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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO DE 20 DE MAIO DE 1863

PRESIDENCIA DO SR. JOSÉ MARIA DA COSTA E SILVA

Secretarios — os srs.

José Tiberio de Roboredo Sampaio.

José Faria Pinho de Vasconcellos Soares de Albergaria.

Chamada — 61 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: Agostinho Ornellas, Alvaro Seabra, Alves Carneiro, Costa Simões, Ferreira de Mello, Antonio de Azevedo, Bernardino de Menezes, Sá Nogueira, Falcão de Mendonça, Correia Caldeira, Silva e Cunha, Barros e Sá, Guerreiro, A. J. da Rocha, A. J. Teixeira, Falcão e Povoas, Pequito, Magalhães e Aguiar, Araujo Queiroz, Montenegro, Cunha Vianna, Vieira da Motta, Conde de Thomar (Antonio), Pereira Brandão, F. F. de Mello, Albuquerque Couto, Coelho do Amaral, Dias Lima, Silveira Vianna, Rolla, Noronha e Menezes, Meirelles Guerra, Assis Pereira de Mello, Ayres de Campos, João de Deus, Gaivão, Cortez, J. M. da Cunha, Pinto de Vasconcellos, Fradesso. da Silveira, Faria Guimarães, Galvão, Bandeira de Mello, Klerk, Costa Lemos, Sousa Monteiro, Teixeira Marques, J. I. Pereira de Carvalho, Costa e Silva, Achioli de Barros, Toste, Rosa, José de Moraes, José Tiberio, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Leite de Vasconcellos, Motta Veiga, Penha Fortuna, Franco, R. de Mello Gouveia, Thomás Lobo.

Entraram durante a sessão — os srs.: A. Rodrigues de Azevedo, Fevereiro, Braamcamp, Rocha París, Villaça, Gomes Brandão, Ferreira Pontes, Azevedo Lima, Seabra Junior, Arrobas, Faria Barbosa, Falcão da Fonseca, Augusto de Faria, Barão da Trovisqueira, Garcez, B. F. Abranches, Carlos Bento, Custodio Freire, Eduardo Cabral, Eduardo Tavares, Faustino da Gama, Silva Mendes, F. M. da Rocha Peixoto, Van-Zeller, Moraes Pinto, Guilhermino de Barros, Silveira da Mota, Innocencio de Sousa, Freitas e Oliveira, Almeida Araujo, Santos e Silva, J. A. Vianna, Mártens Ferrão, João M. de Magalhães, Aragão Mascarenhas, Calça e Pina, Ribeiro da Silva, J. Pinto de Magalhães, J. T. Lobo d'Avila, Gusmão, Xavier Pinto, Maia, Mardel, Faria Pinho, Frazão, Ferraz de Albergaria, J. M. Lobo d'Avila, José M. de Magalhães,J. M. Rodrigues de Carvalho, Sá Carneiro, Batalhoz, J. R. Coelho do Amaral, Pinto Basto, Levy, Ferreira Junior, M. B. da Rocha Peixoto, Aralla e Costa, Pereira Dias, Lavado de Brito, Limpo de Lacerda, R. Venancio Rodrigues, Theotonio de Ornellas, Deslandes, Visconde dos Olivaes.

Não compareceram — os srs.: Annibal, Seixas, Crista e Almeida, Lopes Branco, Torres e Silva, Saraiva de Carvalho, Testa, Fernando de Mello, F. L. Gomes, Pinto Bessa, Gaspar Pereira, Blanc, Baima de Bastos, Judice, Albuquerque Caldeira, Sette, Correia de Oliveira, Dias Ferreira, Freire Falcão, Lemos e Napoles, Silveira e Sousa, Julio Guerra, Mathias de Carvalho, P. M. Gonçalves de Freitas, Galrão, Sebastião do Canto.

Abertura — Ao meio dia e meia hora.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

Officios

1.° Do ministerio' do reino, remettendo as relações dos cidadãos residentes em differentes concelhos dos districtos de Ponta Delgada e Horta, julgados habeis1 para serem' eleitos deputado».

A secretaria.

2.° Do ministerio das Obras" publicas, remettendo' em satisfação ao requerimento' do Sr. Antonio Roberto de Oli-

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veira Lopes Branco, uma tabella das estradas districtaes, formada segundo o processo indicado na lei de 15 de julho de 1862. A secretaria.

3.° Do mesmo ministerio, declarando que os documentos pedidos pelo sr. Pedro Maria Gonçalves de Freitas, não podem ainda ser remettidos á camara por dizerem respeito a um processo affecto ao poder judicial.

A secretaria.

4.° Do ministerio da fazenda, remettendo 160 exemplares do relatorio do tribunal de contas, acompanhados das respostas dadas pelos differentes ministerios e junta do credito publico ás observações feitas pelo mesmo tribunal, tudo em referencia ás contas do exercicio de 1861-1862.

Mandaram-se distribuir.

Representação

Dos pensionistas do monte pio militar, pedindo que se lhe mande pagar por inteiro o monte pio a que têem direito.

A commissão de guerra.

Declaração

Por incommodo de saude não tenho podido assistir ás ultimas sessões da camara. = Francisco Luiz Gomes. Inteirada.

Requerimentos

1.° Requeiro que, pelo ministerio dos negocios da fazenda, seja remettida, com a possivel brevidade, a esta camara, uma relação dos donatarios da corôa ou fazenda encartados posteriormente á lei de 21 de abril de 1866, e outra dos bens ou direitos dominicaes que, em virtude da mesma lei, tiverem sido encorporados nos proprios nacionaes por não se terem os seus possuidores aproveitado, dentro do respectivo praso, do beneficio que tal lei lhes facultou. = Eduardo Tavares, deputado por Almada.

2.° Renovo o requerimento que fiz em 29 de abril ultimo, pedindo pelo ministerio do commercio e industria uma conta de todas as despezas motivadas pelas exposições universaes, e noticia dos trabalhos feitos e apresentados ao governo pelas commissões officiaes, que foram incumbidas de estudos nas ditas exposições. = Fradesso da Silveira.

3.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, commercio e industria, seja remettido a esta camara um mappa designando por districtos, o numero de fusos e teares manuaes e mechanicos, empregados na fiação e tecedura das materias textis. = Fradesso da Silveira.

4.° Proponho que, pelo ministerio da guerra, seja remettida, com urgencia, a esta camara a conta das sommas existentes que provêm dar emissão das recrutas e das que têem tido applicação para se verificar essa remissão, ou para qualquer outro fim. = O deputado, Carlos Bento da Silva.

5.° Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja enviada, com brevidade, a esta camara uma nota da percentagem que respectivamente á contribuição predial pagaram os concelhos de Almada, Cezimbra e Seixal em 1866 e em 1867. O mesmo com relação ao concelho de Lisboa. = Eduardo Tavares, deputado por Almada.

6.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja enviada a esta camara, com a possivel brevidade, uma copia da acta da sessão da junta geral do districto de Lisboa em que se tratou definitivamente da distribuição dos contingentes da contribuição predial relativos aos concelhos de Almada, Seixal e Cezimbra para 1867. = Eduardo Tavares, deputado por Almada.

Foram remettidos ao governo.

Notas de interpellação

1.ª Desejo interpellar o ex.mo sr. ministro das obras publicas sobre o ramal da estrada de Valença a Coura, auctorisado pela mesma lei que decretou a estrada de Caminha a Valença. = O deputado por Valença, Antonio Bernardino de Menezes = Antonio Xavier Torres Silva.

2.ª Requeiro que a mesa participe ao sr. ministro das obras publicas, que desejo interpellar s. ex.ª sobre a administração dos caminhos de ferro do sul e sueste, e sobre a continuação da sua construcção. = O deputado pelo circulo eleitoral de Santarem, Antonio Cabral de Sá Nogueira.

Fizeram-se as devidas participações.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. — De todas as manifestações do direito de propriedade nenhuma é tão cara ao paiz como a liberdade de dispor de seus bens em favor dos filhos, segundo a aptidão e circumstancias especiaes de cada um.

Essa liberdade que é consequencia e complemento daquelle direito, e porventura o maior estimulo de economia e trabalho, é ao mesmo tempo necessaria garantia do poder paternal para que possa corresponder ao seu fim no interesse da moralisação da familia e consequentemente da sociedade.

D'entre todos os paizes era Portugal quasi o unico em que a quota disponivel era limitada á terça parte dos bens, mas podia ella ser largamente ampliada pela livre nomeação dos prazos de vidas, faculdade de que geralmente usavam os paes para regular convenientemente o estabelecimento de familia, impondo ao nomeado os encargos necessarios.

O codigo civil reduzindo todos os prazos a um typo unico — phateosins heriditarios puros, não permittiu ao menos que possam ser nomeados assim como a propriedade allodial, com o encargo do valor estimativo das legitimas para os coherdeiros, como o permittia a legislação escripta, e o direito consuetudinario.

O codigo dispondo assim, restringiu a já muito restricta liberdade de dispor sem a compensação do interesse publico, antes com offensa d'este no enfraquecimento do podér paternal na maior desmembração e excessivo retalhamento da propriedade a que não obsta a indivisibilidade dos» prazos, cada um dos quaes comprehende geralmente pequenos tractos de terra, e todos apenas n'uma parte da propriedade do paiz.

Destruiu um poderoso incentivo á sobriedade e trabalho geral o natural desejo e legitima ambição de transmittir, quando não acrescentado, ao menos não diminuido, o patrimonio herdado, fructo e memoria de economias e sacrificios, e fôro das mais doces affeições.

E permittindo a licitação expor os paes á dolorosa certeza de que a sua morte ha de ser o signal da guerra entre os filhos que educaram nos sentimentos de reciproco affecto, e a estes e á sociedade aos graves inconvenientes das discordias de familia;

Por estas considerações tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E permittido ao que tiver herdeiros necessarios dispor em favor de um ou mais, por doação ou testamento de todos ou parte dos seus bens immobiliarios, salvo para os coherdeiros o direito a serem inteirados a dinheiro no caso de inofficiosidade.

Art. 2.° O governo fará no codigo civil as alterações necessarias, em conformidade com a disposição do artigo antecedente, ouvindo a commissão de jurisconsultos creada por carta de lei de 1 de julho de 1867.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara, 19 de maio de 1868. = O deputado pelo circulo de Lousada, Henrique Cabral Noronha Menezes.

Renovo a Iniciativa do projecto de lei n.° 126 — A, do anno passado, que esta publicado no Diario de Lisboa n.° 126, do mesmo anno, o qual concede á camara municipal de Penafiel o edificio em ruinas do extincto recolhimento de Nossa Senhora da Conceição, e da pequena cerca. = O deputado por Penafiel, João Alves de Almeida Araujo.

Projecto do lei

Senhores. — Tendo tido a honra de apresentar n'esta camara uma representação de proprietarios e lavradores do circulo n.° 21, pedindo se alterem as disposições do codigo civil relativas á liberdade de testar, estando eu em pleno accordo com a doutrina desenvolvida n'aquella representação, extractarei para aqui as principaes considerações que n'ella se contém, concluindo por um projecto de lei no sentido das alterações pedidas.

Pela jurisprudencia anterior ao codigo civil, o testador com herdeiros necessarios, alem de poder dispor livremente da terça dos seus bens partiveis, podia designar os bens de que se havia de compor essa terça, uma vez que não designasse as melhores propriedades do casal. (Correia Telles — Dig. port. 2. art. 1:116.° e 3 art. 1:686.°; Rocha — Dir. civil —nota ao § 487.°)

Pela mesma jurisprudencia era sustentavel o costume de algumas terras, principalmente entre lavradores, nomearem os paes a um dos filhos toda a casa com obrigação de compor os outros a dinheiro.

Finalmente pelas leis anteriores ao codigo civil tinham os paes o direito de (salva a conferencia do valor ou preço dos prazos de nomeação comprados, e a do valor das bemfeitorias nos bemfeitorisados) nomearem esses prazos n'um dos filhos, impondo lhes ou deixando de lhes impor encargos em beneficio dos outros.

Sobro a liberdade do testador consignar a sua terça em certos bens, bem como sobre a de poder nomear n'um dos filhos toda a sua casa com obrigação d'esse filho dar aos outros as legitimas em dinheiro; nada diz explicitamente o codigo civil, antes nos artigos 1:784.°, 1:790.°, 2:126.° e seguintes parece repellir essas liberdades.

É verdade que essa repulsão não harmonisa com o respeito que o artigo 2:107.° mostra pelas doações, não as sujeitando á conferencia em substancias, mas harmonisa com tolher aos paes o direito de designarem o successor dos seus prazos de nomeação, embora com a obrigação de partir a estimação d'elles, e este direito é-lhes claramente colhido pelos artigos 1:662.° e 1:694.°

E contra esses cerceamentos da liberdade de testar que os povos das provincias do norte do paiz reclamam, como já o fizeram os do circulo n.° 21, e brevemente o farão muitos outros.

Que não seja tão ampla a liberdade de testar, que um pae possa deixar tudo a um filho, ficando os outros na miseria, justifica-se. É a lei lembrando ao pae os seus deveres, e pondo uma barreira ao esquecimento d'elles; mas que elle não possa designar d'entre os seus filhos aquelle que julga mais capaz de conservar e augmentar a sua propriedade, e deixar-lhe a elle toda a sua casa ou certos bens á.'ella, com obrigação de dar aos outros a respectiva parte do valor do excesso da terça, é o que de modo algum se póde justificar.

Que lucra o estado em tolher assim os beneficos effeitos da previdencia e auctoridade paterna? Que lucra em extirpar do coração dos paes o desejo de conservarem o seu patrimonio unido n'um dos membros da sua familia? Que lucra em que a propriedade haja, e cada fallecimento, de tornar-se um campo de batalha entre os filhos? Em vez de lucrar, perde. A nossa propriedade, geralmente pequena, será subdividida ainda mais; e esta divisão trará comsigo todos os inconvenientes de diminuição de producção e falta de incentivo ao melhoramento. O pae, não podendo designar d'entre os seus filhos aquelle a quem ha de passar a sua propriedade, ama-la-ha menos, e por isso não empregará, para a melhorar, os mesmos esforços que empregaria se podesse esperar que ella continuasse n'aquelle de seus filhos mais capaz de a conservar e augmentar.

