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N.° 36
SESSÃO DE 22 DE MARÇO DE 1900
Presidencia do exmo. sr. Luiz Fisher Berquó Poças Falcão
Secretarios - os exmos. srs.:
Joaquim Paes de Abranches
Antonio Rodrigues Nogueira
SUMMARIO
Lida e approvada a acta, o sr. presidente communica ter sido recebida por El Rei a commissão que fora apresentar felicitações pelo anniversario natalicio de Sua Alteza o Principe Real. - Dá-se conta do expediente, e têem segunda leitura um projecto de lei do sr. João Franco, e renovações de iniciativa dos srs. Francisco Machado, Lourenço Cayolla, Queiroz Ribeiro e Eusebio Nunes.- O sr. Antonio Cabral participa a constituição da commissão de negocios externos. - O sr. Alexandre Cabral apresenta a ultima redacção do projecto do bill. - O sr. Simões dos Reis apresenta uma proposta para serem aggregados á commissão administrativa os srs. Oliveira Baptista e Fortuna Rosado. - O sr. Simões Baião realisa um aviso previo ao sr. ministro da guerra, que respondo - O sr. conde de Foço Vieira apresenta, em nome do sr. Ferreira de Almeida, oitenta e seis representações de escrivães de direito. - Apresentam avisos previos, projectos de lei e requerimentos os srs. visconde da Torre, Sousa e Silva, Cabral Moncada, Mascarennas Gaivão, Campos Henriques e visconde de Mangualde.
Na ordem do dia (discussão do projecto de lei para compra de armamento) faliam successivomente os srs. José de Azevedo, ministro da guerra (Sebastião Telles) e Augusto Fuschini. - Têem a palavra para explicações, antes de se fechar a sessão, os srs. João Franco e Fuschini.
Primeira chamada - Às duas horas da tarde.
Presentes - 5 srs. deputados.
Segunda chamada - Ás tres horas.
Abertura da sessão - Ás tres horas e um quarto.
Presentes - 62 srs. deputados.
São os seguintes:-Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adolpho Ferreira Loureiro, Affonso Augusto da Costa, Alberto Affonso da Silva Monteiro, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Baptista Coelho, Alvaro de Castellões, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Simões dos Beis, Antonio Teixeira de Sousa, Antonio Vellado da Fonseca, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Casar da Silveira Proença, Augusto Guilherme Botelho de Sousa, Carlos de Almeida Pessanha, Conde de Caria (Bernardo), Conde de Paçô Vieira, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Joaquim Fernandes, Francisco José Machado, Francisco Xavier Correia Mendes, Ignacio José Franco, João Catanho de Menezes, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João José Sinel de Cordes, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Bandeira, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Simões Ferreira, José Adolpho de Mello e Sousa, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Antonio de Almada, José de Azevedo Castello Branco, José Christovão Patrocinio do S. Francisco Xavier Pinto, José Eduardo Simões Baião, José da Fonseca Abreu Castello Branco José Gonçalves da Costa Ventura, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Malheiro Reymão, José Mathia Nunes, José Pimentel Homem de Noronha, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Jayolla, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Manuel Augusto Pereira e Cunha, Manuel Homem de Mello da Camara, Manuel Paes de lande e Castro, Manuel Telles de Vasconcellos, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Miguel Pereira Coutinho (D.), Ovidio Alpoim Certeira Borges Cabral, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Visconde de Guilhomil, Visconde de Mangualde e Visconde da Ribeira Brava.
Entraram durante a sessão os ara.: - Abel Pereira de Andrade, Abilio Augusto de Madureira Beça, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Albino de Abranches Freire de figueiredo, Alfredo Carlos Le-Cocq, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio Lopes Guimarães Pedroza, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Fuschini, Francisco José de Medeiros, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Xavier Cabral do Oliveira Moncada, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, João Augusto Pereira, José Dias Ferreira, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Mendes Veiga de Albuquerque Calheiros, José Osorio da Gama e Castro, José Paulo Monteiro Cancella, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Pedro Mousinho de Mascarenhas Gaivão, Visconde de S. Sebastião e Visconde da Torre.
Não compareceram á sessão os srs.: - Antonio Eduardo Villaça, Antonio Faustino dos Santos Crespo, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Tavares Festas, Arthur de Sousa Tavares Perdigão, Augusto José da Cunha, Conde de Idanha a Nova (Joaquim), Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Xavier Esteves, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Henrique da Cunha Mattos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, João Lobo de Santiago Gouveia, João Marcellino Arroyo, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim José Fernandes Arez, Joaquim da Ponte, Joaquim Rojão, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Augusto Lemos Peixoto, José Bento Ferreira de Almeida, José Braamcamp de Mattos, José Estevão de Moraes Sarmento, José Joaquim da Silva Amado, José Julio Vieira Ramos, José Maria Barbosa de Magalhães, Julio Ernesto de Lima Duque, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Pereira da Costa, Manuel Antonio Moreira Junior, Marianno Cyrillo de Carvalho, Matheus Teixeira de Azevedo, Paulo José Falcão, Polycarpo Pecqnet Ferreira dos Anjos e Salvador Augusto Gamito de Oliveira.
Acta. - Approvada.
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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
O sr. Presidente: - Cumpre-me declarar acamara que a deputação encarregada de felicitar Suas Magestades pelo anniversario natalicio de Sua Alteza o Principe Real, D. Luiz Fihppe, só desempenhou da sua missão, tendo-se dignado El-Rei responder á allocução que a mesma deputação lhe dirigiu em nome da camara.
EXPEDIENTE
Officio
Do ministerio dos negocios estrangeiros, remettendo cento e cincoenta exemplares da 1.ª secção do livro branco, relativa ás negociações commerciaes com os Estados Unidos da America do Norte.
Á secretaria.
Segundas leituras
Projecto de lei
Senhores. - São tão relevantes os serviços á instrucção popular, á sciencia archeologica e ao progresso industrial que tem prestado, especialmente no concelho de Guimarães, a sociedade Martins Sarmento, da cidade de Guimarães, merecidamente, e por diversas occasiões, encarecidos n'esta casa, e louvados oficialmente pelo governo, que a sua representação, pedindo que seja isenta do pagamento da contribuição predial o da contribuição de registo pela transmissão do legado testamentario do dr. Francisco Martins de Gouveia Moraes Sarmento, é digna do acolhimento d'esta camara.
Outros isenções identicas se têem concedido, o nenhuma será mais justificada do que esta.
Em harmonia com estas considerações, tenho a honra de propor o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° A sociedade Martins Sarmento, promotora da instrucção popular, com sede na cidade de Guimarães, é isenta do pagamento da contribuição predial, relativa aos predios que possue e aos que lhe foram legados pelo bacharel Francisco Martins de Gouveia Moraes Sarmento, para fins scienfaficos ou de instrucção.
§ 1.° É igualmente dispensada de pagamento de contribuição de registo pela importancia do legado do referido bacharel Martins Sarmento.
§ 2.º Se acaso já estiver liquidada e paga a importancia d'esta contribuição, ser-lhe-ha restituida.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Lisboa, 16 de março de 1900.= O deputado, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco.
Foi admittido e enviado á commissão de fazenda.
Renovação de iniciativa do projecto de lei n.° 3-P, do anno de 1890
Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a declarar sem effeito a concessão feita à santa casa da misericordia de Elvas, pela carta do lei de 21 de maio de 1896, do edificio do extincto convento das freiras de S. Domingos da mesma cidade, em ruinas.
Art. 2.° Fica o governo auctorisado a conceder o mesmo edificio do convento de H. Domingos, em ruinas, á camara municiai do Elvas, para no terreno respectivo construir uma praça publica, melhorando assim as condições hygienicas do local em que foi situado o mesmo convento.
Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões em 20 de março de 1900. = O deputado pelo circulo de Elvas, n.° 105, Eusebio Nunes.
Foi admittida e enviada ás commissões de fazenda e de administração publica.
Renovação de iniciativa
Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 20-A, apresentado em sessão de 15 de março do 1898. = O deputado, Queiroz Ribeiro.
Foi admittida e enviada á commissão de administração publica.
Refere-se esta renovação de iniciativa ao seguinte
Projecto de lei
Artigo 1.° É declarando pantheon nacional o templo dos Jeronymos, em Belem.
§ 1.° Serão para ali trasladados, á custa do estado, as cinzas dos benemeritos da patria.
§ 2 ° A trasladação só poderá effectuar-se precedendo lei e tendo decorrido quarenta annos completos depois do fallecimento.
§ 3.° Exceptuam-se das disposições do paragrapho antecedente as cinzas de Camillo Castello Branco.
§ 4.° É desde já auctorisado o governo a fazer trasladar para o pantheon nacional as cinzas do visconde de Almeida Garrett.
Art. 2.° O governo decretará os regulamentos necessarios para a execução d'esta lei.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Renovação de iniciativa
Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 130-B, que apresentei á camara transacta em sessão de 13 de julho de 1899, para que aos alumnos da escola do exercito que se matricularam nos cursos das armas de infanteria e cavallaria nos annos de 1897 e 1898 fosse concedido mais um anno de tolerancia, podendo demorar-se na frequencia da mesma escola dois annos alem dos prasos fixados para a conclusão do respectivo curso no artigo 6.° do § unico da lei de 13 de maio de 1896 e regulamento de 27 de setembro de 1897. = Lourenço Cayolla.
Foi admittida e enviada á commissão de guerra.
Refere-se esta renovação de iniciativa ao seguinte
Projecto de lei
Artigo 1.º Aos alumnos da escola do exercito que se matricularam nos cursos das armas de infanteria e cavallaria, nos annos de 1897 o 1898, é concedido mais um anno de tolerancia, podendo demorar-se na frequencia da mesma escola dois annos, alem dos prasos fixados para a conclusão do respectivo curso no artigo 6.°, § unico, da lei de 13 de maio de 1896 e regulamento de 27 de setembro do 1897.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Renovação de iniciativa
Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 22, que tem por fim contar para os effeitos do tirocinio o tempo que tenham exercido cominando de companhia na escola do exercito, ou as funcções de instructor de cavallaria e infanteria no real collegio militar.
Sala das sessões, em 16 de março de 1900. = O deputado, F. J. Machado.
Foi admittida e enviada ás commiss3es de guerra e de fazenda.
Refere-se esta renovação de iniciativa ao seguinte
Projecto de lei
Artigo 1.° A todos os capitães que tenham exercido cominando de companhia no corpo de alumnos da escola do exercito, ou as funcções de instructor de cavallaria e de infanteria no real collegio militar, será o tempo n'esses serviços contado para os effeitos da disposição do § 1.º do artigo 4.º da lei de 13 de maio de 1896.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
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SESSÃO N.° 36 DE 22 DE MARÇO DE 1900 3
O sr. Alexandre Cabral (por parte da commissão de redacção): - Mando para a mesa a ultima redacção do projecto de lei n.° 11 (bill de indemnidade).
A commissão não- fez alteração alguma no mesmo projecto.
O sr. Antonio Cabral (por parte da commissão dos negocios externos): - Mando para a mesa a seguinte
Participação
Tenho a honra de participar a v. exa. que se acha constituida a commissão dos negocios externos, tendo escolhido para presidente o sr. José Dias Ferreira e a num, participante, para secretario. = Antonio Cabral, deputado pelo circulo n.° 6 (Braga).
Para a acta.
O sr. Simões dos Reis (por parte da commissão de administração publica): - Mando para a mesa a seguinte
Proposta
Proponho que sejam aggregados á commissão de administração publica os srs. deputados Oliveira Baptista e Fortuna Rosado. - O secretario da commissão, Simões dos Reis.
Foi approvada.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Simões Baião para dirigir ao sr. ministro da guerra as perguntas a que se refere o aviso previo que s. exa. apresentou na sessão de 9 de fevereiro.
O sr. Simões Baião: - Antes de realisar as suas perguntas, deseja fazer algumas considerações que prendem com o assumpto do aviso previo.
Na sessão do anno passado foi largamente discutido e depois approvado um projecto de lei, auctorisando o governo a reorganisar o exercito.
Convertido em lei esse projecto, o sr. ministro da guerra, em virtude da auctorisação que lhe foi dada, tomou varias providencias, por decretos de setembro e outubro de 1899, e entre ellas conta-se a da dissolução do regimento de infanteria n.° 11, que tinha o seu quartel em Thomar.
