de chegar a um resultado proficuo, mas porque, permitta-se-me a expressão já muito usada, quero varrer a rainha testada.
Como deputado e como professor da universidade tenho obrigação de dizer no parlamento, onde tenho a honra de me encontrar, as duvidas que se me offerecem acerca de uma reforma da instrucção que julgo importante.
A camara de certo não aceita as minhas opiniões, mas em todo o caso cumpro o meu dever.
Concluindo, peço a v. exa. que tenha a bondade de expedir nova copia da interpellação no sr. ministro do reino