Os proprios filhos, incertos sobre qual d'elles virá a ficar com a propriedade paterna, não cuidarão d'ella com o mesmo amor e solicitude, nem respeitarão tanto a auctoridade do pae. Assim os elementos de ordem, trabalho, moralidade, economia, que resultariam d'aquella liberdade de testar, desapparecerão logo.

Por estas rasões, e tambem pela desharmonia que se observa no codigo civil entre o respeito das doações em vida e as restricções da liberdade de testar, parece-me que o codigo deve ser alterado no sentido exposto, permittindo-se a liberdade de o testador tirar na sua terça quaesquer bens da sua casa, e mesmo a de deixar todos ou certos bens seus a um dos herdeiros necessarios, com obrigação d'esse herdeiro dar aos outros a respectiva parte do valor do excesso da terça.

Com estas alterações prende uma outra, que eu me atrevo a propor por ser baseada n'um costume muito louvavel existente na provincia do Minho. Como a nomeação da casa feita pelo pae n'um dos filhos traz como consequencia inevitavel a obrigação de dar as tornas em dinheiro aos outros irmãos, o filho nomeado busca de ordinario para casar uma mulher, cujo dote seja constituido em dinheiro, para com elle desonerar a sua casa e ficar habilitado a pagar as legitimas aos outros coherdeiros.

Mas o artigo 1:140.° do codigo civil, tendo sem duvida em vista segurar o dote da mulher quando constituido em dinheiro, e talvez evitar tambem um dote em dinheiro totalmente phantastico, por o dinheiro nem ser do marido nem da mulher, mas ser de um terceiro, que o emprestou para fazer officio de corpo presente no acto da escriptura, prescreve que esse dinheiro do dote fosse convertido dentro de tres mezes em bens immoveis, inscripções, acções de companhias, ou dado a juros com hypotheca; deixando assim em duvida se elle póde ser empregado em resgatar os bens do marido, onerados com os encargos de tornas ou legitimas. Tirando-se esta duvida no sentido de permittir este emprego do dote da mulher, nenhum dos fins que o codigo teve em vista se contraria, nada perde a mulher nem a sociedade.

Esta modificação vem completar as primeiras, porque é evidente que o herdeiro a quem a casa foi nomeada com encargos de conferencia, tornas ou legitimas nada lucraria se não lhe fosse deixado aquelle meio simples, commodo e trivialmente usado no modo de ser da propriedade nas provincia do norte, e principalmente na provincia do Minho.

Senhores, um codigo civil nunca póde ser a transcripção fiel dos puros principios da philosophia do direito, mas uma justa combinação d'esses principios com os usos, costumes, habitos e necessidades dos povos, cujas relações civis é destinado a regular.

Sobre o modo de ser da propriedade, um bom codigo civil deve alem d'isso respeitar as condições naturaes do solo, que são as que pelas leis da natureza das cousas determinam a divisibilidade da propriedade, a sua producção e o seu systema de cultura. Ora, debaixo d'este ponto de vista, é bem sabido que as condições da propriedade em o norte do paiz são bem differentes daquellas que se encontram na constituição da propriedade na região do centro e na do sul; e para isto ser uma verdade incontestavel basta ver que ao systema das herdades agricolas do sul se contrapõe ao norte o systema dos emprazamentos, verdadeira colonisação do paiz ao qual se attribue em grande parte a propriedade agricola d'aquella região e a densidade da sua população.

Abraçando pois, em vista das exigencias da jurisprudencia theorica, a reforma da emphyteuse, tal como se acha feita no codigo civil, não apaguemos as vantagens que aquelle systema produzia tão notoriamente, e antes forcejemos por achar uma combinação que concilie as vantagens de um e outro systema.

Por todas estas rasões, e por outras que a vossa esclarecida intelligencia ha de certamente suggerir, tenho a honra de vos propor o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° O § 1.° do artigo 1:662.° do codigo civil fica alterado pela fórma seguinte: «A repartição do valor entre os herdeiros, far-se-ha por estimação, encabeçando-se o prazo n'aquelle a quem o mesmo prazo houver sido nomeado pelo foreiro anterior; na falta de nomeação, encabe ar-se-ha o prazo em um dos herdeiros conforme convierem entre si».

Art. 2.° O artigo 1:784.° do codigo civil fica alterado pela fórma seguinte: «Legitima é o quantitativo de herança, de que o testador não póde dispor, por ser applicado por lei aos herdeiros em linha recta, ascendente ou descendente. Esse quantitativo é de dois terços dos bens do testador, salva a disposição do artigo 1:787.°

«§ unico. O testador póde designar assim para a terça de que lhe é livre dispor, como para as legitimas, os bens em que deseje que elles sejam constituidos; e essa designação será respeitada sem prejuizo de direito que a lei dá aos herdeiros necessarios sobre dois terços do valor da herança.»

Art. 3.° O artigo 1:140.° do codigo civil fica alterado pela fórma seguinte: «Se no dote, quer este seja constituido pela mulher, quer pelo marido, quer por outrem, for incluido dinheiro, e o marido não tiver bens de raiz em que segure esse dinheiro, será este convertido, dentro de tres mezes, contados desde o casamento, em bens immoveis, inscripções de assentamento, ou acções de companhias, ou dado a juros por escriptura publica com hypotheca. O dote em dinheiro, que não for convertido na fórma sobredita, ter-se-ha como não existente, e entrará na communhão.»

Art. 4.° Ficam por esta fórma alterados e substituidos os artigos 1:784.° e § unico, 1:140.°, e o § 1.° do artigo 1:662.° do codigo civil, e revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões, 19 de maio de 1868. =. á. Ribeiro da Costa e Almeida, deputado pelo Porto.

Propostas de alteração ao codigo civil

Artigo 174.°:

Este artigo estabelece a obrigação de os irmãos alimen-

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tarem as irmãs por quaesquer bens que possuam, e por qualquer tempo que as alimentadas careçam dos alimentos. Esta era já a disposição da legislação anterior, mas era má.

Que o irmão seja obrigado a sustentar o irmão incapaz de se sustentar pelo seu trabalho e emquanto elle for incapaz, justifica-se de certo modo.

A sociedade, não devendo deixar morrer á fome aquelle incapaz, e não querendo carregar com a alimentação d'elle, tinha necessidade de o lançar a cargo de alguem; e pela maior conjuncção de sangue lança-o a cargo do irmão.

Agora que o irmão seja obrigado a alimentar o irmão capaz de se sustentar pelo seu trabalho, é obrigação que se não justifica. É por um lado crear e proteger a vadiagem do alimentado, e por outro castigar a economia, a habilidade ou a fortuna do alimentante. O alimentado n'essas circumstancias não trata de se apegar ao trabalho; já porque não precisa, e ninguem trabalha sem necessidade, e já porque, apegando-se ao trabalho e tirando d’elle meios de subsistencia, cessam os alimentos. Debalde lhe dirá o alimentante que trabalhe; debalde lhe offerecêra occupação; elle achará sempre mil desculpas plausiveis e mil meios para se furtar ao trabalho. Agora dirá que não esta habilitado para tal trabalho e que não póde habilitar-se; agora que esse trabalho é indigno do seu nascimento e educação; agora que não póde com elle.

Por isso parece-me que o artigo 174.° deve ser alterado pela fórma seguinte: «Na falta de paes e outros ascendentes, podem os filhos legitimos ou legitimados, emquanto menores, ou emquanto incapazes physica ou moralmente de se sustentarem pelo seu trabalho, pedir alimentos... etc...»

Artigo 1:167.°:

Este artigo, pelo modo como esta redigido, deixa em duvida se o impedimento de um esposado dar a outro mais do que a sua terça tem logar sempre que um dos esposados tenha ascendentes, ou só quando o esposado doador os tenha. De certo foi este o ultimo sentido o que se quiz exprimir; mas exprimiu-se ambiguamente. A ambiguidade desappareceria substituindo-se as palavras do artigo: «marido ou a mulher tiverem» pelas palavras: «o esposado doador tiver».

Artigos 315.° e 316.°:

Estes artigos fazem differença entre desasisados mansos com filhos menores, desasisados mansos sem filhos menores, e desasisados com furor. A interdicção dos primeiros só póde ser requerida na falta de parente successivel e de conjuge. A dos segundos e terceiros póde-o ser pelo ministerio publico, assim n'aquelle caso como no de os parentes e conjuge a não requerem. Ora, suppondo a existencia de um desasisado sem filhos menores e sem furor, mas com parentes successiveis ao conjugo, os quaes não querem requerer a interdicção; suppondo mais que a demencia é notoria, e que um individuo intenta propor uma acção em juizo contra o mesmo demente, acontecerá que esse individuo não póde requerer a interdicção nem promover que o ministerio publico a requeira, e comtudo, se intentar a acção, ve-la-ha annullada, até a sentença que porventura obtiver, por effeito da disposição do artigo 335.°, em virtude da notoriedade da demencia.

Este gravo inconveniente póde porém ser evitado, ou seja acrescentando ao artigo 315.° as palavras seguintes: «.tambem o poderá ser, se a clemencia for notoria, por quem tenha a accionar o demente»; ou seja alterando o artigo 316.° n.° 2.°, substituindo as primeiras palavras d'elle pelas seguintes: «No caso da demencia ser notoria, ou acompanhada de furor, ou tendo o desasisado filhos menores... etc...»

Sala das sessões, 19 de maio de 1868. = Antonio Ribeiro da Costa e Almeida, deputado pelo Porto.

Foram admittidas, e enviadas ás respectivas commissões.

O sr. Sá Nogueira: — Mando para a mesa um projecto de lei para regular as disposições da carta de lei de 23 de novembro de 1859 e decreto de 30 de setembro de 1852, em relação a conservarem o logar de deputado os deputados eleitos pelo ultramar, quando se dá o caso de dissolução. Não faço preceder o projecto de relatorio, porque julgo não ser necessario, por isso que ha de ir a uma commissão, que por certo achará justos motivos para o approvar.

A continuação dos deputados do ultramar, n'esta camara, depois de uma dissolução, é contra os principios e contra a rasão, pela qual se deu ao podér moderador essa faculdade. O poder moderador dissolve a camara quando julga necessario ouvir a opinião dos povos, sobre a conveniencia de certas e determinadas medidas; isto é, dissolvo a camara quando suppõe que essa camara não esta de accordo com a opinião publica; por consequencia é necessario consultar todos os circulos da monarchia, para se saber se o paiz approva ou não a politica e a marcha parlamentar dos seus deputados.

A lei faz uma excepção a respeito do ultramar, que se não póde justificar, sendo a unica rasão que se dava até agora, a de que as grandes distancias das provincias ultramarinas faziam esperar muito tempo pelos srs. deputados do ultramar. As distancias são as mesmas actualmente, mas o tempo que se gasta em as percorrer é muito menor, por que temos a navegação a vapor; por consequencia não ha motivo para conservar a excepção da lei.

Este projecto traz a grande vantagem de dispensar esta camara de grandes discussões a respeito da validade ou não validade das eleições do ultramar, e a respeito do direito ou não direito que têem alguns srs. deputados de tomarem assento n'esta camara. O que se tem passado n'esta camara, tanto na sessão anterior como n'esta, e ainda hontem, dispensa-me de fazer largos commentarios a este respeito.

Approvaram-se aqui eleições de deputados para a sessão legislativa do anno de 1869; houve grande duvida ou uma. quasi prova de que até a que se dava com o recenseamento não o era, nem existiam taes recenseamentos, e ainda acon. teceu mais; aconteceu dizer-se ou declarar-se que tinha direito a conservar a sua cadeira n'esta casa um sr. deputado pelo ultramar, que depois de eleito tinha aceitado um emprego lucrativo do governo.

Tudo isto se tem passado, e tudo isto dá logar a uma nova lei.

Como provavelmente esta camara não deixa de tomar em consideração uma proposta de um sr. deputado para que seja reduzido o numero de representantes da nação, já porque não ha necessidade de um tão grande numero, já porque as circumstancias do paiz exigem que façamos economias em todos os ramos de serviço publico a que ellas possam ser levadas, devendo começar o exemplo por nós; como esta questão, repito, ha de ser considerada, introduzi no projecto uma disposição igual ou similhante á que já vinha no decreto de 13 de setembro de 1852 e na lei de 23 de novembro de 1859, que dava ao governo o direito ou faculdade de marcar o numero de circulos eleitoraes do ultramar, ouvido previamente o conselho ultramarino; mas como o governo já fez uso d'esta auctorisação, é natural que se considere como tendo caducado, e era necessario renova-la.

O projecto é o seguinte (leu).

O sr. Pedro Franco: — Pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento (leu).

Este requerimento acha-se tambem assignado pelo meu collega o ex.mo sr. dr. Villaça, digno representante do concelho dos Olivaes.

Sr. presidente, ha mais de dez annos que nos orçamentos do estado tem figurado como receita a verba de réis 20:304$000 que se pretende exigir dos dois municipios de Belem e Olivaes, a titulo das vantagens especiaes que o estado presta a estes dois concelhos.

Da exigencia d'essa enorme cifra, cabe á camara de Belem 12:640$592 réis, e á dos Olivaes 7:663$408 réis.

Requeiro a urgencia d'estes documentos, porque preciso mostrar á camara que esta cifra não é verdadeira. Hei de demonstra-lo, ou quando se tratar do orçamento geral do estado, ou quando apresentar aqui um projecto de lei determinando a cifra real a que ficam obrigados os concelhos de Belem e Olivaes pela compensação que o estado presta a estes municipios.

Já em 1863, quando aqui se discutia o orçamento do estado, o sr. deputado José de Moraes pediu uma nota d'onde constasse o que deviam ao thesouro as camaras municipaes de Belem e Olivaes, e o ministro respectivo, satisfazendo a essa exigencia, declarou n'outra sessão que as duas camaras deviam já ao thesouro cento e sessenta e tantos contos.

Tão fabulosa divida tem ha muito impressionado os cidadãos do Belem o Olivaes, pensando que as camaras ou os seus constituintes se tornaram ou estão responsaveis por similhante phenomeno!