Não pergunta ao sr. ministro qual foi o motivo que o levou a proceder assim, porque, naturalmente, s. exa. lhe responderia que attendeu ás conveniencias do serviço. É certo, porem, que, quando o sr. ministro da guerra tomou esta medida, era voz geral em Thomar que motivos de ordem partidaria tinham actuado no espirito de s. exa. Dizia-se ali geralmente que o sr. presidente do conselho, não tendo conseguido afastar o candidato regenerador, quizera maguar a cidade de Thomar, e que o sr. ministro da guerra obtemperara ao desejo de s. exa., dissolvendo o regimento.
Apesar de ser elle, orador, o candidato regenerador, não acreditou no que se dizia, por lhe parecer que o sr. ministro da guerra, attendendo ás condições naturaes e ao desenvolvimento industrial e agricola da cidade do Thomar, onde o regimento de iufanteria n.° 11, aliás disciplinado, fiel ao Bei, á carta e ás instituições, tinha um bom quartel, não se inspiraria em qualquer motivo de ordem partidaria, para dissolver aquelle regimento. Principiou, porem, a convencer-se de que os habitantes de Thomar tinham rasão, quando viu que s. exa. extinguia lambem o districto de recrutamento o de reserva que tinha a sua sede n'aquella cidade.
Referindo-se depois á encorporação dos concelhos de Pedrogão Grande, Figueiró dos Vinhos e Alvaiazere, do districto de Leiria, e de alguns do districto de Santarem nos districtos de recrutamento e reserva n.ºs 2, 20 e 21, accentua os inconvenientes a que este facto dá logar, fazendo sentir em especial os que resultam da encorporação dos concelhos de Torres Novas, Barquinha e Grollegã no districto de recrutamento e reserva n.° 21, que tem a sua sede em Setubal, isto é, a uma grande distancia, quando aquelles concelhos estão próximos de Abrantes e de Thomar, havendo em Abrantes um districto de recrutamento.
Soarem assim grandes prejuizos e incommodos os povos d'aquelles concelhos, e o thesouro fica sobrecarregado com despezas, provenientes de subsidios de marcha e pagamento a caminhos de ferro.
Sabe que o sr. ministro da guerra está auctorisado a fazer a subdivisão dos districtos de recrutamento e reserva, para diversos serviços, mas estranha que s. exa. não tivesse estabelecido esta subdivisão definitivamente; e por ultimo pergunta: primeiro, se s. exa. está resolvido a fazer justiça aos povos dos concelhos que foram encorporados no districto de recrutamento e reserva n.° 20, subdividindo esto districto, ao menos para o serviço das inspecções, e estabelecendo uma inspecção em Thomar, onde está ainda um batalhão, e onde ha um quartel; segundo, se s. exa. está resolvido a fazer o mesmo com relação ao districto de recrutamento e reserva n.° 21, que tem a sua séde em Setubal, estabelecendo uma inspecção n'um ponto central, como é, por exemplo, Santarem.
Termina, pedindo a s. exa. que, satisfaça os desejos d'aquelles povos.
(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)
O sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Começa, declarando que fez a reorganisação do exercito, attendendo unicamente aos interesses militares, e, quanto possivel, aos das localidades. Não teve outras preoccupações.
Os boatos que correram a respeito da dissolução do regimento de infanteria n.° 11, e a que se referiu o sr. deputado, não tinham fundamento algum. O sr. presidente do conselho deixou-lhe liberdade completa, quanto á maneira de executar a reforma, recommendando-lhe apenas que prejudicasse o menos possivel as localidades, o que, aliás, já era proposito d'elle, orador.
Pela nova organisação tinham de ser dissolvidos alguns regimentos de infanteria, alem dos que já estavam dissolvidos; e, como por outro lado, as divisões tinham de ficar com força igual, é claro que alguns corpos da 1.ª divisão tinham de ser dissolvidos, por ser esta divisão a que tinha maior força.
Foi unicamente por isto que dissolveu, aliás com muito sentimento, os regimentos de caçadores e e o de infanteria n.° 11.
Se não dissolvesse o regimento de infanteria n.° 11, teria do dissolver um regimento de outra divisão. Este teria de ser substituido por aquelle, vindo depois um batalhão para Thomar, e isto daria o mesmo resultado, obrigando, comtudo, o estado a despezas avultadas.
Com relação ao districto de recrutamento e reserva que tinha a sua sede em Thomar, tem a observar que tambem para a sua suppressão não se demoveu por motivos politicos. Este districto tinha de ser supprimido desde que foi supprimido o regimento; mas fazendo isto, deu aos concelhos que o compunham a melhor collocação que lhes podia dar. Collocou-se nos districtos mais próximos.
E se a sede do districto de recrutamento e reserva ficou em Abrantes, foi porque os interesses militares assim o aconselhavam, visto ser aquella localidade um ponto central.
O orador justifica em seguida o seu procedimento com relação ás modificações feitas nos districtos de recrutamento e reserva, declarando, por ultimo, que visto estar auctorisado a subdividir aquelles distriutos para o serviço das inspecções, ainda procurará ver, comquanto isto lhe pareça difficil, se é possivel estabelecer-se uma inspecção em Thomar, satisfazendo assim os desejos d'aquella cidade.
(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)
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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
O sr. Presidente: - Falta acenas um minuto para se entrar na ordem do dia. Não sei se o sr. conde do Paçô Vieira ainda assim quer usar da palavra.
O sr. Conde de Pago Vieira: - Em nome do sr. Ferreira de Almeida mando para a mesa oitenta e seis representações de escrivães, que servem em vinte e cinco comarcas do reino, protestando, em termos aliás respeitosos, contra a reforma do tabellionato o pedindo que por uma lei, de caracter transitorio, se lhe garantam os seus direitos adquiridos e se estabeleça que os logares de tabelliães sejam supprimidos, conforme forem vagando.
Poço mais que uma d'estas representações seja publicado no Diario do governo, a exemplo do que se tem praticado com pedidos iguaes feitos pelos srs. Antonio Cabral, Bailio, J oito Finto dos Santos e outros srs. deputados.
Tambem em nome do sr. Ferreira do Almeida vou mandar deitar na caixa das petições um requerimento de Manuel José Martins, que foi reformado em virtude do um desastre, em que pede melhoria de vencimento.
(Consultada a camara, foi auctorisada a publicação de uma das representações.)
Vae por extracto no fim na sessão.
O ar. Presidente: - Os srs. deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa podem fazel-o.
O sr. Visconde da Torre: - Apresento o seguinte
Aviso previo
Desejo interrogar o exmo. ministro das obras publicas ácerca da construcção e reparação de varias estradas no districto de Braga. = O deputado, Visconde da Torre.
Mandou-se torpedo:
O sr. Sousa e Silva: -Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho da Villa do Porto, pedindo a concessão definitiva do extincto convento de S. Francisco.
Mando tambem os seguintes
Projectos do lei
Artigo 1.° É concedida á camara municipal do concelho de Villa do Porto, districto do Ponta Delgada, a propriedade definitiva do edificio do extincto convento de S. Francisco d'aquella villa, para accommodação das suas repartições.
Art. 2.° Esta concessão ficará de nenhum effeito, revertendo de novo para a posso do estado o edificio, se lhe for dada applicação diversa da determinada no artigo 1.°
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, em 22 de março de 1900. = Antonio Augusto de Sousa e Silva, deputado pelo circulo n.° 126.
Artigo 1.° É extensivo ao porto de Ponta Delgada o determinado no decreto n ° 1, com força do lei de 28 de dezembro do 1809.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara da senhores deputados, 22 de março de 1900. = L. Poças Falcão = Conde de Paçô Vieira = Antonio Augusto de Sousa e Silva.
Mando por ultimo o seguinte
Requerimento
Requeiro que, pelo ministerio dos estrangeiros, seja enviada a esta camara:
1.° Copia do ofiicio em que o secretario d'estado da republica da Liberia participa ao governo portuguez a nomearão do um cônsul geral em Portugal, com residencia em Lisboa, e pede exequatur legio para esta nomeação.
2.° Copia do officio do cônsul geral, assim nomeado, enviando a respectiva patente e o officio do secretario d'estado da Liberia.
3.° Data da entrada d'estes dois officios no ministerio dos estrangeiros.
4.° Copia da resposta, que pelo ministerio dos negocios estrangeiros foi dada noa dois officios.
5.° Ou, no caso de não ter sido dada resposta, qual o motivo d'isso.= O deputado, Sousa e Silva.
Os projectos ficaram para segunda leitura.
O requerimento mandou-se expedir.
A representação teve o destino indicado no respectivo extracto, que vae no fim do summario.
O sr. Cabral Moncada: - Apresento o seguinte
Requerimento
Requeiro que, pelo ministerio da justiça, se me envie, com urgencia, uma nota da qual consto:
1.° O numero de juizes, na efectividade de serviço, que contam setenta e cinco annos de idade feitos, com especificação de quantos d'elles pertencem ao supremo tribunal de justiça e quantos a 2.ª instancia;
2.° O numero de juizes, na effectividade de serviço, de mais de setenta e menos de setenta e cinco annos de idade, com a indicação de quantos são, d'estes, os do supremo tribunal de justiça, e quantos os de 1.ª e 2.ª instancia, relativamente a estes ultimos e seu numero relativamente á sua promoção para o supremo tribunal de justiça.
Requeiro mais que se declare quaes dos magistrados alludidos recebem o terço.-Francisco Cabral Moncada.
Mandou-se expedir.
O ar. Mascarenhas Gaivão: -Mando para a mesa uma representação dos empregados do juizo de paz do districto de Aljezur, pedindo melhoria nas suas attribuições e salarios.
Teve o destino indicado no respectivo extracto, que vae no fim do summario.
O sr. Campos Henriques:-Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro que, com urgencia, me seja enviada pelos ministerios da justiça e da fazenda, uma relação nominal dos juizes das relações do continente do reino o do supremo tribunal de justiça que foram aposentados desdo 1886 inclusive até 31 de dezembro ultimo, indicando-se a quantia que cada um d'elles annualmente percebe como aposentado. = O deputado, Campos Henriques.
Mandou-se expedir.
O sr. Visconde de Mangualde: - Apresento uma justificação de faltas e o seguinte
Requerimento
Requoii-o que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviados a esta camara os seguintes esclarecimentos:
1.° Nota especificada da receita proveniente dos conventos de religiosas supprimidos, arrecadada em cada um dos ultimos cinco annos economicos de 1893-1894 a 1897 e 1898, anteriores á reforma do ministerio da fazenda decretada em 1 de julho de 1898, e bem assim durante a vigencia d'essa reforma até 31 do dezembro de 1899;
2.° Nota especificada da despeza paga por conta d'aquella receita nos periodos referidos. = O deputado, Visconde de Mangualde.
Mandou-se eserpeãir.
A justificação vae no fim do summario.
ORDEM DO DIA
Discussão do projecto de lei que auotorisa o governo a effectuar um emprestimo para a compra do armamento
Leu-se na mesa. É o seguinte:
PROJECTO DE LEI N.° 12
Senhores: - O assumpto da proposta de lei n.° 6-B, submettido ao exame das vossas commissões reunidas de
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guerra e fazenda, é seguramente, pela sua natureza, um dos que mais se impõe á vossa elevada consideração. Relaciona-se elle immediatamente com a defesa do paiz e tanto basta para que a todos deva merecer a mais desvelada attenção.
A necessidade inadiavel da acquisição de armamento e respectivas munições, tanto de infanteria como de artilheria, acha-se perfeitamente demonstrada no lucido relatorio de que é precedida a proposta ministerial.
A historia de todos os tempos e de todos os povos demonstra á saciedade que estes não podem deixar de contar com o estado de guerra, e posto que esta, nos tempos mais modernos, constitua accidente intercallado em largos periodos de paz, não deixam por isso todos os paizes de se prevenir para ella, organisando solidamente os seus exercitos, e dotando-os com o melhor armamento e todos os recursos indispensaveis para que possa cumprir honrosamente a sua missão. D'esta prevenção tem resultado indubitavelmente serem na actualidade mais dilatados os periodos de paz, e estarem mais salvaguardados os direitos, a honra e os interesses dos paizes. Mas não sendo a guerra, como diz Clausewitz, senão a politica continuada por outros meios, a força, não é de esperar que venha a ser para sempre abolida.
A reorganisação do exercito decretada no anno findo elevou o effectivo, em pé de guerra, de combatentes de infanteria armados de espinguarda, a 118:080, sendo 64:944 do exercito activo e 53:136 das tropas de reserva.
