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SESSÃO DE 26 DE FEVEREIRO DE 1886
Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho (supplente)
Secretarios os exmos. srs.
João José d'Antas Souto Rodrigues
Henrique da Cunha Matos de Mendia
SUMMARIO
Não houve expediente. - Representações mandadas para a mesa pelos srs. M. J. Vieira, Ferreira, de Almeida, Sousa e Silva, Lopes Navarro e Goes Pinto. - Requerimento de interesse publico apresentado pelo sr. Sebastião Centeno e outros de interesse particular apresentados pelos srs. Thomas Bastos, Ferreira de Almeida, Avellar Machado, Moraes Sarmento e Luiz José Dias. - Justificações de faltas dos srs. Teixeira Sampaio, Firmino J. Lopes, Pequito, Jalles, D. Luiz da Camara, Torres Carneiro, Sarmento e Tudella. - O sr. Ferreira de Almeida chama a attenção do governo para o estaco da viação publica no districto de Faro; allude á necessidade de economias no ministerio da marinha e termina mandando para a mesa uma proposta e um requerimento, pedindo a sua escusa de membro da commissão de inquérito parlamentar sobre emigração. - A camara não acceita a escusa; a proposta fica para segunda leitura, - Trocam-se explicações entre os srs. Santos Viegas e ministro da justiça sobre diversos assumptos indicados por aquelle sr. deputado. - Apresenta um projecto de lei, que fica para segunda leitura, o sr. Consiglieri Pedroso, que seguidamente dirige algumas perguntas ao governo, respondendo-lhe o sr. ministro da fazenda. - Trocam-se explicações entre o sr. Sousa e Silva e o sr. ministro das obras publicas ácerca da suspensão dos actos da execução da classificação da engenharia. - O sr. Arouca dirige ao governo diversas perguntas a que responde o sr. ministro da fazenda. - O sr. Lopes Navarro refere-se às representações sobre a construcção do caminho de ferro do valle do Corgo, respondendo-lhe o sr. ministro das obras publicas. - O sr. Carrilho, por parte da commissão de fazenda, manda para a mesa um parecer. - O sr. Moraes Carvalho dirige uma pergunta ao sr. ministro das obras publicas e outra ao sr. ministro da fazenda, que lhe respondem em seguida.
Na ordem do dia entra em discussão o projecto de lei n.° 9 e respectivo pertence sobre o orçamento rectificado. - O sr. Consiglieri propõe e sustenta o adiamento. - Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - Usa de novo da palavra o sr. Consiglieri, respondendo-lhe o sr. Carrilho, relator da commissão. - Toma parte no debate contra o projecto o sr. Elias Garcia, que por ter dado a hera fica com a palavra reservada para a sessão seguinte.
Abertura - As tres horas da tarde.
Presentes á chamada - 69 srs. deputados.
São os seguintes: - Adolpho Pimentel, Agostinho Lúcio, Moraes Carvalho, Albino Montenegro, Alfredo Barjona de Freitas, Silva Cardoso, Sousa e Silva, Pereira Corte Real, António Centeno, Lopes Navarro, Moraes Sarmento, Carrilho, A. M. Pedroso, Santos Viegas, Almeida Pinheiro, Urbano de Castro, Augusto Poppe, Neves Carneiro, Conde de Thomar, Conde de Villa Real, Cypriano Jardim, Ribeiro Cabral, E. Coelho, Elvino de Brito, Emygdio Navarro, Sousa Pinto Basto, Goes Pinto, Fernando Geraldes, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Sant'Anna e Vasconcellos, Franco Frazão, Augusto Teixeira, Scarnichia, Franco Castello Branco, Souto Rodrigues, João Arrojo, Teixeira de Vasconcellos, Sousa Machado, Ponces de Carvalho, Joaquim de Sequeira, J. J. Alves, Simões Ferreira, Amorim Novaes, Correia de Barros, Azevedo Castello Branco, Ferreira de Almeida, Borges de Faria, Elias Garcia, Lobo Lamare, Oliveira Peixoto, Luciano Cordeiro, Luiz Dias, Manuel d'Assumpção, Correia de Oliveira, M. J. Vieira, Pinheiro Chagas, Mariano de Carvalho, Guimarães Camões, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Pedro de Carvalho, Santos Diniz Gonçalves de Freitas, Barbosa Centeno, Visconde de Ariz, Visconde das Laranjeiras e Consiglieri Pedroso.
Entraram durante a sessão os srs.: - Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Antonio Candido, Garcia Lobo, A. J. da Fonseca, Pereira Borges, Cunha Bellem, Fontes Ganhado, Jalles, Sousa Pavão, Pinto de Magalhães, A. Hintze Ribeiro, Fuschini, Barão do Ramalho, Lobo d'Avila, Conde da Praia da Victoria, Estevão de Oliveira, Fernando Caldeira, Vieira das Neves, Correia Barata, Castro Matoso, Wanzeller, Barros Gomes, Matos de Mendia, Costa Pinto, J. A. Pinto, J. C. Valente, J. Alves Matheus, J. A. Neves, Avellar Machado, Dias Ferreira, Laranjo, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano, Ferreira Freire, Pinto de Mascarenhas, Lourenço Malheiro, Reis Torgal, Luiz Osório, M. P. Guedes, Marçal Pacheco, Rodrigo Pequito, Dantas Baracho, Pereira Bastos, Tito de Carvalho, Vicente Pinheiro, Visconde de Balsemão, Visconde do Reguengos e Visconde do Rio Sado.
Não compareceram á sessão os srs.: - Garcia de Lima, A. da Rocha Peixoto, Torres Carneiro, António Ennes, Moraes Machado, Seguier, Augusto Barjona de Freitas, Pereira Leito, Avelino Calixto, Barão de Viamonte, Bernardino Machado, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Carlos Roma du Bocage, Filippe de Carvalho, Francisco de Campos, Mártens Ferrão, Silveira da Mota, Baima de Bastos, Melicio, Ferrão de Castello Branco, Teixeira Sampaio, José Maria Borges, Simões Dias, Luiz Ferreira, Luiz Jardim, D. Luiz da Camará, M. da Rocha Peixoto, Manuel de Medeiros, Aralla e Costa, Martinho Montenegro, Pedro Correia, Visconde de Alentem e Wenceslau de Lima.
Acta - Approvada sem reclamação.
Não houve expediente.
REPRESENTAÇÕES
1.ª Dos moradores das freguezias do Faial, de S. Jorge e Arco de S. Jorge e de S. Roque do Faial, na ilha da Madeira, adherindo á representação em que a camara municipal do concelho de Sant'Anna pede uma nova divisão de comarcas na ilha da Madeira.
Apresentadas pelo sr. deputado M. J. Vidra e enviadas á commissão de legislação civil.
2.ª Dos commerciantes residentes em Albufeira, pedindo para ser substituído o posto fiscal de Albufeira, por uma delegação da alfândega de Faro.
Apresentada pelo sr. deputado Ferreira de Almeida e enviada á commissão de fazenda.
3.ª Da camara municipal da villa da Lagoa, districto de Ponta Delgada, contra a actual circumscripção judiciaria decretada pela lei de 16 de abril de 1874.
Apresentada pelo sr. deputado Sousa e Silva e enviada á commissão de legislação civil.
4.ª Da mesa gerente cio instituto de caridade João do Rego Borges, com séde na villa da Lagoa, districto de Ponta Delgada, pedindo uma medida legislativa que declare os bens da dotação e herança d'este instituto de caridade isentos da contribuição de registo.
Apresentada pelo sr. deputado Sousa e Silva e enviada á commissão de fazenda.
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5.ª Das camaras municipaes de Villa Real e de Villa Pouca de Aguiar, pedindo a construcção de um caminho de ferro pelo valle do Corgo.
Apresentadas pelo sr. deputado Lopes Navarro, enviadas á commissão de obras publicas e mandadas publicar no Diario do governo.
6.ª Da associação commercial do dictricto de Vianna do Castello protestando contra as propostas de fazenda, ultimamente apresentadas, e contra qualquer projecto que haja de apresentar-se em detrimento da conservação d'este districto.
Apresentada pelo tr. deputado José Pinto, enviada á commissão de fazenda e de administração publica e manda da publicar no Diario do governo.
REQUERIMENTO DE INTERESSE PUBLICO
Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviadas a esta camara com urgencia:
1.° As provas escriptas (original ou copia) produzidas pelos candidatos ao concurso, que ultimamente se verificou para o provimento do logar de contador geral da junta do credito publico.
2.° A consulta da mesma junta (copia ou original) sobre o merecimento dessas provas e sobre a classificação dos concorrentes.
3.° Uma indicação summaria dos documentos de habilitações litterarias e scientificas e de serviços, apresentadas por cada um dos concorrentes, a que as mesmas provas respeitam. = O deputado, Barbosa Centeno.
Mandou-se expedir.
REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR
1.º Dos primeiros sargentos aspirantes a officiaes, com o curso da arma de infanteria, Antonio Augusto Pinto de Sousa Cruz, Augusto de Mendonça Vasconcellos, João Maria Esteves de Freitas Junior e José Carlos Pinto da Mota, pedindo que lhes sejam concedidas as vantagens estabelecidas no decreto com força de lei de 24 de dezembro de 1863.
Apresentados pelo sr. deputado Thomds Bastos e enviados á commissão de guerra ouvida a de fazenda.
2.° Do engenheiro naval, Duarte Ferreira de Sampaio, pedindo lhe seja concedido o habito de Avia, mercê a que diz ter direito.
Apresentado pelo sr. deputado Ferreira de Almeida e enviado á commissão de guerra
3.° De José da Silva, tenente almoxarife, pedindo que não seja approvado o projecto de lei do sr. deputado Luciano Cordeiro e que altera o quadro e promoção das praças de guerra de 1.ª classe.
Apresentado pelo sr. deputado Avellar Machado e enviado á commissão de guerra.
4.° Dos coroneis de engenheria Ladislau Miceno Machado Alvares da Silva e Eduardo Augusto Craveiro, pedindo providencias para que não subsista a actual situação e organisação do corpo de engenheria civil.
Apresentados pelo sr. deputado Moraes Sarmento e enviados á commissão de guerra.
5.° Dos tenentes de engenheria José Jeronymo Rodrigues Monteiro e Germano José de Oliveira Junior, no sentido dos antecedentes.
Apresentados pdo sr. deputado Luiz José Dias e enviados á commissão de guerra.
JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS
1.ª Declaro que o meu nobre amigo e collega, o sr. deputado Joaquim Teixeira Sampaio, tem faltado ás sessões e faltará a mais algumas por motivo justificado. = O deputado, Luiz José Dias.
2.ª O sr. deputado António Maria de Moraes Machado tem faltado a algumas sessões e faltará ainda a outras por motivo justificado. = O deputado, Firmino J. Lopes.
3.ª Declaro a v. exa. e á camara que tenho faltado a algumas sessões por motivos justificados. = R. A. Pequito, deputado por Lisboa.
4.ª Tenho a honra de participar a v. exa. e á camara que, por motivo justificado, faltei á sessão de 1 do corrente e a mais algumas, pedindo-vos seja relevada a falta. = Antonio Maria Jalles.
5.ª Declaro a v. exa. e á camara que o nosso collega D. Luiz Maria da Camara tem faltado a algumas sessões e faltará ainda a mais algumas, por motivo justificado. = O deputado, Lopes Navarro.
6.ª Participo a v. exa. que o sr. deputado Torres Carneiro tem faltado ás sessões e faltará ainda a mais algumas por incommodo de saude. = O deputado por Penacova, Vieira das Neves.
7.ª Declaro que, por falta de saude, faltei ás sessões de 22 e 23 do corrente. = O deputado, Antonio Sarmento.
8.ª Por motivo justificado, não pude comparecer a algumas sessões. = O deputado, Miguel Tudella.
Mandaram-se expedir.
O sr. Ferreira de Almeida: - Apresentou um requerimento do engenheiro naval Duarte Ferreira de Sampaio, pedindo que seja tomado em consideração outro requerimento que foz ao governo em 4 de março ultimo para ser agraciado com o habito de Aviz.
Apresentou tambem uma representação dos coinmercian-tes de Albufeira, contra o decreto n.º 3 de 17 de setembro de 1885, relativo á reforma aduaneira, na parte em que substituiu a delegação da alfandega que existia n'aquella villa por um posto fiscal, fazendo a este respeito largas considerações, sobre a importancia commercial, agrícola e historica da referida villa.
Esta representação era dirigida ao governo, mas, estando o parlamento aberto, mandava-a para a mesa da camara, a fim de ter o destino que se julgasse conveniente.
Achava tanto mais justa a petição, porque, como os representantes allegam, foram conservadas delegações de alfândegas em localidades que têem um movimento commercial muito inferior ao de Albufeira.
Mandou para a mesa um requerimento, pedindo a sua escusa de membro da commissão de inquerito parlamentar sobre emigração, e uma proposta para que a mesma commissão, eleita na sessão passada, seja auctorisada a continuar os seus trabalhos durante a actual sessão, e, dado o seu encerramento ou adiamento, até nova convocação parlamentar.
Chamou a attenção do governo para o estado era que só encontra o districto de Faro, nas suas relações com o resto do paiz, não tendo uma única estrada que o ligue com o resto do paiz, tendo os governos de manter uma carreira de vapores, para não se interromperem as communicações com a capital.
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As obras do caminho de ferro foram, por um antigo erro economico, abandonadas ha dezoito annos, e hoje continuam com tanta morosidade, que não se sabe quando estarão concluídas.
Pedia ao governo que attendesse a este estado de cousas, sem pretender desvial-o das suas intenções de economia na administração. Tornar productivos os valiosos capitães que n'aquella linha férrea estão ha muito empatados tambem era uma economia.
A proposito de economias, devia dizer, como sempre tem sustentado na camara, que no ministerio da marinha e ultramar havia muitos cortes a fazer, porque existia ali demasia de gratificações, demasia de pessoal e uma necessidade urgente da reorganisação de alguns corpos, taes como o de engenheiros hydrographos, dos capellães e dos commissarios, ao mesmo tempo que era da máxima justiça attender a uma antiga pretensão de se melhorarem os vencimentos de serviço de navegação, que têem a designação de comedorias.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
A camara não concedeu ao sr. deputado a escusa de membro da commissão de inquerito sobre emigração.
A proposta relativa á mesma commissão ficou para segundas leituras.
O requerimento de interesse particular e a representação tiveram o destino indicado a pag. 518.
Leu-se na mesa o seguinte:
Requerimento
Requeiro se consulte a camara para me ser concedida a exoneração de membro da commissão de inquerito parlamentar sobre a emigração. = Ferreira de Almeida
Posto á votoção, foi rejeitado.
Proposta
Proponho que a commissão de inquérito parlamentar sobre emigração, eleita na sessão anterior, seja auctorisada a continuar os seus trabalhos durante a actual sessão e desde o seu encerramento ou adiamento até nova convocação parlamentar. = Ferreira de Almeida.
Ficou para segunda leitura.
O sr. Manuel José Vieira: - Mando para mesa tres representações, das freguezias do Faial, S. Roque do Faial, S. Jorge e Arco de S. Jorge, concelho de Santa Anna, nas quaes se faz sentir a necessidade urgente de uma nova organisação de comarcas judiciaes no districto do Funchal, ilha da Madeira.
N'este mesmo sentido foram dirigidas a esta camara idênticas representações, e peço, portanto, a v. exa. lhes dê o mesmo destino.
Tiveram o destino indicado a pag. 517.
O sr. Santos Viegas: - Sr. presidente, pedi a palavra, porque desejava fazer algumas perguntas ao sr. ministro da justiça, que vejo presente. Não têem essas perguntas caracter algum político, mas traduzem um desejo apenas de advogar uma causa, que nomeadamente diz respeito a uma classe que represento n'esta casa.
Sabe o nobre ministro, e conhece a camara as circumstancias precarias em que se encontra o clero em geral, e sabe também, que leis ha diversas, que têem mandado proceder á confecção de uma lei especial, para a dotação do culto e clero. A ultima lei, de que me lembro, tem a data de 4 de abril de 1861, e d'ella preceitua-se terminantemente, que os bens dos conventos ou corporações religiosas sejam exclusivamente applicados, note bem a camara, exclusivamente applicados, á dotação do culto e clero, lei essa que, comquanto exista e não esteja derogada, é todavia como se o estivera, porque é letra morta.
As circumatancias são especialissimas para o clero; muitos parochos ha, que não têem os emolumentos proprios da sua parochia, ou ainda as congruas consignadas na lei, não podendo por isso satisfazer aos encargos, que a sua missão espiritual e de caridade lhes impõem, nem ainda occorrer ás necessidades da vida, porque lhes escasseiam completamente os meios. O decreto de 19 de setembro de 1836, conhecendo a urgente necessidade de atalhar este grande escandalo pondera no preambulo que, não tendo sido efficazes as medidas adoptadas para a sustentação dos parochos, que vivem pela maior parto na ultima indigencia e abandono, e não convindo ao serviço da igreja e do estado que tão grande escandalo continue por mais tempo, etc., mandava proceder ao arbitramento e derrama das côngruas. Esta providencia, porém, não atalhou o grande escandalo, como o decreto classifica o procedimento dos governos.
Desejo, pois, que o illustre ministro da justiça, pela illustração que o distingue, e pela nobreza de sentimentos, que o caracterisa, se digne dizer-me se porventura tem em vista melhorar a situação, aliás desgraçada, d'esta classe.
No exercício de um direito, que lhe assiste, e no cumprimento de um dever, que lhe impende, proceda o nobre ministro na organisação das dotações, não privando assim os pobres do obulo do sacerdote, não convertendo o parodio em mendigo, e não aggravando a miséria das nossas parochias ruraes inundadas pelas chuvas, e arruinadas pelo mau estado dos negocios geraes e em especial da agricultura pelo detestavel systema da derrama.
Primeira pergunta.
Como consequencia d'esta minha pergunta, desejava fazer ainda uma outra a s. exa., e é com relação á lei de 2 de dezembro de 1840, de que ultimamente se suscitara a observância pela lei de 4 de junho de 1859, lei esta que se refere especialmente á circumscripção parochial.
Como v. exa. e a camara sabem, esta lei, pelas condições e pelas circumstancias em que devia ser cumprida, melhorava consideravelmente a sorte do clero parochial a que ha pouco me referi, por isso que da nova circumscripcão parochial, madura e reflectidamente feita, resultaria o tornar-se independente, ou pelo menos mais satisfactorio o estado d'aquelles, cuja missão na terra é das mais augustas, porque não ha verdade moral ou civil, que não appareça n'esse livro que se chama Evangelho, e que elles devem ensinar pela palavra e pelo exemplo, e para tanto precisam manter-se com decencia proporcional ao seu estado.
O nobre ministro não ignora de certo, que uma divisão territorial, systematicamente realisada, concorre necessariamente para a regularidade do serviço nas suas mais largas relações da administração, já na ordem civil, já na ordem religiosa.
Sabe tambem s. exa. que a circumscripção parochial é uma necessidade urgente, e digo que é uma necessidade urgente, porque, como ella existe actualmente, obrigando os povos a sacrifícios que muitas vezes não podem fazer, torna precarias as condições de vida, tanto do culto, como do clero.
É de urgencia que se attenue a grande desigualdade que se encontra na actual divisão parochial, para que não succeda serem em muitas d'ellas apoucados os recursos, que mal chegam para as indispensaveis despezas do culto e de encargos adventícios.
Se o sr. ministro quizer iniciar no seu ministério, como creio, um systema de regularisação de serviços, tornando independente, pelos menos nas suas relações officiaes, ao administrador espiritual, o parocho, de certo presta bom serviço, que ha de ser tomado em conta por uma classe que não póde deixar de merecer dos poderes publicos toda a consideração.
S. exa. sabe que, sendo a religião catholica apostolica romana a religião do estado, ao mesmo estado compete dar aos ministros dessa religião os meios para viverem independentes. A lei existe, mas é letra morta.
Se, pois, o sr. ministro deseja tomar em consideração o
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meu pedido, ou antes, se quer dar cumprimento á lei, que o auctorisa a fazer essa circumscripção, bom serviço prestarei, e n'essa parte, como em outras propostas de lei que apresente, e se retiram à classe ecclesiastica em beneficio da igreja, serei o primeiro a tomar conta dessas propostas para lhes dar o meu humilde apoio. Oxalá eu tenha de louvar-me e de louvar o nobre ministro por movel-o apor ao serviço da solução d'este problema a sua sabedoria, o seu bom nome, e o desejo de bem servir o seu paiz.
A terceira pergunta que desejo fazer é a seguinte, e esta é grave, porque é uma questão de dignidade nacional.
Refiro-me ao cumprimento do artigo 2.° da lei de 20 de abril de 1876. N'essa lei dava-se auctorisação ao governo para proceder á circumscripção diocesana, e no artigo 2.° dizia-se terminantemente que apenas feita essa circumscripção, se procederia immediatamente nos termos legaes á fixação dos quadros capitulares.
Entrou como base para o accordo entre a Santa Sé e o governo portuguez essa fixação e o provimento dos quadros ciputulares, e não se tendo cumprido isto, está compromettido o brio nacional.
(Interrupção do sr. Neves Carneiro.)
Posso affirmar ao illustre deputado que uma promessa feita pelo paiz, porque a fez o governo, constituo uma questão de brio nacional.
(Interrupção do sr. Neves Carneiro.)
Repito. Pôde o illustre deputado classificar a omissão, como quizer; eu declaro positivamente que é uma questão de brio nacional, porque é do brio nacional cumprir tudo aquillo a que se obriga o governo em nome do paiz.
Pedia portanto ao illustro ministro que som rodeios e claramente se dignasse dizer-me se porventura está na resolução de dar cumprimento ao artigo 2.° da lei de 20 de abril de 1870.
Quanto á ultima pergunta. O illustre ministro conheceu de certo na universidade, como eu conheci, um dos mais distinctos professores d'aquelle estabelecimento scientifico o sr. D. João Chrysostomo de Amorim Pessoa, que foi escolhido pelo seu muito saber e virtudes para prelado no ultramar e no continente, funcções que com elevado criterio e bom senso desempenhou, e em que se tornou um dos mais respeitaveis membros do alto clero portuguez. Pois este distincto prelado acha-se actualmente sem remuneração alguma pelos seus brilhantes serviços! No orçamento do estado não ha, uru a verba qualquer, que signifique ao paiz a merecida e justa consideração pelos serviços prestados por aquelle illustre prelado, e foram tão relevantes e tão distinctos esses serviços que eu não careço de qualifical-os aqui, deixando á intelligencia e á critica do nobre ministro essa qualificação! Mas, pergunto eu, quererá s. exa. reparar essa falta, mandando consignar no orçamento do ministerio a seu cargo uma verba, que possa testemunhar, ao menos, não indemnização, mas o não esquecimento de sacrifícios soffridos por aquelle venerando prelado da igreja lusitana?
São estas perguntas, que faço ao nobre ministro da justiça, e se porventura as respostas de s. exa. não me satisfizerem, hoje, ou em outra occasião, tomarei de novo a palavra para acrescentar o que julgar conveniente ao que por mim fica exposto.
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Começarei por agradecer ao illustre deputado, as palavras, mais do que amáveis, lisonjeiras, que se dignou dirigir-me. Permitta-me, porém, que eu as lance á conta da antiga benevolencia, a que, o illustre deputado, metem habituado. E posto isto, passo a responder, da maneira que pudor, às quatro perguntas que s. exa. me dirigiu.
Começou s. exa. por perguntar se por parte do governo ha ou não intenção de attender á situação precaria em que se acha o culto e o clero, apresentando alguma proposta para a conveniente dotação.
Eu estou de accordo em muitas considerações, que s. exa. fez a este respeito; mas o illustre deputado sabe que a questão da dotação do culto e clero, é uma das mais graves que se podem agitar, por isso que ella se liga com muitos e diversos interesses, de ordem moral, social e economica.
Conhece tambem o illustre deputado o que a este respeito se tem passado.
Um dos meus mais illustres antecessores, o sr. conselheiro Júlio de Vilhena, apresentou uma proposta com relação a este assumpto. Eu conheço essa proposta, e, n'ella, tive occasião de aprender muito, como sempre se aprende em todos os trabalhos d'aquelle illustre estadista. Não quero tomar compromissos, que não possa solver; por isso, o que posso assegurar ao illustre deputado, e á camara, é que não tendo eu senão uma qualidade para ministro, a de ser homem de trabalho, (Apoiados) hei de pôr os meus esforços, tanto quanto puder, ao serviço do estudo d'essa questão importantíssima; e logo que tenha qualquer trabalho concluído, não terei duvida em pedir á camara as providencias necessarias para uma solução que reconheço ser exigida pelas circumstancias actuaes.
Isto com relação á primeira pergunta.
Com respeito á segunda pergunta, que não é menos grave e importante, a circumscripção parochial, não preciso lembrar ao illustre deputado as difficuldades que ha sobre este assumpto.
Tendo tomado ha pouco posse da pasta da justiça, que me foi confiada por indicação em extremo benévola do meu partido, eu tratei de informar-me dos negocios mais importantes que estivessem pendentes, o que pude fazer com os dignissimos empregados da secretaria, e um d'elles é o da circumscripção parochial.
O sr. Santos Viegas: - Ha uma commissão nomeada mas não tem feito trabalho nenhum; apenas ha alguma cousa feita na circumscripção do Algarve.
O Orador: - Ha uma com missão nomeada com relação a este assumpto, mas eu não pude ainda ver os trabalhos que existem, não tive tempo para isso; s. exa. comprehende isto muito bem. Mas hei de estudar este assumpto, que é tambem tão importante como o primeiro.
Quanto ao terceiro ponto que se refere á execução da lei de 20 de abril do 1876, direi o seguinte:
Esta lei tinha auctorisado o governo, no seu artigo 1.°, a proceder á circumscripção das dioceses; esta auctorisação acha-se cumprida, e em vigor, como v. exa. sabe, o no artigo 2.° determinava, que effectuada a reducção das dioceses, se procedesse, pelos meios legaes, á fixação dos quadros capitulares, das cathedraes subsistentes.
Esta materia, pela sua importancia, chamou a minha attenção, e tive o cuidado de me informar, verbalmente, logo que entrei na secretaria, do que havia a respeito d'este assumpto: soube que existem estudos e trabalhos mas não posso ainda dizer ao illustre deputado quaes sejam, nem os termos em que se encontram, porque ainda não tive tempo de os examinar.
Hei de porém, estudar esses documentos a fim de habilitar o governo a tomar, a respeito desta questão grave, uma deliberação.
O sr. Santos Viegas: - Creio que depois de v. exa. estar devidamente informado, não terá duvida em dizer a sua opinião.
O Orador: - De certo: logo que eu esteja habilitado a resolver este assumpto, não tenho a mínima duvida em dizer ao illustre deputado qual é a resolução que pretendo tomar.
Com respeito á quarta pergunta, v. exa. sabe, que não está nas faculdades do governo, inscrever verbas no orçamento, para occorrer a uma necessidade qualquer, por mais imperiosa que ella seja. No orçamento, não se póde inscrever despeza alguma que não esteja auctorisada por lei; portanto, o que, tenho a dizer a este respeito, é não estar
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nas minhas attribuições fazer inscrever no orçamento despezas que não estejam auctorisadas por lei.
São estas as explicações que tenho a dar ao illustre deputado. Tanto quanto possa, comprometto-me a estudar os assumptos a que s. exa. se referiu: e estou prompto a dar conta ao parlamento de qualquer deliberação que, a tal respeito, o governo entenda dever tomar.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Mando para a mesa um projecto de lei, que me abstenho de fundamentar, porque me parece a sua opportunidade tanta, e ao mesmo tempo affiguram-se me tão claras as suas disposições, que immediatamente se convencerá a camara da necessidade da sua approvação com toda a urgencia, a fim de cohibir os abusos que n'este regimen todos os dias se estão dando.
É o seguinte:
«Artigo 1.° E prohibido aos deputados e aos pares electivos acceitarem do poder executivo durante todo o tempo da sua deputação ou pariato, emprego retribuído, commissão subsidiada, ajuda de custo ou qualquer mercê honorifica.
«§ 1.° Esta prohibição estende-se até um período do seis mezes, a contar da data em que legalmente findarem os seus poderes legislativos.
«§ 2.° Não estão comprehendidas nas disposições deste artigo as nomeações precedidas do concurso por provas publicas, nem tão pouco as promoções no exercito e na armada.
«Art. 2.° E um caso de inelegibilidade absoluta para a legislatura que immediatamente se seguir a circunstancia de ter acceitado, seis mezes antes da respectiva eleição, nomeação ou mercê honorifica ou retribuída feita pelo poder executivo.
«§ unico. Não poderá igualmente ser eleito para uma legislatura, quem dentro d'essa legislatura tiver acceitado qualquer emprego retribuído ou mercê do poder executivo.
«Art. 3.° Com os dois casos de inelegibilidade especificados no artigo anterior e seu paragrapho continuam a vigorar tambem com relação aos pares electivos os mencionados no artigo 12.° e paragraphos do decreto de 30 de setembro de 1852.
«§ 1.° Igualmente continuam em vigor, applicaveis aos pares electivos, as disposições do artigo 19.° do citado decreto de 30 de setembro de 1852 com respeito á perda do logar de deputado.
«§ 2.° Uma lei especial de incompatibilidades parlamentares determinará os cargos publicos incompativeis com o logar de deputado e de par electivo.
«Art. 4.° Se por algum caso imprevisto de que dependa a segurança ou o manifesto bem do estado se julgar indispensável derogar as prescripções dos artigos 1.° e 2.°, sómente a camara dos deputados o poderá resolver e ainda assim apenas quando se pronunciem peia derogação dois terços ao menos dos seus membros por votação em escrutínio secreto.
«Art. 5.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
«Sala das sessões da camara, 26 de fevereiro de 1880. = O deputado, Consiglieri Pedroso.»
Já que estou com a palavra, e sentindo não ver presentes, nem o sr. ministro da guerra, nem o sr. ministro da marinha, aos quaes desejava dirigir-me, vou fazer uma pergunta, ao sr. minstro da fazenda, que vejo presente, á qual espero que s. exa. não terá duvida de responder.
V. exa., sr. presidente, e a camara, sabem anal foi a attitude tomada pelo actual sr. ministro da fazenda, com relação ao decreto de 17 de setembro de 1885, na occasião em que parte d'aquelle decreto aqui se discutia.
Eu, que não tenho de certo nesta caba a auctoridade que tem s. exa., não me atreveria agora a repetir uma parte sequer das graves accusações que foram dirigidas pelo hoje ministro da fazenda á organisação e mesmo ao pessoal da fiscalisação externa das alfandegas. Por essa occasião o sr. Mariano de Carvalho cornprometteu n'este ponto a sua opinião, apresentando uma proposta de inquerito, que o sr. Hintze Ribeiro não acceitou, apesar de ser indispensavel para pôr bem a claro os escândalos de toda a ordem e as irregularidades sem numero que se davam n'aquella administração.
Agora, que vejo o deputado de então sentado n'aquellas cadeiras, pergunto-lhe se está disposto a levar por diante a idéa de com toda a urgencia, mandar proceder ao inquerito que, me parece, é inadiavel, em virtude dos factos que foram aqui revelados.
Tambem desejo perguntar qual a attitude que o mesmo ministro vae assumir com relação aos decretos de 17 de setembro de 1885, entre os quaes, como s. exa. sabe, ha, por exemplo, o n.º 5, sobre contrabando e descaminhos, que é um gravíssimo attentado contra as garantias individuaes.
Sobre este decreto, o actual sr. ministro das obras publicas aununciou uma interpellação, e eu desejo tambem saber se s. exa. mantém as disposições de tal decreto, assim como dos demais, ou se promette trazer ao parlamento uma medida que tenda a revogar aquella lei.
Na minha posição, e com as minhas doutrinas politicas, não aconselharei a s. exa. outro procedimento que não seja aquelle que actualmente indicam as nossas instituições parlamentares.
Tambem vou repetir unia pergunta que foi aqui feita em nome de toda a opposição ao ministro da fazenda transacto.
Está o governo disposto a permittir que esta camara discuta o orçamento de 1886-1887?
O sr. ministro da fazenda comprometteu-se a apresentar uma reforma financeira. S. exa. e a camara toda confessam que as circumstancias do thciouro publico são as mais graves. N'estes termos, eu creio que não haveria melhor preparação para o trabalho a que s. exa. se vae dedicar no interregno das sessões parlamentares do que uma larga discussão da questão de fazenda, em que s. exa. e o governo todo podessem inspirar-se dos alvitres apresentados pela representação nacional, a fim de tirar d'elles os elementos indispensáveis para a sua futura reforma.
Feitas estas tres perguntas, ás quaes espero que o sr. ministro da fazenda responda desde já, peço a v. exa., sr. presidente, que me reserve a palavra para quando estiverem presentes os srs. ministros cia guerra ou da marinha.
O projecto ficou para segunda leitura.
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Respondo precisamente ás perguntas do illustre deputado.
Pelo que respeita á fiscalisação externa das alfandegas, estou disposto, e já comecei alguns trabalhos n'este sentido, a, por todos os meios ao meu alcance, inquerir dos abusos, se os ha, e creio que ha, e de quaesquer outros factos reprehensiveis n'esse serviço praticados; póde o illustre deputado estar certo que nunca consentirei nas repartições publicas quem seja prejudicial aos interesses do estado, ou quem avilte essas repartições. (Apoiados.)
Se a camara quizer votar o inquerito parlamentar, declaro desde já que o acceito gostosamente com uma unica restricção, de que não ha de tolher a rainha acção, se antes do inquerito parlamentar eu descobrir motivos para proceder.
Pelo que respeita ao decreto n.° 5, relativo á punição por descaminhos de contrabando e outros, devo dizer ao illustre deputado que algumas das disposições d'aquelle decreto já estavam numa pratica abusiva, sem comtudo serem lei do reino. A minha opinião é contraria a todas as leis anti-liberaes; e para significar a s. exa. qual é a firmeza das minhas convicções a esse respeito, posso annunciar ao illustre deputado e á camara que dentro em breves dias será publicado um decreto passando para o poder judicial as execuções fiscaes.
Pelo que respeita ao orçamento, s. exa. conhece perfeitamente a situação reciproca do governo e da camara, e
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o que posso dizer ao illustre deputado é que envidarei todos os esforços que estiverem ao meu alcance para que esse documento se discuta com largueza.
O sr. Sousa e Silva: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho da Lagoa, adherindo a uma outra enviada ao parlamento pela camara municipal de Nordeste, em que se pede a alteração da actual circumscripção judiciaria. Rogo a v. exa. que a envie á commissão respectiva.
Mando tambem uma representação da mesa gerente do instituto de caridade João do Rego Borges, com sede na villa da Lagoa, districto de Ponta Delgada, pedindo que seja convertido em lei o projecto de minha iniciativa, que teve segunda leitura na sessão de 4 de junho do anno passado.
Considero justissimo este pedido, e aproveito a occasião para declarar que, pela minha parte, tenho como pouco moraes os impostos lançados sobre a esmola, e por isso estarei sempre prompto a concorrer para que se converta em lei o projecto a que me refiro, bem como um outro, tambem pendente d'esta camara, que isenta de contribuição de registo os legados feitos a estabelecimentos de beneficencia.
Visto que estou com a palavra, vou referir-me em breves termos ao que disse o sr. ministro das obras publicas no primeiro dia em que se apresentou n'esta casa.
Disse s. exa. que a primeira cousa que fizera assim que chegara ao seu ministerio, tinha sido suspender por um despacho a classificação da engenheria civil.