Este meteoro de cifras não passa de um errado calculo por parte do thesouro, e tanto assim é que n'um projecto de lei aqui apresentado pelo então ministro do reino, o sr. conselheiro Anselmo José Braamcamp, em 11 de junho de 1862, para ser relevada a camara municipal de Belem da responsabilidade que contrahiu pela falta de pagamento das alludidas prestações, disse o respectivo ministro que =a camara de Belem não havia pago ao thesouro a compensação a que se refere o artigo 5.° da lei de 5 de agosto de 1854, em consequencia de se achar esta disposição da lei dependente de ulteriores medidas que se não tinham ainda tomado =.

Se o calculo que em conformidade do artigo 5.° da lei de 5 de agosto de 1854 se não acha ainda liquidado, como confessou aqui um ministro da corôa, como é pois que o estado se julga credor aos dois municipios de uma cifra determinada, enorme e annual de 20:304$000 réis?

Com os documentos que aqui peço, hei de mostrar até á evidencia que a quantia annual a que a camara de Belem é obrigada pelas vantagens especiaes que o estado lhe presta é de 244$429 réis, e não de 12:640$592 réis.

O erro do calculo provém de se ter tomado por base a media dos impostos das sete casas, arrematados e não administrados.

A base do imposto arrematado é uma cifra fabulosa e especulativa. É uma cifra fabulosa, porque os arrematantes julgando que arrematavam os impostos por grosso e miudo, elevaram a cifra a 42:600$000 réis, estabeleceram casas fiscaes como as do antigo termo das sete casas, de ominosa recordação, e quando lhe foram mandadas fechar superiormente, reconheceram o erro, requereram indemnisação, por ultimo aceitaram letras, e foram compellidos ao pagamento até á ultima instancia, cujas quantias não tinham ainda ha pouco entrado nos cofres do estado. E póde servir de base uma arrematação d'esta ordem?

De certo que não, porque é em desabono do proprio thesouro, porque no anno seguinte, pela sua propria administração, e no espaço de quinze mezes, apenas póde obter 13:793$217 réis, gastando ainda proximamente 10 por cento na sua arrecadação.

E d'este estrondoso anachronismo que nasce toda a questão que ha muito se ventila n'este parlamento e na imprensa periodica, chegando-se ao excesso de se dizer n'um relatorio do tribunal de contas que ha desleixo ou má administração na camara municipal de Belem, e que é preciso faze-la entrar n'um estado regular!

Desleixo! sr. presidente, desleixo por não entregar ao thesouro o que incompetentemente este lhe exige!...

Eu hei de, em tempo competente, endossar esta delicada phrase aquelle venerando tribunal de contas.

O ultimo documento que eu exijo é um documento importantissimo.

O thesouro exige incompetentemente da camara municipal de Belem 12:640$592 réis annuaes, e a camara exige do thesouro a quota parte que á data da desannexação dos dois concelhos de Belem e Olivaes se achava constituida para com a camara de Lisboa na importancia que se achava liquidada de mil quatrocentos oitenta e tantos contos, proveniente de saldo de consignações, juros e outros titulos.

Quando vierem os documentos e se tratar mais largamente d'esta questão, eu demonstrarei a v. ex.ª e á camara que as municipalidades de Belem e Olivaes são credoras e não devedoras.

Foi introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento o sr. Adriano Antonio Rodrigues de Azevedo.

O sr. A. J. da Rocha: — Mando para a mesa um requerimento para ser remettido á secretaria dos negocios do reino; e, para me fazer comprehender melhor, peço licença para fazer algumas observações.

O sr. Antonio Theodoro Ferreira Taborda tentou crear um asylo da infancia desvalida e juntamente com a commissão que se constituiu para esse fim parece-me que adquiriu uma casa, e alem d'isto fez compra de varios objectos para o asylo.

O mesmo magistrado conseguiu que as camaras do districto concorressem com donativos para o asylo e a quantia orça por 8000000 réis pouco mais ou menos, e enviou para a secretaria do reino os estatutos, a fim de serem approvados; mas são passados mais de quatro ou cinco annos e os estatutos ainda não foram approvados e não se sabe qual o destino que se deu tanto aos objectos comprados para o asylo, como ás quantias com que concorreram as camaras municipaes. Eu agora o que pretendo com o meu pedido é que o sr. ministro do reino approve os estatutos, e quando os não approve, que dê as suas ordens para se conhecer o destino que se deu tanto aos objectos comprados, como ás quantias com que concorreram as camaras municipaes.

Justo era que o asylo fosse creado, porque se ha alguma terra do reino que precise d'elle é decididamente Aveiro; mas emfim, eu por agora limito-me ao requerimento que vou ler, e peço a v. ex.ª que o remetta á secretaria do reino. Com este meu requerimento nem me queixo do sr. ministro do reino, nem accuso ninguem; o meu fim é que se tome conhecimento dos estatutos, que se approvem ou não approvem, que se saiba onde esta o dinheiro, que se veja onde estão os objectos comprados, e no caso de que não seja possivel levar a effeito o asylo, então se vendam esses objectos, e reunida a sua importancia com o dinheiro dos donativos, se empregue para ir rendendo, a fim de que depois de alguns annos possamos conseguir esse melhoramento, que é de grande precisão naquella cidade. O requerimento é o seguinte (leu).

Peço a v. ex.ª a bondade do o remetter á secretaria respectiva, e de me dar conhecimento quando de lá vier alguma resposta a esse respeito.

O sr. Carlos Bento: — Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta, e pedia a v. ex.ª que a fizesse remetter á digna commissão do ultramar. A minha proposta tem por fim a reducção dos subsidios concedidos ás provincias ultramarinas no que for restrictamente indispensavel.

Eu não posso ser accusado de suppor que não devem ser comprehendidas nas economias as provincias ultramarinas na parte em que não precisem indispensavelmente de subsidio, quando a camara é testemunha de que todos os dias se estão a propor em larga escala economias sobre o serviço da metropole. Eu approvo a lei de propor tambem economias a respeito do serviço da metropole; mas entendo quanto ao ultramar que não devemos continuar, a seguir absolutamente o systema dos subsidios, systema que, sendo um onus para o thesouro em muitos casos, não significa senão irregularidades do serviço.

Se alguma prova me fosse necessario apresentar em justificação do que digo, bastava notar que escutei com toda a attenção pessoas competentes, não só pela sua illustração como pela sua posição official, as quaes do alto da tribuna d'esta casa declararam que nas provincias do ultramar se cobra mais de uma vez o imposto directo sem que conste que elle esta effectivamente recebido (O sr. José de Moraes: — Ouçam, ouçam.), e tambem ouvi ler um documento importante sobre abusos intoleraveis praticados por auctoridades subalternas n'essas provincias. E então pergunto: em vez de tomarmos providencias directas para remover abusos d'esta ordem, havemos de limitar-nos a subsidiar? Não ha de servir o depoimento de pessoas tão competentes, não nos deve isto acautelar, precisâmos mais alguma declaração?

Pois não disse aqui o sr. ministro da marinha, em uma das sessões antecedentes, que elle quando governador (governador intelligente e muito competente), em uma d'essas provincias se achou em circumstancias difficeis, se contentava que lhe votassem 25:000$000 réis para despezas extraordinarias? E sabe a camara quanto se votou n'essa occasião para essas despezas extraordinarias, que podiam ser custeadas com 25:000$000 réis, segundo a opinião de um funccionario que tinha obrigação de informar o governo? Votou-se uma somma igual a 400:000$000 réis, e realisaram-se 200:000$000 réis; e votou aquella quantia não obstante o individuo que tinha obrigação de fazer face aos obstaculos e difficuldades em que se encontrava aquella provincia, julgou serem sufficientes 25:000$000 réis!

Digo ainda mais. Eu arrastado pelo meu dever de ministro vim propor a esta camara um subsidio, que me era reclamado instantemente por todos os deputados que podiam ter interesse mais immediato n'aquella provincia. Vi que nas circumstancias extraordinarias que ella se achava, eu não devia, não podia, nem estava auctorisado a resistir a essas opiniões manifestadas no parlamento. Pedi pois um

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subsidio de 50:000$000 réis. Quer V. ex.ª saber o que me aconteceu? Foi que interrogando o respectivo governador geral' sobre o destino e applicação do subsidio, respondeu-me = pediu-lho alguma vez? =

Eu não desconheço a necessidade que nós temos de occorrer ás difficuldades reaes em que se encontrem as provincias ultramarinas, e por isso não proponho a suppressão ou abolição completa e immediata dos subsidios para o ultramar. Mas entendo que esta camara não deve illudir-se em suppor sufficiente a sua generosidade, baseada na elasticidade dos soccorros da metropole para o ultramar. Digo mais, este systema dos subsidios para o ultramar, parece-se um pouco com a vida seguida no continente, de esperar tudo dos subsidios provenientes dos emprestimos contrahidos no estrangeiro. As duas cousas parecem muito. Algumas provincias do ultramar vivem quasi exclusivamente do subsidio da metropole, e nós, os da metropole, queremos viver tambem quasi exclusivamente dos subsidios dos emprestimos contrahidos no estrangeiro (apoiados). Eu não quero a continuação nem de uma nem de outra cousa (apoiados).

Todos estes factos, todas as revelações que se fizeram n'esta camara mostram que não é possivel que algumas provincias do ultramar contem unicamente com os subsidios da metropole; tanto mais isto é assim quanto é certo que resulta d'ahi auctorisar o desleixo, a nenhuma attenção d'essas provincias para as suas proprias fontes de receita; porque contam com um meio facil e commodo, como é o de receberem subsidios da metropole. E isto é tanto assim, que quando se trata n'uma provincia qualquer, por exemplo na do Angola, de estabelecer o registo dos escravos para a indemnisação aos proprietarios, apparece logo uma declaração ampla, e em larga escala da existencia d'essa classe (que creio felizmente ha de acabar n'um praso que esta proximo); mas quando se trata de estabelecer o imposto que esses proprietarios devem pagar segundo o numero de escravos, então, como se trata de pagar imposto, as declarações não apparecem. Para a indemnisação, amplas declarações; para o pagamento do imposto, nenhumas, ou em numero muito insignificante. Isto mostra que não ha effectivamente aquella fiscalisação que devia haver para a cobrança dos impostos. Mas espera a camara que haja estimulo para que essa fiscalisação exista? Como póde haver estimulo para querella exista emquanto votarmos subsidios extraordinarios da metropole?

Eu podia citar alguns ramos de industrias importantes que não dão um real de receita para o thesouro. Por exemplo em Mossamedes produzem-se 1:000 pipas de aguardente. Quer a camara saber quanto produz de imposto este importante ramo de producção industrial? Não produz um real de imposto. Pois o producto d'esta industria não será uma importante materia collectavel? Creio que e, mas ali não é. Isto não póde ser. Emquanto nós quizermos ir n'este caminho as difficuldades augmentarão, e Deus sabe as que já temos para resolver a questão do nosso deficit (apoiados).

É preciso que a camara reflicta sobre isto, porque em presença do que vou expor, verá que muitas vezes se apresentam propostas que so inculcam como reducções, e que não são senão augmentos. Por exemplo, alguns srs. deputados, com as melhores intenções possiveis, propõem, como meio de receita para uma das nossas possessões ultramarinas, a occupação do Zaire. A mesma cousa se disse quando se fez a expedição para occupar o Ambriz, o que aconteceu? A despeza augmentou consideravelmente. Logo não aceitemos de leve a idéa de fazer uma nova expedição, para se augmentar a receita. O que teremos desde logo, é um augmento de despeza, e o augmento de receita é muito eventual. Parece-me que é permittido uma referencia á historia a similhante respeito; o que ella nos diz a respeito da occupação do Ambriz, é que não se realisou uma só das nossas esperanças, que todas foram protestadas pela realidade.

Não insisto mais n'estas considerações, o meu fim foi mostrar á camara que ha muitos ramos do serviço publico sobre os quaes a iniciativa indispensavel da camara, para reduzir as despezas, tem um campo amplo para se exercer.

O sr. Camara Leme: — Pedi a palavra para mandar para a mesa os seguintes requerimentos (leu).

Aproveito a occasião para mandar para a mesa o requerimento das pensionistas do monte pio militar, pedindo o integral pagamento do seu monte pio, como têem inquestionavel direito. Como se acha presente o sr. ministro da guerra, pedia a sua especial attenção para o requerimento, que espero será deferido, como merece.

Mando igualmente o requerimento do major Nuno Maria de Sousa Alvares, que espero terá o destino conveniente.

O sr. Guerreiro: — Mando para a mesa a seguinte proposta (leu).

Este projecto de lei diz respeito aos picadores do exercito, tornahdo-lhes extensivas ás disposições da lei que concede o habito de Aviz aos capitães combatentes e não combatentes, quando têem vinte annos de serviço e boas informações. E uma disposição justa, porque os picadores prestam grande serviço nos corpos a que pertencem, não só porque concorrem para a disciplina, mas tambem para a instrucção.

Aproveito a occasião para pedir a v. ex.ª que tenha a bondade de me informar se o requerimento que fiz na sessão de 6 do corrente, e do qual pedi a urgencia, para que pelo ministerio da guerra fossem remettidos diversos documentos de que preciso, já teve ou não solução; e no caso de não ter sido já satisfeito, pedia a v. ex.ª que tivesse a bondade de mandar renovar o pedido.

O sr. Teixeira Marques: — Mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Abstenho-me de fazer considerações que só serão bem cabidas na occasião competente.

Faço este requerimento, porque não me foi possivel entender as contas por se acharem tão conglobadas como as verbas do respectivo orçamento, que na realidade necessitam ser examinadas minuciosamente.

O sr. Faria Guimarães: — Mando para a mesa uma certidão e varios documentos relativos á eleição de Sabrosa, e peço que sejam remettidos á commissão de verificação 'de poderes para serem juntos ao processo que lá se acha.

O sr. Fradesso da Silveira: — Mando para a mesa um projecto de lei. Não faço consideração alguma sobre elle, e limito-me a dizer que a economia que póde resultar da execução d'este projecto é pouco mais ou menos de 30:000$000 réis.

O sr. Klerck: — Pedi a palavra para declarar á mesa que não compareci á sessão de hontem por incommodo de saude.

Aproveito a occasião para perguntar se os documentos que pedi relativamente a gratificações e abonos não auctorisados por lei, já vieram da secretaria dos negocios do ultramar.