A primeira e mais impreterivel necessidade de um exercito é possuir o armamento e municiamento indispensavel, sem o qual não poderá desempenhar-se da sua principal missão, que é combater. Inutil será dizer que a quantidade minima de espingardas não poderá nunca ser inferior ao numero de combatentes. Prover pois á acquisição de material de guerra pelo menos na quantidade indispensavel para armar as tropas que em pé de guerra se podem mobilisar é, por sem duvida, uma necessidade inadiavel. Bem o comprehendeu o governo; bem o fez sentir no relatorio que precede a sua proposta de lei.
Sem duvida maiores quantidades de armamento precisaria ainda o paiz possuir, a fim de se precaver contra todas as eventualidades da guerra, contra todas as perdas inevitaveis de armamento que se produzem em campanha. Estas são tão importantes, que as auctoridades em assumptos militares não julgam um paiz completamente aprovisionado em armamento de infanteria senão quando conta, pelo menos, duas armas por homem. Na batalha de Austerliz o exercito francez perdeu 12:000 espingardas; na campanha de 1806-1807 contra a Frnssia e a Russia, 60:000; na primeira metade da campanha de 1813 na Allemanha, 40:000; na guerra da Criméa, 100:000; perdas resultantes de armas damnificadas pelos projecteis do inimigo, deterioradas pelo fogo, abandonadas pelas tropas no campo de batalha, e pelos feridos e doentes, nos campos, nas ambulancias e nos hospitaes.
Alem d'isso, convem aos paizes terem sempre superabundancia de armamentos, para o caso do ser necessario levantar mais tropas que as que a organisação em pé de guerra comporta, sem fallar nos levantamentos em massa a que os paizes se vêem forçados a recorrer em casos extremos para manter a sua independencia o a integridade do solo patrio.
Para estas tropas possue o nosso paiz algum armamento ainda não para desprezar, mas melhor seria possuil-o para essas mesmas tropas, de modelo mais moderno.
No projecto submettido á vossa illustrada apreciação tem o governo em vista a acquisição de 70:000 espingardas para infanteria devidamente municiadas, e de 8 baterias de artilheria de campanha com as respectivas munições.
Com as 70:000 espingardas que o governo propõe comprar, póde armar-se toda a infanteria do exercito activo; o armamento de repetição m/1886 que actualmente possue o paiz chega para armar as tropas de reserva.
Assim, levada a effeito a acquisição proposta, evitar-se-ha o grave risco do ter o paiz soldados e de não possuir armas para lhes distribuir.
Parece comtudo as vossas commissões reunidas de guerra e fazenda que, podendo provavelmente, dentro da verba de 3:000 contos de réis, comprehender-se a compra de maior quantidade de material do que a indicada na proposta do governo, se não deverá limitar a acquisição a esta quantidade, e antes se deverá adquirir todo o que a verba de 3.000 contos de réis comportar. N'esta conformidade julgámos que alem de 70:000 armas e respectivo municiamento para infanteria, deverá adquirir-se o numero de baterias de artilheria de campanha que a verba de 3:000 contos de réis permittir, depois de deduzido o custo do armamento designado para as tropas de infanteria.
D'esta forma é talvez possivel a acquisição de 12 baterias de artilheria de campanha em pé de guerra, de peças cada uma, municiadas com 300 tiros por peça. Eate numero de baterias não é por certo ainda suficiente para collocar a artilheria no mesmo pé de igualdade que a infanteria do exercito activo, mas representa sem duvida um notavel melhoramento para a arma de artilheria.
O nosso paiz, que foi o primeiro a adoptar, em 1886, o pequeno calibre (8mm) no seu armamento portátil, depois de haver vencido, durante o estudo da arma adoptada (a Kropatschek), differentes dificuldades dimanastes da reducção do calibre, teve a satisfação de ver mais tarde que não errara, e antes tinha acertado na escolha que então fez do modelo para o seu armamento. Paizes poderosos e com elementos de estudo de que o nosso não dispõe, hesitaram por então na adopção do pequeno calibre, decidindo-se pelo calibre medio anteriormente em uso, a que applicaram o systema de repetição, e de que construiram muitas centenas da mil armas que dentro de um e dois annos tiveram de substituir pelo pequeno calibre, para fugirem á inferioridade manifesta do seu armamento. Tal aconteceu com a Allemanha e a Austria.
O momento actual parece, pelo estado da technica do armamento portátil, o mais asado para a acquisição de uma nova arma para infanteria. Os limites entre que deve comprehender-se o calibre estão seguramente determinados, e novos aperfeiçoamentos nas armas de repetição não se antevêem já muito sensiveis, dado o grau de aperfeiçoamento a que têem sido levados os ultimos modelos. É certo que os inventores e fabricantes não descuram o estudo
a espingardas automaticas; mas, sem fallar nos graves inconvenientes que porventura o automatismo possa apresentar, não nos parece duvidoso que os modernos modelos de repetição terão tempo de envelhecer, antes que as espingardas automaticas as possam substituir
Por igual nos parece asado o momento para a compra de artilheria de campanha. A que possuimos data de 1874 (6 baterias de 8cm); de 1875 (6 baterias de 9cm); de 1878 (8 baterias de 9cm); e de 1886 (10 baterias de 9cm).
Têem sido grandes os melhoramentos introduzidos na artilheria desde a ultima data até hoje; e bem carece de ser maior a substituição da artilheria do exercito activo, que se contem na proposta ministerial, a qual não é mais radical em obediencia ás circumstancias.
Proporcionalmente é Portugal o paiz que mais parcimonioso tem sido na acquisição de modernos armamentos para as suas tropas. Á Hollanda, a Suissa, a Roumania, a Belgica, paizes que podem pôr em pé de guerra effectivos muito próximos do nosso, têem adquirido espingardas modernas para os seus exercitos em quantidades que vão de 150:000 a 250:000, sem esquecerem os municiamentos respectivos, nem a artilheria correspondente á sua infanteria e cavallaria.
Para fazer face á despeza com a acquisição em curto proso do material que pretende adquirir, propõe o go-
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verno o levantamento de um emprestimo até á quantia de 3:000 contos do réis, verba em que importaria approximadamente todo o material indicado; devendo o juro e a amortisação d'este emprestimo ser pago pelo producto da remissão dos recrutas.
Como já ficou expresso n'outro ponto d'este parecer, julgam as vossas commissões que, dentro da verba de 3:000 contos de réis, se poderá adquirir mais algum material que o indicado na proposta do governo e por isso vos propõem que se despenda toda aquella verba na compra de armamento, deixando de fixar-se a quantidade de artilheria a adquirir.
A verba minima de 250 contos, tirada do producto da remissão dos recrutas, deverá amortisar o emprestimo de 3:000 contos, pagando todos os encargos d'este, approximadamente, em vinte e um annos, se os cambios se mantiverem na taxa actual; se as taxas variarem n'alguns annos e se só conservar o mesmo tempo de amortisação, é claro que aquella verba terá de ser augmentada ou soffrerá ruducçao n'esses annos se as taxas do cambio forem menos ou mais favoraveis que a actual. Prevendo o caso menos favoravel é que o § 2.° do artigo 1.° do projecto de lei preceituará que a verba destinada a juros e amortisação não seja inferior a 250 contos, como igualmente o preceitua a proposta do governo.
Sem prejuizo da instrucção da segunda reserva, a que tambem é destinado, o producto da remissão dos recrutas, aproveitado pelo modo proposto, isto é, servindo para pagamento de juros e amortisação de um emprestimo, é o meio de se poder armar de prompto o exercito, collocando-o nas circumstancias de poder cumprir com honra a aua elevada missão. Tal se não conseguiria pela compra annual de material, por pequenas porções, cujo preço naturalmente seria mais elevado. Poderia, é certo, accumular só ou capitalisar-se o producto annual das remissões durante um certo numero de annos, e no fim d'esse tempo proceder-se á compra de material de guerra.
O inconveniente d'este modo de proceder seria, nas actuaes circumstancias, termos de nos conservar desarmados durante um largo periodo de tempo, inconveniente que precisa ser de prompto remediado.
Não julgueis, porem, que com a compra do material de guerra que ficou indicado tenha o paiz resolvido o problema do seu armamento. A artilheria de campanha precisaria ser mais largamente dotada, e o artilhamento das fortificações de Lisboa e sou porto exigirão armamentos na importancia d'alguns milhares do contos de réis, a que o producto das remissões nunca poderá occorrer suficientemente, em tempo opportuno.
O governo, porem, com a sua proposta de acquisição de amamento pela forma indicada, não sómente satisfaz a uma necessidade urgente do nosso exercito, mas cumpre tombem um dever altamente patriotico, a que damos os nossos melhores applausos.
Toem, pois, as vossas commissões de fazenda e guerra, do accordo com o governo, a honra de snbmetter á vossa elevada apreciação a proposta n.° 6-B, convertida no seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Pelo producto das remissões de recrutas, em conformidade do § 4.° do artigo 133.° do decreto de 6 de agosto de 1806, é aborto no ministerio da fazenda a favor do da guerra, um credito especial e extraordinario da quantia de 3:000 contos de réis, destinado á compra de 70:000 armas para as tropas de infanteria, municiadas com 300 cartuchos por arma, e de tantas baterias do artilheria de campanha, municiadas com 300 tiros por peça, quantas possam ser pagas pelo mencionado credito, depois de satisfeita a compra do armamento da infanteria.
§ 1.° Para fazer face á despeza de que trata este artigo, é o governo auctorisado a effectuar uma operação financeira, dentro ou fora do paiz, nos termos que julgar moio convenientes, a longo ou curto praso, e mesmo em, conta corrente, não podendo, porem, o pncargo effectivo do juro das quantias tomadas de emprestimo, exceder a 6 por cento ao anno.
§ 2.° Do producto das remissões de recrutas será annualmente reservada uma quantia não inferior a 250 contos de réis, exclusivamente destinada ao pagamento de juros e amortisação das quantias tomadas de emprestimo.
§ 3.° O credito de 3:000 contos de réis, do que trata esto artigo, será applicado desde 1 de julho de 1900 a 1 de julho de 1902, conforme os prasos estabelecidos nos contratos de compra do mencionado material.
§ 4.º Fica isento de quaesquer direitos de importação o material comprado no estrangeiro por conta d'este credito.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões das commissões, 12 de fevereiro de 1900. = José Dias Ferreira (vencido) = Frederico Ressano Garcia = Alberto Monteiro = Luiz José Dias = F. J. Machado = Julio Ernesto de Lima Duque = Francisco X. Correia Mendes = A. Perdigão = Ovidio de Alpoim = João Pinto dos Santos = Arthur Montenegro = Mathias Nunes, relator = Tem voto dos srs. deputados: F. F. Dias Costa = Lourenço Cayolla = Francisco Ravasco.
N.º 6-B
Senhores. - Para a constituição do exercito é preciso attender a tres elementos principaes: recrutamento, organisação e armamento.
O serviço do recrutamento foi bem estudado pelos governos transactos, e entendemos que elle póde ser conservado como existe. Foi por isso que o governo julgou apenas necessario fazer-lhe as pequenas alterações approvadas na ultima sessão legislativa.
A organisação do exercito foi decretada e posta em execução, segundo a auctorisação concedida pelo parlamento, e o governo está convencido que, dentro dos recursos do thesouro, prestou um importante serviço ao paiz, não só pela reconstituição mais racional do exercito activo, mas principalmente pelo desenvolvimento das reservas.
No que respeita ao armamento, e em geral a todo o material de guerra necessario para que o exercito possa prestar os serviços a que é destinado em campanha, pouco se tem podido adquirir n'estes ultimos annos, e a verdade exige que se diga que o não possuimos em quantidade bastante nem em condições convenientes.
A consequencia lógica das reformas anteriores, dos serviços de recrutamento e da que ultimamente só realisou na organisação do exercito, leva a tratar da acquisição do material de guerra, e sobre este assumpto chama o governo a vossa attenção.
O material necessario para a mobilisação de um exercito moderno, é enorme, caro e de difficil confecção, e isto se não justifica, pelo menos dá a rasão da sua actual dificiencia no nosso exercito.
Mas entre todo este complicado material, se deve ainda distinguir aquelle que é possivel adquirir no paiz, o que se póde improvisar em tempo de guerra, e o que é indispensavel comprar no estrangeiro. Este ultimo comprehende o armamento, o mais complicado, o mais dispendioso, mas tambem o mais necessario. Sem armamento não póde o exercito satisfazer ao fim a que é destinado, e ficam inuteis todas as reformas, todos os melhoramentos introduzidos no recrutamento e na organisação.
Esta necessidade foi justamente avaliada pelo illustre estadista Fontes Pereira de Mello, quando em seguida á organisação de 1884, tratou da acquisição do armamento de infanteria, e esta medida encontrou no seu immediato successor na pasta da guerra a mesma boa vontade para a sua execução.