Até hoje ainda não vi publicado no Diario do governo tal despacho, que seria illegal, visto que as tabeliãs de classificação foram publicadas em virtude de um decreto, que não póde ser revogado por um despacho guindado ás alturas de portaria surda.
Pergunto portanto ao sr. ministro nas obras publicas se tenciona suspender legalmente aquella classificação. As tabellas da classificação da engenheria civil têem uma parte que se refere unicamente aos conductores de obras publicas. Eu desejaria que s. exa. me dissesse se tem tambem as mesmas rasões para suspender esta parte das tabellas.
O illustre ministro sabe que ha vinte e dois annos que esta classe de funccionarios muito prestantes anda aos baldões, unicamente por causa das questões de preferencias de antiguidades que existem entre os engenheiros. Prestando elles grandíssimos serviços no ministerio das obras publicas como auxiliares dos engenheiros, e tendo até alguns desempenhado com muito zelo e intelligencia commissões superiores as da sua categoria, é preciso que se olhe pelo seu futuro e não se deixem indefinidamente numa posição dubia, a que não deram origem, e para a qual não têem concorrido.
Não havendo portanto motivo para suspender a classificação dos conductores, eu peço ao illustre ministro que declare isso mesmo, e não faça com que elles fiquem, só Deus sabe por quanto tempo mais, sem direito definido a promoções, sem aposentação, e sem mesmo poderem pertencer ao monte pio official.
Tenho dito.
As representações tiveram o destino indicado a pag. 517.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Eu não suspendi a classificação da engenheria e a reforma em que ella assenta; mandei unicamente suspender quaesquer actos da execução d'aquella classificação, o que é um pouco differente, posto que á primeira vista o não pareça. Suspendi a execução para impedir que se praticassem quaesquer actos, que, tendo o valor de factos consummados, podessem ser invocados como direitos adquiridos, constituindo um estorvo para o governo poder adoptar uma resolução definitiva a este respeito.
Ainda antes de tomar posse do meu cargo fui procurado por uma commissão numerosa de engenheiros que reclamam contra a classificação, e não só contra ella, mas contra algumas bases em que assentou.
A reclamação era não só de engenheiros militares, mas de muitos engenheiros civis. Havia por consequencia um assumpto grave e momentoso que se impunha á minha attenção immediatamente, e que eu não podia deixar de estudar com cuidado e vagar, porque não é d'aquelles que se podem resolver num simples relance. Portanto, era-me necessario suspender os actos de execução, para poder deliberar com acerto e proveito. Foi o que fiz. Mas, logo em seguida a isto, pedi a alguns engenheiros, que mais em contacto estão com a engenheria civil, que dentre si escolhessem uma commissão de tres ou cinco membros da sua classe; e igual pedido fiz aos engenheiros militares. Uns e outros accederam ao meu pedido, e com estes dois grupos formarei uma commissão que ha de ser nomeada ámanhã, ou n'um dia proximo, e á qual eu próprio presidirei, ficando essa commissão incumbida de considerar as reclamações contra a classificação, e estudar as modificações a fazer nas bases em que ella assentou, de modo que se conciliem, no que for possível, os interesses que hoje se mostram divergentes, e que se respeitem tambem os interesses do thesouro.
Espero, activando esses trabalhos, poder apresentar ainda n'esta sessão legislativa qualquer providencia, ou para ser definitivamente suspensa e alterada a reforma nas suas bases geraes, ou sómente modificada nas bases que serviram para a classificação. Portanto, o meu despacho é como se costuma dizer, na jurisprudencia dos tribunaes, sómente um despacho interlocutorio, para melhor poder preparar uma sentença definitiva.
A commissão vae ser nomeada, os trabalhos hão de proseguir activamente, para, segundo elles, se tomar uma providencia definitiva a esse respeito. Não posso dizer desde já qual ha de ser o meio em que assentarei, para pôr termo a esta lucta que existe entre os engenheiros civis e os engenheiros militares, e que dura ha mais de vinte annos. Mas, o que posso dizer ao illustre deputado é que tenho o maior empenho em resolver a questão, conciliando os interesses das duas classes e os de cada uma dellas com os do thesouro, que não são menos legítimos.
Quanto aos conductores, está comprehendida esta classe nestas explicações geraes, e a medida que se tomar para uns comprehenderá os outros.
O sr. Arouca: - Começarei por felicitar o sr. ministro da fazenda pela resposta que deu ao illustre deputado o sr. Consiglieri Pedroso, por isso que s. exa. manteve quanto ao inquérito parlamentar nas cadeiras do governo a mesma doutrina que sustentara o sr. Hintze Ribeiro.
Felicito, pois, o sr. Mariano de Carvalho por sustentar como ministro as mesmas opiniões que teve o seu antecessor.
O sr. Mariano de Carvalho, quando era opposição, propoz o inquérito e o sr. Hintze Ribeiro, recusou-o, dizendo que não era preciso o inquerito, porque lá estava elle para inquerir e para fazer justiça; agora o sr. Consiglieri Pedroso lembra a necessidade do inquerito e o sr. Mariano de Carvalho diz que lá está elle para inquerir.
Exactamente a mesma cousa, e, portanto, só tenho a felicital o.
Mas veja a camara que mudança, que transição das cadeiras da opposição para as cadeiras do governo!
Agora desejo ouvir a opinião do governo ácerca de um assumpto a que se refere um jornal de Penafiel.
Affirma se nesse jornal que os empregados do real de agua estão exigindo este imposto aos lavradores, mesmo quando elles não vendem a retalho, fundando-se nos artigos 22.° e 70.° do regulamento de 1879.
O referido jornal, tratando desta questão com muita proficiência, sustenta que o imposto só póde ser exigido aos lavradores quando, venderem a retalho, e que esta exigen-
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cia que se faz aos lavradores está em desharmonia com a lei que regula esta materia.
Eu penso pela mesma fórma.
Desejava por isso que o sr. ministro da fazenda mo dissesse se entendia que esta exigencia era justa ou injusta. E no caso de entender que é injusta e illegal, pedia a s. exa. que desse as providencias necessárias para não continuar este vexame; se s. exa. entender que tal exigência é justa, então terei occasião de annunciar uma interpellação a s. exa., em que prometto tratar largamente d'este assumpto.
Como um dos pontos do programma do governo é uma revisão justa e prudente da pauta, farei ao sr. ministro da fazenda uma pergunta.
Na pauta antiga o direito de exportação dos vinhos para consumo era de 20,50, e pela proposta do sr. Hintze Ribeiro passava a ser de 18. Ha uma grande desigualdade na applicação do imposto indistinctamente ao vinho branco e ao vinho tinto, não só porque a exportação do vinho branco é quasi nulla, como tambem porque o preço d'este é muito inferior ao do vinho tinto, chegando a ser ás vezes da terça parte.
Um jornal que tem sido muito citado na camara, A Província, ainda hoje annuncia terminantemente que, ou o governo se ha de occupar da questão da agricultura, ou ha de morrer. E eu não desejo que elle morra. (Riso.)
Uma voz: - Tem rasão.
O Orador: - Não sei se aquelle jornal entende que a questão agrícola só póde ser tratada pelo novo ministerio de agricultura. (Riso.) Mas seja como for, eu desejo tratar essa questão, não só para ser agradável ao ministerio, mas para fazer um serviço ao meu paiz.
Com franqueza eu desejava mais que esta questão fosse tratada pelo meu illustre amigo o sr. Navarro, (Apoiados.) porque reconheço em s. exa. muito talento e muita aptidão. (Apoiados.) Ainda na sessão de ante-hontem deu s. exa. uma prova disso, quando respondeu ao meu amigo o sr. Adolpho Pimentel, relativamente a um assumpto gravíssimo, que dizia respeito á exportação dos nossos vinhos pela barra do Porto. Felicito o illustre ministro pela opinião que expendeu, e que eu desejo que fique registada, porque me parece que a questão é da mais alta importancia, porque póde affectar em muitas dezenas de contos o thesouro, e arruinar muitos viticultores da região do sul. (Apoiados.)
Se não me engano, a opinião do sr. ministro das obras publicas, foi esta: que era tarde para se voltar á legislação de 1852, e que a marca para auctorisar a saída pela barra do Porto não era senão a sancção da fraude.
Esta é tambem a minha opinião; e se alguma vez se tratar d'este assumpto, terei occasião de mostrar a v. exa. e á camara a gravidade desta questão e de lhe fornecer esclarecimentos muitíssimos curiosos, e que demonstram o enorme prejuízo que adviria para a agricultura e para o paiz se se adoptassem propostas d'aquella natureza.
Eu fiz a diligencia para conversar com o sr. Thomás Ribeiro sobre este assumpto, mas a estreiteza do tempo não o permittiu, e o assumpto está por assim dizer discutido, desde que o illustre ministro das obras publicas se pronunciou por uma fórma tão positiva.
Posto isto, vou fazer a primeira pergunta ao sr. ministro da fazenda, e é se s. exa. está resolvido a baixar os direitos sobre a exportação do vinho branco, para facilitar a saída d'esse vinho. Este negocio diz tambem respeito á pasta das obras publicas, mas como é uma questão de pautas, defere-se mais particularmente ao ministerio da fazenda.
A segunda pergunta é a respeito dos cereaes. Como um dos pontos do programma do novo gabinete se refere á revisão da pauta, é de crer que o sr. ministro da fazenda terá sobre este assumpto idéas assentes. Desejo, pois, saber se s. exa. está resolvido a elevar o direito sobre a importação do trigo estrangeiro, para, d'este modo, fazer subir o preço do trigo nacional.
Passando a occupar-me do terceiro assumpto, para que pedi a palavra, desejo saber se o sr. ministro da fazenda ou das obras publicas estão resolvidos a manter as idéas que tinha o sr. Aguiar, a respeito de uma transacção com a companhia dos canaes da Azambuja.
Como v. exa. e a camara sabem, esta companhia tinha um contrato com o governo, e em virtude desse contrato começou umas certas obras. Parece, porém, que essas obras foram interrompidas por caso de força maior, ou, segundo a companhia allega, por culpa do governo e das auctoridades administrativas.
Em vista d'isto, intentou-se por parte do governo uma acção de rescisão do contrato, e a companhia contestou essa acção, e por seu turno intentou contra o governo uma acção de reconvenção, pedindo perdas e damnos, porque entendeu que o governo é que tinha a principal responsabilidade de se não ter cumprido o contrato.
O facto é que quem soffreu foi o estado e os povos dos concelhos da Azambuja e do Cartaxo, circulos que eu e o sr. ministro da fazenda representamos nesta casa.
Nós dois conhecemos o assumpto, que interessa igualmente a ambos os concelhos.
O sr. Aguiar tinha chegado já a um accordo com a companhia.
Por esse accordo, que não vale a pena desenvolver agora, a companhia cedia de todos os seus direitos e mesmo das propriedades que havia recebido do estado.
E em virtude de uma representação que a camara municipal da Azambuja poz nas mãos do sr. ministro das obras publicas, o sr. Aguiar, tencionava este illustre cavalheiro pedir ao parlamento auctorisação para ceder áquella camara municipal o esteiro e respectiva caldeira e a casa de guarda que se acha no largo do Esteiro.
Esta questão parece de campanario, mas é de interesse geral, porque pelo esteiro da Azambuja é que saem os vinhos do norte do concelho do Cada vai, do concelho de Obidos, do concelho de Azambuja e dos legares limitrophes do concelho do Cartaxo.
Aquelle esteiro era a única via fluvial por onde se tiravam aquelles vinhos.
Entulhado, como hoje está, não é accessivel senão em certas marés, e alem d'isso é um foco perigosissimo, tanto mais para se evitar, quanto é certo que por toda a parte se tomara providencias para conseguir que o cholera, se entrar em Portugal, faça o menor numero de victimas que seja possível.
Desejo saber se o sr. ministro das obras publicas e o sr. ministro da fazenda estão resolvidos a proseguir n'estas negociações e a resolver esta pendencia, que, por não ter sido já resolvida, não tem feito senão causar prejuízos ao paiz.
Tenho dito.
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Sr. presidente, responderei ao illustre deputado o sr. Arouca, que muito considero, respeito e aprecio, com a mesma precisão e concisão com que respondi ao illustre deputado o sr. Consiglieri Pedroso.
Em primeiro logar não ha exacto parallelo entre a resposta que dei ha pouco sobre a fiscalisação externa das alfândegas e a que deu o sr. Hintze Ribeiro.
Não ha, pois, contradicção alguma como disse o sr. Arouca.
O sr. Hintze Ribeiro entendeu que devia inquerir por si proprio, e por motivos que não discuto n'este momento, declarou que não acceitava o inquerito parlamentar, e eu declaro que o acceito de boa mente.
O sr. Frederico Arouca: - O sr. Hintze Ribeiro declarou que não acceitava o inquerito; mas a camara, fazendo o que entendesse, podia votai-o.
É o que póde succeder agora.
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O sr. ministro declarou que queria inquerir por si mesmo; e a camara póde votar ou não o inquerito.
O Orador: - Está claro que a camara pode dizer se quer ou não o inquérito; mas o sr. Hintze Ribeiro não o acceitava, e eu acceito-o de bom grado. (Vozes: - Muito bem).
Pelo que respeita ao real de agua, não tenho conhecimento das queixas a que se referiu o illustre deputado, e s. exa. comprehende muito bem o motivo d'essa ignorancia, que é o ter tomado conta da pasta da fazenda ha meia dúzia de dias; mas estou disposto a fazer cumprir a lei de 1878, em virtude da qual só são sujeitos ao imposto do real de agua os géneros expostos á venda para consumo.
Acrescentarei que o sr. ministro das obras publicas, eu e todos os membros do governo estamos dispostos a tratar com a maxima attenção as questões da agricultura, não pela rasão de morrermos politicamente, o que para mim não era muito grave, mas porque é o nosso dever.
Alem disso ainda, porque terei occasião de travar discussão larguíssima com e illustre deputado, que tem grandíssimo conhecimento de cousas agricolas.
Pelo que respeita á questão sobre a exportação do vinho tinto e do vinho branco, estou completamente de accordo com o illustre deputado, em que deve o direito de exportação do vinho branco ser inferior ao do vinho tinto. (Apoiados.)
Pelo que respeita á questão dos cereaes, já outro dia disse francamente á camara o que penso a esse respeito, como direi igualmente hoje, porque nunca quero occultar a minha opinião.
Não estou convencido, de que a cultura do trigo, porque é a essa que principalmente se referem as queixas, se possa manter por largos e indefinidos annos em Portugal. Estamos nos confins da região agrícola, propria para a cultura do trigo, e por isso esta cultura é sempre precaria e difficil; mas ao mesmo tempo entendo, que não podemos arruinar a cultura cerealífera, e é necessario preparar uma transição lenta, gradual e prudente para culturas mais productivas.
Portanto, estou disposto a proteger a cultura d'esse cereal, mas preparando as transições para melhor futuro.
Quanto á questão do canal da Azambuja, estou plenamente de accordo com o illustre deputado.
É de indispensavel necessidade e urgência, que o governo tome posse d'aquelle canal, pelo motivo da salubridade publica que s. exa. allegou, e tambem porque abandonado como está hoje, á mais pequena aziéla e até com as marés as aguas do Tejo invadem os campos, havendo prejuízos e graves ruínas! Não é segredo, que está convocada para hoje a commissão de fazenda, e de accordo com o meu collega das obras publicas, pedir-lhe-hei auctorisação, visto que este não é um assumpto político, para tratar com a companhia do canal de Azambuja, a fim de ver se se póde pôr termo a esta questão.
Não sei se o illustre deputado me perguntou mais alguma cousa; mas parece-me que as respostas estão dadas nos mesmos termos em que as perguntas foram feitas. (Apoiados.)
O sr. Lopes Navarro: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa duas representações, uma da commissão executiva da junta geral do districto de Villa Real, e outra da camara municipal do concelho de Villa Pouca de Aguiar, ambas pedindo a prompta construcção do caminho de ferro de via reduzida, chamado do valle do Corgo, que, partindo da linha ferrea do Douro, nas proximidades da Regua, siga pelo alludido valle do rio Corgo, e vá terminar na villa de Chaves.
Já n'uma das sessões passadas, quando tive a honra de mandar para a mesa uma representação da camara municipal da sede do referido districto sobre o mesmo assumpto, disse que achava altamente justas as rasões que fundamentavam o pedido de um tão importante quanto necessario melhoramento, e por isso não me alongarei, por agora, em mais largas considerações sobre o justo pedido das alludidas corporações, reservando-me para o fazer, quando o julgar mais opportuno, então mostrarei quanto este desgraçado districto tem sido descurado por todos os governos, a ponto de se não gastar um terço da verba votada annualmente para estradas!
O talentoso ministro das obras publicas, que eu muito folgo de ver sentado n'aquellas cadeiras, já na outra casa do parlamento, respondendo ao illustre estadista e meu particular amigo o sr. conselheiro Lopo Vaz, fez a declaração categorica de que envidaria todos os esforços para ver se em breve podia apresentar ao parlamento uma proposta de lei, pela qual podesse ser construído este caminho de ferro, sem subvenção ou garantia de juro, o que traria um encargo immediato para o thesouro, mas lançando simplesmente mão para o conseguir de uma justa compensação de tarifas e da isenção do imposto de transito.
Eu sei que foi esta a declaração feita na outra casa do parlamento pelo illustre ministro; mas, sem o querer incommodar, em breve desejava que s. exa. ratificasse n'esta casa a declaração que fez na camara dos dignos pares do reino.
Mando tambem para a mesa uma justificação de faltas do nosso collega e meu particular amigo, o sr. D. Luiz Maria da Camara, que por doença não tem podido comparecer a algumas sessões da camara, nem poderá, infelizmente, comparecer a mais algumas pelo mesmo motivo.
Sr. presidente, peço, por ultimo, a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que as representações que tive a honra de mandar para a mesa sejam publicadas no Diario do governo.
Foi approvada a publicação. 518.
Tiveram o destino indicado a pag.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Pouco mais tenho a dizer ao illustre deputado e meu amigo do que já disse sobre o assumpto na camara dos dignos pares.
Não apresentarei a proposta para o caminho de ferro do Corgo, se ella só podér ser viavel com subvenção ou garantia de juro, porque estou na firme resolução de não apresentar novas propostas de melhoramentos materiaes, que importem augmento de encargos para o thesouro, emquanto durarem as actuaes circumstancias financeiras.
Os povos interessados julgam possível, como o dizem na sua representação, que esse melhoramento se faça, tendo por base financeira um systema de compensações e reducções de tarifas para as mercadorias, que da linha do Corgo passem para a do Douro. N'esses termos, estou prompto a apresentar a proposta. E folgarei de poder fazel-o ainda n'esta sessão legislativa.
Para que o illustre deputado não pense que isto são apenas boas palavras, acrescentarei que desde logo tratei de procurar a realisação pratica d'aquelle pensamento.
Indagando quem fôra o cavalheiro, que principalmente suggeríra e formulara aquellas bases financeiras, soube que elle residia no Porto. Pedi-lhe que viesse a Lisboa, e já conferenciei com elle. Prometteu-me mandar estudar immediatamente sobre o terreno as condições geraes do traçado, para me habilitar com uma resposta decisiva, que me permitta apresentar, ainda nesta sessão legislativa, a respectiva proposta de lei, se os resultados do estudo confirmarem as suas previsões e supposições.
Bem vê o illustre deputado, que não perdi nem um só dia para dar cumprimento leal á minha promessa. Eu não hei de ser fácil em prometter; mas hei de esforçar-mo sempre por cumprir o que prometta.
Renovo, pois, as minhas declarações, nos precisos termos em que as fiz, assegurando ao illustre deputado, que tratarei de me desempenhar lealmente do compromisso que tomei.
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O sr. Carrilho: - Por parte da commissão do orçamento, mando para a mesa o parecer sobre a proposta de lei do governo transacto, relativo ao encerramento das contas geraes para o exercicio de 1877-1878 a 1882-1883, proposta que o governo actual acceitou.
A imprimir.
O sr. Goes Pinto: - Já na sessão anterior v. exa. me tinha inscripto, mas não pude usar da palavra em consequência de se ter prolongado o debate politico a que deu logar a apresentação do novo gabinete, em face do qual reputo inutil declarar qual é a minha attitude. O governo sabe bem que póde contar com o meu leal o desinteressado apoio.
Por occasião de serem apresentadas ao parlamento pelo illustre ministro demissionario sr. Hintze Ribeiro as propostas de fazenda que são conhecidas de toda a camara, a associação commercial de Vianna do Castelio convocou uma reunião de todo o corpo commercial d'aquella cidade, a fim de discutir essas propostas; foi resolvido nessa reunião que se representasse ao parlamento contra ellas, ou, melhor, e contra a maior parte das disposições n'ellas contidas. E essa representação, que a associação commercial me incumbiu de apresentar á camara, que eu tenho a honra de mandar para a mesa.
Coincidiu com a discussão que geralmente se levantou a proposito das medidas de fazenda o espalhar-se o boato de que o governo transacto pensava em supprimir o districto de Vianna, annexando-o ao de Braga. Dizia-se ser essa suppressão uma compensação offerecida a este districto, a fim de pôr termo á lamentável questão entre Braga e Guimarães.
Eu devo declarar com intima lealdade que tanto o sr. Fontes, como o sr. Barjona, me asseguraram que não estava nos intuitos do governo a suppressão do districto de Vianna, mas esta declaração, que me deixou tranquillo na qualidade de representante de quatro dos concelhos d'aquelle districto, foi posterior á reunião de que fallei. Era pois natural que, reunido o corpo commercial para discussão das medidas de fazenda, não deixassem de levantar-se eloquentes protestos em favor da integridade do districto. E assim succedeu.
D'esses protestos se faz interprete a representação que foi dirigida ao parlamento.
Pela minha parte junto a minha voz á d'aquelles que pedem ao poder legislativo que não dê a sua approvação a qualquer projecto que attente contra a integridade do districto de Vianna, e presumo poder assegurar que n'este ponto sou fiel interprete dos desejos de todo o districto.
É certo que, pelo que respeita ás medidas de fazenda, caducou até certo ponto esta representação em consequência da demissão do gabinete regenerador, mas ha n'essa representação a affirmação do que reputo bons principios financeiros e administrativos, ha a affirmação dos justíssimos votos pela integridade do districto, e por isso não quero considerar-me desonerado do encargo de a mandar para a mesa, pedindo ao mesmo tempo a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que ella seja publicada no Diario do governo, por isso que ella está concebida em termos perfeitamente dignos e convenientes.
Foi approvada a publicação.
O sr. Moraes Carvalho: - (O discurso do sr. deputado será publicado quando s. exa. o restituir.)
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - A resposta á pergunta que me dirigiu o iilustre deputado estava dada, em vista dos termos geraes da declaração que fiz na camara dos dignos pares.
Disse ahi, e agora repito, que não proporei, emquanto as circumstancias do thesouro forem pouco prosperas, melhoramento algum novo que custe encargos, mas empregarei todos os esforços para realisar os melhoramentos votados anteriormente, e que estão nas leis do paiz. Os melhoramentos no porto de Lisboa acham-se comprehendidos n'este caso.
E permitta me o illustre deputado que lhe diga que é menos exacta a sua asserção de que a opposição combateu, a todo o transe o respectivo projecto.
Essa questão foi dada como aberta para o partido progressista. A quasi totalidade da imprensa progressista defendeu calorosamente esses melhoramentos; e o sr. Mariano de Carvalho, que hoje se senta nos bancos do governo, defendeu essa idéa, concorrendo até para que a lei saísse um pouco mais perfeita, ou menos defeituosa do que se propunha.
Isto é muito differente do que o illustre deputado affirmou.
Póde, portanto, estar descansado o illustre deputado que não adiarei um melhoramento do tanto interesse para o commercio e para a capital. (Apoiados.)
Seria má pratica, um governo que entra deitar abaixo tudo o que o seu antecessor deixou. No poder ha successão do partidos; mas na acção dos governos não deve haver solução de continuidade. (Apoiados.) Esta é a minha opinião, como regra geral.
No caso especial, acresce que não poderia pôr-se ponto no assumpto, nem offender direitos legitimamente constituídos.
O concurso está aberto, e já com praso terminado, para escolha do projecto definitivo, e prémio aos projectos mais notaveis.
É claro, que o concurso tem de ir até final, para se respeitarem os direitos adquiridos por indivíduos, que a elle foram chamados, e se dedicaram a trabalhos e estudos demorados e despendiosos. Nào póde calcular-se em menos de 8:000$000 réis a 10:000$000 réis o custo de cada um dos projectos que estrio sendo examinados. Quem se abalançou a essa despeza e ao trabalho correspondente tem direito a não ser espoliado da expectativa do premio que se lhe prometteu.
Os projectos apresentados são cinco. Estão nas mãos do sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa, cuja alta competencia é de todos reconhecida, e a quem foram enviados pelo meu antecessor n'esta pasta, o sr. Thomás Ribeiro.
Como o sr. João Chrysostumo tem estado incommodado de saude, não tem por isso podido dar por concluídos os seus estudos sobre aquelles projectos; mas já dei ordem no meu ministerio para que seja posto á disposição de s. exa. todo o pessoal necessario para o auxiliar nos trabalhos de menos cuidado, a fim de s. exa. poder desempenhar-se com menos encardo da missão que lhe foi incumbida.
Dadas estas explicações, já o illustre deputado vê que a intenção do governo é manter a lei dentro da auctorisação parlamentar, e que eu impossibilitado de apresentar propostas minhas, não me descuido em procurar realisar as que o governo transacto deixou votadas.
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Cumpre-me responder tambem ao illustre deputado o sr. Moraes Carvalho.
É certo que em 1880 os illustres deputados da opposição regeneradora combateram n'esta casa a arrematação do real de agua, assim como combateram o imposto de rendimento na sua applicação ás inscripções, aos vencimentos dos funccionarios publicos e á massa dos contribuintes que esse imposto ia abranger.
Pouco depois o governo progressista caiu, e succedeu-lhe no poder o partido regenerador; o ministerio d'essa situação, de que fazia parte, como ministro da fazenda, o sr. Lopo Vaz, se não usou da auctorisação relativa á arrematação do real de agua, manteve comtudo o imposto sobre as inscripções, manteve o imposto sobre os vencimentos dos funccionarios publicos, e só supprimiu a parte do imposto de rendimento que recaía principalmente sobre os maiores contribuintes do paiz.
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Bem vê, pois, o illustre deputado que eu, sem dever ser increpado de incoherencia, podia neste momento renegar a arrematação do real de agua; mas, em principio, não a renego. Agora, uma cousa é renegar ou não uma idéa em principio, outra cousa é regular praticamente a sua execução. Eu julgo necessario e urgente proceder, não só á reorganisação da administração publica e á resolução da questão fazendaria em geral, mas tambem á resolução da questão fazendaria districtal e municipal; (Apoiados.) e com esta e com aquella prende a questão do real de agua.
Portanto o governo não pensa em usar da auctorisação para arrematar o real de agua; pensa por emquanto em fazer cumprir com rigor e vigilancia as disposições legaes sobre a cobrança dos impostos, e espera trazer á camara em praso não muito longo propostas para a reorganisação da fazenda municipal e districtal, e para a melhoria do estado da fazenda publica. Será então ensejo de estabelecer princípios certos e definitivos sobre o real de agua.
O sr. Presidente: - A hora está muito adiantada, e portanto vae passar-se á ordem do dia. Os srs. deputados que tiverem quaesquer papeis a mandar para a mesa, podem fazel-o.
O sr. Marçal Pacheco: - Mando para a mesa duas notas de interpellação.
ORDEM DO DIA
Discussão do orçamento rectificado
Leu-se na mesa o seguinte
PROJECTO DE LEI N.° 9
Senhores. - A vossa commissão do orçamento examinou, como lhe cumpria, a proposta de lei do governo, rectificando os cálculos dos recursos e encargos geraes, ordinarios e extraordinarios da nação, na metropole, no exercício corrente de 1885-1886, e vem dar-vos conta d'esse exame.
[Ver tabela na imagem]
Todos estes augmentos estão, miuda e circumstanciadamente, explicados nos desenvolvimentos que acompanham a proposta do governo, de sorte que se torna desnecessario, neste momento, novos esclarecimentos sobre o assumpto. A vossa commissão, porém, tratou de averiguar se algumas alterações occorreram nos serviços dos diversos ministerios, depois da coordenação das rectificações aos respectivos orçamentos, e dessas averiguações e esclarecimentos prestados pelo governo resultou a convicção de que é preciso modificar a proposta governamental nos termos seguintes.
Quanto ao ministerio da fazenda será necessario fazer as correcções que passam a ser desenvolvidas:
CAPITULO 3.°
Juros e amortisações a cargo do thesouro
ARTIGO 15.°
Encargos de despeza extraordinaria, juros por diversas transacções de thesouraria
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 4.°
Encargos diversos e classes inactivas
ARTIGO 17.º
Classes inactivas
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 18.°
Subsídios
SECÇÃO 2.ª
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 19.º
Restituições
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO VI
Alfandegas Guarda fiscal
Conselho de administração do fundo da massa do corpo da guarda fiscal
ARTIGO 30.º-C
Descrever nos termos do decreto de 17 de setembro de 1885, publicado no Boletim n.º 1 da guarda fiscal, a importancia dos soldos e gratificações de mais 2 vogaes correspondentes a seis mezes e quinze dias, do modo seguinte:
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[Ver tabela na imagem]
Fiscalisação externa
ARTIGO 31.º
Fiscalisação terrestre
SECÇÕES 1.ª a 6.ª
Corpo da guarda fiscal
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 33.º
Esquadrilha da costa
Declarar que se compõe actualmente das canhoneiras Tavira, Faro e Lagos e de um deposito em Faro.
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 8.°
Repartições de fazenda dos districtos e concelhos
ARTIGO 60.°
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 62.º
Despezas diversas das repartições de fazenda
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 9.°
Empregados addidos e de repartições, extinctas servindo em diversas repartições do ministerio e aposentados
ARTIGO 63.º
Empregados addidos e de repartições extinctas
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 64.º
Empregados aposentados até 30 de junho de 1872
Alfandega da Figueira
[Ver tabela na imagem]
Empregados aposentados posteriormente a 1 de julho de 1872
Alfandega de Lisboa
[Ver tabela na imagem]
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528 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 10.°
Diversas despezas
ARTIGO 68.º
[Ver tabela na imagem]
Quanto ao ministerio da justiça as modificações são as seguintes:
CAPITULO I
Secretaria de estado
ARTIGO 4.º - SECÇÃO 1.ª
Eliminar:
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO II
Dioceses do reino
ARTIGO 4.° - SECÇÃO 3.ª
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 4.º
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 7.º
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO IV
Tribunaes de segunda instancia
ARTIGO 10.° - SECÇÃO 1.ª
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO V
Juízos de primeira instancia
ARTIGO 12.° - SECÇÃO 5.ª
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 6.°
Ministerio publico
ARTIGO 14.º - SECÇÃO 2.ª
[Ver tabela na imagem]
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SESSÃO DE 26 DE FEVEREIRO DE 1886 529
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 7.°
Sustento de presos e policia de cadeias
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 8.°
Despezas diversas
ARTIGO 27.º
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 9.°
Aposentados
ARTIGO 28.°
SECÇÃO 1.ª
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 11.°
Exercícios findos
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 5.°
Diversos estabelecimentos e justiça militar
ARTIGO 18.º
Despezas de material
SECÇÃO 5.ª
Estabelecimentos de saude
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 6.°
Officiaes em disponibilidade e inactividade temporaria
ARTIGO 19.º
[Ver tabela na imagem]
CAPITULO 7.°
ARTIGO 20.º
[Ver tabela na imagem]
O ministerio dos estrangeiros pedia, como acima fica dito, para o desempenho do serviço a ?eu cargo, no exericio corrente, mais 40:640$5382 réis do que fôra auctorisado pela lei de 25 de junho ultimo. As causas do augmento estão miudamente explicadas no orçamento rectificado, sendo:
[Ver tabela na imagem]
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530 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Mas, por força dos decretos de 21 de janeiro ultimo, que modificaram o pessoal dos consulados de Londres, Paris, Havre e Cadiz, haverá ainda que acrescentar os seguintes encargos:
CAPITULO 3.°
Corpo consular
ARTIGO 5.°
SECÇÃO 8.ª
Londres
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 6.°
[Ver tabela na imagem]
Ficando o augmento em 42:996$382, nos termos seguintes:
[Ver tabela na imagem]
No ministerio das obras publicas, commercio e industria as correcções a fazer são as seguintes:
CAPITULO V
Direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes
ARTIGO 12.º
Serviço externo
SECÇÃO III
Quadro para o serviço dos correios e telegraphos, fóra dos districtos de Lisboa e Porto
[Ver quadro na imagem]
SECÇÃO V
Quadro do pessoal menor para o serviço dos correios e telegraphos no continente do reino e ilhas adjacentes
[Ver quadro na imagem]
SECÇÃO VII
Percentagens
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 13.º
Despezas geraes variaveis
SECÇÃO II
Despeza do serviço da direcção geral, administração e estações
[Ver tabela na imagem]
SECÇÃO 6.ª
Despezas do serviço e expediente da direcção geral, administração, direcções telegrapho-postaes e estações
[Ver tabela na imagem]
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SESSÃO DE 26 DE FEVEREIRO DE 1886 531
CAPITULO 10.º
Empregados addidos, fóra dos quadros, jubilados e aposentados
ARTIGO 24.°
Empregados addidos e fóra dos quadros
SECÇÃO 7.ª
Direcção geral dos correios telegraphos e pharoes
Extinctas administrações centraes
[Ver tabela na imagem]
Extinctas direcções dos correios nos districtos administrativos
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 25.º
Empregados jubilados e aposentados
SECÇÃO 3.ª
Direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes
Correios
[Ver tabela na imagem]
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532 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
[Ver tabela na imagem]
Ficam, pois, elevadas as despezas ordinarias ao seguinte:
[Ver tabela na imagem]
No em tanto, a vossa commissão entende que algumas receitas devem ser ainda modificadas nos termos seguintes:
[Ver tabela na imagem]
E esta receita tem todas as probabilidades de ser effectiva. Se a compararmos com a ordinaria arrecadada na gerencia, anterior, de 1884-1885, que subia a 31.230:467$904 réis, apenas mostra a differença para mais de 1.194:378$596 réis. Ora no exercício de 1883-1884, as receitas ordinarias foram 29.788:695$287 réis, isto é, mais 1.662:145$524 réis do que no exercício anterior; e em regra as cobranças dos exercícios pouco se distanciam das arrecadações, nas gerencias, que deram o nome aos mesmos exercícios e a differença, quando a ha, é a favor dos exercícios. Assim, em numeros redondos: cobranças ordinárias, na gerencia de 1882-1883, 27.893:000$000 réis; no exercicio de 1882-1883, 28.126:000$000 réis; na gerencia de 1883-1884, cobranças, 29.610:000$000 réis, no exercício 29.788:000$000 réis.
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SESSÃO DE 26 DE FEVEREIRO DE 1886 533
Fica, pois, avaliada a receita ordinaria do exercicio corrente nos termos seguintes:
[Ver tabela na imagem]
Esta receita é apenas superior em 695:954$500 réis á que fora calculada na lei de 17 de julho de 1885, que rectificou o orçamento geral do estado no exercício de 1884-1885, apesar de na actual proposta, se incluirem as receitas novas do imposto do sêllo, as do trafego aduaneiro; o que demonstra ainda a moderação das apreciações no actual documento.
Do que antecedentemente se expõe resulta quanto ao orçamento ordinario:
[Ver tabela na imagem]
como o demonstrou o governo no seu relatorio de 6 do corrente. É licito, pois, suppor que o desequilíbrio do orçamento ordinario se aproximará de 1.000:000$000 réis.
E, antes de entrar no exame das despezas extraordinarias, é preciso notar que as liquidações de despeza ordinaria do ministerio da marinha, relativas ao exercício de 1884-1885, excederam as auctorisações orçamentaes em réis 181:526$260, dando-se os excessos nos artigos seguintes da respectiva tabella, segundo as informações officiaes obtidas pela vossa commissão.
[Ver tabela na imagem]
Esta importancia, comquanto para legalisar o seu pagamento tenha de ser pedida em credito supplementar, não traz realmente augmento de despeza, visto como tem igual importancia de ser inscripta no orçamento da receita, por ser proveniente dos fardamentos pagos pelas praças de marinhagem por desconto nos seus vencimentos.
[Ver tabela na imagem]
Este excesso provém especialmente das seguintes causas:
Augmento no preço dos generos de que se compõem as rações das praças da armada, e que são fornecidos ás guarnições dos navios em serviço nas divisões navaes na costa da Africa oriental, mar da India e da costa da Africa occidental e America do sul, e estação naval da China, réis 57:552$625;
Augmento de 66:000 rações das praças da divisão de veteranos de marinha, e que não estavam incluídas no orçamento 13:200$000 réis;
Abono, não incluído no orçamento, de 51:100 rações aos indígenas que fazem serviço nas embarcações miúdas das referidas divisões navaes, 13:439$300 réis;
Abono de 9:840 rações feito no arsenal da marinha, nos termos do respectivo regulamento, 1:968$000 réis;
Abono de 3:445 rações feito ao pessoal do hospital da marinha, nos termos da carta de lei de 29 de maio de 1883, e não incluído no orçamento, 6:890$000 réis;
Abono extraordinario de gratificações de vinho e aguardente ás praças das machinas dos navios das referidas divisões navaes, na conformidade dos decretos de 30 de dezembro de 1863 e 10 de julho de 1879, 3:013$917 réis;
Importancia da aguada com que se abasteceram os navios nos portos de escala e nas mesmas divisões navaes, 15:000$000 réis;
Importancia dos abonos de rações aos contingentes que foram e regressaram de Macau a bordo do transporte Africa, 15:066$000 réis.
[Ver tabela na imagem]
Este excesso provem do maior armamento dos navios, em relação ao proposto no armamento naval no dito exercício.
[Ver tabela na imagem]
Esta importancia é representativa do tratamento das praças da armada nos hospitaes civis e militares dentro e fora do reino, o, comquanto tenha de ser pedida em credito supplementar, não traz effectivamente augmento de despeza, porquanto no orçamento da receita para o exercício de 1884-1885 está incluída a verba de 6:000$000 réis, proveniente do desconto ás praças para pagamento do tratamento nos hospitaes.
[Ver tabela na imagem]
Este excesso provém do augmento de operários provisórios empregados na construcção de uma nova canhoneira.
[Ver tabela na imagem]
Este excesso provém especialmente do seguinte:
Abono de passagens de officiaes e mais praças, 5:735$872 réis;
Pagamento de direitos á alfandega de Lisboa, de differentes artigos no material despachados na dita alfandega para o arsenal da marinha, 7:000$000 réis, importancia não incluída no orçamento;
Subsidios a recrutas da armada, importancia não incluída no orçamento, 2:076$533 réis.
Poder-se ia lançar da conta do exercício corrente, como pertencente a exercícios findos, o credito necessario para satisfazer estas dividas, mas isso diminuiria a despeza do exercício de 1884-1885, para avolumar indevidamente a do exercício corrente. Por isso a vossa commissão entende, que se deve conceder um credito supplementar aos das despezas do exercício anterior, a fim de regularisar a contabilidade deste ministério, exactamente como se fez por lei de 17 de junho de 1885 para encerrar as contas do exercício de 1883-1884.
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[Ver tabela na imagem]
que o relatorio do orçamento rectificado explica miudamente nos termos seguintes:
«Despezas extraordinarias de saude publica, feitas e a fazer até 31 de janeiro de 1886, nos termos da lei de 25 de junho de 1880:
[Ver tabela na imagem]
Mas como as providencias sanitarias ainda não terminaram, e têem-se prorogado pelo mez corrente, forçoso é descrever a despeza correspondente.
[Ver tabela na imagem]
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SESSÃO DE 26 DE FEVEREIRO DE 1886 535
[Ver tabela na imagem]
Pede ainda o ministerio das obras publicas que a verba destinada a novos pharoes seja elevada a 80:000$000 réis, sendo assim o augmento de 30:000$000 réis destinado ao pagamento de material comprado em Paris, e que se descreva a verba de 11:000$000 réis para a compra de cavallos inglezes, puro sangue, para as candelarias nacionaes.
Ficarão, pois, elevadas as despezas extraordinarias á somma de 7.815:336$$903 réis, havendo para lhe fazer face à receita especial de 286:300$000 réis.
São avultadas estas despezas no actual exercício: mas examinemos se algumas são meramente accidentaes e se têem de repetir-se ainda por largos annos nos nossos orçamentos.
É incontestavel que para este encargo, em 1885-1886 concorrem:
[Ver tabela na imagem]
Para justificar estas despezas disse o sr. ministro da fazenda, no seu já citado relatorio sobre o estado da fazenda publica, o seguinte:
«Ora, as despezas de saude publica foram feitas no uso da auctorisação especialmente conferida ao governo por lei de 25 de junho de 1885, em presença da ameaça de uma invasão de cholera no paiz. A acção devastadora d'este flagello em Hespanha está ainda bem tristemente impressa na memoria de todos; por milhares se contaram as victimas que os boletins officiaes registavam dia a dia; de província em província se alastrou a epidemia com assustadora rapidez e demorada oppressão, deixando em toda a parte a miséria e o luto; por vezes se avizinhou da nossa fronteira; e, todavia, e extensa como esta é, jamais a transpoz. Mas para evitar a emigração para Portugal, e oppor uma barreira ao contagio, teve o governo de se soccorrer dos meios que mais efficazes se lhe afiguraram; restabeleceu os lazaretos e as quarentenas com um serviço regular de vigilancia e fiscalisação, e alongou pela extrema do paiz uma linha militar de defeza, chamando para isso uma parte das reservas, e reforçando quanto possivel os contingentes do exercito; d'ahi occorreram as despezas que o orçamento rectificado descreve, na importancia que se presume necessária até ao fim do anno economico, pois que infelizmente ainda o reino vizinho se não libertou da cholera.
«O governo procedeu como julgou do seu dever; considerou a despeza a fazer como uma exigencia de circumstancias anormaes, como um verdadeiro caso de força maior; ao parlamento incumbe agora tomar a resolução que julgar mais acertada.
Da somma applicada as despezas extraordinárias do ministerio da guerra, 67:962$107 réis, constituem o saldo dos 900:000$000 réis, que o decreto, com força de lei, de 19 de maio de 1884 auctorisou para compra de armamentos; 29:000$000 réis são igualmente o saldo da auctorisação concedida por lei de 15 de junho de 1882 para reparação de quarteis e edifícios militares; e a ambas estas verbas se destinou uma receita especial. Restam réis 467:586$026, importancia de novos armamentos contratados, e 100:000$000 réis para acquisição de torpedos e material correlativo. A conveniencia de nas circumstancias políticas que são peculiares a differentes estados da Europa, precaver o paiz contra futuras eventualidades, reforçando as garantias da sua defeza militar, é de certo por todos reconhecida. Não porque as relações de Portugal com as demais nações não sejam de todo o ponto cordiaes; muito pelo contrario, têem sido amigavelmente dirigidas, e encaminhadas a bom termo, as negociações diplomaticas que sobre difterentes assumptos internacionaes têem corrido; disso são testemunho a ultima conferencia de Berlim, e a diligencia com que Portugal e a França se têem procurado entender no tocante á delimitação dos territórios da Guiné. As precauções de defeza são, porém, uma necessaria condição de paz e de segurança publica. Por isso o governo não duvidou tomar sobre si a responsabilidade de augmentar as forças defensivas do paiz, reservando-se para dar ao parlamento as explicações que ahi lhe possam ser pedidas.
«Pelo que respeita á occupação e installação do novo districto do Congo, os 500:000$000 réis, que se acham inscriptos no orçamento rectificado, foram já auctorisados por lei de 18 de junho de 1885. Depois das laboriosas negociações, que tiveram logar para o reconhecimento, por parte das outras potencias, dos direitos tradicionaes, que sobre o Zaire foram sempre tão insistentemente reclamados por Portugal, dever de honra era para nós, uma vez vencida a pendencia, instituir n'aquelles territorios uma administração regular; e a este dever se não faltou.»
A vossa commissão acceita como satisfactorias estas explicações, e, considerando os actos praticados como conducentes ao bem do paiz, nenhuma outra observação especial, n'este momento, tem de fazer á despeza mencionada, tanto mais que é de esperar que não se torne a repetir nos annos futuros.
Das restantes despezas se podem considerar tambem como cessando, dentro em dois annos, as da construcção de novos caminhos de ferro, 1.5l3:000$000 réis; ponte do D. Luiz I, 100:000$000 réis; novos pharoes, 80:000$000 réis; escola agrícola de reforma, 30:000$000 réis, ou 1.723:000$000 réis.
Teremos assim para todas as demais despezas, incluindo as relativas á construcção de estradas ordinarias, melhoramentos de portos e rios, subsídios ás províncias ultramarinas, e outras, a somma de 3.619:633$068 réis, e ainda assim algumas com receitas especiaes para lhes fazer face, n'este exercício, pela somma de 286:300$000 réis; do que resulta que o recurso ás economias publicas por esta proveniencia fica limitado a 3.333:333$068 réis, que de certo não póde ser considerado exagerado, e que urgente se torna, a todo o custo, que elle fique limitado;
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536 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
quando muito a essa somma, no mais breve espaço de tempo; creando-se sem a menor fallencia os recursos indispensaveis para os juros e mais rapida amortisação das dividas por esta fórma contrahidas.
Abstrahindo, como fica dito, da despeza com a installação do districto do Congo e das expropriações do caminho de ferro de Mormugão, as nossas províncias ultramarinas imporão á metropole o seguinte encargo:
[Ver tabela na imagem]
representando as despezas de soberania, a que entre nós costumámos chamar deficit colonial.
Isto não quer dizer que não devamos envidar todos os esforços para reduzir o mais possível essas despezas de soberania, sem prejuízo do que devemos às colonias e á nossa dignidade; antes pelo contrario: serve apenas para recordar que as colonias impõem encargos a que se não póde fugir sem risco de perigar o brio nacional.
Recapitulando, são, pois, no exercício corrente fixadas:
[Ver tabela na imagem]
ficando o governo auctorisado a realisar por meio do credito as sommas necessarias para fazer face a esses excessos de despezas, tudo nos termos do seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° A avaliação das receitas do estado, no exercício de 1885-1886, é rectificada, em conformidade como mappa junto n.° 1, e que d'esta lei faz parte, ficando computadas as receitas ordinarias na Bomma de 32.424:846$500 réis e as extraordinarias na de 9.693:045$647 réis, perfazendo aquellas e estas a importancia total de 42.117:892$147 réis.
Art. 2.° As despezas totaes do estado, ordinarias e extraordinárias, são fixadas no mesmo exercício:
[Ver tabela na imagem]
de accordo com os mappas juntos n.ºs 2 e 3, que fazem parte d'esta lei.
§ 1.° a governo decretará nas tabellas de distribuição de despeza d'este exercício as rectificações conformes com esta lei.
§ 2.° O governo poderá transferir reciprocamente dos capítulos 6.° e 9.° do orçamento do ministerio da fazenda as sommas que forem necessarias para completa satisfação dos encargos aduaneiros, no exercício corrente, devendo essa transferencia ser feita com as mesmas solemnidades determinadas pelo regulamento geral de contabilidade em vigor, para as transferências de verbas de artigo para artigo dentro de cada capitulo das tabellas.
Art. 3.° É, aberto um credito supplementar a favor do ministerio da marinha, e em relação ao exercício de 1884-1885, da quantia de 181:526$260 réis, sendo:
[Ver tabela na imagem]
devendo as despezas pagas, em virtude d'esta auctorisação, ser escripturadas na actual gerencia em conta do referido exercício.
Art. 4.° Fica assim modificada a lei de 25 de junho de 1885 e revogada toda a legislação contraria a esta.
Sala da commissão do orçamento, aos 9 de fevereiro de 1886. = Caetano Pereira Sanches de Castro = Avelino Cesar Augusto Callixto = Henrique da Cunha Mattos de Mendia = Augusto Neves dos Santos Carneiro = Fernando Affonso Geraldes = Tito Augusto de Carvalho = Dr. Luiz Jardim (com declarações) = Miguel D. G. Pereira = João Pereira Teixeira de Vasconcellos = João José d'Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator.
N.º 1
Mappa das receitas do estado rectificadas para o exercicio de 1886-1886 a que se refere a lei datada de hoje
Receitas ordinarias
ARTIGO 1.º
Impostos directos
[Ver tabela na imagem]
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SESSÃO DE 26 DE FEVEREIRO DE 1886 537
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 2.°
Sêllo e registo
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 3.º
Impostos indirectos
[Ver tabela na imagem]
Página 538
538 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 4.
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 5.°
Bens proprios nacionaes e rendimentos diversos
[Ver tabela na imagem]
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SESSÃO DE 26 DE FEVEREIRO DE 1886 539
[Ver tabela na imagem]
ARTIGO 6.º
Compensações de despeza
[Ver tabela na imagem]
Receitas extraordinarias
[Ver tabela na imagem]
Sala da commissão do orçamento, aos 9 de fevereiro de 1886. = Caetano Pereira Sanches de Castro = Avelino Cesar Augusto Callixto = Henrique da Cunha Mattos de Mendia = Augusto Neves dos Santos Carneiro = Fernando Affonso Geraldes = Tito Augusto de Carvalho = Dr. Luiz Jardim (com declarações) = Miguel D. G. Pereira = João Pereira Teixeira de Vasconcellos = João José d'Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilho.
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540 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
N.° 2
Mappa da despeza ordinaria do estado, rectificada, no exercicio de 1885-1886, a que se refere a lei d'esta data
Junta do credito publico
Administração da divida consolidada
ENCARGOS DA DIVIDA INTERNA
[Ver tabela na imagem]
ENCARGOS DA DIVIDA EXTERNA
[Ver tabela na imagem]
Administração das caixas geral de depositos e economica
[Ver tabela na imagem]
Ministerio dos negocios da fazenda
ENCARGOS GERAES
[Ver tabela na imagem]
SERVIÇO PROPRIO DO MINISTERIO
[Ver tabela na imagem]
Ministerio dos negocios do reino
[Ver tabela na imagem]
Ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça
[Ver tabela na imagem]
Ministerio dos negocios da guerra
[Ver tabela na imagem]
Página 541
SESSÃO DE 26 DE FEVEREIRO DE 1886 541
[Ver tabela na imagem]
Officiaes sem accesso, reformados, aposentados e jubilados .....
Diversas despezas ....
Despezas de exercicios findos ....
Ministerio dos negocios da marinha e do ultramar
Marinha:
Secretaria d'estado e repartições auxiliares ....
Armada ....
Tribunaes e diversos estabelecimentos ....
Arsenal da marinha e suas dependencias ....
Encargos diversos ....
Empregados reformados, aposentados, jubilados e veteranos ....
Despezas de exercicios findos ....
Ultramar:
Despezas do ultramar realisadas na metropole ....
Ministerio dos negocios estrangeiros
Secretaria d'estado ....
Corpo diplomatico ....
Corpo consular ....
Despezas eventuaes ....
Condecorações ....
Empregados addidos e era inactividade ....
Despezas de exercicios findos ....
Ministerio das obras publicas, commercio e industria
[Ver tabela na imagem]
Secretaria d'estado ....
Pessoaltechnico e de administração ....
Estradas ....
Caminhos de ferro ....
Direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes ....
Diversas obras ....
Estabelecimentos de instrucção e tratamento das vinhas phylloxeradas ....
Pinhaes e matas nacionaes ....
Direcção geral dos trabalhos geodesicos, topographicos, hydrographicos e geologicos do reino ....
Empregados addidos, fóra dos quadros, jubilados e aposentados ....
Diversas despezas ....
Despezas de exercicios findos ....
Total - Réis ....
Sala da commissão do orçamento, aos 9 de fevereiro de 1886.= Caetano Pereira Sanches de Castro = Avelino Cesar Augusto Callixto = Henrique da Cunha Mattos de Mendia = Augusto Neves dos Santos Carneiro = Fernando Affonso Geraldes = Tito Augusto de Carvalho = Dr. Luiz Jardim (com declarações) = Miguel D. G. Pereira = João Pereira Teixeira de Vasconcellos = João José d'Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilho.
N.° 3
Mappa da despeza extraordinaria do estado, rectificada, para o exercicio de 1885-1886, a que se refere a lei datada de hoje
Ministerio dos negocios da fazenda
CAPITULO 1.º
Alfandegas
[Ver tabela na imagem]
Melhoramentos geraes no edificio da alfândega de Lisboa, segundo o decreto de 9 de outubro de 1884 ....
Diversas obras nas alfandegas de Lisboa e do consumo, em consequencia da remodelação dos serviços, por decretos de 17 de setembro de 1885:
Acquisição e assentamento de um telheiro ....
Compra de wagonetes e de carros de mão ....
Obras diversas nas duas alfandegas ....
CAPITULO 2.°
[Ver tabela na imagem]
Obras de reparação e limpeza e mobilia no gabinete da direcção geral dos proprios nacionaes, no gabinete e repartições da direcção geral de contabilidade e nas salas do conselho superior das alfândegas ....
CAPITULO 3.º
[Ver tabela na imagem]
Despezas extraordinarias de saude: - para estas despezas, nos termos da lei de 27 de junho de 1885 ....
Ministerio dos negocios do reino
CAPITULO 1.º
Lyceu de Lisboa
[Ver tabela na imagem]
Para a construcção do edificio ....
CAPITULO 2.º
[Ver tabela na imagem]
Despezas da escola polytechnica, nos termos da lei de 10 de junho de 1881 ....
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542 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
CAPITULO 3.º
[Ver tabela na imagem]
Acquisição de 500 exemplares da obra Memorias biographicas de Garrett, lei de 22 de julho de 1885 ....
CAPITULO 4.º
[Ver tabela na imagem]
Adiantamento á camara municipal de Lisboa (obras do esgoto), leis de 12 de abril de 1876 e 28 de julho de 1882 ....
CAPITULO 5.°
[Ver tabela na imagem]
Despezas extraordinarias de saude publica Para estas despezas, nos termos da lei de 27 de junho de 1885 ....
Ministerio dos negocios da guerra
CAPITULO 1.°
[Ver tabela na imagem]
Obras de quarteis e edificios militares
Saldo dos 50:000$000 réis auctorisados na lei de 15 de junho de 1882 ....
CAPITULO 2.º
[Ver tabela na imagem]
Emigrados hespanhoes
Subsidios, rancho, alojamentos e transportes ....
CAPITULO 3.º
Armamentos
[Ver tabela na imagem]
Saldo dos 900:000$000 réis auctorisados por decreto de 19 de maio de 1884 e lei de 23 do dito mez ....
Para completar o pagamento de armamento contratado, e acquisição do que ainda é necessario ....
CAPITULO 4.º
Fortificações de Lisboa e seu porto
[Ver tabela na imagem]
Somma auctorisada na lei do 25 de junho de 1885, para a estrada militar da circumvallação e fortificação de Lisboa e seu porto ....
Para acquisição de torpedos e material correlativo ....
CAPITULO 5.º
Despezas de saude publica
[Ver tabela na imagem]
Despezas sanitarias feitas e a fazer desde junho de 1885 a janeiro de 1886, na conformidade da lei de 27 de junho de 1885 ....
Ministerio dos negocios da marinha e ultramar
Marinha
CAPITULO 1.°
[Ver tabela na imagem]
Grandes reparações nos navios da armada, fora do porto de Lisboa ....
CAPITULO 2.°
[Ver tabela na imagem]
Compra de artilheria e material de guerra ....
CAPITULO 3.º
[Ver tabela na imagem]
Construcção e reparação dos edificios de marinha ....
CAPITULO 4.°
[Ver tabela na imagem]
Para satisfazer o augmento do preço que, porventura, possam ter as rações das praças embarcadas nos navios em serviço das divisões navaes, pelo facto dos generos componentes das mesmas rações serem adquiridos n'aquellas paragens ....
Para satisfazer o abono das rações aos contingentes que forem para o ultramar ou d'ahi regressarem ....
CAPITULO 5.º
[Ver tabela na imagem]
Para ferias e maiorias de jornaes aos operarios provisorios, empregados nas reparações e construcção dos navios da armada, calculadas sobre a despeza feita nos primeiros mezes da actual gerencia ....
CAPITULO 6.º
[Ver tabela na imagem]
Para satisfazer o custo do material da armada, por se elevar o numero de navios do armamento naval ....
CAPITULO 7.º
[Ver tabela na imagem]
Despesas de saude publica nos termos da lei de 27 de junho de 1885 ....
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[Ver tabela na imagem]
Ultramar
CAPITULO 1.º
[Ver tabela na imagem]
Para despeza das provincias ultramarinas - deficit ....
CAPITULO 2.º
[Ver tabela na imagem]
Despezas com o estabelecimento de novas missões ou estações civilisadoras e commerciaes e exploração em Africa ....
CAPITULO 3.º
[Ver tabela na imagem]
Para despezas de occupação e installação do districto do Congo, nos termos da carta de lei de 18 de junho de 1885 ....
CAPITULO 4.º
[Ver tabela na imagem]
Para expropriações no caminho de ferro de Mormugão já feitas e ao pagamento das quaes é urgente occorrer ....
Garantia, segundo o contrato de 5 do junho de 1885, relativa á secção do cabo telegraphico submarino até Bolama e Bissau, no segundo semestre do actual exercicio ....
CAPITULO 5.°
[Ver tabela na imagem]
Garantia, segundo o contrato de 5 de junho de 1885, relativa á secção do cabo telegraphico submarino até Bolama e Bissau, no segundo semestre do actual exercicio ....
Ministerio das obras publicas, commercio e industria
CAPITULO 1.º
Estradas
[Ver tabela na imagem]
Estudos, construcção e grandes reparações de estradas de 1.ª classe no continente do reino e ilhas adjacentes, menos nos districtos de Villa Real e Bragança ....
Estudos, construcção e grandes reparações de estradas de 1.ª classe nos districtos de Villa Real e Bragança ....
Subsidios para estradas municipaes, districtaes e respectivas pontes:
Todos os districtos do continente, e ilhas, menos Villa Real e Bragança ....
Districtos de Villa Real e Bragança ....
Ponte de D. Luiz I (lei de 19 de maio de 1880) ....
CAPITULO 2.º
Caminhos de ferro
[Ver tabela na imagem]
Resto da subvenção á companhia do caminho de ferro da Beira Alta (lei de 20 de janeiro de 1876) ....
Construcção, estudos, fiscalisação da construcção e mais despezas com caminhos de ferro ....
Construcção do caminho de ferro do Algarve e do prolongamento das linhas do sul e sueste, conforme a lei de 29 de março de 1883 ....
CAPITULO 3.º
Obras hydraulicas
[Ver tabela na imagem]
Estudos e melhoramentos de portos e rios, incluindo o Mondego e o Tejo, obras hydraulicas nas bacias das ribeiras e regimen das aguas correntes ....
Porto artificial de Ponta Delgada . ...
Porto artificial da Horta ....
Para o porto artificial no Funchal, podendo esta verba servir de base a uma operação para a mais rapida conclusão da obra ....
Porto artificial de abrigo de Leixões (lei de 26 de junho de 1883) ....
CAPITULO 4.º
[Ver tabela na imagem]
Correios, telegraphos e pharoes Construcção de novas linhas telegraphicas ....
Construcção de novos pharoes ....
Tres carruagens ambulancias postaes ....
Construcção do novo edificio do correio (lei de 14 de fevereiro de 1876). ....
CAPITULO 5.º
Arborisação e dunas
[Ver tabela na imagem]
Pinhaes e matas nacionaes, arborisação das dunas, montanhas e estradas florestaes ....
CAPITULO 6.º
[Ver tabela na imagem]
Escola agricola em Villa Fernando (lei de 22 de junho de 1880) ....
CAPITULO 7.º
[Ver tabela na imagem]
Para compra de cavallos inglezes para as coudelarias ....
CAPITULO 8.º
[Ver tabela na imagem]
Despezas extraordinarias de saude publica Para estas despezas, nos termos da lei de 27 de junho de 1885 ....
Sala da commissão do orçamento, aos 9 de fevereiro de 1886.= Caetano Pereira Sanches de Castro = Avelino Cesar Augusto Calixto = Henrique da Cunha Mattos de Mendia = Augusto Neves dos Santos Carneiro = Fernando Affonso Geraldes = Tito Augusto de Carvalho = Dr. Luiz Jardim (com declarações) = Miguel D. G. Pereira = João Pereira Teixeira de Vasconcellos = João José d'Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilho.
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Pertence ao n.° 9
Senhores. - A vossa commissão do orçamento foram presentes algumas modificações, que o actual governo pretende introduzir no parecer n.° 9 d'esta commissão, sobre a proposta de lei relativa ás receitas e despezas rectificadas do estado no exercicio corrente.
Consistem essas modificações:
1.° Em habilitar o governo a crear os titulos de divida publica necessarios para reforçar as cauções dos emprestimos, que haja de contrahir, para poder pagar todos os encargos auctorisados, para este exercicio;
2.° Em permittir a abertura de um credito especial, até á quantia de 200:000$000 réis para, em conta corrente com as provincias ultramarinas, se poder attender a Baques das juntas de fazenda das colonias, posteriores á coordenação do orçamento, e
3.° Em auctorisar a abertura de creditos supplementares para completa satisfação das despezas aduaneiras, visto como é provavel que sejam insuficientes as verbas destinadas para o pagamento dos encargos com o trafego nas alfandegas, em consequencia do constante augmento do serviço nas mesmas alfandegas; augmento cada vez mais accentuado.
E a vossa commissão, considerando que não se póde nem deve recusar ao governo os meios para elle poder administrar, cumprindo religiosamente as leis do paiz; e sendo certo que das modificações propostas não resulta alteração essencial no projecto de lei, já citado n.° 9, dado para ordem do dia n'esta camara, mas, em regra, só a prevenção contra eventualidades que se podem dar, no pagamento das despezas publicas; entende que as modificações propostas pelo governo devem ser acceitas, e n'essa conformidade alterado o projecto de lei.
As modificações são as seguintes:
Ao artigo 2.° acrescentar:
«§ 3.° Se para occorrer ás despezas dos serviços aduaneiros, de qualquer ordem, no actual exercicio, apesar das transferencias auctorisadas no paragrapho antecedente não bastarem as sommas descriptas nos mencionados capitulos 6.° e 9.° da respectiva tabella, poderá o governo, nos termos do citado regulamento geral da contabilidade publica, abrir os creditos supplementares necessarios para integral pagamento das mesmas despezas.
Artigo 4.° (novo):
«São renovadas, no exercicio corrente, a auctorisação e demais disposições relativas ás provincias ultramarinas, de que trata a lei de 22 de junho de 1880, ficando, porém, limitado a 200:000$000 réis o credito concedido, e devendo o movimento das respectivas operações ser descripto na conta geral do estado sob titulo especial que demonstre, em qualquer epocha, a situação do mencionado credito.»
Artigo 4.° passa a 5.°
Ao mappa das receitas onde se lê:
«Sommas que o governo fica auctorisado a levantar por emprestimo, para fazer face ás despezas d'este exercicio», acrescente-se a podendo crear e dotar os títulos do divida publica necessarios para as respectivas cauções».
A vossa commissão declara tambem que no mappa da despeza ordinaria do ministerio da fazenda se deve fazer uma correcção que não altera o total da verba descripta. A somma do capitulo de exercicios findos deve ser réis 26:000$000; e a das despezas diversas 51:950$000 réis.
Sala da commissão do orçamento, aos 23 de fevereiro de 1886.= Caetano Pereira Sanches de Castro = Augusto Fuschini = Augusto N. S. Carneiro = João Pereira Teixeira de Vasconcellos = Tito Augusto de Carvalho = Henrique da Cunha Matos de Mendia = Fernando Affonso Geraldes = Manuel d'Assumpção = João J. de Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator = Tem voto dos srs. Pinheiro Chagas = Miguel Dantas.
O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.
O sr. Gonsiglieri Pedroso (para uma questão previa):- Sr. presidente, começo por ler a minha questão previa:
Proponho o adiamento do projecto de lei n.° 9, relativo ao orçamento rectificado, até serem enviados os documentos pedidos para justificar as despezas extraordinarias de saude, e até se publicar o relatorio dos actos do ministerio da fazenda.
Em breves palavras, porque não desejo por fórma nenhuma, conforme é de praxe, estar a difficultar a approvação das leis de que o gabinete carece para governar constitucionalmente, em breves palavras, e sómente nas indispensaveis para tornar bem claro o meu modo de ver neste assumpto, vou justificar a questão previa, que acabo de mandar para a mesa.
Não poderia eu, sr. presidente, sem mostrar incoherencia da minha parte, attendendo á posição especial que occupo n'esta camara, unica e simplesmente porque a situação regeneradora, que se sentava n'aquellas cadeiras, cedeu o logar a uma situação progressista, deixar de discutir um projecto de lei que a mim proprio tinha promettido, com toda a largueza, examinar.
Variaram as circumstancias, é certo, por isso que desappareceu d'esta camara o ministerio directamente responsavel por tão monstruoso documento. Não me occuparei por esse facto do orçamento rectificado de 1885-1886 com o desenvolvimento e com a minucia que similhante documento reclama, pois não vejo aqui infelizmente quem possa responder pelas despezas que n'elle se encontram consignadas; mas, entre não discutir este documento com a minuciosidade com que o faria se porventura existissem ainda politicamente os ministros regeneradores e não o discutir em absoluto vae uma grande differença!
Sabe v. exa., sr. presidente, e mais do que ninguem, sabem-no os srs. ministros actuaes, qual foi o sentimento de espanto, quasi de incredulidade, com que esta camara, e o paiz inteiro, receberam a noticia da verba em que haviam sido rectificadas as despezas do estado para o anno economico de 1885-1886.
Não virei eu aqui repetir n'este momento as phrases severas e as palavras justamente impressionadas com que mais de um orador da opposição progressista condemnava ainda ha pouco o governo transacto, avisando-o do perigo eminente que ameaçava o credito publico, a continuar a caminhar-se pela senda de que n'este documento se encontram os indeleveis vestigios.
O orçamento rectificado d'este anno, diziam apenas ha dias esses illustres deputados, era o commentario mais eloquente do estado da fazenda publica tal como a tinham administrado os regeneradores, e apresentava-se como o epilogo inevitavel de uma situação cuja ultima palavra haviam sido as propostas do sr. Hintze Ribeiro, que tão profunda indignação levantaram no paiz!
Eis o que se affirmava hontem, e que hoje, só porque os ministros são outros, não póde deixar de ser igualmente verdadeiro!
Com effeito, um orçamento rectificado que descreve réis 42.000:000$000 de despeza, e que revela perto de réis 10.000:000$000 de deficit conjunctamente com uma divida fluctuante de 12.000:000$000 réis, é não ao um orçamento aterrador para os nossos recursos actuaes, mas muito principalmente reclama a mais cuidadosa analyse, para que quanto antes se ponha um termo n'este louco despender!
Como por agora estou apenas justificando a minha questão previa, não me referirei propriamente desde já á essencia do orçamento. Limito-me n'esta occasião a pedir os
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documentos, que julgo indispensaveis para poder discutir, embora de uma maneira succinta, conforme disse á camara, no entretanto convenientemente elucidado, no que respeita á mais importante das despezas, a que terei de alludir.
Não ignora o sr. ministro da fazenda que a verba mais crescida que avulta na rectificação d'este orçamento é a que diz respeito ás despezas feitas em virtude da auctorisação conferida, na ultima sessão parlamentar, ao governo para os gastos de saude publica.
No orçamento do anno passado, tendo attingido a verba correspondente a quantia de quatrocentos e tantos contos, nós os deputados da opposição envidamos todos os esforços para que os elementos, em que se decompunha naturalmente essa verba, podessem ser esclarecidos com os respectivos documentos comprovativos.
Toda a opposição progressista e republicana se associou á declaração de que não podia discutir-se o orçamento rectificado, com a seriedade com que um documento d'esta ordem deve ser apreciado, sem que os documentos pedidos estivessem sobre a mesa, e sem que elles podessem ser previamente examidos pelos membros d'esta camara.
Hoje a verba das despezas com a saude publica, sem que saibamos o motivo de tão extraordinario acrescimo, importa em 1.200:000$000 réis pouco mais ou menos, isto é, no triplo da quantia a que havia ascendido em 1884-1885.
Por consequencia, os motivos que inspiravam no nosso animo ao exigirmos no anno passado os documentos comprovativos d'esta despeza, devem com muito mais rasão obrigar-nos agora a exigil-os antes que a discussão propriamente dita possa encetar-se.
Eu, sr. presidente, sómente apresentei esta questão previa, depois de me ter convencido que, naturalmente por esquecimento, o governo não nos enviaria esses documentos; pois, a não ser por esquecimento, mal comprehendo como os srs. ministros, que no anno passado julgavam abaixo da dignidade do parlamento discutir sem os esclarecimentos indispensaveis, querem hoje sujeitar esse mesmo parlamento ao papel que então com toda a vehemencia repelliam!
Não tenho a menor duvida que o sr. ministro da fazenda vae levantar-se para apoiar o meu pedido de adiamento, prestando assim homenagem á doutrina claramente expressa na moção de ordem apresentada na sessão de 1885, pelo meu amigo, o sr. Eduardo José Coelho, moção que, como s. exa. sabe, foi calorosamente defendida por mim e por alguns dos actuaes srs. ministros.
Demais, agora que vejo nas cadeiras do poder, quem está comprommettido, por grande numero de declarações feitas n'esta casa, a alterar as normas por que até hoje se tem regulado a nossa administração financeira, não posso deixar de insistir na necessidade de se corrigirem muitos vicios inexplicaveis, que tornam quasi inutil a discussão do nosso orçamento, apesar de ser este o documento mais importante que póde ser discutido n'um systema parlamentar; porque no orçamento vem espelhar-se e reflectir-se todos os erros, todos os desperdicios, todos os abusos, todas as faltas, todas as incoherencias da administração economica e financeira do paiz.
Não juntem, pois, ás dificuldades que resultam da falta de clareza em muitos capitulos da nossa lei de receita e despeza, os embaraços que hão de provir para o debate da não apresentação dos documentos justificativos de algumas das mais importantes despezas extraordinarias!
Assim eu vejo com espanto (e digo com espanto, porque vae contra tudo o que aprendi com relação aos principios mais rudimentares da sciencia de finanças, e o que se passa em todos os paizes regidos pelo systema parlamentar, que entre nós de anno para anno vão divergindo mais os orçamentos de previsão dos correspondentes orçamentos rectificativos. E não só se nota este facto anormal, senão que já um orçamento rectificado não basta! Por exemplo, o orçamento presente, que é a rectificação das auctorisações conferidas na sessão anterior, que fizeram as vezes de orçamento preventivo, tem já duas rectificações! Parece inacreditavel! De modo que não sei quando acabaremos de corrigir e de emendar um documento, que parece dever ficar sempre provisorio no que diz respeito ás despezas!
Demonstremos a veracidade d'esta asserção. O orçamento que vae discutir-se e que representa a rectificação das auctorisações concedidas pela lei de 20 de junho de 1885 excede em 773:000$000 réis, numero redondo, ás despezas ordinarias auctorisadas pela referida lei, servindo de orçamento de previsão. Como se não bastasse esta correcção em grande parte inexplicavel em face dos bons principios financeiros, ainda sobre este orçamento assim rectificado incide uma nova rectificação, decorridos apenas alguns dias, por isso que o orçamento rectificado tem a data de 7 de janeiro deste anno, e o parecer da commissão do orçamento tem a data de 9 de janeiro. Esta segunda rectificação importa em mais de 212:000$000 réis, numero redondo, de despeza. Pois o actual governo no dia 23 de fevereiro ainda propõe algumas rectificações a esta rectificação do orçamento rectificado! (Riso). Isto é simplesmente espantoso! Provavelmente não ficam por aqui as correcções, por isso que as contas do exercicio que devem apparecer para o anno hão de rectificar por sua vez todos os calculos anteriores!
Pergunto. É isto fazenda?! Isto são finanças?! E isto contabilidade publica?! São estas as normas dentro das quaes só devem regular as despezas de um paiz?!
E note v. ex.a, sr. presidente, que não é possivel encontrar motivo algum plausivel, que possa ser adduzido para justificar tão enorme divergencia!
A tendencia em todos os paizes, que são bem governados e bem administrados financeiramente, é para approximar o mais possivel os orçamentos rectificados dos orçamentos de previsão.
Comprehende-se que, quanto mais por um lado se aperfeiçoam e regularisam os serviços de lançamento e cobrança dos impostos, e pelo outro, quanto melhor se fixam os preceitos de uma boa economia na distribuição das receitas, tanto menor será indubitavelmente a differença entre o que se prevê e aquillo que realmente vem a gastar-se, especialmente se attendermos apenas ás despezas ordinarias.
O sr. ministro da fazenda, que é muito lido n'estes assumptos, sabe, que ha paizes onde quasi se não conhece o orçamento rectificado.
A Inglaterra está, por exemplo, n'este caso. Ali não ha nunca, em circumstancias normaes, sensiveis differenças entre a despeza vetada e a despeza effectuada.
Abrem-se, é verdade, creditos extraordinarios ou supplementares, mas isto excepcionalmente e só quando circumstancias de todo o ponto imprevistas, como, por exemplo, uma guerra ou uma grande calamidade publica a isso obrigam.
A Italia nova, desde que encetou com os ministros Magliani e Grimaldi a ultima phase da sua reorganisação financeira, tem procurado acabar com a divergencia entre os seus orçamentos rectificados e o seu orçamento de previsão.
Entre nós dá-se exactamente o contrario. Todos os dias excedemos n'uma progressão sempre crescente ás despezas calculadas, mesmo as ordinarias! E excedemol-as sem rasão plausivel, a não ser em casos muito excepcionaes.
O sr. relator da commissão vae tomar nota; mas não é necessario, porque todos nós sabemos que as despezas sanitarias não são ordinarias, e portanto não explicam por si sós uma tendencia, que é constante nos nossos orçamentos de muitos annos...
(Interrupção).
Eu creio que s, exa., sem que os documentos respecti
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vos aqui estejam, não quererá levantar debate a este respeito...
Torno a dizer: em geral não ha rasão legitima para o nosso orçamento apresentar as enormes differenças que n'elle existem entre as verbas rectificadas e as de previsão; porque de todos os orçamentos que eu conheço, o nosso é um dos elaborados a menor distancia de tempo do começo do respectivo exercicio, o que, como se sabe, é de extrema vantagem para o calculo de certas verbas, como as que dizem respeito a forragens, rações, etc.
A França, por exemplo, dezoito mezes antes do começo do exercicio elabora o respectivo orçamento. Comprehende-se que em taes condições se tenha de fazer rectificações importantes. Pois apesar d'isso Léon Say classifica de calamidade os orçamentos rectificados.
Mas em Portugal, onde o orçamento geral do estado é coordenado, quando muito, nove mezes antes do começo do exercicio, em Portugal, cuja lei financeira se approxima extraordinariamente n'este ponto da Italia, mal se comprehende uma divergencia, que sómente póde explicar-se pelo relaxismo dos nossos costumes politicos e pela frouxidão da nossa fiscalisação parlamentar.
Ponha-se cobro a este estado de cousas e quanto antes; o sr. ministro da fazenda está obrigado moralmente a fazel-o!
Mas não é só isto. Vamos a ver como a clareza não é a virtude da nossa lei orçamental.
O que quer dizer incluir-se no orçamento rectificado, sob o titulo despezas extraordinarias, despezas que são perfeitamente ordinarias em todos os orçamentos e que simplesmente foram desviadas para este capitulo, a fim de melhor se poder encobrir a verdadeira cifra do deficit ordinario?!
O que quer dizer descreverem-se, por exemplo, no orçamento as «grandes reparações nas estradas» como despeza extraordinaria, quando esta verba se repete constantemente, todos os annos, com uma perfeita regularidade?
São despezas estas tão ordinarias como todas as outras, que sob igual denominação são incluidas no orçamento.
Ora parece-me, que é um mau systema obscurecer o que devia ser para todos claro.
É mau que desde logo e á primeira vista nós não saibamos o modo como havemos de apreciar o estado da fazenda publica. Se o deficit ordinario é grande, que lucrâmos em diminuil-o apparentemente, por artificios de escripturação?! Que ganhâmos, senão desnortear-nos, com estes jogos malabares de algarismos, que nada occultam e sobretudo que nada remedeiam?
Para este ponto chamo a particular attenção do sr. ministro da fazenda, por isso que ha de ser s. exa. que terá de coordenar o orçamento de 1887-1888.
Mas voltemos á proposta de adiamento, de que por alguns instantes me afastei.
Entendo que a camara, com a annuencia do governo, deve consentir em adiar a presente discussão até que os documentos relativos ás despezas com a saude publica sejam n'esta casa apresentados.
Não desejo agora, como nunca, fazer obstruccionismo; não pretendo difficultar ao gabinete a votação de uma lei que elle carece para governar constitucionalmente; mas não prescindo dos esclarecimentos que pedi, deixando bem consignado o meu protesto, caso esses documentos me não sejam fornecidos. É este o meu fim e não outro.
Vou sentar-me. Tenho a certeza de que o sr. ministro da fazenda, com a sua voz auctorisada, vae pedir a esta camara que adie a discussão do orçamento, até que cheguem os documentos por mim pedidos. S. exa. não póde deixar de o fazer, estando ao lado de alguns dos seus collegas; que tão directamente intervieram ha um anno na discussão de uma proposta analoga, e tendo a responsabilidade do partido progressista vinculada á minha questão prévia, que, muito de proposito, foi transcripta textualmente da proposta do meu amigo e collega o sr. Eduardo
José Coelho, para que houvesse de ser mais insuspeita para a camara, e para que os illustres deputados governamentaes podessem ter menos repugnancia em acceital-a!
Tenho dito.
O sr. Presidente: - Para que esta proposta possa entrar em discussão, é preciso que seja apoiada por cinco srs. deputados.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Creio que haverá cinco collegas meus progressistas que a apoiem. (Riso.)
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - A minha resposta ao illustre deputado será extremamente breve, porque são pouquissimas as rasões que tenho a allegar, e derivam, não de uma discordancia profunda com os principios apresentados por s. exa. a respeito da boa organisação do orçamento, e da boa coordenação das contas do estado; mas sim da situação em que nos encontrâmos n'este momento.
O que posso prometter ao illustre deputado, é que hei de ser rigorosissimo na coordenação do orçamento, de maneira que represente quanto possivel a verdade.
Não quero ser injusto para ninguem, e por isso não devo occultar que de alguns annos para cá se tem aperfeiçoado bastante a coordenação do orçamento e a escripturação das receitas e despezas do thesouro. Não se póde negar, por exemplo, o beneficio enorme que á gerencia dos dinheiros do thesouro fez o regulamento de contabilidade de 1881; assim como d'este logar não posso, não devo, nem negar os serviços relevantes que tem prestado na applicação d'esse regulamento o actual director geral da contabilidade.
Já lhe prestei este testemunho nos logares da opposição e presto-lho agora daqui.
É certo que temos caminhado muito, mas precisâmos caminhar ainda mais.
Para isso póde o illustre deputado contar commigo.
Para o que não póde contar commigo, com pezar o digo, é para acceitar o adiamento que propoz.
E eu digo singellissimamente as rasões por que não posso acceitar esse adiamento.
O orçamento rectificado auctorisa o governo a pagar despezas feitas e que resultam ou de vencimentos devidos e a dever a funccionarios publicos, ou de contratos realisados que o governo actual encontrou.
Seriam bons, ou seriam maus os actos dos ministros que nos antecederam n'estes logares?
Não preciso dizel-o. S. exa. sabe quaes são as minhas opiniões a esse respeito.
O que é facto é que existiram, é que existem, e que hoje havemos de attender ás suas consequencias.
Por exemplo, nós podemos discrepar dos nossos illustres antecessores quanto ao modo por que elles procederam na defeza do paiz contra a invasão do cholera; eu posso dizer que em circmnstancias similhantes procederia, não de um modo contrario, mas de um modo diverso. O que não se póde evitar é que a despeza esteja feita. Isso não está na minha mão, nem na mão do illustre deputado, nem na mão de ninguem.
Por exemplo tambem, se me apresentassem a questão da compra do armamento, eu discutiria com todos os meus collegas, sobre tudo com os meus collegas da guerra e dos negocios estrangeiros, se tinha chegado a opportunidade ou se havia grande urgencia de se comprarem armas com maior ou menor desenvolvimento.
Mas não posso discutir esse ponto agora, que as compras estão feitas e os contratos estão realisados.
Agora, que os contratos estão realisados, não me resta, para honrar a firma do paiz, senão pagar. Para pagar é que o governo pede o orçamento rectificado.
Não foi o actual governo que fez o orçamento rectificado.
Não foi o actual governo que praticou os actos que deram logar á coordenação d'este documento.
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O governo actual encontrou-se em face de uma necessidade a que é urgentissimo satisfazer.
Póde o illustre deputado dizer: - mas então esperem que venham os documentos para a camara, e apresentem depois o orçamento rectificado.
Eu direi a s. exa. que nos primeiros dias do mez futuro seria muito difficil attender ás despezas publicas, se não fosse votado desde já este documento.
A votação d'este documento é uma necessidade urgente e impreterivel da situação em que nos encontrâmos.
Demais, eu devo dizer ao illustre deputado que a apresentação do relatorio dos actos do ministerio da fazenda perdeu hoje uma grande parte da sua importancia, porque um grande numero dos esclarecimentos que entravam n'aquelle documento vem na conta geral do estado.
Por outro lado, estou de accordo em que não devemos esconder com o nome de despezas extraordinarias certas despezas do estado, que se podem reputar mais que ordinarias. Comtudo, ha n'este ponto uma pequena discrepancia, e permitta-me o illustre deputado que lh'a lembre.
N'estas discussões aprendemos todos.
Umas vezes ensinar-me-ha s. exa. alguma cousa; outras vezes posso eu, sem o querer ensinar, lembrar-lhe certos factos.
As reparações ordinarias de estradas estão no orçamento ordinario.
O que está no orçamento extraordinario são as grandes reparações, ou reparações que equivalem quasi a novas construcções.
Não quer isto dizer que, havendo todos os annos temporaes, desmoronamentos, e todas as cousas que dão motivo a reparações extraordinarias, ellas hajam de figurar todas no orçamento chamado extraordinario; quer dizer apenas que a sua accusação não foi absolutamente justa, antes carece de correcções.
Quanto aos documentos relativos ás despezas que se fizeram com a saude publica, estão-se colligindo com a maior urgencia para serem enviados á camara os que faltarem, e espero que o illustre deputado terá occasião do os examinar com todos os seus collegas, mas não póde deixar de se pagar a despeza que se fez. Os documentos que faltaram hão de vir á camara, e s. exa. apreciará as responsabilidades constitucionaes e politicas de quem mandou fazer o serviço de uma certa fórma!
No momento actual é necessario que a camara muna o governo com meios para satisfazer despezas urgentes, indispensaveis e feitas. Ahi está quanto posso dizer. (Apoiados.)
Alguns documentos mesmo já vieram: lembro-me de receber um e talvez recebesse mais qualquer outro illustre deputado.
(Pausa.)
Informam-me alguns collegas, que vieram á camara bastantes documentos, mas foram entregues ao sr. Ennes, que está doente. Se alguns faltarem, hão de ser enviados á camara, e então será occasião de discutir, mas o que se não póde é evitar que a despeza seja paga. (Apoiados.)
Submetto estas observações á consideração da camara, e é em nome d'ellas, que, com muito sentimento, não posso acceitar a proposta de adiamento.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Não me alongarei na replica que tenho a dar ao sr. ministro da fazenda, pois me parece que muito facilmente posso responder a s. exa.; entretanto fique desde já bem assentado e d'isso eu tomo nota, que s. exa. vae envidar todos os esforços para que de hoje em diante haja de se coordenar o orçamento no sentido de algumas das observações que acabei de fazer á camara.
Não tenho duvida de me associar ao elogio feito por s. exa. aos progressos realisados no serviço da nossa contabilidade, e estas minhas palavras são completamente insuspeitas, porque sabe o illustre relator da commissão do
orçamento quaes foram durante dois annos as relações politicas que com s. exa. sempre mantive. No entretanto, se se tem progredido, muito e muito resta ainda por fazer.
Fica tambem n'este ponto consignada a minha acquiescencia ás palavras do sr. ministro da fazenda.
Com relação á ultima parte das observações que o sr. ministro da fazenda me dirigiu, affirmando ter eu sido um pouco exagerado na classificação das despezas que figuram no orçamento extraordinario e que pelo contrario deviam ser levadas ao orçamento ordinario, direi, em primeiro logar, que fallei na despeza de estradas, por ser a primeira que me occorreu no genero, e depois que eu sabia bem que se tratava das grandes reparações. Mas a resposta é exactamente a mesma.
São tão ordinarias as despezas, com as pequenas, como com as grandes reparações.
Vamos agora á questão dos documentos.
Se o sr. ministro da fazenda não tivesse, depois do conferenciar com dois dos seus collegas, declarado que parte dos documentos que eu pedia já existiam em poder de alguns membros d'esta casa, talvez eu não tivesse pedido novamente a palavra e talvez não tivesse insistido, attendendo, não, sr. presidente, á procedencia das rasões que invocou o sr. ministro da fazenda para não dar o seu assentimento á minha proposta, mas á circumstancia de que eu considerava essa proposta condemnada, do momento que o governo a ella se oppunha.
Com effeito, se os documentos existem em poder de um deputado, o adiamento que eu proponho póde ser de um dia apenas.
Já não ha rasão, pois, para deixarem do se fazer pagamentos das despezas feitas em serviços publicos, ou em virtude de contratos realisados; não ha mais do que mandar pedir esses documentos e apresental-os á camara na proxima sessão.
Agora, sim, é que está confirmada a necessidade e indispensabilidade d'este adiamento, depois das ultimas palavras do sr. ministro da fazenda.
S. exa. comprehende que eu não venho imputar-lhe a responsabilidade das despezas que estão n'este orçamento. S. exa. sabe que eu bem conheço a necessidade de que essas despezas se satisfaçam, desde o momento em que estão auctorisadas com a firma do estado. Mas não é d'isso que se trata; trata-se de por um ou dois dias adiar esta discussão, até que aqui sejam presentes os documentos que existem.
Eu lembro novamente ao sr. ministro da fazenda, que no orçamento rectificado do anno passado, em que intervieram os illustres deputados progressistas, s. exas. apresentaram uma moção que é exactamente a que eu agora mandei para a mesa, sem alteração de uma unica virgula.
Então o sr. ministro da fazenda, Hintze Ribeiro, poderia tambem ter invocado, visto que igualmente se oppunha á apresentação dos documentos, as rasões que acabam hoje de dar-se. Mas não. Deram-se o anno passado outros motivos.
Invocou-se n'essa occasião, como rasão unica, servirem os documentos para as contas e não para o orçamento, affirmando-se que nós não tinhamos mais do que votar as verbas que n'este ultimo documento estavam consignadas.
Esta foi a rasão que se deu o anno passado. Hoje vejo que a rasão da recusa é diversa.
E note v. exa., sr. presidente, tanta rasão tinha a opposição em 1885, que, apesar dos esforços em contrario do ministro e da do relator da commissão, os documentos pedidos vieram e a mesa deu conhecimento d'elles á camara.
Eu até tenho presente a acta stenographada d'essa sessão, que se tornou tão tumultuosa a ponto de ter de ser interrompida.
A rasão d'essa urgencia inadiavel dos pagamentos tambem nada significa, e muito me admira de que o sr. ministro da fazenda a tenha apresentado.
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No anno passado o orçamento rectificado foi apresentado muito mais tarde, em maio, e apesar d'isso vieram os do documentos; este anno estamos apenas em fevereiro, e portanto muito distantes ainda do anno economico. Nada importaria, portanto, para a regularidade dos pagamentos tres ou quatro dias de espera.
Não insisto, porém, mais n'uma proposta que vejo completamente desacompanhada, e, quando muito, approvada por mim e pelo meu distincto correligionario o sr. Elias Garcia. Como não quero, já o disse, tomar tempo á camara, nem estar a prolongar um debate, que resultado algum daria, resta-me simplesmente o expediente de sentar-me, abstendo-me de discutir o orçamento rectificado, visto que não posso entrar n'uma discussão para que me faltam os elementos. No entretanto, seja-me licito dizer, que os documentos que pedi não deviam ser-me recusados por nenhum membro da camara, e muito menos, por nenhum dos membros d'este governo!
Tenho dito.
O sr. Carrilho: - (O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)
O sr. Marçal Pacheco: - Pedi a palavra unicamente para dizer a v. exa., em referencia ás observações feitas pelo sr. Carrilho, especialmente com relação ao caminho de ferro do Algarve, que eu já hontem mandei para mesa uma nota de interpellação sobre o assumpto ao sr. ministro das obras publicas, e que por occasião d'ella se realisar, expenderei largamente as minhas idéas a este respeito.
Nada mais tenho a dizer.
O sr. Elias Garcia: - Não tratarei de defender a proposta apresentada pelo meu collega, porque o sr. ministro da fazenda acaba de dizer que é instante a approvação d'este projecto.
Dispensarei esses esclarecimentos. As observações que tenho a fazer com respeito ao projecto submettido ao exame da camara não carecem, em especial, d'esses documentos que não estão presentes á camara, ou, pelo menos, não estão á disposição dos deputados por modo que os possam examinar com consciencia.
O meu desejo é outro pedindo a palavra n'esta discussão; é expor, na conjunctura actual, qual é a minha opinião sobre o modo mais conveniente de proceder para resolver, ou, pelo menos, para encarar e propor, a chamada questão de fazenda, a que tantas vezes tenho ouvido referir, quer os deputados regeneradores, quer os deputados progressistas.
V. exa. sabe que tenho já estado em diversas sessões n'esta camara, e que não sou, de certo, d'aquelles que mais se têem referido a esta questão de fazenda, que para mim é consequencia e não principio.
Persisto n'esta opinião que bem poucos partidarios n'esta casa tem; e apenas folgo em ter ouvido ha poucos dias um dos nossos collegas dizer, que só poderemos resolver completamente a questão financeira quando estiverem resolvidas as questões politicas, ou, pelo menos, quando estiver a nossa administração collocada em taes moldes que a vida politica dos governos não tenha de embaraçar-se com os moldes imperfeitos em que actualmente se encontra.
Parecia-me comtudo que a occasião em que estamos era asada para entrar n'um debate sereno e pacifico, e que se não chegassemos a resolver, pelo menos conseguiriamos, na busca da resolução da questão de fazenda, o auxilio e cooperação de todos os elementos politicos que se encontram n'esta casa.
E digo isto, porque v. exa. ha de recordar-se, e toda a camara, que n'estes ultimos quatro ou cinco annos nunca se discutiu tão cedo o orçamento rectificado, nunca aconteceu discutir-se tal projecto no mez de fevereiro; esta discussão veiu incontestavelmente mais cedo do que costumava.
De mais succede que as circumstancias politicas são inteiramente de molde para que nós possamos entrar no debate despreoccupados de todos os receios de que possa vir algum embaraço ou incommodo politico para a situação que domina.
V. exa. sabe que ha muito poucos dias mudou a situação politica, e que os homens que hoje estão assentados nas cadeiras do poder são os que ha poucos dias viamos militar na opposição.
A crise suscitada desatou-se por um certo e determinado modo.
Eu não entrei n'esse debate por motivos que escuso agora de referir; mas não quero furtar-me a expor a minha opinião com respeito á solução d'esta crise na primeira occasião em que me é dado usar da palavra, e principalmente porque entendo que a solução da crise veiu contribuir de uma maneira muito notavel para podermos entrar n'este debate com toda a serenidade.
V. exa. sabe que se communicou a esta camara que o governo regenerador abandonou o poder. E digo abandonou porque para mim foi esse exactamente o seu procedimento.
Eu ouvi as palavras pronunciadas pelo sr. presidente do conselho demissionario.
S. exa. disse que tinha recorrido ao poder moderador para obter o adiamento das camaras e que, não tendo podido conseguir que o poder moderador acquiescesse á sua indicação, elle reconhecera ter perdido a confiança da corôa, e que n'essas circumstancias pedira a demissão que lhe foi acceita.
V. exa. sabe que é de absoluta necessidade, nos paizes regidos por instituições livres, accentuar de uma maneira bem clara como as crises se resolvem, porque isto constitue a historia politica, constituo o melhor commentario da execução do regimen constitucional e parlamentar do paiz; é indispensavel pois, desde que o parlamento está aberto e que a crise se operou em presença d'elle, accentuar bem o motivo e as circumstancias que determinaram uma certa e determinada crise, e a solução que ella teve.
E para mim ha muito tempo, e é já hoje da nossa constituição que o poder moderador não é responsavel por nenhum acto.
Sempre o considerei assim; houve porém homens de governo da nossa terra que entenderam que o poder moderador podia praticar um certo numero de actos para os quaes não era chamada a responsabilidade dos ministros.
Era esta a opinião do duque d'Avila, que mais de uma vez a manifestou n'esta camara. Muitos a contrariaram, e eu fui um d'elles.
Effectivamente a ultima reforma da constituição veiu desfazer todas as duvidas, e no novo acto addicional está estabelecido o preceito de que o poder moderador não tem responsabilidade por quaesquer actos, a qual impende aos seus conselheiros.
Portanto, no que vou dizer não me refiro ao poder moderador, mas sim aos que têem responsabilidade dos seus actos.
Entendo mais, que os homens publicos, quer no parlamento, quer na imprensa, quer no governo, têem stricta obrigação de zelar os bons principios, e proceder de modo que no que d'elles depender não possa alguem deixar de respeitar esses mesmos principios. Assim, se os ministros estão em presença do poder moderador têem stricta obrigação de lhe indicar o que convem fazer, sob pena de não desempenharem bem o seu papel, ou de não serem, como devem, verdadeiros homens d'estado; porque é sabido que esse poder nada póde fazer sem que alguem responda pelos seus actos.
Portanto a explicação que nos deu o illustre presidente do conselho, na minha opinião não foi correcta, e se o foi por traduzir a verdade, direi que s. exa. não se comportou como eu desejava que se comportasse um homem da sua esphera, e com a larga experiencia que tem da vida constitucional e parlamentar.
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Se s. exa. desejava que houvesse o adiamento, não era ao poder moderador que se devia dirigir; porque não só a constituição mas até o regulamento do conselho d'estado diz que esse conselho deve ser ouvido sobre a prorogação, o adiamento ou a dissolução das camaras. O conselho d'estado deve ser consultado primeiro, e depois é que o poder moderador resolve. A obrigação do illustre ex-presidente do conselho, era lembrar ao poder moderador a necessidade de consultar o conselho d'estado ácerca do adiamento. Por isso eu digo que, na minha opinião, a explicação dada por s. exa. não foi correcta. O que eu entendo que e. exa. fez foi pedir a demissão do governo e mais nada.
É por isso que eu digo, e tomo nota d'isto, que o partido regenerador abandonou o poder; e não deixarei de acrescentar que entendo que o devia abandonar. Reconhecendo, embora tarde, que a opinião publica lhe era adversa, entendeu, e fez bem, que devia largar o poder. Já ha muito que elle não tinha força absolutamente nenhuma para se poder sustentar. (Apoiados.)
A declaração de que o governo perdera a confiança da corôa, na minha opinião não significa outra cousa se não que o governo pedindo a sua demissão, a corôa lh'a acceitára, como era sua stricta obrigação.
Nós podemos recorrer á vida constitucional de outros paizes para explicar uns certos phenomenos parlamentares, e mesmo porque é necessario ir aperfeiçoando successivamente o nosso regimen parlamentar. O actual sr. presidente do conselho disse ha dias que no nosso regimen se davam umas certas condições a que eu agora não me referirei.
Eu diga que, segundo a minha opinião, o nosso regimen parlamentar ainda está muito atrazado, e que é necessario que todos os homens publicos contribuam para que seja mais genuina a sua expressão, para que esteja de accordo com a vontade da nação. É necessario que se não desminta este equilibrio, sob pena de cairmos n'um regimen pessoal, n'um regimen condemnavel.
Na minha opinião, o partido regenerador, se querem bem ou mal é com elle, pediu e obteve a demissão e o governo actual subiu por escolha da corôa, a qual julgou ter motivos para o chamar ao poder.
Portanto, o governo subiu em consequencia do artigo da carta que dá ao Rei o direito de poder nomear e demittir os seus ministros.
Mas isto não basta. Para que o regimen constitucional seja respeitado, é necessario mais alguma cousa. A corôa não deve inspirar-se senão pelas indicações constitucionaes que saíem do parlamento.
Nos paizes regidos por instituições livres e das mais aperfeiçoadas, acontece muitas vezes que o poder ou o governo desajusta da opinião do povo, e para se sair d'esta difficuldade não é necessario recorrer á dissolução do parlamento; mas esses paizes são muito educados para saberem esperar a occasião em que a opinião pese na resolução dos negocios.
Na Europa não se está n'estas condições, e mesmo em nenhum paiz se chegou ao estado de aperfeiçoamento da Inglaterra. A nação que mais adiantada está com respeito ao regimen da opinião é a Inglaterra; tem um regimen mais delicado e perfeito do que as outras, mas ainda assim carece se de muita attenção para bem ajustar o que é a opinião do governo com o que é a opinião do parlamento, por que é preciso que nem o parlamento deixe do estar representado no governo, nem o governo deixe de estar representado no parlamento, que é quem representa a nação. Na Inglaterra faz-se sempre toda a diligencia para que ajustem e se movam bem as peças d'este mechanismo.
E até nas occasiões em que se diz que a corôa intervem, representando um poder, como ultimamente succedeu, dirão alguns que essa reluctancia da corôa, até confirma ser a mesma corôa a primeira empenhada em mostrar que a nação é que governa, porque a corôa se inclina perante a, vontade da opinião. Ali não ha ninguem, por mais alto que esteja collocado, que tenha vontade superior á da nação.
Mas desde que nos paizes como o nosso se dá uma crise como esta, segundo o meu parecer o governo que ali está assentado não é o que a opinião publica indicaria; digo-o sem de maneira alguma querer ferir, nem melindrar os cavalheiros que ahi se sentam. Esta e a minha opinião.
Mas desde que o governo foi chamado pela iniciativa tomada pela corôa em acceitar a demissão d'uns ministros e nomear outros, é indispensavel, pelo menos no regimen atrazado e imperfeito em que nos encontramos, que á confiança da corôa primeiro manifestada venha ajustar-se ou corresponder de algum modo a confiança parlamentar.
Eu assisti á recepção do actual governo n'esta casa, e esperava uma de duas cousas - ou a maioria comprehendia, embora tarde, que tinha feito mal em apoiar o governo transacto e reconhecia, pelo procedimento do seu chefe, que não podia de maneira nenhuma levantar-se para embaraçar o governo que ella não podéra fazer, ou então entendia que a corôa não tinha procedido segundo as melhores indicações o se declarava em hostilidade aberta ao novo governo. Não se apresentou, porém, nenhuma moção de confiança ou de desconfiança, o que me parece teria sido mais correcto, e eu interpretei a ausencia d'essa moção, hostilidade, ou como, lhe quizerem chamar, como acquiescencia da antiga maioria, como acceitação do governo que ali está, para ajustar de um modo imperfeito, é verdade, mas como póde ser no estado actual das nossas instituições, as disposições do parlamento com a confiança da corôa.
Por isso eu disse que chegados á conjunctura da antiga opposição progressista d'esta casa, hoje representada nos bancos do poder e a antiga maioria forçada a acceitar as consequencias dos seus erros constituirem uma maioria tão grande, havendo apenas notas discordantes por parte de dois deputados que apesar d'isso estão acostumados a não melindrar os homens que militam nos outros partidos, poderiamos entrar n'este debate com toda a serenidade e placidez, afigurando-se-me por consequencia ser esta a occasião mais asada para discutirmos com uma certa minuciosidade, sem todavia sermos prolixos, visto que estamos todos á vontade e que as responsabilidades dos actuaes srs. ministros não são tão grandes em presença d'este orçamento, como seriam as dos seus antecessores.
Esta questão podia ser tratada methodicamente, de outro modo, visto o estado em que nos encontrâmos.
Isto não quer dizer que entremos n'uma discussão academica, mas n'uma discussão serena, uma vez delimitado o terreno em que nos encontrâmos e reconhecidas igualmente as vantagens e a utilidade de trocarmos as nossas opiniões e de apresentarmos o resultado dos nossos estudos ácerca d'este documento.
Eu já disse que o sr. ministro da fazenda da situação transacta apresentara a esta camara um documento que era de uma grande utilidade.
Este documento é a conta de encerramento definitivo de exercicios findos, abrangendo seis annos. Esse documento é muitissimo elucidativo; e segundo me consta foi mandado ha pouco para a mesa o parecer sobre a proposta do sr. ministro da fazenda do governo transacto, e creio que acceita pelo actual.
Essa proposta, na minha opinião, devia ser o prologo para este debate, porque emfim nunca tinhamos visto o encerramento definitivo das contas com respeito a diversos annos economicos, e assim íamos vel-o.
Poder-se-ía d'essa fórma responder ao meu illustre collega o sr. Consiglieri Pedroso, quando s. exa. disse que não sabia até que ponto chegaria este orçamento, que estava rectificado tantas vezes e que só as contas nos diriam quantas vezes mais seria rectificado.
Aquellas contas de encerramento definitivo forneceriam elementos seguros para o estudo da nossa contabilidade e
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para o estudo das nossas gerencias financeiras, porque abrangem um periodo de annos em que houve diversas situações politicas.
Eu entendo que esse debate seria muito proveitoso para todos se convencerem das normas que segue a nossa contabilidade, e para se assentarem principios seguros e firmes que podessem ser seguidos por todos.
Os principios derivados d'esse debate seriam scientificos.
Em principios scientificos não ha motivo para que os progressistas sigam um caminho, os regeneradores outro e os republicanos outro.
Dos principios assentes scientificamente, ninguem se póde affastar, sob pena de faltarem ao que devem a si e á causa publica os homens que tratam dos negocios da nação.
Afigurava-se-me, pois, que seria esse o melhor processo.
Infelizmente ou a commissão de fazenda, ou o sr. ministro da fazenda, ou o governo, ou não sei quem entendeu que se devia começar de outro modo, que se devia começar pelo orçamento rectificado.
Emfim, como este é o primeiro trabalho que se nos apresenta, eu, embora elle não possa dar para o assumpto elucidação tão completa como daria a discussão previa da proposta de lei a que me tenho referido, com a discussão da qual muito lucrariamos nós e lucraria a nossa contabilidade, não insisto n'este ponto, e apenas lamento que não se tenha seguido o methodo que indiquei.
Tratemos pois d'este documento.
Este documento já o sr. ministro da fazenda o disse, não é da sua responsabilidade, nem eu lha peço.
Não é da sua responsabilidade inicial, mas s. exa. já tem alguma responsabilidade n'elle, pelo menos com respeito aos artigos que lhe foram addicionados.
Mas nem mesmo essa responsabilidade peço ao sr. ministro da fazenda.
Por isso é que estamos em condições do debate correr serenamente. Não ha aqui nenhum ministro que possa julgar-se ferido, digamos a palavra, por quaesquer observações que se façam com relação ao orçamento.
Qualquer d'elles dirá que acceitou simplesmente o que estava.
O sr. ministro da fazenda disse que era de absoluta necessidade que este orçamento rectificado fosse votado, porque, e, se me não engano foram estas as palavras que s. exa. disse á camara, se elle não fosse votado, haveria difficul-dade, ainda n'este mez ou nos principios do mez seguinte em se fazerem certas despezas.
Não affirmo, por que não ouvi bem, que sejam estas as palavras que s. exa. disse á camara.
Parece-me que repito as suas phrases; mas, se não foram estas, quem quizer que faça a rectificação, que eu a acceito de bom grado.
Creio que s. exa. disse, repito, que a necessidade de que este orçamento fosse votado era tão instante que já n'este mez ou nos principios do mez proximo algumas despezas se não podiam fazer, se elle não fosse approvado.
Devemos tirar d'aqui uma lição para lembrarmos ao actual governo e aos governos que vierem quanto será difficil e embaraçosa para os gabinetes em certas occasiões a sua gerencia, se ella se fizer de tal modo que logo ao sexto ou setimo mez seja preciso o orçamento rectificado.
Então os que applaudimos a disposição introduzida no regulamento de contabilidade para que haja um orçamento rectificado, talvez tenhamos de pedir que em vez de um, haja dois ou três!
Se quando se chega ao sexto mez temos necessidade de orçamento rectificado, é provavel que antes de se chegar ao duodecimo mez seja preciso outra rectificação, e talvez algumas indicações que aqui se encontram, estejam a mostrar essa necessidade!
Portanto, a gerencia do sr. ministro da fazenda foi feita por modo, que ao setimo mez já era necessario o orçamento rectificado.
O governo apresentou o orçamento rectificado, que ascendia a 41.661:918$102 réis e um mez depois ou proximamente um mez, a commissão de fazenda apresenta o seu parecer, fazendo-o ascender a 42.117:892$147 réis. Quer dizer, que a commissão de fazenda entendeu que o orçamento rectificado carecia de melhoria, por haver verbas que não estavam bem computadas para a gerencia desde o setimo mez até ao fim do anno.
Desde a epocha em que foi feito o orçamento rectificado até ao fim do anno, eram necessarias verbas para serem despendidas n'esse tempo, mas algumas d'essas verbas, segundo aqui se diz, esqueceu no orçamento o consideral-as; e se esqueceu, então, ha muito tempo faziam falta!
Queria perguntar ao actual governo, se entende que o calculo feito pela commissão de fazenda estava ou não exacto, e ao actual sr. ministro da fazenda se acceita este augmento que a commissão de fazenda fez no orçamento rectificado. E digo isto por uma rasão muito simples, porque este augmento é em diversos ministerios...
O sr. Carrilho: - O governo declarou que acceitava este orçamento e o respectivo parecer, e foi sobre elle que á commissão propoz as alterações.
O Orador: - Sobre essa acceitação do governo é que eu prometti fazer alguns reparos. Eu já disse que não tomo a responsabilidade ao governo do documento primordial, entendo, porém, que tem alguma responsabilidade n'este parecer; se eu mo enganar, e o governo disser logo que não tem responsabilidade, eu acceito a declaração categorica.
Desejava desde já entrar n'estas observações, mas como deu a hora, se v. exa. me permitte terminarei amanhã muito rapidamente as minhas considerações.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para amanhã é a continuação da que estava dada e mais a eleição de commissões.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarde.
Redactor = S. Rego.