O sr. Secretario: — Tenho a declarar ao illustre deputado e a todos os mais senhores, que logo que venham quaesquer esclarecimentos pedidos pelos srs. deputados, immediatamente serão prevenidos.

O sr. Dias Lima: — Tendo os moradores das freguezias de Prado do concelho de Villa Verde, e S. Paio de Moralim, concelho de Braga, representado ao ministerio das obras publicas contra a construcção de um açude que um proprietario construiu no rio Cavado, acontece que por portaria de 8 do corrente mez, foi concedida licença áquelle proprietario para conservar o açude, marcando-se-lhe a altura de 0m,70, mas como se não possa conhecer se a altura referida é acima da que tinha o, açude antigo, e se mesmo assim continua a prejudicar os povos; por isso pedi informações aos habitantes das localidades para avaliar se o publico continua a soffrer prejuizo, ou mesmo os proprietarios das margens d'aquelle rio, quando o "açude fique nas condições indicadas na portaria citada, e porque esta se refere a um processo, mando para a mesa um requerimento para que se enviem a esta camara alguns esclarecimentos existentes no mesmo processo (leu).

O sr. Fortunato de Mello: — Pedi a v. ex.ª a palavra para mandar para a mesa uma nota, que tem por fim renovar a iniciativa do projecto de lei, que apresentei na sessão de 26 de junho do anno passado, e que vou ler.

Renovo a iniciativa do projecto de lei, que tive a honra de apresentar n'esta casa, na sessão de 26 de junho do 1867, publicado no Diario de Lisboa de 10 de julho do anno passado, n.° 151, que tem por fim auctorisar o governo a contratar por meio de concurso ou sem elle, a navegação a vapor do rio Guadiana para o estabelecimento de uma carreira diaria de ida e volta entre Mertola e Villa Real de Santo Antonio,.com escala por Alcoutim e Pomarão.

Abstenho-me de fazer considerações n'este momento. Não as julgo necessarias. Não é esta a occasião propria para discutir o projecto, a que alludo; quando elle vier á discussão tratarei de o sustentar no caso de ser impugnado, o que não espero.

As rasões expendidas no relatorio, que precede o mesmo projecto, justificam a sua utilidade, e demonstram até á saciedade a necessidade d'elle ser lei do paiz. Quem deixou do reconhecer, que a navegação de um barco a vapor nas aguas do Guadiana, é hoje uma necessidade geralmente sentida, e que realisando-se este melhoramento devem resultar d'elle grandes vantagens para as duas provincias do Alemtejo e Algarve, e em geral para o paiz? É esta uma verdade de simples intuição, e seria prolixo entrar na sua demonstração.

Chamo pois a attenção do sr. ministro das obras publicas e da respectiva commissão sobre o importante objecto de que tenho tratado. Folgarei muito que o nobre ministro o a illustre commissão, em quem pelo seu reconhecido zêlo pelo bem publico e grande illustração, muito confio, aceitem o pensamento do meu projecto, que me parece muito justo, devendo produzir beneficos resultados para o paiz, no caso de chegar a ser lei. Peço pois a ss. ex.ªs que queiram tomar na devida consideração um tão momentoso objecto.

Tendo a palavra, farei ainda uso d'ella. Desejo fazer umas perguntas ao sr. ministro da justiça, e chamar a sua attenção sobre um objecto, que tambem considero de grande importancia.

O nobre ministro da justiça, o sr. visconde de Seabra, não esta n'esta casa, e por isso não posso n'esta occasião fazer as considerações que desejava, mas julgando conveniente saber desde já qual é a opinião de s. ex.ª sobre o importante assumpto de que queria tratar, entendo que devo fazer já a pergunta que tencionava, e espero que s. ex.ª, depois do ler o Diario de Lisboa, terá a bondade quando vier a esta camara e julgar conveniente de attender ao meu pedido, respondendo á minha pergunta.

O fim d'ella é saber do nobre ministro se esta ou não disposto a consentir, que se dê desde já execução á lei que o auctorisa a crear novas comarcas no paiz'.

Muito folgarei eu, e creio que todos nós, que s. ex.ª quando tiver a bondade de me responder, declare que vae pôr em execução a lei a que alludo, creando as comarcas para que esta auctorisado. Ás vantagens da execução de uma tão justa e excellente lei, são por todos nós manifestamente reconhecidas. A justiça assim será mais bem administrada, e os povos, começando a lei a produzir os seus beneficos resultados, hão de encontrar n'ella as garantias e commodidades de que estiveram privados por muito, tempo em consequencia de não haver uma boa divisão judicial.

Se a resposta do nobre ministro for affirmativa, declarando que vae pôr em execução a lei que o auctorisa a crear novas comarcas, peço, n'este caso, desde já, a s. ex.ª que queira crear uma comarca na villa de Mertola. Em occasião opportuna espero demonstrar, que este meu pedido é justissimo, e que não póde deixar de realisar-se em vista da lei a creação de uma comarca na mencionada villa.

A comarca de Almodovar é uma das que tem maior extensão no, baixo Alemtejo. Tem quatro grandes julgados, e d'estes o maior é o de Mertola. A mencionada comarca tem dez mil e tantos fogos, e uma area muito extensa. Dos julgados que compõem esta comarca o que fica a maior distancia da séde d'ella, que é na villa de Almodovar, é o de Mertola. As mais importantes povoações d'este julgado, entrando n'este numero a séde d'elle, distam da séde da comarca quarenta e cincoenta e tantos kilometros, tendo este mesmo julgado o numero de tres mil quinhentos e tantos fogos. Parece-me pois que em vista das circumstancias em que se acha o referido julgado de Mertola, não póde ella deixar de ser elevado á categoria de comarca, não só pela sua muita importancia, senão tambem pela sua grande e extensa area, comprehendendo-se dentro dos seus limites a muito importante mina de S. Domingos, que dista da villa de Almodovar, séde da comarca, cincoenta e tantos kilometros.

Convencido pois, como estou, que o mesmo julgado, o qual já foi comarca por muitos annos, tendo sido supprimida pela lei de 24 de outubro de 1855, deve ser elevado á categoria de comarca, não só porque todas as rasões de conveniencia publica assim o aconselham, mas tambem porque a lei assim o exige, peço ao sr. ministro da justiça, em quem pelos seus muitos conhecimentos juridicos, longa experiencia dos negocios publicos, reconhecida illustração, e decidido zêlo pelo bem publico, tenho a maior confiança, queira crear n'aquelle mesmo julgado uma comarca, sendo a séde d'esta na villa de Mertola, aonde actualmente se acha a séde do julgado, e conservar a antiga comarca na villa de Almodovar, que pela sua muita importancia e muitas rasões de reconhecida utilidade e conveniencia publica deve continuar a subsistir.

Seria para desejar que se pozesse desde já em execução a lei, que auctorisa o nobre ministro da justiça a crear novas comarcas, mas se por qualquer ponderosa rasão não for possivel executar-se já esta lei, peço n'esse caso a s. ex.ª que não supprima os juizes ordinarios. N'esta parte não estou de accordo com o que ha poucos dias ouvi ao meu nobre amigo e collega, o sr. Rodrigues de Carvalho. Avançou s. ex.ª no muito brilhante e eloquente discurso que fez n'esta casa, na sessão do dia 14 do corrente, quando se discutiu o bill de indemnidade, uma asserção com a qual me não posso conformar.

Disse s. ex.ª que depois do deficit a maior calamidade que conhecia no seu paiz eram os juizes ordinarios, e pediu ao sr. ministro da justiça que os supprimisse desde já, e annexasse ainda mesmo sem a creação das novas comarcas ou julgados extinctos ás antigas comarcas. Permitta-me o illustre deputado, cujas luzes e intelligencia eu e todos lhe reconhecemos, me separe da sua opinião. O que s. ex.ª deseja não póde ter logar. A sua idéa poderia aceitar-se se as comarcas fossem pequenas e a população não estivesse como esta tão separada; mas nas circumstancias em que se acham a maior parte das comarcas d'este paiz, a realisação do pensamento do nobre deputado seria altamente inconveniente, e inteiramente contraria á boa administração da justiça e á commodidade dos povos.

A extincção dos juizes ordinarios sem a creação das novas comarcas, e a annexação dos julgados extinctos ás antigas comarcas, poderia na conjunctura em que ainda hoje nos achâmos, causar a perturbação da ordem publica, e seria por certo aceita pelos povos com a mesma repugnancia com que aceitaram a circumscripção administrativa decretada na lei de 10 de dezembro de 1867, hoje felizmente revogada (apoiados).

O que eu entendo ser uma perfeita calamidade para o meu paiz é supprimir, nas circumstancias criticas em que ainda nos achâmos, os juizes ordinarios sem haver outros juizes que os substituam. Não. se pense que eu sou partidario dos juizes ordinarios. A experiencia de alguns annos me tem mostrado que elles não correspondem perfeitamente ao fim para que foram instituidos; e tenho ha muito tempo, é hoje mesmo, o pleno convencimento de que esta instituição não póde nem deve continuar a subsistir, e em harmonia com esta minha convicção, tive o gosto de votar na sessão do anno passado, n'esta casa, a lei que supprime os juizes ordinarios, e que auctorisa o governo a crear novas comarcas. Provo com isto que não sympathiso com esta instituição, mas tambem entendo que ella deve conservar-se emquanto não houver outra melhor que a substitua.

Com as comarcas que temos na actualidade não podem deixar de admittir-se os juizes ordinarios (apoiados). O serviço d'estes póde não ser bom, e certamente o não tem sido em alguns julgados, e nem admira, porque sendo para estes logares nomeados muitas vezes pessoas incompetentes e que não têem conhecimentos de direito, não podem desempenhar bem a missão de que se acham encarregadas; mas é tambem forçoso confessar que ha muitos juizes ordinarios que têem prestado bons serviços ao paiz, e que nas grandes comarcas, como são todas as do alto e baixo Alemtejo, a conservação d'elles nas circumstancias actuaes é absolutamente necessaria.

Não se póde duvidar que os povos lucram muito quando recorrendo á sua justiça não têem a percorrer grandes distancias. Esta vantagem pelo menos têem os povos com a conservação dos juizes ordinarios. Estes, como todos' sabe mos, julgam até certa alçada, preparam os processos, e isto não é indifferente aos povos, que quando quizerem requerer a sua justiça não precisam em certos casos ir á séde da comarca, percorrendo distancias de cincoenta e tantos kilometros e atravessando caminhos intransitaveis, o que de

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certo lhes não acontecerá se os julgados forem supprimidos sem a creação das novas comarcas. E não será injusto obrigar o jurado a testemunha; a parte que quer tratar da sua justiça a conservar-se na sede da comarca por dez, quinze, vinte e trinta dias, como muitas vezes acontece, na distancia de cincoenta e tantos kilometros das suas casas, com grande prejuizo dos seus interesses? Entendo que sim.

O meu nobre amigo e collega, o sr. Rodrigues de Carvalho, tem estado por mais tempo na provincia do Minho. Creio que as comarcas d'esta provincia não têem uma grande area e a população ali esta muita junta; se s. ex.ª desse um passeio ao baixo Alemtejo, transitasse pelas pessimas estradas que ha n'aquelle districto, e reconhecesse as grandes distancias que ha entre aquellas povoações, estou bem certo que mudava de opinião. Faço a devida justiça ás suas boas intenções e á sua muita illustração.

Não direi hoje mais nada a este respeito, e só me limito a pedir ao nobre ministro da justiça, que queira tomar na consideração que merece o importante assumpto a que tenho alludido, esperando, como não posso deixar de esperar, que s. ex.ª attenderá ao meu justo pedido, não supprimindo os juizes ordinarios emquanto não forem creadas as novas comarcas.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO DO PARECER SOBRE A ELEIÇÃO DE VINHAES

O sr. Falcão da Fonseca: —Direi poucas palavras. O illustre deputado, é sr. Montenegro, no brilhante discurso que hontem pronunciou n'esta casa, pareceu-me querer fazer uma accusação ao administrador do concelho de Vinhaes, e é essa accusação ou censura que eu desejo levantar, porque aquelle cavalheiro longe de merecer censuras, merece elogios.

As taes armas a que o illustre deputado alludiu, dizendo que estavam escondidas n'um palheiro, asseguro-lhe eu, e com os documentos se for preciso, que estavam ali sem previo conhecimento de tal facto por parte do administrador, e acredite a camara que se elle soubesse de tal, teria dado as providencias que o caso pedia.

Espero que o illustre deputado concordará commigo n'esta parte, e nada mais tenho a dizer.

O sr. Presidente: — Não ha mais ninguem inscripto, e por consequencia vae proceder-se á votação. O sr. José de Moraes: — Requeiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se quer votar este parecer por levantados e sentados.

O sr. Presidente: — O regimento diz que qualquer votação que possa affectar pessoa determinada se faça por escrutinio secreto. A camara póde dispensar o regimento se assim o entender, e por isso consulto-a sobre o requerimento que acaba de fazer o sr. José de Moraes.

Vozes: — Espheras, espheras.

O sr. Falcão da Fonseca: — Como fui o unico deputado que impugnou o parecer da commissão, parece-me que não será fóra de proposito dizer que estou de accordo com o que requereu o sr. José de Moraes. É talvez a primeira vez que estou de accordo com s. ex.ª, e a franqueza pede-me que assim o declare. A votação por espheras leva mais tempo, e n'este caso parece-me que ella se póde dispensar.

Posto a votos o requerimento do sr. José de Moraes, foi rejeitado.

O sr. Presidente: — Vão-se distribuir as espheras para se votar. (Pausa.)

Posto a votos o parecer, foi approvado por 97 espheras brancas contra 10 pretas.

O sr. João M. de Magalhães (sobre a ordem): — Por parte da commissão de guerra tenho a honra de mandar para a mesa um parecer da mesma commissão ácerca do projecto de lei dos srs. José de Moraes e Camara Leme, para a revogação da carta de lei de 2 de julho de 1867.

O sr. Ferreira Junior: — A commissão de saude acha-se installada, tendo nomeado para presidente o sr. Gonçalves da Cunha, a mim para secretario, havendo relatores especiaes conforme os negocios que á mesma commissão forem affecto s.