O armamento de infanteria que possuimos data de 1886; depois só foi adquirido em 1895 o armamento para a ca-
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vallaria e mais recentemente para as fortificações; anteriormente, de 1874 a 1878, comprara-se o armamento para a artilheria de campanha.
Estas datas são suficientes para mostrar que o armamento que possuimos, não está a par das exigencias modernas. Mas não é só a qualidade que deixa a desejar, falta-nos a quantidade necessaria; e de todas as faltas as que nos parece mais urgente preencher, é a do armamento da infanteria do exercito activo e a de uma parte da sua artilheria.
No armamento da infanteria é onde mais se faz sentir a insuficiencia da quantidade, sobrepondo-se ainda aos defeitos da qualidade.
O armamento de infanteria que possuimos foi escolhido com muita felicidade, porque só hoje, no fim de quatorze annos, começa a ser inferior aos modelos mais aperfeiçoados dos exercitos estrangeiros; mas não é suficiente para o exercito activo estabelecido pela nova organisação, e não o seria tambem para os effectivos das tropas activas fixados pela organisação de 1884. Em ambas as organisações, parte do exercito activo e todas as reservas, só poderiam armar-se com antigos modelos de pouca utilidade pratica e em numero insuficiente; mas esta insuficiencia é ainda maior com a ultima organisação, visto que ella augmentou consideravelmente os effectivos das reservas.
Para completar o armamento da infanteria do nosso exercito, precisamos de 70:000 armas. Este numero não varia qualquer que seja o modelo a adoptar: 70:000 são precisas para que a infanteria do exercito activo e das reservas seja dotada com armas de repetição do actual modelo; 70:000 serão tambem precisas quando se adoptar um novo modelo para o exercito activo, passando o existente para armamento das reservas. A escolha do novo modelo, que ha mais de um anno está entregue ao estudo de uma commissão competente, não influe na necessidade de se adquirir aquelle numero de armas.
O armamento da artilheria de campanha que possuimos não está em melhores condições do que o da infanteria; é suficiente para o exercito activo, mas não chega para as reservas, e a sua qualidade está, em relação com os novos modelos hoje adoptados, em condições inferiores áquellas que notámos n'este armamento.
O que seria para desejar, era fazer-se para a artilheria de campanha o mesmo que propomos para a infanteria, isto é, adquirir material novo para as tropas do exercito activo, e destinar o existente para armamento das reservas e dos pontos fortificados. Infelizmente as nossas circumstancias financeiras não permittem duas medidas tão radicaes.
Adoptamos este systema só para a infanteria, por ser a arma mais numerosa e a que com mais facilidade póde occorrer á defeza do paiz. Para a artilheria de campanha propomos apenas que se adquiram oito baterias para substituir as peças do modelo mais antigo e já deterioradas que possuimos. As condições financeiras restringem as aspirações do governo, que de certo, são tambem as vossas e as de todo o paiz.
Resumindo as breves considerações apresentadas, o governo entende ser de absoluta necessidade adquirir 70:000 armas de infanteria e 8 baterias de artilheria de campa nhã Apenas acrescentaremos que para esto armamento se deve tambem adquirir as munições correspondentes, por isso que a fabricação nacional não permitte fornecer os depositos indispensaveis, sem os quaes o armamento, seria inutil.
Todo este material custará approximadamente 3:000 contos de réis, incluindo os cambios; e á dificuldade do problema que submettemos á vossa illustrada apreciação, reside na maneira de obter esta importante quantia nas condições actuaes do thesouro publico.
São essas condições bem conhecidas, e apesar da incontestavel melhoria ultimamente realisada, o governo não viria propor-vos um tão consideravel augmento de despeza extraordinaria, se ella se não podesse fazer pelo producto das remissões de recrutas, que não entra nas receitas do estado e por lei é destinada á acquisição de material de guerra.
O principio da remissão do serviço militar é condemnado na maior parte dos exercitos modernos, mas tem a utilidade pratica de produzir uma importante receita. Se esta receita fosse absorvida pelas despezas geraes do estado, o prejuizo produzido na constituição do exercito, não teria compensação alguma. A unica maneira de obter uma compensação, consiste em destinar o producto das remissões a melhoramentos do proprio exercito; debaixo d'este ponto de vista, podem ser até vantajosas porque dispensam elementos que possuimos em excesso para obter outros que nos faltam.
É o que se deve fazer nos paizes de fracos recursos pecuniarios, para poder dispor, para as necessidades mais urgentes da defeza nacional, de uma importante quantia que por outra forma seria difficil, se não impossivel de obter.
No nosso paiz, encarou-se ultimamente assim, pelo melhor lado, o principio da remissão, reclamada tambem por outra ordem de interesses geraes, e a partir de 1892 foi o correspondente producto destinado á acquisição de material de guerra, destino que se accentuou melhor em 1896, generalisando-o tambem á instrucção da 2.ª reserva.
Com estes recursos se tem conseguido, sem pesar no orçamento do ministerio da guerra, melhorar o nosso material, fazendo as compras e reparações necessarias, sem as quaes teria chegado a um estado deploravel. Com os mesmos recursos se poderá dar a mstrucção indispensavel ás praças da 2.ª reserva necessarias para completar os effectivos da actual organisação, e adquirir grande parte do material que nos falta.
O systema até hoje seguido de dispender o producto das remissões dentro do correspondente anno de exercicio, permitte ir gradualmente melhorando o nosso material de guerra, fazendo as reparações necessarias e adquirindo o e menor preço, mas nunca fazer a acquisição do material novo a que anteriormente nos referimos.
É preciso, portanto, mudar de systema; é preciso aproveitar a receita das remissões, a unica de que actualmente se póde dispor sem sacrificio, para adquirir o material de guerra mais importante, mais necessario, e sem o qual o exercito não póde satisfazer á sua missão.
Não é possivel realisar a compra d'esse material em annos successivos, porque se passariam muitos sem, estarmos armados, e os progressos rapidos do armamento não permittem seguir este processo. A renovação do armamento de um exercito, ou se faz rapida e seguidamente, ou nunca se faz. E se isto é exacto para todos os exerci-tos, mais ainda o será para o nosso, onde a renovação não tem unicamente por fim substituir antigos modelos, mas preencher tambem faltas importantes.
A maneira de conciliar estas differentes e oppostas necessidades, consiste em seguir o systema adoptado para a execução de todos os melhoramentos materiaes feitos entre nós; contrahir um emprestimo, consignando ao seu pagamento as receitas que têem o correspondente destino especial. E o systema que temos a honra de vos propor.
O producto das remissões, tendo sido muito grande em 1896, diminuiu nos dois annos seguintes, mas póde calcular-se que de futuro não será inferior a 450:000$000 réis. D'esta importancia se deve abater 100:000$000 réis para dar instrucção ás praças da 2.ª reserva; 100:000$000 réis para pagar as reparações no material existente e a acquisição de outro de menor preço, sem augmentar as verbas para este fim descriptas no orçamento; figa, portanto livre a
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quantia de 250:000$000 réis, que póde ser destinada a pagar os juros e a amortisar o capital levantado para a compra do armamento que propomos.
Esta quantia representa um minino, reservando-se a faculdade de se augmentar, quando houver maiores receitas da remissão, uma outra combinação na sua administração, ou maiores recursos do thesouro.
A presente proposta de lei consigna o pensamento que temos procurado desenvolver. Ella fica submettida á vossa illustrada apreciação, e o governo conta que lhe introduziréis as modificações que julgardes mais convenientes, tendo em vista o fim patriotico que a dictou, ao qual não dareis menos valor do que o proprio governo.
PROPOSTA DE LEI
Artigo 1.° Pelo producto das remissões de recrutas, em conformidade do § 4.° do artigo 132.° do decreto de 6 de agosto de 1896, é aberto no ministerio da fazenda a favor do da guerra um credito especial e extraordinario até á quantia de 3.000:000$000 réis, destinado á compra de setenta mil armas para os corpos de infanteria, de oito baterias do artilheria de campanha e das correspondentes munições.
§ 1.° Este credito será applicado desde 1 de julho de 1900 a 1 de julho de 1902, conforme os prasos estabelecidos nos contratos de compra do mencionado material.
§ 2.° Fica isento do quaesquer direitos de importação o material comprado no estrangeiro por conta d'este credito.
Art. 2.° Para fazer face á despeza de que trata o artigo antecedente, o governo é auctorisado a effectuar uma operação financeira, dentro ou fora do paiz, nos termos que julgar mais convenientes, a longo ou curto praso, e mesmo em conta corrente, não podendo, porem, o encargo effectivo do juro das quantias tomadas de emprestimo exceder a 6 por cento ao anno.
§ unico. Do producto das remissões de recrutas será annualmente destinada uma quantia não inferior a réis 250:000$000, exclusivamente destinada a pagar juros e a amortisar o capital de que trata o artigo anterior.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 31 de janeiro de 1900. = Manuel Affonso de Espregueira = Sebaatião Custodio de Sousa Telles.
O sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 1.° o sr. José de Azevedo Castello Branco sobre a - Começa lendo a seguinte
Moção
A camara, reconhecendo que não existe circumstancia de caracter interno ou externo que justifique avultadas despezas com armamento militar;
Reconhecendo que as apertadas condições financeiras do thesouro não são de natureza a absolvel-a de um tão inopportuno dispêndio, reconhecendo que todas as propostas já apresentadas pelo sr. ministro da fazenda, importam quasi insupportaveis aggravamentos de contribuições, o que denuncia a miseria do thesouro:
Resolve por isso adiar para hora mais opportuna a discussão d'este projecto e continua na ordem do dia. = José de Azevedo Castello Branco.
Continuando, observa que talvez a camara julgue que o partido regenerador, a que se honra de pertencer, não liga grande interesse ao projecto, por ser elle, orador, quem toma a palavra para encetar o debate. Não é, porem, assim. Pela sua palavra falla n'este momento o sentir do seu partido, para declarar que julga inconveniente a discussão de um projecto que importa tão avultado dispendio.
Não vem discutir o projecto, cujas condições technicas e financeiras serão tratadas por outros srs. deputados mais competentes; vem apenas justificar a sua moção de adiamento, tendo a pretensão de interpretar n'ella os sentimentos não só do seu partido, mas tambem do paiz, o qual não póde ver com bons olhos que, no momento em que tratámos de lhe aggravar os sacrificios, vamos pedir um emprestimo de 3:000 contos para compra de armamento.
Não sabe só o paiz está com o parlamento e com o governo, ou se o governo e o parlamento andam inteiramente alheados do paiz; o que sabe é que o governo não correspondo por forma alguma n'este momento ás necessidades publicas.
Todos os indicadores da opinião publica mostram que ella pede que se attenda ás circumstancias da nação e ás condições deploraveis do thesouro; mas, se se percorrerem as propostas do governo, o que se vê, áparte umas futilidades, como o das reformas politicas, é o pedido constante de aggravamento das despezas e o consequente pedido de augmento de impostos.
Estes factos representam um desnorteamento completo do parlamento e do governo, e hão de necessariamente levar o paiz a uma situação incompativel, a uma vergonhosa ruina.
Diz em seguida o orador que o pedido para se contrahir um emprestimo do 3:000 contos para se armar o exercito é uma pura formalidade, porque o governo ao mesmo tempo que apresenta o projecto, subtrahe á camara todos os elementos de fiscalisação.
Pede o governo auctorisação para contrahir um emprestimo de 3:000 contos, dentro ou fóra do paiz, a curto ou longo praso, com juro caro ou barato, e em conta corrente ou sem ser em conta corrente. Ha de ser, emfim, um emprestimo como Deus for servido.
O governo, porem, deve saber que no paiz não o póde contrahir, como se prova pelo das classes inactivas, sem um juro muito elevado, e com canção de inscripções, dando margem a grandes lucros. Não ignora tambem que lá fora não o poderá igualmente fazer sem que as nações estrangeiras venham discutir as condições, vigiar o sou destino e fiscalisar a sua applicação.
É por isto que se lhe afigura que não ha um grande perigo na votação do projecto; mas entende que é um dever dizer claramente que as circunstancias actuaes não permittem que o paiz se abalance a uma despeza que, nas melhores condições, seria, pelo menos, inopportuna.
Entende elle, orador, que não são suficientes para justificar o projecto as rasões allegadas pelo sr. ministro da guerra no seu relatorio, e, em sua opinião, antes de se comprar o armamento para o exercito, dever se ia dar-lhe todas as outras condições que lhe faltam para que elle possa ser um elemento de ordem na metropole e de segurança nas colonias.
