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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

No difficil accesso do alguns portos, na impossibilidade, ás vezes, de communicar de terra com os navios que desses portos se approximam, na falta de faceis meios de embarque e desembarque das mercadorias, na insufficiencia das alfandegas, que impede a regularidade e rapidez das transacções, encontra o commercio difficuldades que só póde superar á custa de sacrificios que pesam sobre elle e o paralysam.

Na carencia de vias de communicação accelerada ou ordinaria, na insufficiencia de meios de transporte, na falta mesmo de pontes sobre os rios e ribeiras, que na estação das chuvas se tornam invadeaveis, encontram a industria agricola, as industrias extractivas, o commercio, e mesmo a administração, a policia, a defeza do territorio um constante e desastroso impedimento, que entorpece e aniquila, muitas vezes, os mais energicos esforços. A todos estes males e urgente dar remedio, e o remedio está em desenvolver largamente as obras publicas.

Ha vinte annos foi promulgado um decreto referendado pelo marquez de Sá da Bandeira, no qual, por elevadas considerações de justiça, de administração e de boa economia publica se prohibiu o serviço forçado, denominado serviço dos carregadores; esse serviço, verdadeira iniquidade, que tirava a sua origem do barbaro principio de que derivava a escravidão, consistia em serem obrigados os negros, livres subditos portuguezes, ao penoso trabalho de transporte de mercadorias e mais objectos forçadamente e sem remuneração.

As ordens reiteradas do governo não poderam ainda pôr termo ao abuso condemnado pelo decreto a que acima me referi, e como disse o marquez de Sá da Bandeira no seu livro sobre O trabalho rural africano «ainda presentemente o abuso não cessou, se bem que se pratique debaixo de outras denominações».

O abuso não cessou, mas a sua pratica tem-se ido tornando de dia para dia mais difficil, e com a abolição definitiva do trabalho servil será, felizmente, impossivel. O emprego dos negros como meio de transporte, - é ainda quasi geral nas provincias africanas, e particularmente em Angola, para todas as mercadorias que não são (trazidas do interior pelo Quanza. Esse meio de transporte, insufficientissimo e barbaro, é, alem d'isso, muito caro e muito moroso.

A indolencia tem feito até hoje que se não hajam empenhado esforços para mudar um tão deploravel estado de cousas; não se construiram caminhos, não se lançaram pontes sobre os rios, não se tem ensaiado sequer o emprego dos carros de que tão geral uso se faz em Africa austral, fóra dos dominios portuguezes.

Para se fazer idéa do custo do transporte por meio dos carregadores basta lembrar o que a tal respeito disse o governador geral de Angola n'um officio de 23 de março de 1874, em que responde á portaria de 5 de agosto de 1873, na qual se pediam as indicações geraes sobre viação publica. Tomando por base a estatistica da alfandega de Loanda, calcula o referido governador em 4.245:864 kilogrammas o peso de mercadorias para exportação transportadas do interior pelos negros, e em 1.686:508 kilogrammas as conduzidas pelo rio Quanza: as mercadorias transportadas pelos carregadores negros de Loanda para os concelhos do interior são calculadas em metade das que vem d'esses concelhos para a cidade.

Ao todo o transporte das mercadorias pelos carregadores approximadamente de 6:368 toneladas, o peso de cada carga não excede 45 kilogrammas, são pois necessarios 141:500 carregadores para o transporte d'aquella consideravel massa de mercadorias. Cada carregador custa entre 2$000 a 3$000 réis, ou em media 2$500 réis. Das indicações dadas pelo governador, e de outras informações, póde julgar-se que os carregadores percorrem um caminho entre 100 e 150 kilometros de extensão. Em vista d'estes dados, que não fornecem mais do que a base para um simples calculo approximado, acha-se que a tonelada no percurso total custa de transporte 55$000 réis, ou por kilometro a tonelada approximadamente 440 réis. Este preço exorbitante dos transportes mostra bem os graves inconvenientes que para a producção e o commercio das nossas provincias da Africa tem a falta de meios de communicações. Em S. Thiago de Cabo Verde calcula o governador no seu relatorio de 1874 o transporte de uma tonelada por kilometro em 155,5 réis, o que com rasão elle attribue á falta de boas estradas.

As indicações acima feitas suggerem as seguintes considerações. No caminho de ferro economico para ligar Loanda aos concelhos do interior, na extensão de 150 a 200 kilometros, caminho que, segundo o reconhecimento já feito, importará em 15:000$000 réis por kilometro, despender-se-hão de 2.250:000$000 a 3.000:000$000 réis. Suppondo o preço dos transportes reduzido á quarta parte, e suppondo-o, que não é muito, quando se substitue a locomotiva aos carregadores, que o movimento das mercadorias quintuplica logo nos primeiros annos, segue-se que o caminho de ferro póde desde o principio ter uma receita bruta annual, só das mercadorias, de 200:000$000 a 300:000$000 réis, na hypothese de que o percurso medio seja igualha metade da extensão total da linha, o que no caso de que se trata é uma hypothese racional. E pois evidente que um caminho de ferro em taes condições póde com o auxilio do estado ser facilmente realisado, « que a sua utilidade para a provincia de Angola é incalculavel.

É imperfeita, irregular, sem as condições que o commercio reclama, a navegação do Quanza, e comtudo dois quintos das mercadorias que vem a Loanda descem por aquelle rio, e os factos provam que o estabelecimento de barcos de vapor ali deu um consideravel impulso á actividade agricola e commercial da provincia, augmentando. proporcionalmente os rendimentos aduaneiros. Foi em setembro de 1866 que o primeiro barco a vapor sulcou as aguas do Quanza, e em meiados de 1867 começou a navegação regular.

Se compararmos os rendimentos da alfandega de Loanda, antes e depois d'este facto memoravel, teremos a prova de quanto fica dito, e do fundamento das previsões que, ácerca do resultados auspiciosos que do caminho que se haja de construir, entre Loanda e os fertilissimos concelhos do interior, se podem e devem tirar.

Os rendimentos da alfandega foram os seguintes:

Annos Rendimentos

1863-1864............................ 133:053$630

1864-1865............................ 128:805$675

1865-1866............................ 150:910$721

1866-1867............................ 153:332$981

1867-1868............................ 160:115$113

1868-1869............................ 239:846$826

1869-1870............................ 313:545$101

1870-1871............................ 319:898$893

1871-1872............................ 355:973$594

1872-1873............................ 390:193$773

Os algarismos são, em questões d'estas, prova mais convincente do que todos os argumentes de outra natureza que se possam accumular para levar a convicção aos espiritos mais rebeldes.

A construcção de uma via ferrea de Loanda ao interior do districto, não só é proveitosissima pelas facilidades que dá ao commercio, influindo assim indirectamente na agricultura e nas industrias, é tambem indispensavel para que os cultivadores possam ter as machinas de que precisam para trabalhar as suas terras, e os apparelhos para montarem as officinas e industrias complementares da cultura, principalmente necessarios em região onde a canna, o café e outras producções da mesma natureza são a base de toda a riqueza agricola.

A suppressão dos carregadores tambem será o resultado

Sessão de 2 de março