O sr. Presidente: — Passa-se á discussão do seguinte:

Parecer II." Senhores.: — A 1.ª commissão de verificação de poderes tem a honra de sujeitar á vossa apreciação o resultado do seu minucioso exame sobre o seguinte processo eleitoral. CIRCULO N.° 18 (CABECEIRAS DE BASTO) Quatro assembléas formam este circulo: Refoios, Pedraça, Mosteiro e Salamonde. Foi o numero real dos votantes 2:248.

O" cidadão Paulino Teixeira Botelho de Sousa obteve............................... 1:277 votos

O cidadão Guilherme Augusto Pereira de Carvalho........................... 929 »

O cidadão Severino José de Miranda Magalhães................................ 21»

O cidadão João Matheus de Faria.......... 18 »

O cidadão Antonio Correia Caldeira......... 1 »

Houve tres listas brancas, e nota-se a differença de 1 voto a mais, que nada influe no exito da eleição.

Nem nas actas das assembléas primarias, nem na de apuramento apparece reclamação alguma;; foram porém presentes á commissão um protesto e um contraprotesto, aos quaes esta prestou, como lhe cumpria, attenta consideração.

O protesto, assignado por quatro cidadãos do concelho de Vieira, funda-se principalmente em não se ter cumprido nas assembléas de Refoios e Pedraça, onde o cidadão Paulino de Sousa obter a quasi unanimidade, o disposto no artigo 18.° § unico da lei de 23 de novembro de 1859, procedendo-se ahi á eleição, mão pelo recenseamento de 1867, unico valido e legal, mas por outro recenseamento feito pouco antes da eleição, e em que fôra elevado a 1:545 o numero dos eleitores, que era de 804, figurando como taes, na opinião dos signatarios do protesto, individuos destituidos de censo legal e rigorosamente proletários. N'estes termos julgam os referidos cidadãos que deve ser proclamado deputado o candidato Guilherme de Carvalho, porque, devendo considerar-se nullos os votos das assembléas de Refoios e Pedraça, pelo menos na parte em que excedem a 804, e tendo o mencionado candidato obtido nas assembléas de Mosteiro e Salamonde 928 votos d'entre 991 que entraram na urna, fica elle com a maioria absoluta de 30 votos, e com a relativa de 100 votos sobre o candidato Paulino de Sousa, ainda suppondo que recaíssem n'este ultimo todos os votos dos 804 eleitores, inscriptos no recenseamento das duas primeiras assembléas.

O contraprotesto, assignado por sete cidadãos do concelho de Cabeceiras de Basto, dá como improcedentes os argumentos contra o recenseamento de 1868: 1.°, porque o recenseamento de 1867 tinha caducado em presença dos termos a que chegára já o do corrente anno, definitivamente visto e encerrado; 2.°, porque a interpretação dada pela portaria de 8 de abril de 1858 ao artigo 155.° do decreto de 30 de setembro de 1852 deve ser applicada ao disposto no § unico do artigo 18.° da lei de 23 de novembro de 1859; 3.°, porque seria absurdo que a lei quizesse nunca dar o direito de votar a quem o tivesse perdido, ou nega-lo aos que pelo recenseamento feito e terminado tivessem já esse direito; 4.°, emfim, porque é intempestivo o protesto no que respeita á validade ou regularidade do recenseamento, contra o qual sómente se póde reclamar pelo modo e no tempo e logar que a lei marca.

Ponderados com escrupulo os fundamentos do protesto, e do contraprotesto, a commissão considerando que é expresso o § unico do artigo 18.° da lei de 23 de novembro de 1859, em virtude do qual a eleição só podia ser feita pelo recenseamento revisto no anno de 1'867, recenseamento que, tanto para as eleições de deputados, como para as de quaesquer empregos municipaes ou parochiaes, vigora até 30 de junho do corrente anno.

Considerando que a interpretação dada pela portaria de 8 de abril de 1858 ao artigo 155.° do decreto do 30 de setembro de 1852 não póde applicar-se á disposição clara e terminante de uma lei posterior;

Considerando que o artigo 2.°- n.° 2.° do decreto de 17 de fevereiro ultimo, e a portaria do ministerio do reino de 15 de março vem confirmar a disposição do citado artigo 18.° § unico da lei de 23 de novembro de 1859;

Considerando que seria flagrante injustiça fazer-se a eleição em algumas assembléas de um mesmo circulo pelo recenseamento revisto n'um anno, e em outras pelo recenseamento revisto, no anno seguinte;

Considerando que, annullada a eleição nas duas assembléas de Refoios e Pedraça, não póde deixar de o ser em todo o circulo, não só porque não cabe nas attribuições da camara dar ou transferir diplomas, mas ainda porque o effectuar-se a eleição pelo recenseamento de 1868 n'essas duas assembléas, poderia porventura influir para o resultado da eleição nas outras:

É de parecer que deve julgar-se nullo o processo eleitoral do circulo n.° 18 (Cabeceiras de Basto), e mandar-se proceder a nova eleição para preencher a sua vacatura.

Sala da commissão, 14 de maio de 1868. = Antonio Pequito Seixas de Andrade = Francisco de Albuquerque Couto = Antonio Alves Carneiro = Ignacio Francisco Silveira da Motta = José Carlos Mardel Ferreira (com declarações).

Foi introduzido na sala para defender a sua eleição á barra, o sr. Paulino Teixeira Botelho, deputado eleito pelo circulo de Cabeceiras de Basto.

O sr. Ferreira do Mello: — Peço a palavra contra o parecer.

O sr. Presidente: — O sr. deputado eleito quer usar agora da palavra?

O sr. Paulino Teixeira: — Depois de impugnado o parecer.

O sr. ferreira de Mello: — Alguns collegas meus mais conhecedores dos actos parlamentares dizem-me que é costume, por deferencia, fallar primeiro o sr. deputado eleito, a quem a eleição diz respeito, e então eu fallarei depois.

O sr. Paulino Teixeira: — Eu cedo da palavra, porque desejo fallar depois do sr. Ferreira de Mello.

O sr. Presidente: — -Então tem a palavra o sr. Ferreira de Mello contra o parecer.

O sr. Ferreira de Mello: — Declaro a v. ex.ª que é com alguma difficuldade e mesmo com alguma contrariedade, que levanto a minha voz n'esta casa a favor ou contra uma eleição. Era meu proposito deixar correr a discussão das eleições e deixa-las discutir por pessoas mais competentes e habilitadas do que eu, limitando-me' apenas a formar o meu voto pelos esclarecimentos que podesse obter na discussão.

A difficuldade ou contrariedade que sinto em usar da palavra n'este assumpto, explico-a com a franqueza de que me prezo. Quasi sempre estas questões de eleições são encaradas, por mais que se pretendam desviar d'este campo, como questões pessoaes ou de mera politica, e não como questões de verdade ou de legalidade e justiça. E entendo que nós mesmos temos concorrido alguma cousa para isto, porque é costume quando se discute qualquer eleição, declararem todos que respeitam muito o caracter do cavalheiro eleito» e que são apreciadores das qualidades do cavalheiro que ficou em minoria. Por consequencia, damos um indicio de que se não prepondera são nosso animo, ao discutir eleições, o merecimento dos candidatos, ao menos essa idéa não é absolutamente estranha ao nosso espirito.

Pela minha parte confesso que, quaesquer que sejam as relações que tenho com os cavalheiros que disputaram esta eleição, não vejo senão a lei, o processo eleitoral e o parecer da commissão, e que me esqueço dos nomes d'estes cavalheiros. Agora não os conheço.

Mas depois da declaração que fiz de certo devia haver motivo importante ou poderoso para vencer a contrariedade que declarei ter, e para ser o primeiro a tomar parte na discussão do parecer de que hoje nos occupâmos...

Este motivo, tambem o declaro a v. ex.ª e á camara com toda a franqueza, é unicamente a circumstancia de ser o meu circulo contiguo e limitrophe com os dois concelhos de que se compõe o circulo de Cabeceiras de Basto, Cabeceiras e Vieira.

D'aqui resulta que, achando-me eu no meu circulo na occasião em que se procedeu a esta eleição, sei, e não ha um unico eleitor em todo o circulo que represento que não saiba com conhecimento de causa a verdade e exactidão dos factos que se passaram n'aquelle circulo, tanto no concelho de Cabeceiras como no da Vieira.

Estando eu ali por essa occasião, seria criminoso, seria réu de lesa-verdade e justiça se ficasse silencioso n'esta camara diante do parecer que a illustre commissão apresentou, e se os meus constituintes vissem que auctorisava com o meu silencio a approvação de um parecer que não se funda nem na lei, nem na justiça, nem na verdade.

Cumpre-me agora fazer uma declaração previa. Eu respeito immenso todos os membros da commissão que assignaram este parecer, e com alguns d'elles, até com a maior parte, honro-me de ter relações de amisade pessoal, e amisade antiga; e portanto declaro á camara e aos membros da commissão que as minhas palavras, na apreciação do parecer, não ferem de fórma nenhuma nem as pessoas nem as intenções de ss. ex.ªs E fique esta declaração bem presente no animo de ss. ex.ªs, porque eu, que não meço muito as palavras de que me sirvo quando discuto, e gosto de discutir livremente, não posso estar a prender-me com a escolha de palavras, e com o emprego de termos mais ou menos amaveis, e devo apreciar o parecer com aquella severidade com que costumo apreciar actos que me parecem injustos.

Não tenho nada que dizer nem com relação ao relatorio, que se encontra n'este parecer nem com relação aos tres primeiros considerandos. O relatorio é rigorosamente justo e rigorosamente exacto, e os tres primeiros considerandos são rigorosamente justos, rasoaveis e muitissimo bem elaborados. O quarto considerando porém é para mim inintelligivel.

E provavel, quanto a este, que o que eu não pude conseguir com o auxilio só da minha rasão, o consiga muito facilmente com as explicações de algum dos membros da commissão. Espero-as.

Mas o ultimo considerando e a conclusão destacam horrivelmente da justiça e da intelligencia que os illustres membros da commissão revelaram ao formularem os tres primeiros considerandos.

Declaro que esta conclusão e o ultimo considerando poderão ser só absurdos, mas é o maior favor que lhes poderemos fazer, menos do que absurdos é que não podem ser. Podem ser mais alguma cousa, podem considerar-se absurdos e facciosos, se alguem quizer levar a apreciação mais longe do que eu me propuz a faze-lo.

O ultimo considerando é o seguinte:

«Considerando que, annullada a eleição nas duas assembléas de Refoios e Pedraça, não póde deixar de o ser em todo o circulo, não só porque não cabe nas attribuições da camara dar ou transferir diplomas, mas ainda porque o effectuar-se a eleição pelo recenseamento de 1868 n'essas duas assembléas, poderia porventura influir para o resultado da eleição nas outras:

«E de parecer que deve julgar-se nullo o processo eleitoral do circulo n.° 18 (Cabeceiras de Basto) e mandar-se proceder a nova eleição para preencher a sua vacatura.»

Com a audacia mesmo de deputado novo permitta-me v. ex.ª que proteste solemnemente contra esta deducção das attribuições d'esta casa (O sr. Barros e Sá: — Apoiado). Isto para mim é uma cousa inadmissivel e declaro que a não comprehendo. Isto é o maior dos absurdos (apoiados).

Vou argumentar com os arestos e por esta occasião declaro que tambem tinha duvidas em me servir de arestos. Em toda a minha vida desde que cheguei a ter o uso de rasão, nunca me guiei por arestos logo que elles se não conformam perfeitamente com a minha rasão e com o exame e avaliação da materia a que são applicados. Tanto me importa o que diz um aresto como o que deixa de dizer, porque tratei sempre de regular as minhas acções unicamente pela minha intelligencia e pela boa interpretação da lei que regula a especie a decidir (apoiados). Os casos são sempre sujeitos a discussão, e a rasão humana nunca abdica o seu direito de livre exame para proferir justa apreciação (apoiados).

Diz porém a illustre commissão: «que não esta nas attribuições da camara dar ou transferir diplomas». Pergunto em primeiro logar á commissão onde é que esta a lei que prohibe a esta camara dar ou transferir diplomas? Em que é que a commissão se funda, para vir dizer isto á camara? Pois nós não estamos aqui para fazermos leis e as apreciar-mos livremente?

O illustre relator dia commissão, que é um jurisconsulto distincto, sabe perfeitamente que não é preciso ser deputado, basta ser um simples cidadão, para fazer o que aliei não prohibe; e se isso assim succede, a camara, a quem compete fazer leis, não poderá praticar uma insignificancia d'esta ordem, e sobretudo quando «Ha tem por fim admittir no seio da representação nacional um homem que teve o diploma legal, e que tem a votação da maioria dos eleitores?

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Se a minha voz não tem o prestigio sufficiente para fazer ressaltar como axioma esta verdade profunda, calar-me-hei eu, e vae fallar a lei em meu logar.

O artigo 90.° da lei de 1852 diz o seguinte:

«Serão considerados como eleitos deputados, aquelles cidadãos que obtiverem maioria relativa, comtanto que reunam pelo menos um quarto dos votos do numero real dos votantes de todo o circulo eleitoral.»

N'esta parte não esta revogada a lei de 1852, e não ha lei que deixe de dizer «que é deputado eleito aquelle que reunir a maioria legal do numero real dos votantes».

Ora, agora deveremos nós considerar deputado eleito aquelle que se apresentar com maioria real e legal de votos, ou aquelle que se apresenta com o diploma simplesmente?

Eu respondo.

Nunca esperei ver-me na dura necessidade de defender perante esta assembléa illustrada uma verdade intuitiva. Pois onde queremos levar nós a dignidade d'esta assembléa?,

Supponhamos uma hypothese muito facil de acontecer e de realisar. Supponhamos que uma commissão de apuramento ao apurar os votos de um circulo eleitoral para entregar o diploma ao deputado eleito, entrega facciosa ou criminosamente a um homem que não tem um só voto, deixando de o conferir a quem pelas descargas dos cadernos e actas da eleição nós vemos que unica e legalmente pertencia. Pergunto eu, em taes circumstancias deverá esta camara reparar a injustiça palpitante, visivel e clara, ou curvar a cabeça e subscrever ás trapassas, injustiças e illegalidades das commissões de apuramento? Creio que não tem questão. Isto não se póde sustentar, não se póde imaginar mesmo sem indignação profunda.

Vamos aos arestos.