O projecto em discussão que é uma verdadeira iniquidade pela sua inopportunidade, representa um dispêndio que vae pesar profundamente sobre as contribuições do estado, sendo uma illusão o suppor-se que o dinheiro que ha de fazer face a esse encargo, sáe de uma caixa especial do sr. ministro da fazenda. D'onde elle sáe é do imposto geral do estado na sua forma mais repugnante.
E custa a acreditar que seja um partido liberal, que seja o partido progressista quem venha invocar um acrescimo de imposto sobre a miseria e sobre o proletariado, para sobre elle architectar uma operação financeira!
E por todos estes motivos que a opposição regeneradora não póde votar este projecto de lei.
Crê que nada mais lhe resta a dizer para justificar plenamente a sua moção de ordem.
Lida na mesa foi admittida, ficando em discussão com o projecto.
(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)
O sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles):- Pediu a palavra n'uma situação embaraçosa para respon-
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der ao illustre deputado regenerador, o sr. José de Azevedo.
S. exa. condemnou o principio da remissão, que diz ser contrario ao programma do partido progressista, e todavia este imposto, que na opinião de s. exa. é condemnado por todas as idéas liberaes, foi estabelecido pelo partido regenerador! É, portanto, elle, orador, quem tem de defender essa medida do partido regenerador, mas defende-a com convicção, porque o considera util aos interesses do paiz.
Se tem algum facciosismo é só para os interesses militares. Esse não ha duvida que o tem, e conserva-o. Mas esse facciosismo não foi adquirido no parlamento, foi adquirido, ha muitos annos, lá fora.
Disse s. exa. que a compra de armamento importa um dispêndio inutil, que o paiz não póde approvar! Mas, elle, orador, pergunda a s. exa., e a toda a camara, desde o momento em que existe uma lei, consignando o producto dás remissões á compra do armamento, que novidade póde haver n'esta medida?
Começa agora a dar-se execução a essa lei? Não. Desde 1895 que ella é executada, sendo ministro da guerra o sr. Pimentel Pinto.
Essa lei estabelecia, no artigo 133.°, este principio, e acquisição de guerra. A differença na forma da applicação é que deve ser apreciada.
Parece-lhe que esta é a forma mais util de applicação, e a outra a mais inconveniente.
S. exa. criticou ainda o projecto sobre um ponto, dizendo que elle não se estabelecia nem com juro firme! O juro está fixo.
Sendo o emprestimo feito, tem uma consignação especial estabelecida por lei, e ha por consequencia todos os elementos que definem as condições d'esse emprestimo, sem maiores explicações.
Diz s. exa. que o emprestimo póde ser interno ou externo; mas isto representa uma vantagem, porque é um direito que o governo se reserva. Depois do emprestimo feito é que se póde dizer se teria sido melhor que elle fosse feito no interior ou no exterior.
Referindo-se ás condições desgraçadas do paiz, que a opposição costuma pintar com as cores mais feias, disse ainda o sr. deputado que, n'essas condições, não se devem lançar mais encargos sobre o paiz. A esta observação já elle, orador, respondeu, mostrando que não se trata de encargos novos.
Este imposto não figura no orçamento e não tem figurado até hoje, e o projecto só tem por fim dar a esse imposto uma applicação mais regular e mais justa do que se dava até agora. D'aqui não póde vir mal nenhum ao paiz.
Realisar o emprestimo, accrescenta s. exa., é, sem duvida, a primeira difficuldade; mas, depois do emprestimo feito, a difficuldade é pagar.
O producto das remissões pertence ao ministro da guerra despendel-o, e tem-o despendido até agora.
O sr. João Franco: - O que s. exa. está dizendo não se vê no projecto.
O Orador: - Está na lei geral. Ha o projecto e ha a lei vigente anterior ao projecto.
Como já está auctorisado a despender o producto das remissões com o armamento, o governo podia contratar com qualquer fabrica e depois pagar em prestações...
(Alguns srs. deputados interrompem o orador.)
O sr. Presidente: - O sr. ministro da guerra permittiu que o sr. João Franco fizesse uma interrupção, mas os srs. deputados Teixeira de Sousa e Alberto Monteiro não podem tomar parte n'ella.
O Orador: - Estava dizendo, que se a intenção do governo fosse contratar a compra de armamento, não trazia o projecto á camara; podia ter feito o contrato. Como argumento principal para demonstrar que o projecto deve ser condemnado por completo, apontou o illustre deputado para o estado do exercito, que, no seu entender, não tem organisação, não tem instrucção, e que nem sequer tem soldados para as fileiras, querendo d'aqui concluir que, visto elle achar-se em tão deploraveis condições, não vale a pena fazer nada em seu beneficio; é preferivel deixal-o morrer!
Observa, porem, a s. exa. que foi exactamente por não estar o exercito devidamente organisado é que elle, ministro, o organisou; e porque elle não tem armamento e precisa tel-o, é que apresenta agora este projecto. Desde o momento em que o ministro da guerra sirva unicamente para assignar despachos, para fazer distribuir contingentes e para ordenar alguns exercicios, é inutil a sua conservação no governo. Assim não será ministro da guerra.
Disse tambem s. exa., que o exercito por mais melhoramentos que recebesse, nunca poderia achar-se em situar cão de garantir a defeza do paiz! Elle, orador, tem opinião completamente contraria. Não são sómente os exercitos das grandes nações os que podem satisfazer essa missão. O nosso paiz está em condições de poder ter um exercito que o possa defender.
Accrescenta ainda o illustre deputado que o nosso exercito não póde estar a par dos exercitos estrangeiros e não vale por isso a pena fazer qualquer cousa em seu favor. Se s. exa. quizesse completai- o raciocinio, chegaria a esta conclusão: se nós dissolvêssemos o exercito, por não poder estar a par das nações de primeira ordem, com o mesmo fundamento devemos dissolver a instrucção publica, que não está a par da das nações estrangeiras; e pela mesma rasão temos de dissolver o commercio, a industria, tudo, emfim resultando da applicação completa de similhante principio a dissolução do paiz!
Sabe elle, orador, perfeitamente que esta não póde ser a opinião do partido regenerador. Nem ella se póde conciliar com a tradição, que vem do sr. Pimentel Pinto, o qual augmentou as despezas do ministerio da guerra, nem sempre orientado pelos principios da defeza nacional.
Como conciliar-se essa opinião com a do sr. Fontes que augmentou consideravelmente as despezas do ministerio da guerra?
N'esta questão do armamento é preciso attender á justiça com que se applica a rhetorica e com que se applica a lógica.
O producto das remissões em 1896 rendeu 800 e tantos contos. Depois d'esse anno o sr. Moraes Sarmento, apesar de ter mais de 800 contos, não julgou esta quantia sufficiente para o armamento do exercito, e no orçamento que ainda chegou a fazer, consignava mais 230 contos como verbas para despezas extraordinarias. Como é, pois, que s. exa. que de certo approvariam aquelle orçamento, vêem hoje condemnar este projecto?
É uma theoria muito commoda; o partido regenerador póde fazer todas as despezas, os outros não!
O illustre deputado quer um exercito colonial.
N'uma questão de organisação póde fazer differença, mas n'uma questão de armamento, não. Porventura é conveniente ter um exercito colonial, sem armamento?
Se as cousas estão más, a minha opinião é que se melhorem. Se as cousas estão más, não se fazer nada, á peoral-as.
Sabe que é mais commodo fazer acquisição de armamento com augmento de despeza, e de certo a organisação havia de ser melhor se podesse gastar á larga; mas como isso não é possivel, e tem de se restringir á legislação em vigor, procura introduzir todos os melhoramentos n'estas condições.
este o programma que tem accentuado; é este o pro-
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gramma que ha de cumprir tem o applauso dos seus collegas, e apoiado por todo o partido progressista.
(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir.)
O sr. Augusto Fuschini: - Começa por ler a seguinte
Moção
A camara, considerando que o projecto de lei para compra do armamento, embora corresponda a conveniencias nacionaes, envolve consideravel despeza, espera que o sr. ministro da guerra consinta em adiar a respectiva discussão para depois de estudado o votado o orçamento n'esta do parlamento. = Augusto Fuschini.
Continuando, diz o orador que não se occupará da parte technica d'este projecto, porque tem pouquissimos conhecimentos em sciencias militares.
Como a sua moção o demonstra, não o combate na sua essencia, apenas lhe contesta a opportunidade, porque não julga a occasião para grandes despezas, nem o momento azado para controhir emprestimos.
Não quer isto dizer, que nos limites do possivel, não contribua com o seu voto e com a sua palavra para o aperfeiçoamento das instituições militares.
Viu levantar-se grande discussão sobre a constituição dos exercitos. Deve dizer francamente a sua opinião: prefere o principio da nação armada, como a Suissa e o Transvaal; mas reconhece que esto fim sómente se consegue com esforços intelligentes e harmónicos de successivas gerações.
Parece-lhe que este principio é o mais util e applicavel ás nações pequenas, como os exemplos o vão demonstrando ; julga, porem, que o exercito permanente, bem instruido e armado, facilita esta solução, correspondendo ao mesmo tempo a necessidades impreterivois do ordem publica e do defeza nacional. Sem um quadro de bons oificiaes e um nucleo do soldados, não póde conseguir-se armar uma nação.
Faz toda a justiça ao sr. ministro da guerra, o seu desejo é acertar e contribuir com o seu trabalho e esforço para os aperfeiçoamentos militares.
Não póde ser um bom critico, porque lhe faltam os conhecimentos especiaes; mas formou a sua opinião, ouvindo o consultando alguns amigos seus militares, que não militam em nenhum dos campos partidarios. A reforma do exercito do actual ministro é a melhor que tem sido realisada no paiz, o mais completa seria se a politica partidaria do sr. José Luciano a não polvilhasse com alguns absurdos.
A propria base 17.ª, que tendeu a estabelecer a perequação das promoções, se não resolve o grave problema, que aliás parece insoluvel, não deixa de constituir um importante aperfeiçoamento sobre o systema anterior.
Na questão da compra do armamento não está do accordo com o ministro, sente dizel-o por que é um amigo.
A ultima reforma organisou as reservas, disso o ministro, ora, para que elles não existam só no papel, é indispensavel dar-lhes instrucção e armamento. É incontestavel.
Mas as necessidades são relativas; é necessario regulal-as conforme os meios disponiveis. A questão é saber se podemos e devemos comprar armamento na actual conjunctura; pelo menos, em tão importante quantidade.
O assumpto tem um lado que se prendo com as condições financeiras do paiz, o mais importante no momento actual.
É possivel que o sr. ministro da guerra, que só declarou plenamente dedicado, até faccioso pelas questões militares, immerso nos serios problemas da sua pasta, absorto na sua rosolução, não faça justo idéa do nosso estado financeiro.
Não seria para admirar; outros collegas seus e mais responsaveis n'este ponto, tambem o não conhecem, porque o sr. Espregueira, considerado como um dogma, guarda em profundo segredo os seus elixires financeiros. Elle diz que tudo vae bem, que existem recursos, que abunda o dinheiro ao governo, logo é verdade.
Entendo que todos os projectos que envolverem despeza, devem ser apreciados depois da discussão do orçamento, visto que será durante ella que se poderá apreciar com algum rigor não só o estado economico do paiz, como o estado financeiro do thesouro. D'aqui a origem da sua moção.
Não póde n'este momento expor desenvolvidamente as suas opiniões, comprovadas com algarismos, ácerca do estado da fazenda publica, mas permitte-se apenas fazer algumas observações, que podem esclarecer a camara e o paiz.
O resultado geral da nossa administração financeira póde avaliar-se pela grandeza dos deficits. O desequilibrio entre as receitas e as despezas é um indicador seguro, embora não seja o unico.
Nos seis annos economicos de 1893-1899, as contas geraes do estado e as contas do thesouro manifestam deficits totaes na importancia approximada de 25:800 contos. No corrente anno economico as contas do thesouro, publicadas até 30 de setembro, accusam um deficit de 2:000, é mais do que provavel que este deficit duplicará até 31 de dezembro. É o semestre das vaccas magras. O segundo semestre corrente - janeiro a junho - porque é o das vaccas gordas equilibrará, quando muito, as receitas com as despezas. O deficit do anno economico corrente não será inferior a 4:000 coutos, segundo todas as previsões.
Teremos, pois, em sete annos 29:800 contos de desequilibrio entre receitas e despezas; ou melhor, cerca de 31:000 contos, porque, por simples artificio de escripturação para diminuir o respectivo deficit, em 1894-1895 se escripturou como receita extraordinaria 1:109 contos, lucros da amoedação da prata, que foram realisados e gastos antes de 1893.
