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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
contribuição predial não póde subsistir como está. Detesto o systema de repartição. Acho-o improprio, porque começa por assentar em bases arbitrarias. Qual foi a base economica, logica, sensata e racional que determinou o actual contingente da contribuição predial? Foi a media dos cinco annos de producto da antiga decima? Mas nós sabemos perfeitamente que a antiga decima estava defraudada, pois que o rendimento collectavel era deficientissimo e não correspondia ao que realmente devia ser. Qual foi a rasão fundamental que determinou o legislador a fixar o contingente em 1:649 contos e não em 2:000 contos?
A contribuição predial deve ser de quota. Para isso é necessario melhorar as matrizes.
Ha quasi seis annos que o consulado regenerador tem as redeas do poder. Compõe-se o governo de homens intelligentes e illustradissimos, de economistas profundos e de experimentados estadistas; mas tem descurado por tal maneira o aperfeiçoamento e correcção das matrizes, que se vê hoje obrigado a crear o imposto das barreiras e de circulação para supprir a sua negligencia e o seu desmazello. (Apoiados.)
Não se diga, portanto, que venho propor o aggravamento da contribuição predial. Venho pedir ao governo que estude, antes de pedir o augmento das contribuições, quaes são os recursos que póde colher da legislação existente. Venho pedir-lhe, que empregue os meios precisos para reformar as matrizes prediaes, e que se prepare, para opportunamente operar a transformação da contribuição de repartição pela de quota, que sendo proporcional á materia collectavel, e acompanhando o natural e espontaneo desenvolvimento da riqueza publica, deve produzir em poucos annos uma enorme receita sem aggravacão, e até talvez com diminuição da taxa ou percentagem respectiva a cada contribuinte, concorrendo efficazmente para desaffogar o thesouro das actuaes difficuldades, e habilitando-nos para dispensar esses pobres e mesquinhos expedientes a que nos vemos obrigados a recorrer.
Eis aqui o que penso a respeito da contribuição predial.
Com relação á contribuição industrial, oh! sr. presidente, não sei o que hei de dizer. É quasi uma vergonha que este imposto esteja nas circumstancias em que se acha. É necessario operar ali uma grande reforma no sentido de desaggravar algumas taxas para aggravar outras. É necessario proceder a inqueritos, a estudos conscienciosos, tendo em consideração os trabalhos que se tem feito n'outros paizes. Lembro para isso a ultima lei de contribuição industrial hespanhola, e os trabalhos devidos á penna de um grande economista, que sinto não tenha hoje assento na camara franceza, mr. Mathieu Bodet, que elaborou em 1872 um magnifico relatorio sobre a contribuição das patentes.
Ahi, sr. presidente, ha principios luminosos, ha reformas profundas, que é necessario ter em vista quando se tratar de applicar, a um paiz pequeno, a experiencia do que lá fóra tem merecido a attenção dos homens competentes, ou produzido grandes resultados. (Apoiados.)
Na contribuição industrial, e na maior parte das nossas contribuições directas, é preciso principalmente attender á organisação das corporações encarregadas de fazer a repartição. (Apoiados.)
As juntas de repartidores influenciadas pelos agentes, politicos do governo, quasi sempre procedem, não em harmonia com os interesses do thesouro, mas em proveito dos interesses politicos d'esses agentes. (Apoiados.)
É preciso, sr. ministro da fazenda, pôr as juntas de repartidores de todas as contribuições directos fóra do alcance das paixões e dos interesses politicos. (Apoiados.) É preciso que os administradores de concelho não tenham interferencia n'essas juntas. (Apoiados.) Só d'este modo, separando a politica da administração da fazenda publica, conseguiremos ter boas e solidas finanças. (Apoiados.)
O que digo é que a contribuição industrial carece de profunda reforma, reforma que s. ex.ª foi o primeiro a reconhecer, quando antes de saír do ministerio nomeou uma commissão encarregada de rever a respectiva legislação, e de propor ao governo as alterações que julgasse mais convenientes sobre este assumpto. Mas que trabalhos, que resultados alcançou s. ex.ª da nomeação d'essa commissão? O que pensa s. ex.ª a respeito da reforma d'esta contribuição? Pois é com as ampliações do real de agua que se pretende reformar a nossa legislação tributaria e attender ás circumstancias especiaes do thesouro? Não póde ser! (Apoiados.)
É de querer que o governo tenha plano mais acabado, pensamento mais completo, idéas definidas e assentes. E é sobre esse ponto que estou pedindo explicações claras o inequivocas. (Apoiados.)
E se á camara parecer que estas reflexões não vem muito a proposito, dir-lhe-hei que a questão de fazenda se levanta naturalmente n'este projecto, porque se levanta sempre nos projectos de impostos. (Apoiados.)
Quando se trata de crear impostos, ahi surge logo a questão de fazenda, e é necessario que cada um tome a sua responsabilidade e diga claramente o que pensa e o que quer. (Apoiados.)
Eu podia fazer uma resenha das reformas que entendo necessarias em todas as outras contribuições publicas, porque todas carecem mais ou menos do que a illustrada intelligencia do nobre ministro da fazenda procure ali remedio para o mal de que o nosso thesouro publico soffre ha muito tempo, e em todas as contribuições actuaes podemos achar mais ou menos recursos para curar esse mal; não o farei agora para, não me desviar demasiado do assumpto que nos occupa; mas devo dizer a s. ex.ª, e n'isto acompanho em uma das suas idéas o meu illustre amigo, o sr. visconde de Moreira de Rey; devo dizer ao illustre ministro que todo o trabalho será perdido, toda a diligencia ficará esteril, se s. ex.ª não acompanhar os seus trabalhos sobre as contribuições de reformas consentaneas ao systema da nossa contabilidade publica; porque, emquanto os governos, emquanto os ministros poderem gastar sem limitação todas as verbas que figurarem no orçamento do estado, e até as que ali não figuram, sem fiscalisação parlamentar, digo a v. ex.ª e á camara que a boa gerencia dos dinheiras publicos ha de depender sempre da boa ou má indole dos ministros. (Apoiados.)
Se tivermos o infortunio de ter ministros dissipadores, a gerencia da fazenda publica, será má; se tivermos a fortuna de ter ministros escrupulosos na gerencia dos negocios publicos, na applicação dos dinheiros do estado, a gerencia da fazenda do estado será boa.
Já vê v. ex.ª que eu supponho que a chave de toda a nossa organisação financeira está n'uma boa organisação da contabilidade publica, e sobretudo na reorganisação do tribunal de contas, ao qual, a meu ver, devem ser dadas attribuições de fiscalisação sobre as despezas publicas, de modo que nenhuma despeza possa ser feita senão dentro das verbas auctorisadas pelo parlamento, e que seja nullo e sem effeito qualquer despacho que ordene a applicação dos dinheiros do estado a despezas illegaes. (Apoiados.)
Sr. presidente, eu já tinha dito, não n'esta sessão, mas por outras vezes, que o projecto de reforma a que me quero referir, do tribunal de contas, não é innovação minha. Está praticada essa idéa na Belgica. Está praticada tambem na Italia. E se eu podesse pedir, em nome dos interesses publicos, algum favor, pediria a s. ex.ª que tivesse em consideração esta materia, que quizesse applicar os largos cabedaes da sua cultissima intelligencia ao assumpto para que estou requerendo a sua attenção; eu pediria a s. ex.ª que tivesse em vista os trabalhos luminosos de organisação da contabilidade a que tem procedido o governo italiano; porque ali, no regulamento do tribunal de contas, ha muito que aprender, e nos trabalhos a que recentemente se deu um dos mais illustres ministros das finanças d'aquelle estado para proceder a uma nova orga-