Quando em 1858 se discutiram n'esta camara as eleições de Lamego, a segunda commissão de verificação de poderes diz o seguinte na conclusão final do seu parecer:

«A commissão é de parecer que deve ser proclamado deputado o sr. Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel, não o sendo o sr. Antonio Julio Pinto Ferreira, posto que apresentasse o seu diploma, porque pelo restabelecimento da verdadeira votação este senhor ficou excluido.»

É o que fez esta commissão de poderes.

Seguiu porventura este caminho e o expediente já adoptado a nossa commissão, cujos membros eu muito respeito? Não. Fez exactamente o contrario, seguiu o caminho opposto.

Como tivesse todos os elementos para examinar a votação, e como soube por uma operação arithmetica sommar o numero de votos de' cada um dos eleitos o diminuir ou comparar este com o numero real de votantes, concluiu que o sr. Antonio Julio Pinto Ferreira, que apresentou o seu diploma, não tinha tido a maioria real e legal, e que o sr. Antonio Pereira de Vasconcellos Pimentel, tendo tido essa maioria era quem devia tomar assento n'esta casa, apesar de ser o primeiro que apresentou o diploma.

Deputado eleito é aquelle que mereceu a confiança do paiz, e que obtendo a maioria de votos se póde apresentar aqui legal e validamente.

N'essa occasião, quem primeiro fallou foi um distincto ornamento d'esta casa, que sinto não ver presente, o sr. Lobo d’Avila, que respondeu assim ao sr. Affonso de Castro:

«A commissão não se fundou para dar o seu parecer sobre a idéa de preferir o immediato em votos, mas sobre a rasão de que restabelecida a verdade da votação o sr. Antonio Telles ficára eleito.»

Foi exactamente a applicação da theoria justa, da theoria verdadeira e santa que acabei de expor. Foi o cumprimento do artigo da lei, que deputado eleito será aquelle que tiver maior numero de votos e não aquelle que apresentar o seu diploma.

Na sessão seguinte moveu-se tambem esta duvida, e houve tambem espiritos timidos ou receiosos das attribuições que a lei fundamental do estado nos confere, porque eu creio que ha sempre n'estas assembléas homens timidos que tremem até do poder que lhe metteram na mão, que escrupulisavam que a camara podesse dar diplomas.

Respondeu o sr. Sant'Anna e Vasconcellos em phrase mais forte, mas que exprimia melhor o sentimento da verdade:

«Quando porém, como n'este caso, se não trata senão de restabelecer uma votação, e quando o supposto immediato em votos é realmente o deputado que os eleitores quizeram eleger, entendo que pede a justiça e a boa rasão que uma trapaça eleitoral não prevaleça contra a verdade.»

Isto põe a questão clara, e nós não temos de ver na apreciação d'esta eleição senão qual dos dois candidatos obteve a maioria real e legal dos votos de todo o circulo.

Este caso da eleição de Lamego em 1858 não é o unico n'estas circumstancias. Em Lamego, na eleição antecedente a esta, tinha-se dado um caso analogo, e a decisão havia sido reconhecer como deputado aquelle que tinha obtido a maioria legal e real dos votos n'aquelle circulo.

As duvidas continuaram. E note v. ex.ª e note a camara que esta eleição de Lamego, se por um lado se apresenta identica a esta, por outro lado esta em condições muito mais desfavoraveis do que a eleição de que actualmente nos occupâmos.

Para restabelecer a verdade da votação da eleição de Lamego foi necessario annullar os votos de uma assembléa, porque, alem de falsificação das actas, tinha havido erros e infracções de lei no apuramento de uma das assembléas primarias. Este motivo é que, na eleição de Lamego, levou espiritos muito esclarecidos e muito rectos a duvidarem por um momento da decisão que haviam de dar em relação áquella eleição, porque, diziam elles, «nós não temos duvida nenhuma em restabelecer a verdade da eleição de Lamego, e restabelecida ella conhece-se que effectivamente o deputado que traz o diploma não é o que teve a maioria dos votos do seu circulo; não temos duvida nenhuma em dar logar n'esta camara ao deputado, que devia ter a maioria de votos, e deixar portanto fóra da camara aquelle que a não teve, ainda que trouxesse o diploma; a unica duvida é se, considerando nullos os votos de uma das assembléas primarias, nós temos de admittir que essa assembléa, quando fossem validos os seus votos, poderia influir no resultado da eleição ».

Portanto a duvida que se offerecia áquelles espiritos esclarecidos não era a mesma these que eu aqui defendo; não era a circumstancia de reconhecer como deputado eleito aquelle que teve a maioria de votos no seu circulo, era apenas a circumstancia de ser preciso annullar uma das assembléas primarias para reconhecer depois a maioria.

Ora as attribuições da camara, que de certo estão no animo de todos e que todos reconhecem, estão bem explicadas tambem nos longos discursos que aqui se proferiram por essa occasião.

Lerei apenas o seguinte:

«Diz-se que esta camara não faz deputados, e não faz; mas esta camara proclama os deputados a quem as operações eleitoraes conferiram os direitos, e esta camara não póde tirar os direitos a quem as operações eleitoraes os deram.

«Mas esta camara não. póde passar diplomas. Nem é preciso que os passe; logo que se estabeleça a verdade da votação, o diploma esta passado, porque não se faz senão dizer-se —o diploma que se deu a este individuo foi achado illegal—; e esta resolução da camara vale mais que qualquer outro diploma que elle tenha trazido. O diploma é a resolução da camara. A camara resolve em ultima instancia todas as questões eleitoraes, e a resolução da camara é o diploma com que o eleito entra n'esta casa.»

Ora aqui tem V. ex.ª e a camara definitivamente estabelecido, não só pelos discursos pronunciados n'esta casa, mas tambem pela resolução final sobre este assumpto, que o diploma não é considerado elemento essencial para a entrada de um deputado n'esta casa; quem lhe dá o diploma é a camara.

Que nos importa que um homem traga trinta diplomas, se elles forem todos illegaes e nullos? Porventura nós aceitâmos aqui a lei das commissões de apuramento? Porventura podemos nós admittir o absurdo de que o diploma é o Unico elemento essencial para a entrada de um deputado n'esta casa, sem nos revoltarmos contra esta doutrina tão cerebrina? O que nós devemos fazer é examinar rigorosamente se as commissões do apuramento conferiram os diplomas a quem os deviam conferir, ou se os conferiram illegalmente. Esta é a verdadeira e unica questão.

Para deixar de uma vez este assumpto dos arestos, basta mostrar que este objecto foi segunda vez á commissão de verificação de poderes, e ella, considerando-o de novo, deu o mesmo parecer que foi a final approvado na sessão de 13 de julho de 1858.

Ora agora, sr. presidente, demonstrado, como me parece que esta demonstrado até á evidencia, que o deputado eleito, e que nós temos de reconhecer é aquelle que reuniu a maioria real e legal dos votos dos eleitores do seu circulo, a segunda parte das minhas reflexões limita-se a demonstrar que effectivamente a maioria d'esses votos recaíu no cidadão Guilherme Augusto Pereira de Carvalho e Abreu, e não no cidadão Paulino Teixeira Botelho de Sousa, que aqui se apresenta com o diploma.

Para isto, pedindo para este ponto a attenção da camara, não preciso mais do que fazer desde já notar a v. ex.ª o Diario de 15 de abril passado, em que, a respeito do circulo de Cabeceiras de Basto, apparecem 2:246 eleitores, havendo em todo o circulo apenas 1:625 pessoas recenseadas!

Já V. ex.ª vê que isto é impossivel; 1:625 eleitores produzirem 2:246 votos, só se póde explicar quando o eleitor deite na urna mais de uma lista, e por consequencia dê mais do que um voto.

Qual foi a rasão d'isto? A rasão d'isto esta explicada nos considerandos da commissão, que eu acho não só justos mas muito habilmente fundamentados, e alem d'isto redigidos com perfeito conhecimento de causa.

A rasão foi que os eleitores de Cabeceiras de Basto entenderam que, apesar da portaria do ministerio do reino de 15 de março d'este anno, do artigo 2.°, n.° 2.°, do decreto de 17 de fevereiro ultimo e do artigo 18.°, § unico, da lei de 23 de novembro de 1859, deviam fazer a eleição pelo recenseamento de 1868, quando todas estas leis mandavam que ella fosse feita pelo recenseamento de 1867.

N'esta parte não tenho que impugnar a doutrina da commissão, porque a doutrina que ella estabelece é a mesma que eu apresento; mas desde que a commissão estabelece, e é esta a conclusão' que desejo tirar, que o unico recenseamento válido e legal para se proceder ás eleições em virtude das quaes todos nós estamos aqui, era o recenseamento de 1867, a commissão tem de reconhecer tambem que tendo-se feito a eleição pelo recenseamento de 1868, essa eleição não podia contar se e tinha de attender-se aos principios sanccionados pela praxe constante d'esta casa, que ora examinar se essas illegalidades que se tinham commettido em Cabeceiras de Basto podiam influir no resultado válido da eleição do circulo de modo que conduzissem a annullar a eleição. Se não influissem devia declarar que essas illegalidades não influiam no resultado da eleição, e que por consequencia ella devia ser approvada, porque o defeito não influia no resultado real e arithmetico da mesma eleição.

A commissão reconheceu, e eu estou tambem de accordo com ella, que o cidadão Guilherme de Carvalho e Abreu obteve em Vieira uma maioria de 928 votos, onde se procedeu á eleição pelo recenseamento legal de 1867. A commissão reconheceu tambem que os eleitores de Cabeceiras de Basto, pelo recenseamento de 1867, era apenas 804; por consequencia a operação arithmetica a fazer é muito facil. Deduzindo 804 votos de 928 temos mais de 100 votos de maioria, d'onde resulta que o cidadão Guilherme de Abreu tinha obtido maioria absoluta sobre o resultado (legal da eleição de Cabeceiras de Basto, fosse elle qual fosse.

Pergunto á commissão: Que escrupulo é o seu em relação á eleição de Cabeceiras de Basto? Reconhece ou não a commissão que em Cabeceiras do Basto não podia haver validamente mais de 804 votos, porque não havia mais eleitores? Reconhece, e ella mesma o affirma.

Supponhamos que em Cabeceiras de Basto não tinha morrido um unico eleitor depois de feito o recenseamento de 1867, e que todos estavam vivos; quantos eram? 804. Supponhamos que nenhum tinha ficado em casa, que todos tinham ido á eleição; quantos eram? 804. Supponhamos que todos votaram no sr. Paulino; quantos votos podia reunir este candidato? 804. Deduzindo estes 804 de 928 não se encontra uma maioria muito maior do que aquella por que muitos de nós estamos n'esta casa? Qual é pois a rasão por que havemos de concordar com a conclusão da commissão, e irmos privar um cidadão legalmente eleito de um direito igual áquelle por que nós aqui estamos? Pois havemos de annullar a eleição de um deputado que obteve uma maioria de votos tão espantosa no seu circulo, apesar da guerra atroz que soffreu em consequencia das circumstancias especiaes em que se achavam os dois concelhos de que se compõe o seu circulo? Essas circumstancias permitta v. ex.ª que eu as exponha á consideração da camara, porque estou persuadido que lhe hão de fazer muita impressão.

O circulo n.° 18 compõe-se de dois concelhos: de Cabeceiras de Basto e Vieira. O sr. Guilherme de Carvalho e Abreu era o representante do circulo, n'esta casa, muito a contento dos eleitores de Vieira e Cabeceiras de Basto; esteve no parlamento passado e aqui teve de votar e tomar parte na discussão das medidas que foram revogadas dictatorialmente, e cuja revogação nós confirmámos aqui outro dia. Em resultado da lei administrativa que mandava proceder a nova circumscripção, o representante d'este circulo desejando, porque era a sua idéa, que, eu sei e posso affirmar a v. ex.ª, poder crear uma comarca no concelho de Cabeceiras e outra no de Vieira, empregou todos os esforços para que esta sua pretensão podesse ser admittida e podesse achar confirmação na nova lei; apesar porém de todo% os esforços que elle fez, e de estar constantemente em Lisboa trabalhando para esse fim, não póde conseguir o resultado que desejava, e que eu estou convencidissimo que elle folgaria muito de obter, para evitar no seu circulo estes desgostos e complicações que apparecem agora.

Sendo pois essa pretensão incompativel com a divisão territorial, o deputado que representava o circulo teve naquella occasião, ou de consentir, se lhe pediram o seu consentimento, ou de receber, se por acaso o não consultaram, a creação da comarca de Vieira, e de receber igualmente a suppressão do concelho de Cabeceiras.

D'aqui resultou uma cousa muito natural, e foi que o deputado que representava o circulo, o sr. Guilherme de Abreu, ficou elevado ás nuvens no concelho de Vieira, para onde tinha conseguido a comarca, e foi mettido cem braças debaixo da terra no concelho de Cabeceiras, cuja suppressão elle tinha aceitado porque não podia deixar de a aceitar.

Seguiu-se o movimento do paiz, a revogação d'aquella medida, a dissolução do parlamento e as novas eleições; e o resultado foi que se podia dizer que o sr. Guilherme de Abreu não tinha um voto contra no concelho de Vieira, e não tinha um voto a favor no concelho de Cabeceiras; mas isto com uma differença essencialissima para que peço á attenção da camara, e é que o sr. Guilherme de Abreu no concelho de Vieira, onde tinha as sympathias, a adhesão e o enthusiasmo dos povos, tinha contra si a auctoridade local, que lhe difficultava não só as operações do recenseamento, mas todas as operações eleitoraes, e que não consentiria em qualquer excesso se por acaso lá fossem capazes de o fazer, o que eu não creio; e no concelho de Cabeceiras acontecia o contrario, acontecia que juntamente com a indignação popular, indignação adredemente excitada, mas que já existia nos animos (pois eu concordo em que existia, e existia naturalmente pela suppressão do concelho) juntamente com essa indignação, natural em todos os eleitores do concelho de Cabeceiras, acontecia que a auctoridade tinha o mesmo zêlo, o mesmo interesse, a mesma conveniencia que tinham os eleitores em prejudicar a eleição do sr. Guilherme de Abreu, e em favorecer todo e qualquer outro candidato que contra elle por ali fosse proposto.

O resultado foi que o recenseamento do concelho de Cabeceiras, que sempre teve e apparece no anno de 1867 com 804 votos, foi de repente elevado a mil e quinhentos e tantos, e foi elevado a este numero sem reclamação, sem uma unica duvida em todo o concelho.

Mas a falta de reclamação significará que o recenseamento representa fiel e exactamente a verdade dos que estavam recenseados no circulo, e dos mais que tambem o deviam ser? Não; isso é uma cousa que eu nego, e que nego absolutamente pelo conhecimento que tenho daquellas localidades; porque, como eu disse a v. ex.ª e á camara, o meu circulo é limitrophe com ambos os concelhos d'este circulo. Não ha eleitor nenhum no meu circulo que ignore a maneira como as cousas se fizeram.

Podem argumentar-me com os dados estatisticos da po-

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pulação, com os caprichos e com os propositos que anteriormente alteravam o recenseamento. Tudo tem resposta, e por isso eu posso responder que não ha falsificação n'esse recenseamento, nem havia receio nenhum d'ella; porque o sr. Guilherme de Abreu, era deputado por aquelle circulo, e em ambos os concelhos com uma maioria extraordinaria. Por consequencia não tinha interesse nenhum o partido que tomasse a peito a eleição d'elle em diminuir o recenseamento, absolutamente nenhum, porque ali não havia perigo; o perigo veiu apenas quando elle teve forçosamente que aceitar a suppressão de um dos concelhos que compunham aquelle circulo eleitoral.

Agora vou dizer outra cousa que se sabia, que affirmo sem receio de que alguem o negue. Os eleitores de Cabeceiras de Basto não reagiram só contra o determinado no decreto e portaria de 17 de fevereiro e 15 de março d'este anno, e no § unico do artigo 18.° da lei de 23 de novembro de 1859, leis que mandaram proceder á eleição pelo recenseamento de 1867. Esses não só reagiram contra os citados decreto, portaria e lei, mas reagiram tambem contra as ordens repetidas do governador civil do districto, cavalheiro dignissimo (apoiados), e cuja dignidade tenho obrigação de zelar aqui. Esta auctoridade quiz evitar, por todos os modos, que no seu districto apparecesse uma eleição com essa mancha; mas não foi possivel. Era tal o proposito de se fazer a eleição como se fez, que se resistiu a tudo e porque? Porque, é facil saber-se. Dizia-se, antes do resultado da eleição, e todos o sabiam no circulo vizinho, «faz-se a eleição assim, sem esperança d'ella se julgar válida; faz-se assim de proposito, para que seja julgada nulla, a fim de se mandar proceder a nova eleição, que se fará pelo recenseamento de 1868, que então já terá apparencias de legalidade, isto é, pelo mesmo recenseamento que nós agora achâmos illegal, nullo e admissivel, recenseamento que a propria commissão, apesar da conclusão que tirou, se viu obrigada a condemnar, e não aceitar para a eleição.

Agora direi a v. ex.ª e á camara uma cousa que eu podia dispensar-me perfeitamente de dizer aqui, porque todos nós a sabemos, mas que sempre direi: se nós queremos ter prestigio para as leis que vamos fazer, temos rigorosa obrigação de provarmos primeiro que temos imparcialidade e intelligencia necessaria para entendermos e applicarmos as leis que estão feitas. V. ex.ª vê que se eu tomo isto a peito, não é por credito individual meu; porque esse esta salvo desde o momento que eu combato esta illegalidade, mas é porque pugno pelo prestigio que as nossas resoluções devem sempre ter. Por consequencia, antes de me sentar, direi uma verdade profunda, e é que se nós queremos annullar a eleição para a repetir pelo recenseamento de 1868, que dobra os eleitores de Cabeceiras de Basto, que as póde duplicar ou centuplicar, a ponto de apparecerem aqui tantos ou mais que os eleitores do circulo de Ambaca, porque lá não haverá ninguem que reclamo contra isso; digo, se nós não queremos approvar a eleição porque foi feita por um recenseamento illegal, mas a vamos mandar fazer outra vez pelo mesmo recenseamento, então é melhor mais franqueza e approvar desde já esta eleição. Se queremos illegalidade, já a temos, escusado é repeti-la (apoiados).

Vozes: — Muito bem, muito bem.

Mando para a mesa a seguinte substituição ao ultimo considerando e conclusão do parecer. Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Considerando que a votação do concelho de Cabeceiras de Basto, logo que fosse feita pelo recenseamento legal de 1867, nunca podia influir no resultado da eleição do circulo por ter o cidadão Guilherme de Carvalho e Abreu obtido a maioria real e legal dos votos do mesmo circulo:

E restabelecida a verdade da votação e deve ser proclamado deputado o cidadão Guilherme Augusto Pereira de Carvalho e Abreu. = Antonio Augusto Ferreira de Mello.

O sr. Paulino Teixeira: — Sr. presidente, são difficeis as circumstancias em que subo a esta tribuna, porque não tenho pratica das lides parlamentares, faltam-me recursos de sciencia para ter a honra de levantar a minha voz de modo que disperte a attenção das illustrações de que vejo composta a representação nacional, e porque sou forçado a occupar-me de uma questão em que esta envolvida a minha pessoa.

Porém, sr. presidente, eu espero que v. ex.ª e os illustres deputados relevem a minha insufficiencia, e me escutem com a benignidade que os caracterisa, julgando do que tenho a expor, não pela debilidade da exposição, mas pela força da rasão.

Se o que eu tenho a dizer tendesse sómente a sustentar a honra individual que me póde caber por vir a fazer parte da representação nacional, ter-me-ía abstido de subir a este logar, porque, comquanto me lisonjeie muito a distincção de poder sentar-me n'esta casa, não me lisonjearia menos descansar em paz no seio da familia.

Mas o que eu tenho a sustentar, sr. presidente, não é o que mais me lisonjeia, é o que mais me obriga; é o diploma de representante da nação, que os cidadãos de Cabeceiras de Basto foram, em 24 de novembro passado, pedir-me a casa lhes aceitasse, e que ratificaram e me conferiram pela eleição de 22 de março.

Eu tenho de sustentar o sagrado direito que assiste a todo o cidadão inscripto legalmente no recenseamento de eleger livremente o seu representante em côrtes, direito que foi exercido em Cabeceiras com a mais ampla liberdade e desafogada consciencia, e até com enthusiasmo. Posso asseverar á camara que a vontade do eleitor, a intenção do legislador e o espirito da lei foram ali mantidos religiosamente, e por isso ouso esperar que a moralidade d'este acto não ha de ficar abafada debaixo da materialidade das palavras «30 de junho» escriptas na lei para pôr um termo ás questões de reclamações e recursos que confiram direitos, e não para tolher direitos adquiridos.

Não posso portanto deixar de pugnar pela validade do direito que assistia a meus concidadãos de escolherem quem teve mais fortuna do que merecimentos para alcançar a sua confiança e suffragio. Desamparar sem debate a posição em que me collocaram seria degradar-me e descurar seus interesses; seria abandonar seu mandato cobardemente áquelle a quem por motivo justo o cessaram em 24 de novembro; seria finalmente entrega-los á discrição e vindicta do ingrato representante de quem fugiam.

Sr. presidente, eu já tive a honra de mostrar por um impresso que dirigi aos illustres deputados a desproporção enorme em que esta o recenseamento de Vieira do anno de 1867, não só para com todos os concelhos do districto de Braga, mas muito principalmente para com Cabeceiras. Os dados estatisticos, pelos quaes mostrei isto, são officiaes, e por isso incontroversos.

Tambem mostrei pelas actas originaes em que o povo e camara de Cabeceiras retiraram sua confiança ao sr. Carvalho de Abreu, e que se acham juntas ao processo, a impossibilidade moral em que elle esta de rehaver essa confiança. Se a camara quer que as leia, tenho-as aqui. (Vozes: — Leia.) (Leu.)

A consequencia necessaria de tudo isto é que o sr. Carvalho de Abreu não póde representar a maioria real do circulo n.° 18 (Cabeceiras), porque sendo este a cabeça do circulo e o mais importante, teve n'elle 1 voto apenas, e tendo eu os outros todos e 24 em Vieira, represento inquestionavelmente aquelle, e represento melhor Vieira com 24 votos do que o sr. Carvalho de Abreu representa Cabeceiras com 1.

E eu não tive mais votos em Vieira, porque as cousas por lá não correram como se blasona, como podia provar com um pasquim diffamatorio affixado contra mim e arrancado da porta de uma das assembléas, e que não leio para não ferir a susceptibilidade d'esta camara.

O sr. Barros e Sá: — Leia.

O Orador: — Eu não desejo lê-lo, porque tenho de justificar-me depois, mas se insiste, leio.

O sr. Barros e Sá: — Pois então leia.

(Leu o pasquim e uma carta do pae do sr. Carvalho de Abreu, e com mais algumas explicações terminou este incidente.)

Em Cabeceiras correram as cousas de modo diverso. Escandalisado como estava o povo contra o candidato opposto nem d'elle se lembrou no dia da eleição, mostrando assim elevar-se á maior altura de um povo civilisado. É que, sr. presidente, a magnanimidade é sempre bem cabida. Voto por isso d'aqui os meus louvores áquelle generoso povo, que soube vingar-me assim da intencionada affronta.

Resta-me contestar o parecer da commissão de verificação de poderes.

O primeiro considerando da commissão revela o seu exagerado escrupulo e afferro ás disposições litteraes da lei, e o completo esquecimento do seu espirito, e da natureza da assembléa a quem se dirije.

Qual é o espirito da lei eleitoral? Qual é o fim a que se propõe o conjuncto de todas as suas disposições? Espero, senhores, que não levareis a mal que seja eu quem venha n'este recinto lembrar tão singelas verdades a tão distinctos jurisconsultos.

O fim da lei eleitoral é fixar as condições de independencia e capacidade, que se julgam necessarias para que se exerça em proveito da sociedade o direito da escolha dos representantes da nação: mandar fazer com a maior solemnidade a enumeração exacta daquelles que a lei julga capazes de exercer esse direito; a esta enumeração chama-se na lei recenseamento; cercar emfim o exercicio d'este direito de todas as garantias possiveis de liberdade e de verdade.

Vejamos agora o que aconteceu.

Exerceram n'esta eleição o direito de eleger o seu representante aquelles a quem a lei o deu, ou não?

A resposta não póde ser duvidosa, porque ninguem se atreverá a sustentar, com assentimento dos homens competentes e imparciaes, que possam presumir-se menos legaes eleitores os que se acham inscriptos no recenseamento revisto em março d'este anno, recenseamento contra o qual não se formulou uma só queixa nem uma só reclamação, e que era portanto definitivo e perfeito, do que aquelles que por ventura se achavam inscriptos como taes no recenseamento de 1867, por ser evidente que, postas de parte muitas considerações aliás obvias, bastaria o espaço de tempo decorrido desde a revisão do recenseamento de 1867 para o tornar em exactidão e verdade manifestamente inferior ao de 1868.

Foi este direito exercido com todas as solemnidades que a lei determina, e que são a garantia da liberdade dos que elegem, e de que a eleição seja a verdadeira expressão da sua vontade? Ninguem póde sustentar o contrario, porque do processo consta que foram observadas todas as formalidades da lei.

Que pretendem portanto os illustres auctores do parecer da commissão? Que sem o querer, porque faço plena justiça ás suas intenções, seja sacrificado o fim da lei á sua letra, a verdade á simples apparencia d'ella, e por ultimo a vontade de mil e tantos eleitores ás subtilezas e argucias de uma interpretação meticulosa?

A isto cumpre acrescentar que a commissão - não é um tribunal de juizes de direito, nem se dirige a um tribunal que o seja. A camara dos deputados, perante quem tenho a honra de fallar, é essencialmente uma assembléa politica, representa uma parte da soberania nacional e decide as questões d'esta ordem, não restricta á imperfeição litteral da lei escripta, mas pelos luminosos principios do direito politico, applicaveis e de accordo com o que lhe parecer mais genuina expressão da vontade dos eleitores.

Parece-me, salvo o devido respeito á illustração dos membros da commissão, que não foram mais felizes no seu segundo considerando que no primeiro. A illustre commissão julgou « que a interpretação dada pela portaria de 8 de abril de 1858 ao artigo 155.° do decreto de 30 de setembro de 1852, não póde applicar-se á disposição clara e terminante da lei posterior», que é o § unico do artigo 18.° da lei de 23 de novembro de 1859. Esqueceu-se porém, produzindo este argumento, que não tendo o governo, de quem emanou a portaria citada, faculdade para interpretar autenticamente as leis, a interpretação doutrinal da sua portaria, para os que não são empregados da sua dependencia, carece de força obrigatoria, que não tem mais que a força derivada do valor das rasões em que se funda.

Ora, não podendo ser controvertido o que fica dito, permittirá a illustre commissão que eu lhe pergunte se, sendo substancialmente iguaes as disposições do artigo 155.° do decreto de 30 de setembro de 1852 e as do § unico do artigo 18.° da lei de 30 de novembro de 1859, as rasões em que se funda, a interpretação dada ás primeiras pela portaria de 8 de abril de 1858, perderiam a sua força logica quando applicadas á lei posterior de 1859? E evidente que não. É trivial o principio que, onde ha identidade de disposição deve existir identidade de rasão. Deixo aos illustres deputados avaliar a procedencia d'estas minhas reflexões, em cujo desenvolvimento me não parece necessario insistir.

A illustre commissão não melhorou de fortuna com o terceiro considerando, porque se o artigo 2.° n.° 2.° do decreto de 17 de fevereiro ultimo reproduzisse textualmente (o que não faz) a disposição do § unico do artigo 18.° da lei de 1859, é evidente que não acrescentava um átomo á força da mesma, porque a reproduzia, e o valor d'esta já eu expliquei. E quanto á nova portaria de 15 de março d'este anno que, na opinião da illustre commissão, veiu reforçar aquella disposição da lei de 1859, escapou á penetração da illustre commissão que a hypothese a que a portaria se refere é essencialmente differente da que se deu em Cabeceiras de Basto, e é todavia a este concelho que a illustre commissão a applica.

O quarto considerando é nova demonstração de que a illustre commissão se deixou dominar tão absolutamente pelas disposições litteraes da lei, que foi descobrir uma rasão ponderosa para annullar uma eleição, não na falta de legitimidade dos eleitores que a fizeram, mas na desigualdade de data do papel em que estavam escriptos. Pelo que tenho lido nas decisões parlamentares do meu paiz, e pelas respostas dadas a muitas perguntas minhas por homens mais versados que eu na nossa historia parlamentar, supponho que é esta a primeira vez que esta fatal desigualdade de data de uma inscripção ou registo vem servir de fundamento a que se considerem não dados ou nullos os votos que mil e tantos eleitores legitimos conferiram ao homem da sua escolha. Se o argumento da illustre commissão é verdadeiro, ha de sê-lo em todas as hypotheses em que se der.

Supponha a illustre commissão que no circulo A se fez a eleição n'umas assembléas pelo recenseamento de 1867, e n'outras pelo de 1866, porque se perdêra ou não fizera o de 1867. Qual seria n'este caso a sua decisão? O que n'este caso se faria pela não existencia do recenseamento de 1867, fez-se em Cabeceiras, por estar demonstrado que era, segundo o espirito da lei, preferivel, como já disse, o recenseamento ultimado por mais perfeito.

Permitta-me agora, V. ex.ª, sr. presidente, que eu chame a attenção da illustre commissão e da camara para varios casos que têem sido resolvidos n'esta assembléa, muito em contrario da doutrina rigorosa adoptada no parecer derivada da letra da lei, e em conformidade com a que deixo expendida.

(O orador fez differentes observações sobre as eleições de Villa Nova de Famalicão, Rezende, e 2° circulo de Angola d'esta legislatura, e dos de Cintra e de Moçambique das anteriores.)

Em vista do exposto, sr. presidente, salva a devida consideração aos escrupulosos aferrados á letra da lei, eu tributo profundo respeito á opinião sensata daquelles que a sabem interpretar em conformidade com o espirito d'ella. E não posso deixar de tornar a lembrar á camara que é jury e não juiz n'esta pendencia; á camara, que é soberana representante da opinião e vontade de paiz, não posso deixar de notar, digo, que a minha eleição representa tambem a opinião e vontade da maioria do circulo n.° 18 (Cabeceiras de Basto), como esta camara representa a opinião e vontade da maioria da nação, porque os sentimentos e convicções dos povos que me elegeram foram dos primeiros que se manifestaram (já em novembro) pela necessidade da revolução pacifica que veiu a realisar-se em janeiro; e se esta abriu aos illustres deputados as portas d'esta camara, eu vim para ella na vanguarda dos representantes da nação, e não posso por isso ser expulsado d'aqui por aquelles que representam como eu a vontade nacional e a mesma situação politica; e menos posso ser substituido por aquelle que primeiro mereceu a reprovação dos povos que representava, sem que sáiam atraz de mim todos os outros.

Em tal caso, sr. presidente, em tal caso passe á historia este periodo de illusões, adormeça o paiz, e revivam os que nos antecederam!

O sr. Silveira da Motta: — Tendo de defender este parecer, como membro da commissão e seu relator, vejo-me no estreito passo que sempre receia quem se encontra collocado entre dois fogos.

Com fundamentos diametralmente oppostos é atacada a opinião que emittimos aqui. Querem uns que seja approvada a eleição em todas as assembléas do circulo, e por isso proclamado deputado o sr. Paulino Teixeira Botelho de Sousa;

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allegam outros que a eleição é sómente nulla nas assembléas de Refoios e Pedraça, e que a consequencia logica d'essa annullação é transferir immediatamente o diploma do sr. Paulino de Sousa para o sr. Guilherme de Carvalho; e entre estes dois extremos entende a commissão que esta nullo o acto eleitoral nas duas assembléas mencionadas, e que nulla deve por isso considerar-se a eleição em todo o circulo (apoiados).

Antes de entrarmos na analyse dos argumentos que por lima e outra parte se apresentam, consinta-mo a camara que em brevíssimos termos eu tente expor o estado da questão.

Em quatro assembléas se divide o circulo cuja eleição se discute: Morteiros, Salamonde, Refoios e Pedraça. Nas duas primeiras procedeu-se ao acto eleitoral pelo recenseamento de 1867, nas outras pelo recenseamento de 1868, definitivamente visto e encerrado. Do modo por que se fez a eleição obteve maioria absoluta o sr. Paulino de Sousa, ao qual a assembléa de apuramento conferiu o respectivo diploma; se o recenseamento de 1867 vigorasse em todas as assembléas do circulo, presume-se que sairia eleito o sr. Guilherme de Carvalho. Nem nas actas das assembléas primarias, nem na de apuramento apparece protesto ou reclamação alguma.

Estabelecidas estas circumstancias, tratarei de fundamentar o parecer da commissão, respondendo aos oradores que me precederam; e, posto que muito respeite as suas opiniões, desde já declaro á camara que me parecem perfeitamente improcedentes os argumentos apresentados.

Começarei dirigindo-me ao sr. Paulino de Sousa, que pugna pela validade da sua eleição em todas as assembléas do circulo.

O principal argumento que me parece s. ex.ª apresentou baseia-se em que o recenseamento de 1868 estava já concluido, e sem reclamação nem recurso, devendo por isso ser considerado tão apto para servir então, como depois de 30 de junho do corrente anno.

A esse argumento porém dá cabal e incontestavel resposta o § unico do artigo 18.° da lei de 23 de novembro de 1859, em vista do qual a eleição só podia ser feita pelo recenseamento de 1867 (apoiados). Permitta-me a camara que eu leia o artigo e o respectivo § (leu).

A phrase assim revisto de modo algum póde ser traduzida como o pretende o sr. deputado eleito, e apenas indica que os recenseamentos não são feitos de novo do anno em anno, mas sómente revistos ou emendados em virtude das alterações que as vicissitudes da vida e da sociedade hão de ter necessariamente occasionado. De sorte que o dizer a lei assim revisto é o mesmo que se dissesse assim corrigido ou assim modificado (apoiados).

A portaria de 8 de abril de 1858, portaria cuja doutrina eu aliás em caso algum aceitaria, tambem não invalida o parecer da commissão, porque ainda quando podesse interpretar o artigo 155.° do decreto do 30 de setembro de 1852, não estava nas mesmas circumstancias para com a disposição clara e terminante de uma lei geral, e que é posterior á citada portaria (apoiados).

O argumento por absurdo de que a lei de 23 de novembro de 1859, daria assim o direito do votar aos que já o tivessem perdido, e o negaria aos que já o tivessem alcançado, prova de mais. Qualquer que seja o recenseamento que vigore, hão de sempre votar individuos que tenham já perdido esse direito e serem privados de o exercer outros que já o tenham alcançado.

O que porém mais influe no meu animo para que julgue nulla esta eleição, o que para mim tem ainda mais importancia, se é possivel, do que a letra e o espirito da lei de 23 do novembro, e do que as disposições innegavelmente explicitas do decreto de 17 do fevereiro último e da portaria de 15 do março, é a manifesta injustiça que de certo resultaria de ser feita a eleição em algumas assembléas de um mesmo circulo pelo recenseamento revisto n'um anno, e em outras pelo recenseamento revisto no anno seguinte, recenseamento, em virtude do qual quasi se duplica o numero dos eleitores, que era de 804 e se transforma em 1:545.

Isto é que não é legitimo, nem justo, nem conforme com o principio fundamental, que todos respeitâmos, da igualdade perante a lei (apoiados).

Suppondo ter respondido aos principaes argumentos, apresentados pelo sr. deputado eleito, dirigir-me-hei agora ao sr. Ferreira de Mello, que, conformando-se com o parecer da commissão, na parte em que julga nullo o acto eleitoral nas assembléas de Refoios e Pedraça, entende todavia que a consequencia rigorosa d'essa annullação é ser proclamado deputado o sr. Guilherme de Carvalho.

Peza-me não ver presente o sr. deputado a quem vou responder, mas isso não póde inhibir-me de procurar rebater os seus argumentos.

(Entrou o sr. Ferreira de Mello.)

Ainda bem que s. ex.ª chegou.

O sr. deputado foi demasiadamente áspero na apreciação do parecer da commissão, mas como s. ex.ª declarou logo no principio do seu discurso que não tinha intenção alguma de offender, não responderei a suppostas injurias, e sómente aos argumentos.

Sr. presidente, custa-me deveras entrar n'esta discussão, porque ligações de sympathia e de excellente camaradagem me fariam desejar ver entre os actuaes representantes do paiz o sr. Guilherme de Carvalho. Como porém tive a desgraça de ser eleito pela junta preparatoria um dos membros da commissão de verificação de poderes, e chamo-lhe desgraça, porque d'ahi não resulta senão fadiga e desgosto, não posso declinar de mim o penoso dever de manifestar ao paiz as convicções do meu entendimento, muito embora a despeito de quaesquer outras considerações.

Sr. presidente, á camara, emquanto verifica poderes, cumpre unicamente approvar ou annullar eleições, proclamar ou não deputados os cidadãos aos quaes as assembléas do apuramento tenham conferido os competentes diplomas. Nós n'este ponto não exercemos funcções legislativas; temos de respeitar o direito estabelecido (apoiados).

Disse o sr. Ferreira de Mello que se a lei o não permitte, tambem o não prohibe; mas s. ex.ª não se lembrou que o argumento nos levaria ao absurdo. Da mesma sorte a lei não prohibe a qualquer cidadão approvar eleições nem dar diplomas, e todavia nenhum se julga com o direito de o fazer senão em certos e determinados casos.

Eu só conheço disposições sobre o assumpto no decreto com força de lei de 30 de setembro de 1852, decreto que n'esta parte não foi derogado pela lei de 23 de novembro de 1859; e em vista dellas persuado-me que a questão tem de resolver-se em conformidade com o parecer da commissão.

Pelo artigo 104.° do citado decreto, compete á camara decidir sobre a capacidade legal, inelegibilidade absoluta ou relativa e sobre as incompatibilidades de cada um dos deputados eleitos, e pelo artigo 105.° pertence-lhe ainda decidir da capacidade legal dos deputados eleitos, que todavia não estejam inscriptos em nenhum recenseamento de elegiveis; mas em artigo algum se determina que no caso de se annullar o acto eleitoral em parte do circulo que influa no resultado da eleição, a camara se converta em assembléa de apuramento e assuma o direito de dar diplomas (apoiados).

O artigo 90.°, que o sr. Ferreira de Mello citou, refere-se sómente ao que é preciso para que as mesas de apuramento possam considerar eleitos os deputados, e não poderia por isso ter applicação ao caso de que se trata, ainda quando não estivesse derogado pela lei de 23 do novembro de 1859.

Para os casos de que se trata, sr. presidente, a camara é uma especie de tribunal de revista que se limita a examinar se foram preenchidas as formalidades legaes, se houve conta certa o exacta, e se emfim se cumpriram as disposições da lei. Estudado cada processo, a camara proclama o deputado, se do perfeito cumprimento da lei resulta a validade da eleição ou annulla esta, se as formulas legaes foram insanavelmente postergadas; mas em caso algum arroga a si o direito dos eleitores.

Disse o sr. Ferreira de Mello que admittida esta jurisprudencia, uma mesa qualquer de apuramento poderia dar o diploma de deputado a um individuo que não tivesse alcançado voto algum, ou que apenas tivesse alcançado 20 ou 30 votos, não obstante ter um outro cidadão alcançado 500, e que nós nem ainda assim poderiamos restabelecer a verdade perfeitamente evidente, mas apenas nos limitaríamos a annullar o acto eleitoral.

Não, sr. presidente, se este caso se desse, a camara podia e devia proclamar deputado o cidadão que tivesse realmente alcançado a maioria, porque tendo sido mal contados os votos que lhe pertenciam, outro cidadão, em virtude de tal erro, tinha usurpado o seu logar; mas n'esse caso, notem bem os impugnadores do parecer, não se annullava acta alguma, não se invalidava eleição, não era a camara que lhe creava direito, achava esse direito já creado no processo respectivo (apoiados).

Disse o sr. Ferreira de Mello que outros inconvenientes dimanavam ainda das doutrinas aceites pela commissão. Ainda quando porém s. ex.ª provasse a existencia d'esses inconvenientes, tal demonstração apenas serviria para indicar que a lei n'esse ponto é deficiente, e que precisa ser reformada, e não conseguiria convencer-nos que emquanto é lei não tem de ser cumprida (apoiados).

Allegou tambem s. ex.ª a existencia de um caso julgado, do um precedente admittido n'esta casa, o do sr. Telles de Vasconcellos, a quem foi em tempo transmittido o diploma de um deputado, cuja eleição se julgou viciada. Não ha porém tal precedente, porque o caso que se recorda não é identico e nem se quer analogo áquelle de que se trata.

Com relação á eleição do sr. Telles de Vasconcellos não se tratou de annullar eleição alguma, mas sómente de rectificar operações viciadas e de repor votos, que de feito aquelle cidadão tinha obtido.

(Interrupção do sr. Ferreira de Mello, que não se percebeu.)

Mas note s. ex.ª que o parecer d'aquella commissão esteve a ponto de ser rejeitado, exactamente pelos principios que aqui foram expostos, e que, se ella quiz que fosse approvado, teve de o modificar, fundando-se apenas nas faltas de que a camara podia tomar conhecimento; porque o diploma só tem valor e importancia quando é a copia fiel e verdadeira da acta a que se refere (apoiados).

O caso do sr. Telles e Vasconcellos é exactamente o da hypothese que ha pouco figurei. Pelas actas das assembléas primarias conheceu-se que o sr. Telles de Vasconcellos tinha realmente obtido a maioria dos votos; o diploma fôra por engano ou por fraude dado a outro cidadão. Que fez a camara? Emendou o erro e proclamou deputado o individuo a quem devia ter sido entregue o diploma (apoiados). Mas n'esse caso não foi a camara que lhe creou ou deu direitos alguns; esses direitos, se me é licito usar de uma phrase vulgar no fôro, e por isso de certo familiar ao meu illustre contraditor, saíram do ventre dos autos, existiam no processo eleitoral (apoiados).

Vozes: — Deu a hora.

O Orador: — Eu pouco mais tenho a dizer.

Vozes: — E melhor ficar para ámanhã.

O Orador: — Então peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para a sessão seguinte.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para depois de ámanhã é a continuação da que está dada, e se houver tempo trabalhos em commissões.

Está levantada a sessão. — Eram quatro horas da tarde.

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