Sabe o ministro da guerra como se fez face a este enorme desequilibrio ? Vão dizer-lh'o e por aqui avaliará s. exa. a gravidade da conjunctura.
Recorreu-se ao banco de Portugal, e do seu capital ou pelo respectivo credito arrancaram-lhe pela conta corrente, pelo emprestimo para as classes inactivas, pelo redesconto de bilhetes do thesouro e por um snpprimento caucionado coroa de dois terços d'aquella quantia. O resto foi buscar-se á divida fluctuante por emissão de bilhetes do thesouro, ou supprimentos caucionados, ao excesso de circulação do cedulas, e finalmente á venda - dizem que directamente no mercado, o que lhe parece impossivel- de fundo interno de 3 por cento. Eis o principal, pelo menos; e não se dirá que não é sublimo este mechanismo financeiro!
Acha o ministro que será opportuno para largas compras de armamento o momento, em que estes tristes expedientes estão prestes a esgotar-se, e chegado aquelle terrivel quarto de hora de Rabelais, em que se pagam as orgias!
Diz s. exa. que não augmenta as despezas, visto que vae procurar a annuidado do seu sonhado emprestimo á verba das remissões, que está auctorisado a gastar. De estar auctorisado a dever gastal-a vae sua differença. Quando existem tão elevados desequilibrios orçamentaes deve prevalecer o bom censo da economia ás auctorisações legaes. Este raciocinio seria rigorosamente exacto, dado o equilibrio orçamental, aliás não o é.
O plano de um emprestimo externo é uma verdadeira phantasia. Com outros elementos o com outras garantias não conseguiu ainda nada, o bem o deseja, o sr. ministro da fazenda.
Lembre-se s. exa. no emprestimo para navios de guerra,
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feito n'outro tempo e n'outras condições, para o obter foi necessario passar quasi directamente das mãos dos banqueiros para a dos constructores as sommas resultantes da segunda emissão das obrigações dos tabacos; nem assim o conseguirá o sr. ministro.
O emprestimo, se se fizer, ha de ser nacional. Seja como for, no primeiro caso iremos dificultar ainda mais as nossas condições internacionaes, as exigencias dos credores, as ambições de interferencia nos nossos negocios internos, e fazer uma concorrencia deploravel: aos supprimentos, porventura necessarios para pagamento de des-pezas impreteriveis; no segundo caso, soffrerá a economia interna, porque o capital nacional absorvido em grande parte pelas necessidades do thesouro, immobilisar-se-ha em papeis de credito, avolumados pelo novo emprestimo, em vez de se applicar á agricultura, ao commercio, á industria, os verdadeiros factores da riqueza publica, já tão ferida pela grande e longa concorrencia do thosouro.
Não insista o sr. ministro da guerra; retire o seu projecto ou reduza a despeza ao minimo, ao estrictamente necessario. Dá-lhe um conselho de amigo. Mas se o ministro insistir, ao menos lembrar-lhe-ha o caso do arco da rua Augusta.
Em tempos que já lá vão, quando os nossos; orçamentos eram pequenos, se não havia meio de legalisar certas despezas, eram carregadas áquella construcção. Se se podesse fazer a liquidação da sua despeza, poderiamos construir com ella não um arco mas uma arcada. Depois inventaram-se outros arcos, por exemplo os lucros da amoedação da prata. Não deixe o sr. ministro repetir o caso com o emprestimo do armamento, n'este anno em que ha grandes festas em Paris.
O sr. ministro quer espingardas para defender o paiz contra a invasão de phantasticos inimigos externos, pois de peor mal estamos ameaçados.
Esgotados os expedientes financeiros, usados até hoje, o quarto de hora da agonia approxima-se rapidamente; já a presentimos em 1892 e 1893.
Para equilibrar o orçamento de que recurfos immediatos póde lançar mão o sr. ministro da fazenda?
Das economias? Quem as quer? O orçamento da despeza cresceu em seis annos cerca de 10:000 contos. Provam-o as contas do estado.
O que resta, pois, senão o augmento das receitas pela violencia dos impostos de tão feroz caractér fiscal, que até foram ás sociedades de soccorros mutuos, ou o ideal da conversão, feita em condições taes que abra os mercados estrangeiros a nova orgia de emprestimos?
O paiz soffre as consequencias lógicas da sua imprudencia; soffrel-as-hia maiores e mais profundas se não olhar com attenção extrema para o seguimento dos negocios publicos. Não ha insania que mais cedo ou mais tarde não tenha dolorosa liquidação.
Deus afaste a hypothese da conversão. Póde ser que esta idéa seja quasi uma monomania no seu espirito. Talvez; mas os hystericos e os monomaniacos são ás vezes videntes.
O inimigo terrivel, contra o qual não luctará a valentia do nosso exercito e a perfeição do seu armamento, não entrará pela fronteira; póde entrar pela mão de um ministro da fazenda e pela porta da junta dó credito publico.
E se elle entrar, que os deputados venham ao parlamento depor a seu mandato inutil e entoar um requiem, terrivel e doloroso, sobre o corpo inanimado da nacionalidade portugueza.
Leu-se na mesa a moção, e foi admittida.
(O discurso será publicado na integra geando s. exa. o restituir.)
O sr. Presidente: - A hora está adiantada e o sr. João Franco pediu a palavra para explicações para antes de se encerrar a sessão.
Vou consultar a camara sobre se concede a palavra ao sr. João Franco para explicações.
A camara resolveu affirmativamente.
O sr. João Franco: - O illustre deputado que acabou de fallar, referindo-se a um emprestimo feito pelo ministerio, a que eu tive a honra de pertencer, para a renovação de parte do material da nossa marinha de guerra, fel-o por fórma a poder deixar, em quem ouviu, a impressão de que a entrada do producto d'esse emprestimo na junta do credito publico, e a sua entrega feita directamente pela junta aos fornecedores dos navios de guerra, tinha sido uma idéa, uma clausula, uma obrigação, por qualquer maneira insinuada, ou imposta, ao governo d'essa epocha, ou pelos fornecedores dos navios, ou por quem quer que fosse, ou talvez mesmo pelos fornecedores dos fundos do emprestimo.
Representando eu n'esta camara esse ministerio, não sendo membro d'ella o ministro da fazenda, que era tambem presidente do conselho de então, entendi do meu dever affirmar a v. exa. e á camara, pela fórma mais terminante e positiva, que um tal principio, consignado na lei que esse ministerio apresentou ao parlamento, auctorisando aquelle emprestimo e n'aquellas condições, foi de pura iniciativa dos membros d'essa situação politica. Fizeram-n'o assim, lembrados - e eu com isto não quero fazer insinuações a ninguem - de que antes um outro ministerio tinha feito um emprestimo para navios de guerra, e abandonando, a breve trecho, as cadeiras do poder o ministerio que tinha feito esse emprestimo, - vejam a lealdade com que eu fallo -, navios de guerra não se adquiriram, mas o emprestimo gastou-se. (Apoiados.)
O ministerio que apresentava essa lei em 1896, tinha quatro annos de existencia. Não tinha duvidas sobre as condições politicas que lhe assistiam, e, portanto, sobre a estabilidade da situação. Já disse que não quero fazer injuria a ninguem, por isso mesmo torno a accentuar não ter sido seu intento aggravar quem quer que seja. O que quiz, porem, foi evitar que ao producto d'este viesse a succeder o mesmo que tinha succedido ao emprestimo de 1883. (Apoiados.) Assim, desconfiando de si mesmo e dos seus successores, estabeleceu, que o dinheiro que era pedido para similhante fim, não podesse ter outra applicação, mas só áquella para que era pedido. D'esta fórma nós julgámos ter procedido bem e dado ao paiz uma prova da nossa sinceridade. (Apoiados.)
Assim, pois, terminantemente affirmo, sem receio da mais pequena contestação de quem quer que seja, que tal idéa nasceu no seio do governo; ninguem a insinuou e portanto ninguem a impoz. Fizemol-o pelas rasões que acabo de expor á camara. (Apoiados.)
Está affirmação fica de pé para poder ser contestada por quem quer que seja.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Fuschini: - Desde que um membro do ministerio de 1894 deu a explicação que acabo de ouvir, livre e expontanea, acceito-a, - mas não desejo que o caso se repita.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente: - Amanhã ha sessão; a ordem do dia é a mesma que estava dada para hoje.
Está enterrada a sessão.
Eram seis horas e vinte e cinco minutos da tarde.
Documentos enviados para a mesa n'esta sessão
Representações
Da camara municipal do concelho da Villa do Porto, districto de Ponta Pelgada, pedindo a concessão definitiva do
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extincto convento de S. Francisco d'aquella villa, para accommodação das suas repartições.
Apresentada pelo sr. deputado Sousa e Silva e enviada a commissão de fazenda.
Dos empregados do juizo de paz do districto de Aljezur, comarca de Lagos, pedindo melhoria nas suas attribuições e salarios.
Apresentada pelo sr. deputado Mascarenhas Gaivão e enviada á commissão de legislação civil.
Dos escrivães dos juizos de direito das comarcas de Amarante, Alijo, Aveiro, Baião, Beja, Celorico da Beira, Celorico de Basto, Covilhã, Estarreja, Gollegã, Lagos, Leiria, Mafra, Marco de Canavezes, Monsão, Ovar, Penacova, Pombal, Ponte do Lima, Sabugal, S. Thiago do Cacem, Vianna do Castello, Portimão, Villa do Conde e Sattam, pedindo que por uma lei de caracter provisorio se estabeleça que a reforma do tabellionato ou notariado se execute, a medida que vaguem os logares dos actuaes escrivães de cada comarca e com reducção dos seus quadros, em harmonia com as necessidades do serviço judicial, dada que seja a separação gradual do tabellionato nesses logares vagos.
Apresentada pelo sr. deputado conde de Paçô Vieira, a pedido do sr. deputado Ferreira de Almeida, enviadas á commissão de legislação civil e auctorisada a publicação no Diario do governo.
Justificação de faltas
Deelaro que por falta de saude deixei de comparecer ás ultimas sessões da camara. = Visconde de Mangualde.
Para a secretaria.
O redactor = Barbosa Colen.
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Discurso proferido pelo sr. deputado Simões Baião, que devia ler-se a pag. 3 da sessão n.° 36 de 22 de marco de Í900
O sr. Simões Balão: - Sr. presidente, antes de dirigir ao sr. ministro da guerra as perguntas que se encerram no meu aviso previo, permitta-me v exa. que eu faça algumas rapidas considerações que se prendem com o assumpto d'aquellas perguntas e tendem a esclarecel-as.
Sr. presidente, recorda-se v. exa. de que na sessão passada foi aqui largamente discutida, como discutida largamente o tinha já sido na commissão de guerra a auctorisação, que foi convertida em lei, para o sr. ministro da guerra proceder a varias reformas nos serviços do exercito. Em virtude d'essa auctorisação, o sr. ministro publicou o decreto com força de lei de 7 de setembro e posteriormente o decreto de 17 de outubro de 1899 publicado na ordem do exercito n.° 14 que se refere á composição e fixação das sedes dos districtos de recrutamento e reserva. Alem d'estas medidas, o sr. ministro da guerra publicou outras, praticou outros actos, e entre elles extinguiu o regimento de infanteria n.° 11 que tinha a sua sede em Thomar.
Eu não vou agora perguntar ao sr. ministro da guerra, quaes os motivos que o determinaram a extinguir aquelle regimento, porque s. exa. me responderia, como já fez ao illustre deputado e meu amigo sr. Abilio Beça, que motivos de conveniencia publica determinaram no seu espirito a extincção d'aquelle regimento.
Sei bem que é esta a trincheira que serve de parapeito aos B?S. ministros, quando boas rasões não têem para justificar os seus actos.
Mas, sr. presidente, se não vou perguntar ao sr. ministro da guerra os motivos que o determinaram a extinguir o regimento de infanteria 11 pelo receio de não colher outra resposta que não seja aquella que apontei, não posso resistir á tentação de dizer a v. exa. que na occasião em que foi extincto o regimento de infanteria n.° 11, era voz constante na cidade de Thomar, que motivos estreitos e mesquinhos de politica partidaria tinham actuado exclusivamente no espirito do sr. ministro da guerra para extinguir aquelle regimento.
Diziam todos una você, sem discrepancia, que o sr. presidente do conselho, vendo baldados todos os seus esforços e do seu delegado de confiança no distrioto de Santarem para demover os habitantes de Thomar dos seus honrados e inquebrantaveis propositos de elegerem um deputado regenerador; desgostoso com este mallogro da sua actividade eleiçoeira, procurava amor com amor pagar, a desgosto com desgosto corresponder, e que assim o sr. ministro da guerra, apercebendo-se dos desejos do sr. presidente do conselho, acudira logo pressuroso a consolar-lhe o coração dolorido, inflingindo á cidade de Thomar o fundo e perduravel desgosto de lhe extinguir o seu, regimento de infanteria 11.
Era isto, sr. presidente, o que se dizia n'aquella cidade.
E se a voz do povo é a voz de Deus e a voz de Deus a voz da verdade, duvida alguma podia haver a este respeito.
E v. exa., sr. presidente, vae ficar admirado ao ouvir-me dizer que eu, pela repugnancia que me causava um tal procedimento, era um dos que punha em duvida que um homem illustrado, como é o sr. ministro da guerra, se deixasse influenciar por tal forma e fosse por motivos tão mesquinhos desgostar e tão gravemente prejudicar a cidade de Thomar.
E, sr. presidente, quanto mais reflectia commigo mesmo nas tradições da cidade de Thomar, nas suas condições hygienicas, na sua posição topographica, na sua proximidade e ligação com as estações do caminho de ferro e campo de manobras em Tancos, nas boas condições do seu quartel, na formosura dos seus campos e na grandeza dos seus monumentos, tanto mais no meu espirito se radicava aquella duvida.
Eu olhava para a cidade de Thomar e via que era uma cidade bastante associada, cortada de largas e espaçosas ruas, asseiados os seus edificios particulares como os edificios publicos, os seus largos arborisados e ajardinados, bastantemente abastecida de agua potavel, melhoramento devido á iniciativa e exforços de vereações transactas e mencionadamente do seu presidente o importante industrial d'aquella cidade sr. Torres Pinheiro.
Eu via sr. presidente, a cidade de Thomar atravessada do norte a sul por um rio que pela amenidade das suas margens constituo um dos seus maiores attractivos e a torna uma das mais apraziveis cidades do paiz, um rio que constituo uma das suas riquezas principaes porque, alem de beneficiar a agricultura, fertilisando e tornando mais productivos os seus campos marginaes, é ainda um importante motor hydraulico, pois concorre para a laboração da real fabrica de tecidos e algodão, cuja importancia v. exa. sr. presidente avaliará, sabendo que n'ella trabalham diariamente 1:500 operarios; das importantes fabricas de papel do Prado, do Porto de Cavalheiros, de Mananaya e Matrena, de uma importante fabrica de moagens e ainda de muitas outras de relativa importancia secundaria mas de capital importancia no seu conjuncto.
Eu olhava, sr. presidente, a collina verdejante que se levanta ao poente e via erguer-se no seu cume altaneiro e em toda a sua altivez o castello de Gualdim Paes, de onde em dia de primavera, ao cair da tarde, quando o sol lá ao longe começa a esconder-se no horisonte, se gosa o mais surprehendente espectaculo, que mais encantador não é facil encontrar; eu via j unto d'este monumento esse outro grandioso monumento, chamado convento de Christo, e logo a seguir, habitado por um dos seus descendentes, o solar d'esse grande estadista, que se chamou Antonio Bernardo da Costa Cabral e que morreu marquez de Thomar. Eu via tudo isto sr. presidente e perguntava a mim mesmo que cidade haveria no paiz que em melhores condições estivesse de receber um regimento dentro dos seus muros?
Pois todos esses monumentos a todas as horas ante os olhos do soldado não lhe despertariam na alma e fortaleceriam no coração o amor da patria, esse sentimento que tão vivo e arreigado deve estar sempre na alma e no coração do soldado portuguez?! (Apoiados.)
Pois esse continuo labutar agricola e fabril a todos os momentos ante os olhos do soldado não lhe robusteceria no seu espirito o amor do trabalho e não lhe seria seguro incitamento para, ao terminar o serviço da fileira, cumpridas as obrigações militares e volvido ao remanso do lar e á tranquilidade da aldeia, retomar o seu logar na cultura dos campos e no labor da industria? (Apoiados.)
Pois quê! Todas estas rasões não deveriam actuar no espirito do sr. ministro da guerra para se não deixar arrastar, por motivos estreitos e mesquinhos de politica par-
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tidoria, a extinguir o regimento de infanteria 11?! (Apoiados.)
Mais. Olhando para o quartel, eu via que contiguo o fronteiro lhe ficava um extenso largo rodeado de renques de frondosas arvores, formando um grande quadrilatero, de extensão sufficiente para a instrucção e exercicio dos soldados, o que não é indifferente, porque essa instrucção o exercicios eram fiscalisados pelos officiaes superiores de portas a dentro do quartel, (Apoiados.) eu via que o quartel de infanteria 11 ficava a pouca distancia das estações do caminho de ferro de Paialvo, do Entroncamento e da Barquinha, o que poderosamente facilitava a mobilisação do regimento ou de qualquer destacamento; eu sabia que o regimento de infanteria 11 era um regimento bem instruido, bem disciplinado, dedicado á patria, leal ao rei, fiel ás instituições, (Apoiados.) e perguntava a num mesmo, e pergunto agora a todos que me escutam, se tudo isto não era para reflectir, para considerar, para ponderar, se tudo isto não são rasões mais que sufficientes para determinarem o sr. ministro da guerra a conservar o regimento na cidade de Thomar? (Apoiados.)
Pois quê?! Se o regimento de infanteria 11 tinha todos estos predicados, se a cidade de Thomar tinha todas estas condições, como é que o sr. ministro da guerra vem assim ferir aqnelle regimento, desgostar e prejudicar uma cidade inteira, determinado apenas por motivos de politica partidaria, para satisfazer emfim a um desejo injustificado e senil do sr. presidente do conselho?
Isto é inacreditavel. (Apoiados.) Mas, sr. presidente, se a voz do povo é a voz de Deus, e a voz de Deus é a voz da verdade, é certo, e ninguem em Thomar o põe em duvida, que para praticar acto tão arbitrario, tão iniquo e tão injusto, outras rasões não actuaram no espirito do sr. ministro da guerra, o que é triste e profundamente lamentavel! (Apoiados.)
Adviriam algumas vantagens para as instituições militares com a extincção do regimento? Nenhumas, creio poder affirmal-o. Mas, se as houve, diga-as o sr. ministro da guerra, ouso pedir a s. exa. que as diga, que nos esclareça a esto respeito.
No meio do tudo isto, sr. presidente, devo confessal-o, ainda havia um homem, talvez o unico, que defendia o sr. ministro da guerra. Era um homem de idade avançada, do broncos cabellos, que tinha nascido e vivido toda a sua vida na cidade de Thomar, a quem dedicava todos os seus cuidados, todos os seus pensamentos, por quem tinha o mais encendido amor. Esse homem, porem, era um pouco supersticioso e tinha antypathia, mau agouro, com o numero 13. "Assim, dizia elle, se eu tenho antypathia, mau agouro, com o numero 13, assim tambem poderá acontecer que o sr. ministro da guerra deteste, tenha antypathia mau agouro, com o numero 11, o como o illustre ministro não desconhece que a vingança é o prazer aos deuses, não quereria agora saborear este prazer e dar satisfação aos seus sentimentos de antypathia pelo numero 11, extinguindo por esse motivo o regimento do infanteria n.° 11.º? Não, acudiram logo alguns, isso não póde ser.
Se o sr. ministro da guerra tivesse antypathia, mau agouro, com o numero 11, e por esse motivo extinguira o nosso regimento, tinhamos de acreditar que antypathia e mau agouro tinha tambem com os numeros 8, 3 e 9, pois que extinguiu os regimentos de caçadores 8, de cavallaria 9 e de cavallaria 3, e isso seria attribuir-lhe demasiada antypathia com os algarismos.
Ahi tem confirmadas as nossas affirmações, de que os motivos de vingança politica determinaram a extincção do regimento, acudiram logo todos:
"Pois não vê que o regimento do caçadores e tinha a sua sede em Abrantes, que é antigo baluarte do partido regenerador? Pois não vê Alcobaça que luctou na ultima eleição e lucta agora, para que triumpho a candidatura do deputado regenerador, o sr. Ferreira da Cunha?
"E Bragança? Julga que Bragança é o reducto inexpugnavel do sr. Eduardo José Coelho? Engana-se. Bragança é cidadolla conquistada pelo candidato regenerador sr. Abilio Beça.
E de facto, sr. presidente, aqui temos d'este lado da camara o meu bom e querido amigo sr. Avellar Machado, que Abrantes, honrando-se a si e honrando o parlamento, elegeu mais uma vez sou representante em cortes; lá está ainda Alcobaça em lucta aguerrida em favor do sr. Ferreira da Cunha, e aqui temos tambem ao nosso lado, sentado d'este lado da camara, a representar o circulo de Bragança, o nosso illustre e sympathico correligionario e meu amigo sr. Abilio Boca.
Sr. presidente, confesso a v. exa. que o meu espirito começou a vacillar e a breve trecho começou a invadir-me o convencimento de que tinham rasao os habitantes da cidade de Thomar, attnbuindo a extincção do regimento a motivos mesquinhos do politica partidaria. E em verdade, sr. presidente, um novo acto do sr. ministro da guerra não tardou a radicar no meu espirito aquella convicção. O illustre ministro, que tinha descarregado tão cruamente a sua espada reformadora, ou antes demolidora, sobre o regimento do infanteria 11, fel-a vibrar sobre o districto de recrutamento e reserva, que tinha a sua sede em Thomar e extinguiu-o tambem, inflingindo assim mais um desgosto aquella cidade, ferindo-a nos seus interesses e prejudicando sensivelmente, sem vantagem alguma para o serviço ou para as instituições militares, os differentes concelhos, de que se compunha aquelle aistricto de reserva.
E quer v. exa. ver, sr. presidente, o que fez o sr. ministro da guerra, depois de extinguir este districto de reserva? Foi encorporar os concelhos de Torres Novas, Barquinha e Gollegã, que faziam parto d'aquelle districto, no districto n.° 21, que tem a sua sede em Setubal!
Mesmo a quem for leigo no assumpto, de certo parecerá absurdo ir encorporar n'um districto de reserva, com sede em Setubal, concelhos que lhe ficam a tão grande distancia. Como se explica este procedimento? Porque é que Barquinha, Gollegã, Torres Novas e ainda a Chamusca foram cncorporados em um districto que tem a sede em Setubal e não o foram no districto de reserva n.° 20, que tem a sua sóde em Abrantes, de onde ficam a uma distancia consideravelmente inferior?!
Não será isto um prejuizo grave para os habitantes d'aquelles concelhos, que tendo de tratar negocios nos districtos de recrutamento, são assim obrigados a percorrer tão grandes distancias? Não importa isto tambem uma despeza mais avultada para o estado, que tem de pagar maiores subsidios de marcha e transportes no caminho de ferro aos recrutas que vão á inspecção? (Apoiados.)
O sr. ministro da guerra não só prejudicou os interesses e commodidades dos povos d'aquelles concelhos, como sobrecarregou o estado com um augmento de despeza desnecessario e inutil.
Nem administrou nem economisou! Antes augmentou a despeza, complicou serviços, feriu interesses, prejudicou localidades! Esta é irrecusavelmente a verdade. (Apoiados.)
O procedimento de s. exa. não tem realmente explicação plausivel. (Apoiados.)
Mas ao mesmo passo que o sr. ministro da guerra annexava a Setubal os concelhos de Torres Novas, Barquinha, Gollegã e Chamusca, que ficam a curta distancia de Abrantes, foi encorporar no districto de reserva n.° 20, que tem a sua sede em Abrantcs, os concelhos do Ferreira do Zezere, Alvaiazere, Figueiró dos Vinhos e Fedrogão Grande, que todos ficam ao norte de Thomar e portanto a uma maior distancia de Abrantes!
Mais aggravamento de dospeza, mais vexamos, mais incommodidades, mais prejuizos para os povos d'aquelles concelhos e do concelho de Thomar; e todo este augmen-
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to de despeza, todos estes inconvenientes, todos estes vexames, todos estes prejuizos teria s. exa. evitado, se conservasse, como de justiça era que conservasse, na cidade de Thomar o districto de recrutamento e reserva, tal como se achava constituido. (Apoiados.)
Sr. presidente, se tudo isto não denota o malefico proposito de ferir e prejudicar a cidade de Thomar, revela sem contestação possivel que um errado criterio inspirou ao sr. ministro da guerra a organisação dos districtos de recrutamento e reserva, tal como se encontra no quadro annexo ao decreto de 17 de outubro de 1899. (Apoiados.)
Citarei ao acaso alguns exemplos, que bastam para evidenciar os absurdos que se encontram n'aquella organisação.
V. exa., sr. presidente, conhece de certo o concelho de Condeixa e sabe que fica a pouca distancia de Coimbra, a 15 kilometros o maximo; havendo, como ha, um districto de recrutamento e reserva com sede em Coimbra, parecia natural que o concelho de Condeixa pertencesse a este districto.
Pois quer v. exa. saber onde pertence o concelho de Condeixa? Pertence a Leiria, de onde dista approximadamente 50 kilometros!
Da mesma maneira o concelho de Penella, que naturalmente devia pertencer a Coimbra, foi tambem encorporado no distrioto de reserva, que tem a sua sede em Leiria!
Porto de Moz, como todos sabem, fica a distancia de Leiria não superior a 18 kilometros; não era por isso natural que Porto de Moz pertencesse ao districto do recrutamento e reserva que tem a sua sede em Leiria? Era; mas não pertence. Porto de Moz faz parte do districto de recrutamento e reserva que tem a sua sede em Lisboa!
E o mesmo succede com Alcobaça o Pederneira, que, ficando a curta distancia de Leiria, foram encorporados no districto de reserva n.° 2, que tem a sua sede em Lisboa!
Ora, sr. presidente, de actos d'esta natureza resultam despezas com os recrutas que vão á inspecção com transportes nos caminhos de ferro e subsidios de marcha, incommodos para os interessados e maiores prejuizos pelo dispendio de mais tempo roubado ao trabalho dos campos e ás suas quotidianas occupações; e tudo isto eram motivos que deviam ter imperado no espirito do sr. ministro da guerra para não praticar estes absurdos. (Apoiados.)
Eu bem sei que o sr. ministro da guerra me me dizer que precisava organisar os districtos de maneira que todos tivessem approximadamente a mesma população.
Eu não sei bem qual a população dos districtos de recrutamento e reserva organisados pelo sr. ministro da guerra, porque não tive occasião de o verificar; quer-me parecer, porem, que a differença da população de uns para outros districtos é bastante sensivel. (Apoiados.)
Mas, dado que seja approximadamente a mesma, direi a v. exa. que, em minha opinião, a constituição dos districtos de recrutamento e reserva não póde exclusivamente obedecer a um principio, que na sua execução origina taes absurdas. (Apoiados.)
A outra ordem de rasões deve tambem attender-se, e até não é indifferente e devia ter-se considerado o numero de concelhos, de que se compõe cada districto.
Sr. presidente, é raro o districto de recrutamento e reserva que tenha mais de quinze concelhos, tendo alguns dez e outros ainda menos.
Pois sabe v. exa. qual o numero de concelhos que tem o districto de recrutamento e reserva n.° 21 com sedo em Setubal? Tem vinte.
Sabe v. exa. quantos concelhos tem o districto que tem a sua sede em Abrantes? Tem vinte e três.
Dirá o sr. ministro da guerra que lhe é indifferente o numero dos concelhos desde que os districtos de recrutamento e reserva tenham a mesma população ?
Permitta-me, porem, s. exa. que lhe diga que é absolutamente indispensavel fazer as leis e organisar os regulamentos, de forma que as suas disposições sejam harmónicas e não briguem umas com outras. Ora o regulamento de 6 de agosto de 1896, devido ao sr. Moraes Sarmento, regulamento que, no entender do sr. ministro da guerra, como já por vezes aqui tem declarado, é um trabalho primoroso, e tanto que s. exa. não o quer alterar, manda que o sorteio se faça no mez de novembro.
Como v. exa. sabe, o sorteio é feito por uma commissão presidida pelo commandante do distncto de recrutamento e reserva, e esse commandante tem de percorrer todos os concelhos do seu districto, de forma a realisar em todos o sorteio durante aquelle mez.
Pergunto, se é materialmente possivel que os commandantes dos districtos do reserva n.°s 20 e 21, com sede em Abrantes e Setubal, possam fazer o sorteio durante o mez de novembro em vinte e tres ou vinte concelhos que se estendem de Souzel a Pedrogão Grande e de Grandola a Torres Novas?
Eu creio que é inteiramente impossivel; e assim da maneira por que o sr. ministro da guerra constituiu aquelles dois districtos resulta a impossibilidade de dar cumprimento ao regulamento de 6 de agosto de 1896, tendo aquella operação de se antecipar ou prolongar alem do mez de novembro, o que é contrario á letra e espirito d'aquelle regulamento, porque vae perturbar o resultado harmónico a que se quiz attender no conjuncto das suas disposições attinentes á execução do melindroso e importante serviço do recrutamento.
Terá de alterar-se o praso para se realisar o sorteio na area d'aquelles dois districtos de recrutamento, e quem o ha de alterar?
O commandante do districto não, porque não tem para isso competencia.
O commandante da divisão tambem não, porque só tem para isso competencia no caso previsto no artigo 87.° do regulamento de 1896, que não é o caso de que se trata.
O governador civil? De forma alguma, porque só tem essa attribuição com respeito ao recenseamento e distribuição dos contingentes pelos concelhos e freguezias nos casos previstos no artigo 167.° d'aquelle regulamento.
Terá de ser alterado, porque isso é indispensavel, pelo sr. ministro da guerra, mas por um acto seu, arbitrario, porque tambem não encontro em lei, decreto ou regulamento disposição que a tal o auctorise.
São taes os absurdos que resultam da constituição dos districtos de recrutamento e reserva tal como se encontra no quadro annexo ao decreto de 17 de novembro ultimo, que realmente custa a crer que o sr. ministro da guerra os organisasse d'esta maneira.
Obedeceu s exa. ao principio de crear um numero de districtos de recrutamento o reserva igual ao numero de regimentos de infanteria? Talvez houvesse rasão para isso; mas o decreto de 7 de setembro de 1899 auctonsava o sr. ministro da guerra a subdividir os districtos de recrutamento e reserva e esta disposição de certo habilitava o sr. ministro a attenuar de alguma maneira os graves inconvenientes que resultavam de uma divisão d'esta natureza. S. exa. não o fez e devia logo tel-o feito, quando organisou os districtos de recrutamento e reserva.
S. exa. devia ver os inconvenientes que resultavam d'aqella organisação e devia logo fazer a subdivisão, e assim, obedecendo ao principio de organisar os districtos de recrutamento e reserva em numero igual ao numero dos regimentos de infanteria, teria evitado aos povos, ás localidades e ao estado os graves inconvenientes e as avultadas despezas que apontei.
S. exa. devia fazer isto e não o fez. (Apoiados.)
Bem sei que o sr. ministro me póde dizer que no decreto de 2 de novembro ultimo, artigo 9.° § unico, se declara que os districtos de recrutamento e reserva podem
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16 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
ser subdivididos ou para todos os trabalhos commettidos aos districtos ou só para os serviços de inspecção, e que por isso ainda pôde, fundado n'este preceito, obtemperar a alguns dos inconvenientes apontados.
Mas porque não fez s. exa. desde logo esta subdivisão? Pois os inconvenientes apontados não saltam aos olhos de quem conhece a topographia do paiz ? Não só impunha ao sr. ministro da guerra a necessidade e o dever de attender aos interesses dos povos que tão prejudicados foram com a organisação dos districtos?
Quer s. exa. sacrificar os povos dos concelhos de Pedrogão Grande, de Figueiró dos Vinhos, de Alvaiazore, Ferreira de Zezere e Thomar; quer sacrificar os povos de Torres Novas, da Barquinha, da Gollegã, da Chamusca e Almeirim, obrigando-os a percorrerem, para irem á inspecção, as grandes distancias que medeam entre aquellas localidades e Abrantes e Setubal?
O illustre ministro, reproduzindo no decreto de 2 de novembro ultimo, o preceito que se 16 no artigo 9.°, reconheceu a necessidade da subdivisão dou districtos; mas quiz ficar na sua mão com esta arma politica para realisar aquella subdivisão a seu arbitrio e á medida que lh'o aconselharem as conveniencias partidarias. (Apoiados.)
Pois, sr. presidente, o que o illustre ministro devia era ter evitado o escolho da politica; devia ter evitado os embaico n'osse escolho dos negocios do ministerio da guerra, que da politica deviam andar alheados, mas em que a politica ultimamente tanto se tem enleiado em detrimento da boa ordem, da disciplina o da cohesão até, que deve existir no exercito portugnez. (Apoiados.)
Se s. exa. desde logo fizesse essa subdivisão dos districtos do recrutamento e reserva para que estava auctorisação pelo decreto com força de lei do 7 de setembro de 1899, tinham desapparecido estes inconvenientes e eu mjesmo não viria aqui roubar tempo á camara a reclamar do s. exa. perante o parlamento a justiça que assiste á cidade de Thomar e aos povos dos concelhos, de que se compunha o districto do recrutamento e reserva, que tinha a sua séde n'aquella cidade.
Sr. presidente, ha ou não inconvenientes e prejuizos para ou povos dos concelhos do Torres Novas, Barquinha, Gollegã o Chamusca em percorrerem a distancia que existe entro estes concelhos e o concelho de Setubal para irem á inspecção?
Ha ou não inconvenientes e prejuizos para os povos dos concelhos de Pedrogão Grande, Figueiró dos Vinhos, Alvaiazora, Ferreira do Zezere e Thomar em percorrerem a distancia que vae até ao concelho de Ábrantes para irem á inspecção?
O sr. ministro da guerra não o póde negar. (Apoiados.)
E ou não verdade, como já disso, que d'ahi resultam augmentos de despeza com subsidios de marcha e transpor too do caminho de forro que o estado tem de abonar?
É tambem verdade. Creio que s. exa. tambem o não póde negar. (Apoiados.)
Mas, pergunto ao sr. ministro da guerra, desde que isto é verdade e desde que s. exa. está auctorisado pelo decreto de 2 de novembro de 1899 publicado na Ordem do exercito n.° 15 a subdividir os districtos de recrutamento e reserva para todos os serviços commettidos aos districtos ou só para o serviço das inspecções, está o sr. ministro disposto a fazer justiça aos povos d'aquelles concelhos, subdividindo os districtos pelo menos para o serviço das inspecções?
Está o sr. ministro resolvido a mandar proceder na cidade de Thomar ás inspecções da recrutas pelo menos dos concelhos de Thomar, Ferreira do Zezere, Alvaiazere, Figueiró dos Vinhos e Pedrogão Grande?
Está tambem resolvido, pelo que respeita ao districto de recrutamento e reserva com sede em Setubal, a mandar fazer em Torres Novas a inspecção dos recrutas d'este concelho e dos concelhos da Barquinha, Gollegã, Chamusca e Almeirim, que se acham encorporados n'aquelle districto de recrutamento e reserva?
Está ainda o sr. ministro resolvido a mandar proceder em Santarem á inspecção dos recrutas d'este concelho e dos concelhos do Cartaxo e Rio Maior, que se acham encorporados no districto de recrutamento e reserva n.° 2, que tem a sede em Lisboa?
São estas as perguntas, que dirijo ao sr. ministro da guerra, e com ellas, digo-o lealmente, vae tambem o pedido, que faço a s. exa., em nome dos interesses da cidade de Thomar e das conveniencias e interesses dos povos d'aquelles concelhos, de que ordene que as proximos inspecções de recrutas d aquella região sejam respectivamente feitas em Thomar, Torres Novas e Santarem.
São tão poderosas as rasões apontadas, que estou certissimo de que s. exa. ha de attender o meu pedido. (Apoiados.)
Reclamam-n'o as commodidades o conveniencias dos povos, aconselham-n'o as precarias circumstancias do thesouro e exige-o a justiça. (Apoiados.)
Pelo que respeita ao regimento de infanteria 11 nem sequer ouso pedir ao sr. ministro da guerra, que repare a grande injustiça e fundo desgosto, com que tão crua e pungentemente feriu a cidade de Thomar, porque antecipadamente sei, que o sr. ministro não deferiria o meu pedido.
Mas na qualidade de representante de Thomar n'esta casa do parlamento, que é a mais subida honra que tenho recebido em toda a minha vida publica, aqui deixo consignado bem alto o meu protesto bem sincero e bem sentido contra tão dolorosa violencia, não me fallecendo a esperança de que não virá longe o dia em que as minhas modestas palavras e os meus vivos e ardentes desejos possam encontrar echo nas cadeiras do poder e seja reparada a injustiça inflingida aquella laboriosa, aprazivel e formosissima cidade. (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem.