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SESSÃO DE 27 DE FEVEREIRO DE 1886

Presidencia, do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho (supplente)

Secretarios os exmos. srs.

João José d'Antas Souto Rodrigues
Joaquim Augusto Ponces de Carvalho

SUMMARIO

Não houve expediente. - Teve segunda leitura e foi approvada uma proposta do sr. Ferreira de Almeida, para que a commissão de inquerito parlamentar sobre emigração, eleita na anterior sessão legislativa, seja auctorisada a continuar os seus trabalhos durante a actual sessão, e desde o seu encerramento ou adiamento até nova convocação parlamentar. - Teve segunda leitura o projecto de lei do sr. Consiglieri Pedroso, prohibindo aos deputados e aos pares electivos acceitarem do poder executivo, durante todo o tempo da sua deputação ou pariato, e num periodo de seis mezes a contar da data em que legalmente findarem os seus poderes legislativos, emprego retribuído, commissão subsidiada, ajuda de custo ou qualquer merco honorifica. - Nomeia-se a commissão de redacção. - Apresenta o sr. Marcai Pacheco duas notas de interpellação, sendo uma ao sr. ministro das obras publicas, ácerca da construcção do caminho de ferro de Cazevel a Faro, e outra ao sr. ministro da marinha, ácerca da industria da pesca no Algarve. - O sr. Germano de Sequeira faz algumas considerações sobre os processos de liquidação de contribuição de registo, os quaes jaziam amontoados nas repartições de fazenda, sem se lhes dar andamento, e mandou para a mesa um projecto de lei com o fim de regular este assumpto. - Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - O sr. Consiglieri Pedroso apresentou uma representação da classe dos couductores civis de obras publicas, pedindo que lhes sejam applicadas as disposições do decreto com força, de lei de 18 de novembro de 1885, chamou a attenção do governo sobre a necessidade de revogar a ordem pela qual foram prohibidas as cooperativas que existiam no exercito, e perguntou tambem se o governo estava resolvido a trazer á camara o tratado sobre o protectorado na costa de Dahomey. - Respondem os srs. ministros da guerra e da marinha. - Foi declarada urgente, e seguidamente approvada, uma proposta do sr. Santos Viegas, para que a commissão parlamentar nomeada no anno passado pela mesa, para no intervallo da sessão se occupar de assumptos que interessam às provincias ultramarinas, junto á secretaria do ministerio da marinha, seja auctorisada a continuar os seus trabalhos durante a actual sessão e desde o seu encerramento ou adiamento até nova convocação parlamentar, e para que á mesma commissão seja aggregado o sv. Pinheiro Chagas. - O mesmo sr. deputado chamou a attenção do governo para as graves accusações que se têem publicado num jornal á administração da 6.ª repartição do ministerio da guerra, mostrando a necessidade de se mandar fazer uma syndicancia, para se conhecer o que ha ou deixa de haver de verdade n'essas accusações. - Responde o sr. ministro da guerra. - O sr. Carrilho apresentou um parecer da commissão de fazenda, sobre o projecto de lei n.º 8-A. Este parecer proroga por mais tres annos o praso para a execução da lei de 18 de março de 1881, pela qual foi suspensa a disposição do artigo 6.° da carta de lei de 27 de dezembro de 1870, ficando livre de direitos de importação no continente do reino e ilhas dos Açores o assucar produzido na ilha da Madeira e proveniente de canna cultivada na mesma ilha. - O sr. ministro da fazenda mandou para a mesa uma proposta de lei, auctorisando o governo a adiantar á camara municipal de Lisboa uma quantia igual á consignação que ella deve receber do thesouro publico durante o anno economico de 1886-1887. - O sr. Mendes Pedroso chamou a attenção do governo sobre a necessidade do desdobramento de algumas cadeiras do curso de medicina da universidade de Coimbra, materia sobre que tinha o anno passado apresentado um projecto, que não tivera parecer, e que agora via tambem approvada no relatorio do conselho de instrucção publica, elaborado pelo sr. Jayme Moniz, onde, tratando do ensino medico, se propunha o desdobramento das mesmas cadeiras. Fez tambem algumas considerações sobre a questão agricola. - Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - a sr. Firmino Lopes, por parte da commissão de verificação de poderes, apresentou o parecer sobre a renuncia do sr. deputado Bernardino Machado ao seu logar de deputado pelo circulo de Coimbra, sendo a commissão de voto que se não deve conceder a renuncia pedida. - Este parecer entrou logo em discussão, dispensado o regimento, e seguidamente foi approvado. - O sr. conde de Thomar fez algumas considerações sobre differentes irregularidades e actos lesivos da companhia das aguas, em relação aos consumidores, e chamou a attenção do governo sobre peteassumpto. - Respondeu-lhe o sr. ministro das obras publicas. - Justificaram faltas os srs. Henrique Mendia e Francisco de Campos.
Na ordem do dia continua a discussão do projecto n.º 9 e parecer addicional (orçamento rectificado), usando da palavra, que lhe ficara reservada, o sr. Elias Garcia, - Falla tambem o sr. ministro da fazenda, acceitando um additamento apresentado pelo sr. Arouca.- O additamento ficou para se tomar conhecimento d'elle na sessão seguinte.

Abertura - As três horas e meia da tarde.

Presentes á chamada - 71 srs. deputados.

São os seguintes : - Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Moraes Carvalho, Torres Carneiro, Alfredo Barjona do Freitas, Silva Cardoso, Sousa e Silva, Pereira Corte Real, Antonio Centeno, Garcia Lobo, Lopes Navarro, Moraes Sarmento, Carrilho, A. M. Pedroso, Santos Viegas, Sousa Pavão, A. Hintze Ribeiro, Urbano de Castro, Augusto Poppe, Neves Carneiro, Conde da Praia da Victoria, Conde de Thomar, Conde de Villa Real, Ribeiro Cabral, E. Coelho, Sousa Pinto Basto, Estevão de Oliveira, Fernando Geraldes, Fernando Caldeira, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Francisco de Campos, Castro Matoso, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Baima de Bastos, Augusto Teixeira, Scarnichia, Souto Rodrigues, João Arrojo, Teixeira de Vasconcellos, Sousa Machado, J. Alves Matheus, Ponces de Carvalho, Joaquim de Sequeira, J. J. Alves, Amorim Novaes, Azevedo Castello Branco, Ferreira de Almeida, Borges do Faria, Elias Garcia, Lobo Lamare, Figueiredo Mascarenhas, Oliveira Peixoto, Luiz Dias, Correia de Oliveira, M. J. Vieira, Marcai Pacheco, Mariano de Carvalho, Guimarães Camões, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Pedro de Carvalho, Santos Diniz, Barbosa Centeno, Pereira Bastos, Tito de Carvalho, Visconde de Ariz, Visconde de Balsemão, Visconde das Laranjeiras e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Pimentel, Antonio Candido, Pereira Borges, Cunha Bellem, Fontes Ganhado, Jalles, Augusto Barjona de Freitas, Fuschini, Barão do Ramalho, Barão de Viamonte, Caetano de Carvalho, Lobo d'Avila, Elvino de Brito, Emygdio Navarro, Vieira das Neves, Correia Barata, Sant'Anna e Vasconcellos, Franco Frazão, J. A. Pinto, J. C. Valente, J. A. Neves, Avellar Machado, Correia de Barros, Laranjo, Pereira dos Santos, José Luciano, Simões Dias, Pinto de Mascarenhas, Lourenço Malheiro, Luiz Osório, Pinheiro Chagas, Martinho Montenegro, Pedro Correia, Rodrigo Pequito, Vicente Pinheiro, Visconde de Reguengos e Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão os srs.: - Agostinho Lucio Garcia de Lima, Albino Montenegro, A. da Rocha Peixoto, A. J. da Fonseca, Antonio Ennes, Moraes Machado, Pinto de Magalhães, Almeida Pinheiro, Seguier, Pereira Leite, Avelino Calixto, Bernardino Machado, Sanches de Castro, Carlos Roma du Bocage, Cypriano Jardim, Goes Pinto, Filippe de Carvalho, Mártens Ferrão, Wanzeller, Barros Gomes, Matos de Mendia, Silveira da Mota, Costa Pinto, Melicio, Franco Castello Branco, Ferrão de Castello Branco, Simões Ferreira, Teixeira Sampaio, Dias Ferreira, Ferreira Freire, José Maria Borges, Luciano Cordeiro, Luiz Ferreira, Reis Torgal, Luiz Jardim, D. Luiz da Camara, Manuel d'Assumpção, M. da Rocha Peixoto Manuel de Medeiros, Aralla e Costa, M. P. Guedes, Gonçalves de Freitas, Dantas Baracho, Visconde de Alentem e Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

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Segundas leituras

Projecto de lei

Artigo 1.° É prohibido aos deputados e aos pares electivos acceitarem do poder executivo durante todo o tempo da sua deputação ou pariato, emprego retribuido, commissão subsidiada, ajuda de custo ou qualquer mercê honorifica.
§ 1.° Esta prohibição estende-se até um periodo de seis mezes, a contar da data em que legalmente findarem os seus poderes legislativos.
§ 2.° Não estão comprehendidas nas disposições d'este artigo as nomeações precedidas do concurso por provas publicas, nem tão pouco as promoções no exercito e na armada.
Art. 2.° E um caso de inelegibilidade absoluta para a legislatura que immediatamente se seguir a circumstancia de ter acceitado, seis mezes antes da respectiva eleição, nomeação ou mercê honorifica ou retribuida feita pelo poder executivo.
§ único. Não poderá igualmente ser eleito para uma legislatura, quem dentro dessa legislatura tiver acceitado qualquer emprego retribuido ou mercê do poder executivo.
Art. 3.° Com os dois casos de inelegibilidade especificados no artigo anterior e seu paragrapho continuam a vigorar tambem com relação aos pares electivos os mencionados no artigo 12.° e paragraphos do decreto de 30 de setembro de 1852.
§ 1.° Igualmente continuam em vigor, applicaveis aos pares electivos, as disposições do artigo 19.° do citado decreto de 30 de setembro de 1852 com respeito á perda do logar de deputado.
§ 2.° Uma lei especial de incompatibilidades parlamentares determinará os cargos públicos incompativeis com o logar de deputado e de par electivo.
Art. 4.° Se por algum caso imprevisto de que dependa a segurança ou o manifesto bem do estado se julgar indispensavel derogar as prescripções dos artigos 1.° e 2.°, sómente a camara dos deputados o poderá resolver e ainda assim apenas quando se pronunciem pela derogação dois terços ao menos dos seus membros por votação em escrutinio secreto.
Art. 5.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara, 26 de fevereiro de 1886. = O deputado, Consiglieri Pedroso.
Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de legislação civil.

Proposta

Proponho que a commissão de inquérito parlamentar sobre emigração, eleita na sessão anterior seja auctorisada a continuar os seus trabalhos durante a actual sessão, e desde o seu encerramento ou adiamento até nova convocação parlamentar. = Ferreira de Almeida.
Foi admittida e approvada.

REPRESENTAÇÃO

De conductores civis de obras publicas, pedindo se tornem effectivas para a sua classe as disposições do decreto com força de lei de 18 de novembro de 1885, e a classificação junta á portaria de 17 do fevereiro corrente.
Apresentada pelo sr. deputado Consiglieri Pedroso, enviada á commissão de obras publicas e mandada publicar no Diario do governo.

INTERPELLAÇÕES

1.ª Requeiro, que seja prevenido o sr. ministro da marinha, de que desejo interpellal-o ácerca da necessidade de dotar com providencias regulares e estáveis a industria da pesca por apparelhos fixos nas costas maritimas do Algarve. = O deputado por Faro, Marcçal Pacheco,
2.ª Requeiro que seja prevenido o sr. ministro das obras publicas, de que desejo interpellal-o ácerca da construcção do caminho de ferro de Cazevel a Faro. = O deputado por Faro, Marçal Pacheco.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PUBLICO

Roqueiro que, pelo ministerio da justiça, se informe com urgencia a esta camara qual o andamento que tem tido o processo de queixa intentado contra o escrivão de direito Breda de Mello, da comarca de Vouzella, ultimamente transferido para Paredes de Coura. = Miguel Dantas.
Mandou-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

1.° Dos sargentos graduados, aspirantes a officiaes, Antonio Gomes Pinto Sarmento Osório e Constantino Augusto Ribeiro, pedindo que lhes sejam garantidas as vantagens da lei de 23 de dezembro de 1863.
Apresentados pelo sr. deputado Correia de Oliveira e enviados às commissões de guerra e de fazenda.

2.° Dois requerimentos de officiaes de engenheria, contra as disposições da reforma do serviço das obras publicas, ultimamente decretada.
Apresentados pelo sr. deputado António Centeno e enviados á commissão de obras publicas.

3.° O requerimento de Francisco Epiphanio José Pimenta, pedindo a reforma no posto de capitão com o vencimento da respectiva patente, foi a informar ao governo, a requerimento do sr. deputado Lamare, secretario da commissão de guerra.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Declaro que, por motivo justificado, não compareci á sessão de hontem. = Francisco de Campos.

2.ª Participo a v. exa. e á camara que, por motivo justificado, não pôde hoje assistir á sessão o nosso collega o sr. Henrique de Mendia. = Souto Rodrigues.
Para a acta.

O sr. Presidente: - A mesa nomeou para a commissão de redacção os srs. deputados:

Urbano de Castro.
Correia Barata.
Luciano Cordeiro.
Antonio Candido.
Santos Viegas.

O sr. Germano de Sequeira: - Todos estão de accordo em que a questão de fazenda é a questão palpitante, e por consequência todos tambem devem estar de accordo em envidar todos os esforços para a resolver e para que cada um de per si possa auxiliar a que se resolva completamente. É com este fundamento que eu vou apresentar um projecto de lei que, se não for perfilhado, deve ao menos servir de indicação, como informação, como esclarecimento, ou como em direito melhor logar haja, para que se tomem providencias sobre a matéria e doutrina de que trata o mesmo projecto. O meu projecto de lei versa sobre a contribuição de registo por titulo lucrativo.
A camara sabe que eu já na sessão do anno passado pedi por differentes vezes esclarecimentos sobre este assumpto. A camara sabe que ha muitos processos de contribuição de registo amontoados nos cartórios das repartições de fazenda sem se lhes dar desenvolvimento ou andamento

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algum. É pernicioso o estado de marasmo era que se encontra este ramo de serviço, porque priva a fazenda publica de receber as contribuições que dahi lhe provém, e porque priva o contribuinte de transaccionar de prompto sobre os objectos sujeitos á contribuição. Poderá ainda o contribuinte transaccionar, mas é necessario prestar caução, e a caução importa ispo facto uma nova contribuição. Se poder obstar-se, pois, a que este estado de cousas continue; se com uma medida legislativa o governo poder obstar a que continuem os processos de liquidação de registo parados nos cartórios, essa medida deve ter o apoio de todos, porque se trata nem mais nem menos do que de fazer com que a contribuição entre de prompto nos cofres do estado. Ora é sobre este ponto que versa principalmente o meu projecto.
A maior parte dos escrivães de fazenda desculpam-se de que os processos não têem andamento, primeiro porque não têem o pessoal necessario nas repartições para se poderem encarregar deste serviço e dar-lhe o desenvolvimento necessário; segundo, porque os processos de liquidação envolvem questões de direito difficeis de desenvolver, como são as questões da contagem de graus de parentesco e outras; e terceiro, porque umas outras circumstancias obstam a que os processos tenham seguimento, e de que não desejo occupar-me agora.
Ora, sr. presidente, o meu projecto tende a obviar a todos estes inconvenientes, o meu projecto em curtos paragraphos obvia a que os escrivães de fazenda não dêem andamento aos processos de liquidação, porque, se não têem o pessoal necessario augmenta-o mas sem agumentar as despezas do estado, o que eu vejo que é possível fazer-se sem sacrificio e com vantagem.
Se os processos de liquidação envolvem questões de direito, obvia-se a essa difficuldade, respondendo o ministerio publico logo depois de feitas as avaliações e antes de se proceder á liquidação pelo escrivão de fazenda, e então dará a sua opinião, resolverá as questões que se houverem levantado, indicará a percentagem, que a cada um dos contribuintes compete pagar, bem como a forma de liquidação.
Se os escrivães de fazenda no praso legal não concluírem os processos respectivos, pela primeira vez serão advertidos superiormente, pela segunda vez serão suspensos, e pela terceira vez, que é uma reincidência muito mais notavel, serão demittidos.
Vou ler á camara os artigos do projecto, e só elles não poderem ser perfilhados e discutidos, como sei, devem valer ao menos como informação ao sr. ministro da fazenda, a fim de que esta ordem de serviços públicos saia do estado do abatimento em que se acha.
Sei que existem nos cartórios das repartições de fazenda massos de processos, a que não se dá andamento desde muitos mezes e annos, e devo esperar que o sr. ministro da fazenda, com a vasta intelligencia que lhe reconheço, compenetrando se da urgência deste assumpto, e considerando que augmenta o rendimento do estado, do ao meu projecto a attenção que lhe merecer.
(Leu.)
Creio, portanto, que a doutrina do projecto que acabo de ler torna mais prompto e realisavel o embolso da fazenda publica.
Ha nelle muita realidade.
É assim que eu encaro as cousas neste século de positivismo, e a rethorica fica para as horas vagas. (Apoiados.)
O sr. Presidente: - O projecto do illustre deputado fica sobre a mesa para segunda leitura.
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - O illustre deputado comprehende perfeitamente que não posso desde já emittir a minha opinião ácerca das perguntas apresentadas por s. exa. Não posso, nem devo em face do regimento.
Mas o que eu posso asseverar é que, pelo ministerio da fazenda, se empregam todos os meios para a prompta cobrança, não só da contribuição de registo, mas ainda de todas as contribuições directas, e mais especialmente dos direitos de mercê.
Emquanto ao projecto, logo que parlamentarmente o possa examinar, dar-lhe-hei toda a attenção que elle merece em si e pelas qualidades do illustre deputado apresentante.
Tenho a honra de mandar para a mesa uma proposta de lei que passo a ler:
(Leu.)
Esta proposta vae tambem assignada pelo sr. ministro do reino.
Foi á commissão de fazenda.
A proposta vae pubblicada no fim da sessão a pag. 564.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Mando para a mesa uma representação da classe de conductores civis de obras publicas, pedindo que lhes sejam applicadas as disposições do decreto com força de lei de 18 de novembro de 1885.
N'esta representação vem largamente fundamentadas as rasões deste pedido, que me parece de toda a justiça, para os representantes de uma classe que tão prejudicada se encontra nos seus legitimos interesses.
Apesar de não estar presente o sr. ministro das obras publicas, a cuja pasta diz respeito o assumpto, eu peço aos srs. ministros presentes que transmitiam ao seu collega o conteúdo desta representação, para que s. exa. tome em consideração as rasões allegadas pelos requerentes.
Como a representação está redigida em termos convenientes, eu roqueiro a sua publicação na folha official.
E visto estarem presentes os srs. ministros da guerra o da marinha, farei algumas perguntas a s. exas.
Em primeiro logar desejo saber se o sr. ministro da guerra mantém ou pelo contrario vae mandar revogar, se na o mandou já, a ordem em virtude da qual as cooperativas militares que existiam no exercito foram prohibidas.
Como s. exa. sabe, esta medida, altamente vexatória e prejudicial para os interesses de uma classe tão importante, foi violentamente combatida pelo partido progressista; eu desejo saber agora se o sr. ministro da guerra está disposto a prestar homenagem a esta opinião, que era unanime em todo o partido que s. exa. representa no poder.
Com relação ao sr. ministro da marinha, a pergunta que tenho a dirigir-lhe é a seguinte:
Sabe o sr. ministro da marinha que na occasião de se declarar a crise, em virtude da qual o partido progressista subiu ao poder, estava-se discutindo n'esta camara uma interpelação de que eu era o auctor, e que tinha por fim saber quaes as rasões por que o governo transacto se havia negado a apresentar, com menosprezo da doutrina do artigo 10.° do acto addicional, o tratado de Dahomey á approvação do parlamento.
Esta interpellação generalisou-se, tomando parte n'ella distinctos membros do partido progressista, sendo o primeiro o actual sr. ministro da fazenda e o ultimo, que nem sequer pôde concluir o seu discurso, em virtude de circumstancias que estão bom presentes, o sr. Elvino de Brito, que com a sua provada competencia era assumptos ultramarinos, igualmente se pronunciou contra o procedimento do sr. ministro da marinha anterior, por não ter cumprido o que é expresso e categórico na nossa, lei fundamental.
Alem d'isso ha a circumstancia de o actual sr. ministro da marinha na camara de que é digno membro, ter annunciado uma nota de interpellação ao governo pela, inconstitucionalidade de se haver decretado a organisação do protectorado de Dahomey sem que o mesmo protectorado tivesse sido discutido pela camara.
Desejo, pois, saber se s. exa. hoje tem as mesmas idéas que tinha, ha pouco com
Relação a este assumpto, e no

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caso affirmativo, quando é que s. exa. tenciona apresentar ao parlamento esse instrumento diplomatico a fim de ser por nós apreciado.
Nada mais direi por agora, e peço a v. exa., sr. presidente, que tenha a bondade de inscrever-me para depois dos srs. ministros fallarem.
O sr. Ministro da Guerra (visconde de S. Januario): - Sei que houve cooperativas junto de alguns corpos do exercito, mas ignoro quaes foram as circumstancias que preponderaram no animo do meu illustre antecessor, para dissolvel-as e prohibil-as.
Sem que me comprometia desde já a emittir uma opinião decisiva ácerca deste assumpto, porque ainda não o estudei, nem tenho opinião fundamentada sobre elle, a minha idéa é, se algum beneficio resulta dessas cooperativas para a economia dos fornecimentos dos corpos, e particularmente para a economia domestica dos officiaes, o que convém é tratar de ver o melhor modo de aproveitar esse systema, ou por essa ou por outra qualquer forma, adoptando medidas geraes, que satisfaçam as conveniencias dos interessados, sem prejuizo das da administração publica, para o que procurarei estudar, o mais breve que possa, o assumpto.
O sr. Ministro da Marinha (Henrique de Macedo): - Um dos meus primeiros actos, logo que tomei posse da pasta da marinha, foi officiar ao meu collega dos negócios estrangeiros, pedindo-lhe que me remettesse copia exacta dos termos em que foi feita a notificação às potências estrangeiras do tratado feito com o potentado de Dahomey.
V. exa. e a camara, e bem assim o illustre deputado que me interrogou, bem comprehendem que, se esta notificação, cuja copia apenas recebi ha pouco, quando saia da secretaria para esta camara, e que por isso não tive ainda occasião de ler e estudar, foi feita sem nenhuma espécie de reserva ácerca da approvação pelo parlamento do tratado notificado, o procedimento do governo tem de ser um, e que, só esta notificação foi feita com reserva, o procedimento do governo em relação ao tratado, no tocante á sua apresentação á camara, deverá ser inteiramente outro, porque só no primeiro caso o tratado deve considerar-se como um acto inteiramente consummado.
Em qualquer hypothese, o que eu posso desde já affirmar ao illustre deputado e que, sendo o tratado um instrumento diplomático, que, alem das suas consequências puramente internacionaes, teve tambem consequencias de ordem administrativa, pela creação do novo districto; esse acto, praticado pelo meu antecessor, ha de ser submettido, em obediencia á lei, como tambem todos os outros da mesma origem, que digam respeito a actos reservados á apreciação do parlamento.
Nessa occasião terá a camara, terá tambem o illustre deputado, ensejo opportuno para apreciar e portanto para approvar ou rejeitar as consequencias administrativas e financeiras do tratado, bem como, se o julgar ainda conveniente e opportuno, para apurar as responsabilidades politicas do meu antecessor por um acto que, hoje como hontem, quando simples membro da camara dos pares, continuo a julgar inconstitucional. (Apoiados.)
O sr. Santos Viegas: - Mando para a mesa uma proposta, de que peço a urgencia.
(Leu.)
Já que estou com a palavra, chamarei a attenção do sr. ministro da guerra para um assumpto de alta importância moral e administrativa.
Ha dias, têem sido publicados em um jornal, que não é suspeito para nenhum dos srs. ministros, o Correio portuguez, varios communicados, em que se accusa gravemente a administração da 6.ª repartição militar.
N'esses communicados fazem-se accusações graves, e por tal forma, que estou certo de que, se o sr. ministro da guerra tivesse conhecimento d'ellas; mandaria immediatamente syndicar dos factos accusados para conhecer, se sim ou não aquellas accusações têem fundamento.
Pela minha parte posso affirmar ao sr. ministro da guerra que de algumas das accusações tenho conhecimento perfeito, e sei que ellas são de todo o ponto fundamentados.
O sr. ministro da guerra, como todos os seus collegas, é de certo partidario dos inqueritos e syndicancias, com o fim de se apurar a verdade sobre factos com que muitas vezes se faz carga a certos e determinados empregados.
Sendo pois assim, e sendo eu igualmente apologista dos inqueritos em certos casos, nenhuma duvida tenho em chamar a esclarecida attenção do sr. ministro da guerra, pedindo-lhe que mande proceder immediatamente a esse inquerito, porque estou certo que d'elle ha de resultar para o sr. ministro a convicção de que tal administração não pôde continuar, e que quem a dirige não póde estar á testa da repartição a que me refiro, porque os factos por tal forma se me afiguram graves, que sem duvida igualmente o serão ao animo do illustre ministro.
Declaro á camara que não desistirei da palavra, nem deixarei de tratar d'este assumpto emquanto tiver assento nesta casa, e emquanto o sr. ministro da guerra não der explicações categoricas sobre os factos de que o empregado que dirige aquella repartição é accusado.
Aguardo a resposta do sr. ministro da guerra, e se julgar opportuno pedirei de novo a palavra.
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que a commissão parlamentar nomeada o anno passado pela mesa, para, no intervallo das sessões, se occupar de assumptos que interessem as provincias ultramarinas, junto á secretaria do ministerio da marinha, seja auctorisada a continuar os seus trabalhos durante a actual sessão, e desde o seu encerramento ou adiamento até nova convocação parlamentar.
Proponho mais que a essa commissão seja aggregado o sr. deputado Pinheiro Chagas. = O deputado, Santos Viegas.
Foi admittida.
Votada a urgencia foi approvada.

O sr. Ministro da Guerra (visconde de S. Januario): - Posso asseverar ao illustre deputado que não tenho conhecimento dos factos a que s. exa. alludiu com relação a irregularidades que se dizem commettidas na 6.ª repartição militar.
Entretanto, attendendo a que parece serem graves, segundo s. exa. diz, as accusações que ali se fazem, eu tratarei de indagar como as cousas se têem passado em relação aos pontos arguidos nesse jornal, procurarei obter conhecimento da verdade dos factos, que por emquanto não posso affirmar se são ou não verdadeiros, e posso assegurar ao illustre deputado que hei do providenciar de modo que, se houver irregularidades, ellas cessem immediatamente, dando-se assim satisfação á moral e á imprensa.
O sr. Carrilho: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda, sobre o projecto n.º 8-A, prorogando por mais tres annos o praso para a execução da lei de 18 de março de 1881, pela qual foi suspensa a disposição do artigo 6.° da carta de lei de 27 de dezembro de 1870, ficando livre de direitos de importação no continente do reino e ilhas dos Açores o assucar produzido na ilha da Madeira e proveniente da canna cultivada na mesma ilha.
A imprimir.
O sr. Mendes Pedroso: - Eu tinha pedido a palavra para dirigir uma pergunta ao sr. ministro do reino, que não vejo presente; mas como me parece que, pela natureza do assumpto, qualquer membro do governo me poderá responder, vou usar da palavra, mesmo na ausência daquelle illustre ministro.
Ha sessão do anno passado tinha eu mandado para a

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mesa um projecto de lei em que propunha o desdobramento, nas escolas medicas, das cadeiras de physiologia e de hygiene e desta só na universidade.
Esse projecto foi remettido á commissão respectiva, ma por mais diligencias, que eu fiz na sessão passada, não logrei alcançar que a commissão desse parecer sobre o projecto, de sorte que eu estava persuadido que tinha andado enganado, e que aquelle projecto, que eu pensava ser uma necessidade inadiavel, não o era realmente.
No principio, porém, da sessão legislativa deste anno, foi publicado no Diario do governo o relatorio do conselho superior de instrucção publica, assignado pelo sr. conselheiro Jayme Moniz. Nesse relatorio trata vá-se em primeiro logar da reforma do curso de theologia, e eu comprehendi bem que os assumptos de ordem moral devessem ter primazia a qualquer outros; mas com respeito á reforma dos estudos medicos, eu vi com surpreza, para mim muito agradavel, que na primeira parte d'aquelle relatorio, em que o sr. conselheiro Jayme Moniz alliava o brilhantismo de forma a um grande fundo de erudição, demonstrava-se primeiro que tudo a necessidade do desdobramento exactamente das duas cadeiras a que eu me referia no meu projecto. Foi então que eu comprehendi que efectivamente não tinha andado tão mal avisado em apresentar aquelle projecto.
Eu julguei que aquelle relatorio viria de alguma maneira era harmonia com as idéas do illustre ministro do reino n'aquella epocha, o sr. conselheiro Barjona de Feitas, e fiquei esperando que s. exa. apresentasse em qualquer dia ao parlamento um projecto de lei mais ou menos em relação com o que se dizia naquelle relatório, e que era realmente uma reforma importante e completa, pois não só se propunha a creação de nova cadeira, como o estabelecimento de laboratórios, e de tudo em fim que póde constituir uma verdadeira reforma do ensino medico.
O que eu desejava, pois, perguntar ao sr. ministro do reino, é se s. exa. tenciona apresentar ao parlamento algum projecto de lei para a reforma do ensino medico, mais ou menos em harmonia com aquelle que se propunha no referido relatório.
Mas, sr. presidente, logo no começo da sessão em que se apresentou aqui, pela primeira vez, o actual governo, ouvi a um dos srs. ministros, não sei se ao sr. ministro do reino ou da fazenda, a declaração de que, emquanto se não podessem realisar as economias que s. exa. entendia que era indispensavel fazer, não devia o governo propor reformas que trouxessem augmento de despeza. Realmente contristou-me um pouco esta declaração. Ha reformas tão importantes que não se podem adiar de modo algum.
Eu entendo que se devem fazer as economias possiveis; e apesar de eu ser um apostolo convicto das economias, entendo, comtudo, que ellas se devem realisar em todos os serviços que devam considerar-se menos uteis e sobretudo superfluos; mas realisar economias em assumptos de serviço publico e em instituições taes como instrucção superior, cujas reformas eu creio inadiáveis, é seguir um processo similhante áquelle que empregam os lavradores que não alqueivam, nem estrumara as terras, nem escolhem a semente, que não fazem a sementeira em tempo apropriado, e depois se queixam de que a colheita é escassa.
Por isso não posso deixar de insistir na necessidade de se fazer alguma despeza mais com o serviço da instrucção superior.
Os professores da instrucção superior terem vencimentos iguaes aos que tem qualquer empregado de fazenda, da alfandega e outros funccionarios, que não têem habilitações comparáveis às destes professores, e que nem sempre, precisam de um concurso para chegarem aos seus logares, é impossível. O sr. Marianno de Carvalho, cuja illustração sou o primeiro a admirar, professor distinctissimo de uma escola de instrucção superior, vence 800$000 réis annuaes de ordenado apenas, igual, se não interior, ao de um escrivão do fazenda de 2.ª classe!!
É lamentável. Isto não póde ser; é necessario entrar em reformas mais francas a este respeito, que remunerem equitativamente o mereccimento e o trabalho.
Sabe v. exa. quanto vence um professor de medicina em França? 15:000 francos ou 2:700$000 réis, e no Brazil 2:400$000 réis. Nós conservâmos os professores na miseria que acabo de apontar. É necessario fazer com que os professores tenham a independencia que devem ter. Nós estamos vendo que em geral elles são distinctissimos; e basta lançar os olhes para os que aqui estão no parlamento, onde constituem a plêiade mais importante dos nossos oradores, para provar o que a seu respeito affirmo.
A consequencia que deriva desta remuneração insufficiento e obvia, e observa-se frequentemente. Uma grande parte dos professores, e, porventura, dos mais talentosos, tomam o magisterio superior como mais uma habilitação, como um principio de vida para depois exercerem uma profissão mais lucrativa; por isso, Logo que um ensejo favoravel se lhes offerece, abandonam o magisterio e vão collocar-se, uns no serviço superior das alfandegas, outras no da fazenda publica, este no fôro, aquelle na direcção de uma companhia, ou na administração de grandes propriedades, etc.
O anno passado ouvi dizer que um professor substituto da universidade estava regendo simultaneamente tres cadeiras de ensino superior. Isto assim não póde continuar. É necessario tomar providencias serias.
Pergunto, pois, ao governo se está disposto a fazer alguma reforma, no sentido que acabo de indicar e que julgo inadiavel.
Aproveito a occasião, visto estar com a palavra, para fazer algumas considerações sobre a questão agricola.
A questão da agricultura é sem duvida a mais importante para o paiz, porque não só deve produzir para o estado um dos seus maiores rendimentos, mas constitue tambem, quando bem tratada, a felicidade da nação, por ser a nossa principal industria.
O sr. Arouca fez ha poucos dias considerações muito sensatas, que eu tive o prazer de applaudir. S. exa. declarou que a questão agricola precisava, para ser resolvida, que se nomeasse uma commissão especial para inquerir das necessidades da agricultura. Concordo com esta idéa, e entendo que essa commissão não deve ter carracter politico, e deve ser composta dos homens mais conhecedores do assumpto, que sejam sabios e praticos.
Faço estas considerações, porque fui eu quem no anno passa-lo propuz a commissão de inquerito parlamentar. Essa comissão, como todos sabem, não deu o resultado que se esperava. Essa commissão reuniu apenas uma vez...
O sr. Fuschini: - Não se fazem inqueritos sem meios. O governo não os quiz dar, nada se pôde fazer.
O Orador: - Não trato agora de avaliar quaes as rasões por que o inquerito não deu bom resultado. Quando propuz a nomeação da commissão de inquerito, fiz, na reunião em que só instastou, um certo numero de considerações, e não tive duvida em assinalar que algumas das causas da decadencia da agricultura esvtavam tambem nos proprietarios e nos agricultores.
Sou medico ha trinta annos, e nunca mandei dourar as pílulas. Não o fiz tambem nessa occasião. Talvez fizesse
mal.
Não quero ter a pretensão vaidosa de que essa fosse a causa de não ter continuado a funccionar a commissão. Outras seriam as causas, e entre ellas talvez a que apontou o sr. Fuschini. O que é certo é que ella não deu resultado,
eu tanto previa que assim succedesse, que ainda o anno passado propuz que os trigos estrangeiros tivessem um imposto um pouco superior ao que já tinham, sem augmentar o imposto sobre as farinhas, para assim poderem mais fa-

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cilmente serem adquiridas pelos donos das fabricas de moagens.
Essa proposta não teve seguimento. Entretanto vi que o sr. Arouca pende para estas idéas, posto não chegasse a apresentar proposta n'este sentido.
Concordo em que deve haver uma commissão que estude este negocio com attenção, que se sirva de todos os meios para apresentar ao governo uma opinião segura, em que elle se funde para propor medidas proprias e efficazes, a fim de levantar a agricultura do abatimento em que está.
Parece-me que esta medida é mais proveitosa do que a da creação do ministerio de agricultura. Parecia-me que estes trabalhos, que pesam agora sobre os hombros vigorosos de um ministro de uma actividade extraordinaria, de uma grande intelligencia e de um nunca desmentido patriotismo, como o sr. Emygdio Navarro, estão muito bem entregues, e receio que, passando esta cruz para outros hombros menos robustos, não poderá ser tão bem sobraçada como por s. exa. (Apoiados.)
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Responderei em muito poucas palavras ao illustre deputado.
Eu não estava em Lisboa quando o conselho superior de instrucção publica se reuniu em sessão plenaria, mas estava quando se assignaram algumas consultas ao governo sobre reformas, que se julgavam uteis, de diversos ramos de instrucção publica, especialmente de iustrucção superior.
Tive a honra de assignar uma consulta a respeito das escolas medicas, no sentido indicado pelo illustre deputado, e assignei-a "conforme". Por consequencia já s. exa. comprehende a minha opinião sobre o assumpto.
E agora devo acrescentar que o governo pensa muito a serio na reforma do ensino superior.
Estou de accordo com o illustre deputado em que este ensino está incompleto, tendo aliás professores distinctissimos. Póde-se dizer que este ensino está num estado quasi cahotico, e ao mesmo tempo que os professores estão mal pagos.
Creio que se se acabar com duplicações que são escusadissimas, duplicações que se dão até aqui em Lisboa, e se montarmos melhor o ensino superior, poderemos remunerar mais equitativamente os professores sem sacrificio da fazenda publica.
Tambem estou de accordo com o illustre deputado em que é necessario alqueivar as terras, estrumal-as e semeal-as para se poder tirar d'ellas uma boa colheita. Mas é necessario não alqueivar fora do tempo, não estrumar contra os principios da sciencia, e não deixar cair a semente sobre as pedras, porque vem as aves do céu e comem-na. (Apoiados.) Portanto alqueivemos, estrumemos e semeemos, mas de modo que possamos tirar uma colheita profícua. (Apoiados.)
Quanto á questão agrícola a que s. exa. se referiu devo dizer que a idéa do governo não é só nomear uma commissão especial para estudar os negocios da agricultura, mas, pelo pensamento que temos ácerca da direcção dos trabalhos do ministerio das obras publicas, devendo sobejar uma parte importantissima do illustrado pessoal technico d'aquelle ministerio, entendemos que se póde empregal-o em fazer um inquerito agricola minucioso e scientifico como deve ser. (Apoiados.)
Pelo que respeita á questão da importação do trigo e das farinhas, que é uma questão grave, não passa pela idéa do governo proteger a industria da moagem em detrimento dos interesses do thesouro e da agricultura. É negocio muito para pensar se convirá elevar o direito sobre o trigo, baixando o das farinhas. Se isto se não fizer com muita cautela póde acontecer que não protejamos a industria da moagem, nem a agricultura, que vamos importar farinhas falsificadas, e que fiquemos privados dos resíduos da moagem uteis para a alimentação do gado. (Apoiados.)
Concordo com s. exa. em que é urgente resolver o problema da crise cerealifera, e digo crise cerealifera, porque entendo que ha crise, já o disse e sustento. Mas isto não é uma questão que se possa resolver de leve, é melhor estudal-a, para depois se tomar uma resolução que todos possam applaudir e que possa ser proveitosa para o paiz.
O sr. Mendes Pedroso: - Agradeço a resposta do sr. ministro.
O sr. Firmino João Lopes (por parte da commissão de verificação de poderes): - Mando para a mesa um parecer sobre a renuncia pedida pelo sr. deputado Bernardino Machado.
O parecer concluo pela não acceitação d'essa renuncia.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento, para que este parecer entre já em discussão.
Consultada a camara, resolveu que se dispensasse o regimento.
Leu-se na mesa o parecer.
É o seguinte:

PARECER

Senhores. - A vossa commissão de verificação de poderes foi presente o officio dirigido á presidencia desta camara, pelo deputado por Coimbra, circulo n.º 40, Bernardino Luiz Machado Guimarães, em que pede licença para resignar o seu logar.
Considerando que o artigo 108.° da lei de 30 de setembro de 1852 diz terminantemente que o deputado, depois de tomar assento na camara, não póde renunciar o seu lugar sem approvação da mesma camara;
Considerando que o sr. deputado Bernardino Luiz Machado Guimarães tomou assento nesta camara;
Considerando que o motivo de doença que impedia a comparência do illustre deputado cessou:
Julga a vossa commissão, que não deve ser approvada a renuncia pedida.- J. A. Neves = Frederico Arouca = Firmino J. Lopes = Moraes Carvalho = Pereira Leite, relator.
Foi approvado.
O sr. Conde de Thomar: - Como a hora está bastante adiantada, farei quanto for possível para resumir o que tenho a dizer ao sr. ministro das obras publicas.
O anno passado annunciei eu uma interpellação ao sr. ministro das obras publicas, o sr. conselheiro Fontes, então presidente do conselho, sobre a applicação do artigo 70.° do regulamento da companhia das aguas de 30 de outubro de 1870, a respeito da canalisação da agua dos particulares.
Nunca me foi possível realisar essa interpellação, naturalmente porque motivos de serviço publico impediram s. exa. de comparecer na camara para esse fim.
Ultimamente tinha conversado particularmente com o sr. Thomás Ribeiro, e
tinha-lhe annunciado que desejava dirigir-lhe algumas perguntas com relação a este assumpto; mas, como s. exa. saiu do ministerio, não pude fazer essas perguntas.
Hontem tive a honra de annunciar ao sr. ministro das obras publicar, que desejava dirigir-lhe algumas perguntas com relação ao assumpto.
Servir-me-hei apenas da documentos que me foram fornecidos pelo ministerio das obras publicas, sendo o primeiro um officio assignado pelo sr. Fontes Pereira de Mello, no qual se remettem differentes documentos que pedi, e diz.
"Cumprindo-me declarar a s. exa., em relação á ultima parte d'aquelle requerimento, que não existe informação do fiscal technico do governo, junto d'aquella companhia, sobre a applicação e execução do dito regulamento.
Faço leitura d'este documento, para me poder servir de base às perguntas que tenho a dirigir ao sr. ministro.
O outro documento é da procuradoria geral da corôa

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fazenda, e é datado de 26 de julho de 1879. Lerei apenas a parte que diz respeito ao assumpto em questão.
"O direito do governo é incontestavel. O exercício deste direito deve ser determinado por considerações de interesse publico, e de conveniência municipal, mas essa questão só o governo a pude resolver".
Sr. presidente; o artigo 70.° do regulamento da companhia das aguas diz o seguinte:
"Os encanamentos feitos antes da publicação do presente regulamento completar-se-hão e modificar-se-hão nos termos d'elle, com excepção do artigo 21.° e seus paragraphos, de que são dispensados.
§ unico. A esta modificação precederá sempre o traçado ordenado no artigo 14.°"
E sobre este ponto que eu desejo chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas, e mostrar em breves considerações quanto tem sido vexatoria para o municipio de Lisboa a interpretação que a direcção da companhia das aguas tem dado a este artigo.
Todos sabem que na origem da companhia das aguas foi deixado á liberdade de cada um fazer os encanamentos, sempre debaixo do traçado dado pela companhia, ou executal-os por conta da mesma companhia.
Mais tarde a companhia entendeu dever submetter um novo regulamento á approvação do governo, em virtude do qual a canalisacão se tornava obrigatória e, por assim dizer, exclusiva da companhia, porque as condições que a companhia impõe pelo regulamento approvado em 30 de outubro de 1870 são de tal ordem, que os particulares que quizerem fazer o encanamento por sua conta luctam com tantas dificuldades, que são quasi insuperaveis.
Eu tive occasião de apreciar estas difficuldades, porque, apesar da boa vontade e de toda a dedicação e amisade de alguns dos directores da companhia, e das ordens terminantes dadas á administração da companhia, - chamar-lhe-hei a machina da companhia -, luctei com as maiores difficuldadcs para poder realisar o encanamento por conta própria, porque se levantavam difficuldades de toda a ordem sobre traçado, espessura da tubagem, modelos de torneiras, por isso que a companhia tem o cuidado de exarar no seu regulamento qual o diâmetro dos tubos, e sua espessura, e o modelo das torneiras, etc., etc., etc., que devem servir para os seus encanamentos.
Ora, como a companhia das aguas tem o exclusivo, para assim dizer, da collecção do encanamento nas casas dos particulares, pelas difficuldades que o particular tem de os fazer por conta propria, é claro que o commercio não trata de arranjar nem torneiras, nem portinholas, nem torneiras de segurança do modelo da companhia.
Muitas das peças empregadas nas catalisações não se encontram no commercio, por consequencia o particular que quer fazer obra por sua conta tem de recorrer a expedientes que são morosos.
Pela nossa habitual inercia para evitarmos algum incommodo vamos-nos lançar nos braços da companhia, que faz mais depressa mas muito mais caro.
Acresce tambem que o governo approvou no regulamento de 1880, uma tabella do preço corrente da tubagem, das torneiras, e todos os accessorios necessários, e isto quando o preço do chumbo era o dobro do que é hoje; mas a companhia mantém, no interesse proprio, este mesmo preço, o que é contra toda a equidade.
Tive occasião de me informar nas fabricas de Lisboa e de ver que todas as vezes que um individuo comprava mais de 1:000 kilogrammas de tubagem, as fabricas fazem-lhe um desconto. Quando se trata de um certo numero do toneladas, esse desconto póde chegar muitas vezes a 50 por cento, e no emtanto a companhia das aguas continua a fornecer a tubagem pelos mesmos preços que a fornece ha muitos annos. Isto é um vexame para os munícipes de Lisboa, que não têem culpa que a administração da companhia das aguas não fosse tão correcta, nem tão bem montada a sua administração como actualmente está e que só pretenda ressarcir os prejuízos primitivos com os lucros tirados na collocação e modificações dos encanamentos.
O publico, confiando nos contratos que fizera com a companhia, fez os encanamentos, ou foram feitos pela companhia, e mais tarde vem a companhia e diz - modifique o encanamento á sua custa e como eu entendo mais util para os meus interesses, em vista do artigo 70.°, de modo que a companhia lança sobre os nmnicipes de Lisboa um grande encargo, porque se sobrecarregam os proprietarios com uma despeza forte, os quaes muitas vezes reclamam dos inquilinos um augmento de renda, aggravando assim a situação de todos.
É um estado no estado.
Não me parece que seja justo que a companhia das aguas tire uma somma de 20:000$000 a 30:000$000 réis de lucros sobre os encanamentos que faz nas casas dos particulares. Nós não temos culpa que a companhia tivesse tido desastres no principio; a culpa não é nossa, e os particulares não devem ser obrigados a pagar com os lucros auferidos com os encanamentos a péssima administração que houve na companhia.
Mas, como diz o sr. procurador geral da corôa na sua consulta, deve-se attender aos interesses do municipio e dos particulares; e quer v. exa. saber como foram attendidos?
O presidente da camara municipal de Lisboa dirigiu ao governo o seguinte officio antes da approvação do regulamento.
Diz o presidente da camara municipal no seu officio de 20 de agosto de 1883:
"A esta camara não compete apreciar se o governo cumpriu ou não o seu contrato, como accentua o digno presidente da direcção; menos se os proprietarios empregaram bons ou maus argumentos; se os queixosos não são tantos quantos eram precisos para o digno presidente da direcção achar que tinham rasão; e ainda menos se a companhia lucra ou perde. Tudo isto é de competencia alheia.
"O ponto não está no valor mas no exemplo, porque uma arbitrariedade é consequencia de muitas outras.
"O fiscal do governo fez causa commum com a companhia das aguas, e espantou-se de que só apoz tres annos appareça a reclamação.
Tudo isto não é para admirar e mostra quanto os interesses do publico são pouco attendidos pelos poderes publicos. Já o anno passado eu tinha annunciado uma interpellação, a qual não pude verificar-se, e foi preciso que se d'esse agora uma circumstancia extraordinaria para eu poder fazer algumas perguntas ao sr. ministro das obras publicas ácerca deste importante assumpto.
Devo notar á camara que o anno passado tive uma questão com a companhia das aguas relativamente á directriz de uma canalisação. Dirigi uma reclamação ao digno fiscal do governo e nada consegui. Passado pouco tempo, encontrando s. exa. nesta camara, s. exa. respondeu-me que eu requeri fora de tempo. De sorte que o publico deve conhecer a legislação da companhia, a legislação tributaria e milhares de excepções, o que é inteiramente impossivel.
Quando se requer a uma companhia nos devidos termos, a reclamação deve ser attendida; se a companhia das aguas tem feito á cidade de Lisboa beneficios que são incontestaveis, tambem o municipio tem direito a ser tratado com uma certa benevolencia. (Apoiados.)
Mas a companhia não se limita só a exigir modificações nos encanamentos dos particulares. Ha uma innovação que data do anno passado, para a qual chamo a attenção do illustre ministro das obras publicas, e que realmente não póde continuar. E preciso que o fiscal do governo fiscalise, aliás não sei para que servem os fiscaes do governo junto das companhias. (Apoiados.) A innovação é esta.
O proprietario é obrigado a fazer o encanamento no seu predio, com tantos ramaes, quantos são os quartos habitados. O proprietário faz o encanamento. Mas ha um inqui-

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lino a quem convém ter o contador um metro mais abaixo ou mais acima, ou n'outro sitio que não seja a cozinha, que é o indicado pela companhia. O inquilino requer á companhia que lhe mande fazer essa modificação, estando prompto e disposto a pagar a despeza.
E sabe. v. exa. o que a companhia responde desde o anno passado? O proprietario que se responsabilise pela despeza, porque o inquilino póde mudar-se no fim de seis mezes, e nós não podemos perder a despeza que fizemos com essa modificação. Mas o que tem o proprietário com isso? E uma nova despeza que recáe sobre esse proprietário, que não póde ser responsável pela despeza feita, caso o inquilino de má fé se retire sem querer pagar a despeza feita e que a companhia atirou para a bolsa do proprietario.
Chamo, portanto, a attenção do sr. ministro das obras publicas, não para o que já está feito, porque não tem remedio, mas para o que se póde evitar. Os proprietarios já foram obrigados a modificar o encanamento, e eu creio que não está longe de se realisar a previsão de que a companhia entenda dever modificar o seu systema de encanamento e a distribuição das aguas. O consumo augmenta consideravelmente, e a companhia mais dia menos dia será obrigada a retirar parte das avencas, porque não tem agua sufficiente para o tempo de estiagem em Lisboa, especialmente agora, com a nova área da cidade, fornecendo agua para os Olivaes e outros pontos.
A companhia póde, talvez, querer recorrer ao systema inglez, que é estabelecer depósitos, segundo o numero de indivíduos que habitam as casas, e distribuindo uma certa e determinada quantidade de agua, o que ha de trazer necessariamente uma nova modificação nos encanamentos.
E para este ponto e por este motivo que chamo a attenção do sr. ministro das obras publicas, esperando que s. exa., que entra de novo nos conselhos da coroa, ha de zelar com todo o vigor os interesses do municipio de Lisboa, não desprezando todavia os interesses da companhia, que são santos e justos, como justos são os interesses dos particulares.
O que não podemos é estar todos sujeitos às modificações que a companhia entenda dever impor-nos. (Apoiados.)
O sr. Presidente: - Vae dar-se conta da ultima redacção do projecto n.º 5.
Foi approvada, e o projecto enviado para a outra camara.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - (O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)
O sr. Lamare: - Mando para a mesa, por parte da commissão de guerra, o requerimento de Francisco Epiphanio José Pimenta, que pede melhoria de reforma a fim de ser enviado ao governo para informar. A commissão aguarda que venham essas informações para sem demora resolver este assumpto como for conveniente.

ORDEM no DIA

Continuação da discussão do projecto n.º 9 e parecer addicional (orçamento rectificado)

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Elias Garcia para continuar o seu discurso.
O sr. Elias Garcia: - Sr. presidente, na sessão anterior tinha indicado que me parecia mais conveniente discutir primeiro outra proposta de lei que tem relação com este assumpto; entretanto, pondo essa questão de parte, entremos no exame do orçamento rectificado.
Este orçamento rectificado, como disse na ultima sessão, é elevado pela commissão de fazenda á importância de 42.117:892$147 réis.
Lembro á camara que, no anno passado, quando o sr. ministro da fazenda apresentou aqui o orçamento rectificado, esse orçamento attingiu a cifra de 40.000:000$000 réis; nessa occasião, um dos cavalheiros que hoje se senta nas cadeiras do governo, levantou um grito de verdadeiro terror, aqui, no parlamento, e a ponto que no parecer a commissão dispoz as cousas para não apparecer aquella importância elevada até 40.000:000$000 réis e ficasse abaixo, talvez para assim serenarem um pouco os receios e as duvidas que tinham sido levantadas por parte d'aquelle dos nossos antigos collegas.
Este anno, ao apresenta-se o orçamento rectificado, saiu o mesmo grito de terror; mais tarde a commissão não se deteve diante destes terrores e acrescentou a verba a ponto, que ella passou de 41.061:918$102 réis a 42.117:892$147 réis, isto é, augmentou 455:974$045 réis. E agora, como vamos ver, ainda o orçamento rectificado é mais augmentado, e, comtudo, já os gritos de terror se não soltam! E bom que todos nos acostumemos a viver no meio dos perigos; o que de repente nos surprehende, é o que nos assusta, depois habituâmo-nos de tal modo com o perigo que adiantando-nos para o abysmo, ninguém receia cair n'elle! Ora ainda bem, sr. presidente!
Mas é notavel que a cifra total, comprehendendo a despeza ordinaria e a extraordinaria, fosse elevada em mais réis 455:974$040; e o que é ainda mais notavel, e para aqui peço a attenção da camara, é que esse augmento se fizesse em parte nas despezas ordinarias que subiram mais 211:774$040 réis. Quer dizer, augmento de 211:174$045 réis em relação ao orçamento rectificado apresentado pelo governo, porque o orçamento do governo já apresentava o augmento de 773:441$387 réis.
As despezas ordinarias cresceram desde o ultimo orçamento até este, cerca de 1.000:000$000 réis. A despeza ordinaria cresceu porque o governo apresentou no seu orçamento rectificado o augmento de 773:000$000 réis e a commissão, corrigindo esse orçamento, augmentou-a em 211:000$000 réis.
Pelo que respeita ás despezas extraordinárias, o governo apresentava no orçamento a importancia de 7.284:836$903 réis, e a commissão modificou, corrigindo para mais esta despeza. E assim attingiu 7.529:036$903 réis.
O deficit ordinario, que segundo o orçamento rectificado do sr. Hintze Ribeiro era de 1.679:509$699 réis, passou a ser, segundo a commissão de 1.877:708$744 réis. Ao passo que no orçamento apresentado pelo sr. Hintze Ribeiro as sommas auctorisadas a levantar por emprestimo, ascendiam a 8.964:346$602 réis, segundo o parecer da commissão ascendem a 9.406:745$647 réis.
É certo que á primeira vista, n'esta modificação apresentada pela commissão do orçamento, sobre o orçamento rectificado, se os terrores que podia apresentar o orçamento rectificado eram fundados, agora deviam ser maiores, porque o augmento é maior, subiu o desequilibrio entre as receitas e as despezas ordinarias. É de notar, porém, que a commissão no seu parecer, para de alguma maneira não aflligir o nosso espirito, nos diz que este deficit, se é calculado em importancia superior a 1.800:000$000 réis, segundo ella suppõe, as cousas não se hão de passar assim, porque em vez de mais de 1.800:000$000 réis no fim de junho, o deficit ou desequilibrio orçamental ordinario, chegaria apenas a 1.000:000$000 réis.
Quer dizer, estando nós na actualidade, a calcular o que se passará daqui a quatro mezes, calculamos no orçamento um deficit de 1:870 e tantos contos, e temos a esperança de que estes 1.800:000$000 réis se reduzam a 1.000:000$000 réis!
Peço licença para dizer, que me parecia conveniente fazer o calculo mais proximo da exactidão, porque só tratamos de fazer um calculo approximado de como as cousas se hão de passar e estamos a quatro mezes de distancia e calculámos de um certo modo, que o deficit será de 1.800:000$000 réis entre receitas e despezas ordinarias, comtudo temos a confiança ou pelo menos, a bem

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fundada esperança de que esse desequilíbrio se induzira apenas a 1.000:000$000 réis.
Portanto, não nos assustemos com os 1:800 contos porque naturalmente a importancia não ascendera senão a réis 1.000:000$000
Ao menos isto é para nos consolar.
O governo que acceita estes calculos da commissão, poderá chegar aqui para o anno e dizer-nos, que operou uma grande e extraordinaria reforma, porque no orçamento do anno anterior estava calculado o desequilibrio entre as despezas e as receitas ordinarias em mais de 1:800 contos, e em uma gerencia apenas de quatro mezes reduzira o desequilibrio a 1.000:000$000 réis, o que será facto digno de verdadeira admiração e de innumeros louvores, ficando o paiz sabendo que sob o dominio dos cavalheiros que hoje estão á testa do governo, o desequilibrio orçamental ordinario, que fôra calculado em mais de 1:800 contos, fôra reduzido a 1.000:000$000 réis.
Mas vamos a ver mais minuciosamente como é que estas cousas se passam, e peço licença para ir pouco a pouco fazendo estas indicações, unicamente para destrinçar o que entendo ser da responsabilidade dos antigos ministros e o que entendo ser da responsabilidade dos actuaes, porque do que elles não forem responsaveis de certo lhes não peço contas.
Vamos ao orçamento rectificado apresentado pelo sr. Hintze Ribeiro.
Diz-se no artigo 1.º da proposta de lei do orçamento rectificado:
"Artigo 1.° A avaliação das receitas do estado, na metropole, no exercicio de 1885-1886, é rectificada, em conformidade com o mappa n.º 1 junto a esta lei, e que d'ella faz parte; nos termos seguintes:

1.º Receitas ordinarias, na somma de .... 32.411:271$500

2.º Receitas extraordinarias .... 286:300$000
32.411:271$500

3.° Sommas que o governo fica auctorisado a levantar de emprestimo, para occorrer ao pagamento de todas as despezas:

"Ordinarias .... 1.679:509$699
"Extraordinarias .... 7.284:836$903

Aqui são destrinçadas com grande clareza, e na minha opinião, com grande vantagem, as origens das receitas.
A commissão modificou n'este sentido:
"Artigo 1.° A avaliação das receitas do estado, no exercicio de 1885-1886, é rectificada, em conformidade com o mappa junto n.º1, e que desta lei faz parte, ficando computadas as receitas ordinarias na somma de 32.424:846$500 réis e as extraordinarias na de 9.693:040$647 réis, perfazendo aquellas e estas a importancia total de 42.117:892$147 réis.
Ora eu preferia que a commissão deixasse exactamente a disposição do governo, e não viesse corrigil-a, por modo que não me parece o melhor.
Prosigamos. O orçamento do ministerio da fazenda tem, por exemplo, um augmento proposto pela commissão de 177:294$900 réis, mas n'esse augmento entra nada menos do que uma só verba com 133:000$000 réis, que no fundo é um esquecimento na organisação do orçamento, porque basta ver a natureza das verbas. Diz-se ali:
"Incluir para pagamento dos encargos com a reforma das letras da divida fluctuante interna, existentes em 31 de dezembro de 1885, na somma de 4.616:000$000 réis, a importancia de 138:000$000 réis, juros d'aquella quantia, a 6 por cento ao anno, em seis mezes.
Nós temos mais de uma vez rendido homenagem a melhoramentos introduzidos nas contas publicadas com respeito a administração da fazenda publica, mas agora não podemos tecer os mesmos elogios a repartição que redige o orçamento, porque se deram esquecimentos desta ordem. Disse-nos o sr. presidente do conselho que queria empregar na administração publica a maia severa economia e estava disposto a não augmentar as despezas publicas, sem fazer nas despezas inúteis todas as correcções absolutamente indispensaveis, sem o que não se encontrava com força para recorrer ao imposto, caso fosse necessario.
Entre as verbas que se augmentam podia citar algumas, mas ha uma que me parece devia lembrar ao sr. ministro da fazenda o ser eliminada, por estar disposto a fazer economias. Refiro-me a verba de 5:000$000 réis para despezas eventuaes.
Como o governo está resolvido a effectuar a mais severa economia nas despezas publicas, não é de suppor que se veja forçado a fazer despezas eventuaes, que só em um ministerio vem aqui acrescentadas em 5:000$000 réis.
Pelo orçamento rectificado apresentado a esta camara pelo governo transacto, via-se que em todos os ministérios augMentara a despeza, e só no ministerio da justiça se effectuara urna diminuição de 109$999 réis; mas d'entro eM pouco esta diminuição de despeza se traduz em um augmento de 16:510$335 réis, e uma das causas que deu origem a esse augmento, foi a seguinte.
Noto um d'esses augmentos apenas no artigo 4.°, que diz:

"Augmento:
"Os vencimentos relativos aos mezes de janeiro a junho de 1886, dos membros do cabido da extincta sé de Leiria, definitivamente collocados na sé patriarchal por decreto de 30 de outubro de 1885, réis.... 2:600$000
"Diminuição:
"Os subsidios dos membros do cabido da extincta sé de Leiria, com referencia aos mezes de janeiro a junho de 1886, réis .... 423$601

Quer dizer, extinguiu-se a sé de Leiria, e todos diriam que por tal motivo haveria grande economia. Pois a verdade é que poupamos 423$601 réis e gastamos mais reis 2:600$000. Veja v. exa.! Se se extinguem todas as sés, quanto teremos de gastar!
Escapou ao sr. ministro da justiça, Manuel d'Assumpção, que viera aqui muito ancho dizer-nos que se tinha feito uma economia. Tinha-se esquecido d'esta economia com a extincção da sé de Leiria! Mais 2:600$000 réis só com os membros do cabido!
Outra verba tambem acrescentada é a verba para sustento dos presos e policia das cadeias. Ainda ha poucos dias, ao discutir-se a proposta de lei para a reforma do Limoeiro, com o fim de transferir alguns presos para a penitenciaria, eu chamei a attenção da camara para o augmento progressivo em que iam as despezas com os presos, porque daqui a pouco, despendendo-se tanto com os presos, era melhor estar preso do que solto; pois havendo tanta gente em miseria cá fora, e estando a gastar-se tanto com os presos, não faltaria quem quizesse trocar a sua liberdade pela prisão. N'essa occasião citava eu o que vinha no orçamento do anuo que vem, e citei tambem o que viera no orçamento d'este anno. Pois aqui está já a comprovação do que eu disse, porque a verba já vem augmentada com mais 2:500$000 réis.
Eu disse então que o augmento da despeza na cadeia do Limoeiro, se por acaso se podia representar por um, quando faziamos esse augmento na penitenciaria, triplicava, quadriplicava ou mais!
E eu sinto não ver presente o sr. ministro da justiça porque seria occasião de lhe perguntar se s. exa. está disposto a acompanhar esse projecto até a outra camara, ou se está antes disposto a adoptar a idéa, que aqui apresen-

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tou, de alargar a concessão das fianças, idéa com que eu sympathiso e que acho muito mais vantajosa do que a outra.
Segue-se agora o ministerio da guerra. Nas despezas do ministerio da guerra fez-se um augmento, que não é muito grande. Eu não sou dos que têem manifestado mais sustos pelos augmentos de despeza, porque eu confio principalmente na honestidade e na rectidão da administração. Não tenho mesmo duvida muitas vezes de propor algum augmento de despeza, principalmente quando esse augmento de despeza é a justa retribuição do trabalho, porque eu sei bem que nada se consegue gratuitamente, tudo se paga; e quando se pedem melhoramentos, forçoso é que votemos a despeza indispensável, e depois a receita correspondente. Eu nunca recuarei em votar despeza para algum melhoramento: o que desejo sempre é que esse melhoramento seja feito com perfeição, com rapidez e com a maior economia.
Este é que é o problema que se propõe á administração publica.
Felizmente eu vejo nos bancos do poder, dois cavalheiros que ha três annos fizeram uma proposta que foi recebida com todo o applauso desta camara, proposta apresentada na sessão de 28 de abril de 1883, pelos srs. Navarro e Mariano de Carvalho, que vou ler:
"Proponho que aos operarios da officina de carpinteiros do arsenal do exercito, seja abonada a feria de 600 réis, como aos das outras officinas. - Mariano de Carvalho = Emygdio Navarro.
Esta proposta foi bem recebida; creio que s. exas. ficaram inteiramente satisfeitos com a acquiescencia da commissão do orçamento e do sr. ministro da fazenda.
Em virtude disto, estou convencido de que a commissão de fazenda ficou no presuposto de que esta resolução ficaria muito recommendada ao governo, e até se me afigura, que o proprio governo tanto d'isso se compenetrou, que expediu para a estações competentes ordem de pagamento a estes operarios, segundo as indicações feitas na proposta apresentada por aquelles dois cavalheiros.
A verdade é que isto foi passado ha perto de tres annos, e ainda até hoje não está em execução. S. exas. estão agora nas cadeiras do poder; é muito natural que as suas idéas sejam mais facilmente acolhidas e as suas ordens executadas.
Portanto, eu, não faço proposta; não sei qual o modo por que s. exa. vão considerar esta resolução; eu, declaro que pugno por ella, e que desejo que s. exas. e a commissão de fazenda a acceitem. E não formulo proposta, porque não quero que s. exas. vejam n'ella algum defeito que os inhiba de adoptar uma providencia; arreceio me de a redigir mal e causar embaraços ao seu bom andamento.
Mas o que peço é que no caso de s. exas. acceitarem a proposta, isto fique consignado de modo que, uma vez votado no parlamento, seja executado pelo governo; porque não é licito, n'esta como em todas as questões, que o que é votado pelo parlamento deixe de ser executado.
Não quero embaraçar as idéas do governo; o que quero é que se traduza de um modo efficaz esta doutrina. Não tenho duvida em dar o meu voto a esta proposta, embora d'ella provenha augmento de despeza, porque na minha opinião é um augmento de despeza extraordinariamente reproductivo; é augmento de despeza que vae tornar mais efficaz o trabalho d'aquelles servidores do estado que hoje vivem quasi na miseria.
O sr. Carrilho: - No orçamento de 1883-1884 não foi inserida esta disposição, porque foi apresentada uma proposta por occasião da discussão do orçamento rectificado de 1882-1883, e na lei de 8 de junho diz-se o seguinte:
(Leu.)
É certo que já não é preciso disposição legislativa nova para que o pensamento da proposta apresentada pelos srs. Emygdio Navarro e Mariano de Carvalho seja comprehendido aqui, porque está aqui na lei de 8 de junho de 1883 que é de execução permanente.
O Orador: - Esta declaração do sr. relator mais me obriga a solicitar do governo a maior attenção, e sinto não ver presente o sr. ministro da guerra, porque era a attenção de s. exa. que principalmente eu queria solicitar.
Esta proposta foi apresentada quando se discutiu o orçamento ordinario, mas depois, na occasião em que se discutia o orçamento rectificado, foi aproveitada para immediatamente se inserir ahi. Quando percorri a carta de lei relativa ao orçamento ordinario, não a encontrei; mas, como o sr. relator me disse, encontra-se no orçamento rectificado. O que é certo, porém, é que não se tem executado; está na lei, mas não se executa. Como, porém, mais de uma vez por se terem esquecido são ri validadas disposições legislativas existentes, veja a commissão se entende que deve revalidar esta.
O que eu desejo, pois, é que estas disposições se cumpram, e estimo que o governo não ponha impedimento a que ella se execute.
(Interrupção do sr. ministro da fazenda.)
Em outros ministérios não deixa de haver augmento de despezas. Augmenta-se tambem no ministerio dos estrangeiros.
Sinto que não esteja presente o actual ministro dos negocios estrangeiros, porque s. exa. nos mostrou o anno passado a sua excellente disposição para tratar de assumptos de politica internacional; e apesar de s. exa. se interessar muito pelos negocios externos, não tem deixado de fazer vibrar no parlamento a corda economica.
No ministerio dos negocios estrangeiros houve um augmento de despeza de 42:000$000 réis. É realmente um augmento de despeza extraordinario, e custa a comprehender como o sr. ministro, com a resolução e a firmeza com que costuma encarar todas as questões do ministerio dos estrangeiros, não tivesse coragem para cortar estas despezas.
Só para despezas eventuaes no ministerio dos estrangeiros, foram 22:000$000 réis.
O sr. Hintze Ribeiro propunha 40:000$000 réis. Como se fosse pouco, vem ainda o sr. ministro dos estrangeiros e augmenta mais a despeza com o corpo consular diplomatico de Londres, Paris e Cadix. Para um ministerio que está animado do maior desejo de fazer economias, parece-me que...
Uma voz: - Isso já lá vae.
O Orador: - Já não se póde evitar. O que eu quero é justamente deixar consignado que esta despeza já se fez. Ficamos desde já sabendo como os negocios diplomaticos foram dirigidos, e quanto custaram. O resto fica para outra occasião.
Nos ministerios das obras publicas e da marinha tambem ha augmento.
Com respeito ao ministerio do reino não se apresenta nenhum augmento. Mas a rasão disso é porque se dá uma particularidade nesse ministério. Ali dispôe-se de uma cousa de que não se dispõe nos outros. É de umas sobras extraordinarias, e essas sobras chegam para muito. Ha algum tempo serviram para pagar espectaculos em S. Carlos. (Riso.) Este anno servirão para outra cousa. Para onde irão?
Por exemplo, havia a verba de subsidios dos districtos para sustento de presos. Este dizer (indicando o projecto) figura ha muito tempo no orçamento. Diz-se que estão ahi esses 64:000$000 réis, mas em chegando o orçamento rectificado faz-se uma economia.
V. exa. sabe que, segundo a reforma do municipio de Lisboa, pelo ministerio do reino se hão de fazer despezas que até agora se não faziam. Creio que o sr. ministro do reino do gabinete transacto o devia saber, assim como o actual sr. ministro; mas aquelle era tão esquecido que não admirava que se esquecesse tambem disso. (Riso.) Devo

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augmentar a despeza com as escolas normaes que passa a ser feita pelo governo, e com o delegado de saúde. Mas nada disto figura aqui.
O actual sr. ministro do reino póde achar-se embaraçado na gerencia dos negocios que dizem respeito á sua pasta se isto não ficar bem claro, para que tenha verba para as despezas que é obrigado a fazer, e ao mesmo tempo não seja tentado a applicar algumas sobras que podem ter porventura alguma applicacão que não seja a mais conveniente.
Nas despezas extraordinarias ha algumas que avultam mais. Essas despezas eram calculadas em 7.071:136$903 réis, e a commissão entendeu acrescentar estas despezas extraordinarias elevando-as a 7.815:336$903 réis, por forma que cresceram mais de 244:000$000 réis.
Para este ponto é que eu chamo especialmente a attenção dos srs. ministros. Eu sei que os actuaes ministros não têem a responsabilidade das despezas feitas pelos ministros anteriores, nem eu lhes peço esta responsabilidade; mas com respeito ao que se calcula que se póde gastar desde o dia em que entraram para o governo até ao fim do anno, ahi muda o caso de figura, e para ahi é que eu chamo toda a attenção dos srs. ministros.
Como já disse ha pouco, o orçamento nas despezas ordinárias não foi bem feito, porque houve esquecimentos notaveis; nas despezas extraordinárias diz-se aqui:
"Pelo ministerio da fazenda a despeza ordinária até 31 de janeiro de 1886 subia a 23:413$679 réis. Pois o orçamento rectificado apresentado pelo governo transacto estava calculado até 31 de janeiro de 1886 em 21:000$000 réis.
Quer dizer: já no fim de janeiro era maior do que se calculava.
Não sei como fôra o calculo feito, mas estava feito de tal modo que o orçamento rectificado apresentado em 7 de janeiro já não calculava bem as despezas para dahi a vinte e dois ou vinte e tres dias.
Vem depois indicada a despeza no ministerio do reino, seguindo-se a do ministerio da guerra até fevereiro, a do ministerio da justiça até fevereiro, a do ministerio da marinha até fevereiro, mas com respeito ao ministerio do reino diz-se: até ao próximo mez de março, sem dizer só inclusiva ou exclusivamente.
O sr. Carrilho: - Os orçamentos estão calculados até ao fim de fevereiro.
O Orador: - Então eu pedia que se dissesse "até ao fim de fevereiro" para ficar bem entendido.
O sr. Carrilho: - O que se vota não é o relatório, são as conclusões do parecer.
(Pausa.)
O Orador: - É certo como observa o sr. relator que se não vota o relatorio, mas se o relatorio em vez de nos esclarecer serve para nos confundir, então peço á commissão que não o apresente. Pela minha parte, prescindo do relatorio se elle só serve para me confundir.
E se é só até ao fim de fevereiro que ficam auctorisadas as despezas de saúde, ainda faço uma observação. Este mez de fevereiro é o mais pequeno de todos, mas é o que custa mais, porque a despeza augmentou 45:000$000 réis. Quer dizer, eu vejo que no ministerio da fazenda para calcular o que custaria o mez de fevereiro, foi-se buscar a despeza média dos sete mezes; mas porque é que no ministerio do reino se não tomou esta média?
O que vejo é que, quanto mais pequenos são os mezes, maior é a despeza.
Pergunto, o governo está disposto a acabar com todas as despezas de saúde publica amanhã? No dia 1.° de março já não ha despezas a fazer com a saúde publica? Estas despezas são só até ao fim de fevereiro? Pergunto, os srs. ministros daqui em diante não gastam mais com a saúde publica?
Era bom que se explicasse isto; era bom que nos dissessem o que querem, porque ficávamos sabendo como as cousas hão de correr.
Eu comprehendo que o governo se ha de ver embaraçado em dar explicações, mas a ausencia d'ellas tambem me serve.
Quanto ao ministerio das obras publicas tambem eu noto que se peçam 22:000$000 réis e faço a respeito d'este ministerio as mesmas observações que fiz com respeito aos outros.
Mas quanto ao ministerio das obras publicas eu abstenho-me de fazer largas observações, porque o sr. ministro pouco conhecimento tem dos negocios que são passados.
Ouvi fallar aqui no desdobramento do ministerio das obras publicas, e que o illustre ministro das obras publicas declarou-se auctor ou patrono de tal idéa; chegou mesmo s. exa. a dizer, que logo que podesse realisar algumas economias que contrabalançassem aquella despeza não teria duvida em a fazer.
Tambem ouvi alguns dos meus collegas pronunciarem-se, ao que me pareceu, contra tal melhoramento; pois eu não sou contrario á creação do ministerio da industria, do commercio e da agricultura, como tambem sou propugnador de um ministerio de instrucção publica. E a sua creação não deixará de ter os meus applausos, como os tem tudo que contribuir para desenvolver intellectualmente o nosso paiz. porque só com esse desenvolvimento intellectual contribuiremos da maneira mais poderosa para a sua prosperidade e adiantamento.
O novo ministerio de agricultura, commercio e industria será verdadeiramente o ministerio do trabalho nacional, tratando de o collocar nas condições mais fecundas e productivas, que é exactamente o que de mais carecemos.
O que importa é que á frente d'estes dois ramos da administração publica estejam homens que comprehendam não só o seu mister, como homens do governo, mas que sejam deste tempo, os propugnadores da diffusão da sciencia, que só por meio d'ella se podem adiantar as nações. (Apoiados.)
Emquanto não nos compenetrarmos da necessidade absoluta de que os homens que entendem nos negócios públicos se despreoccupem da pequena política que os amesquinha e os humilha, não poderemos sair da situação em que nos achamos.
Não me assusta, portanto, a creação do ministerio de agricultura, nem regatearia a despeza que com elle se fizesse, principalmente se essa creação trouxesse uma transformação económica do paiz, como trouxe em 1852 a creação do ministerio das obras publicas.
Se não tivessemos feito sair a intendencia e o serviço das obras publicas do ministerio do reino, certamente não teriamos dado ao paiz o desenvolvimento, nem conseguido o progresso que elle tem tido desde 1852, e aquelles serviços continuariam a ter ali uma vida rachitica.
Quando examinámos o orçamento do ministerio do reino no tempo em que ainda estava dependente desse ministerio o serviço das obras publicas, vemos o que ellas eram n'essa epocha. Recordo-me agora, porém, de um orçamento, que cito com satisfação, porque uma feliz coincidência assim mo permitte, orçamento que era feito pelo pae de v. exa., sr. presidente, o sr. Manuel Antonio de Carvalho, orçamento apresentado em 1835 ao parlamento, e no qual estavam indicados mais desenvolvidamente alguns serviços d'aquelle ministerio, que passaram posteriormente a constituir o ministerio das obras publicas, do que por muito tempo n'este se encontraram.
Apresentou-se então aos representantes da nação de um modo bem claro e lucido, como as despezas deviam ser feitas. Honra seja, pois, ao ministro d'aquelle tempo.
Eu não me opponho á idéa da creação do ministerio de agricultura, commercio e industria, applaudil-a-hei mesmo e todos hão de abençoal-a, se ella produzir os resultados de que é susceptivel.

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Desejo fazer ainda uma outra observação ao sr. ministro das obras publicas. S. exa. disse n'esta camara que tinha mandado suspender o que quer que fosse, porque não entendi bem, e, se me não engano, asseverou aqui que appareceria hoje uma providencia a esse respeito.
Como eu não entendi bem as palavras de s. exa., fiquei em duvida; mas, em todo o caso, percorri hoje o Diario, para ver se encontrava alguma providencia.
Não a encontrei, porém, e não sei, portanto, a natureza della.
O que eu quero lembrar simplesmente a s. exa. é que me parece conveniente que nas providencias que tomar se esquive quanto possivel a incorrer na pecha que os seus correligionarios politicos ainda ha poucos dias notavam no sr. ministro da fazenda demissionario, com relação às providencias tomadas relativamente aos decretos com força de lei, promulgados em virtude de uma auctorisação parlamentar.
Com a engenheria civil póde succeder o mesmo que se deu com esses decretos.
Como os ministros da coroa, segundo a carta constitucional, não podem, nem interpretar, nem alterar, nem suspender as leis, eu lembro ao sr. ministro das obras publicas a conveniência de empregar todas as diligencias para se, esquivar a que possam increpal-o de proceder fora da legalidade.
Nenhum ministro se encontra tão mal como quando procede illegalmente.
Creia s. exa. que, procedendo sempre legalmente, pelo menos liberta-se dos reparos, das observações e das censuras que lhe façam, não eu, porque não costumo ser acerbo nas minhas considerações,mas os que militam no campo
da opposição.
Embora não evite a dissidência, a divergencia de opiniões.
Não é preciso, para se combater um governo, que elle sáia da legalidade.
Mantenha-se o governo dentro da constituição e das leis, que eu tenho muitos meios de o combater, se as suas idéas não se ajustarem com as minhas.
Eu não preciso que o governo sáia fóra da lei para o combater.
Não desejo que ao sr. ministro das obras publicas succeda o mesmo que succedeu ao sr. ministro da fazenda demissionario, e por isso lhe peço que tome cautela.
Como não conheço a providencia que s. exa. tomou, nada digo a respeito d'ella: faço estas observações e nada mais.
Agora vou fazer alguns reparos, e serão os ultimos, sobre as alterações apresentadas á ultima hora pela commissão do orçamento, depois de ter ouvido o sr. ministro da fazenda.
Naturalmente escapam-me algumas cousas, mas eu não desejo cansar a attenção da camara, e por isso serei o mais breve possível.
O artigo 1.° do projecto de lei da commissão não está redigido em termos tão claros, como estava o da proposta de lei do governo.
Eu preferiria nesta parte ao projecto de lei da commissão a proposta de lei do governo.
É este o primeiro reparo que faço.
O segundo reparo é o seguinte:
O artigo 2.° da proposta de lei do governo tinha um só paragrapho, o § unico. A commissão acrescentou um paragrapho, transformando o § único em § 1.°, ficando, portanto, a haver § 1.° e § 2.° E agora, depois das indicações do actual sr. ministro da fazenda, acrescentou-se ainda um § 3.°
Permitta-se-me que eu faça algumas observações a este respeito.
O § 2.°, acrescentado pela commissão, diz o seguinte:
"O governo poderá transferir reciprocamente dos capítulos 6,° e 9.° do orçamento do ministerio da fazenda as sommas que forem necessarias para completa satisfação dos encargos aduaneiros, no exercício corrente, devendo essa transferencia ser feita com as mesmas solemnidades determinadas pelo regulamento geral de contabilidade em vigor, para as transferencias de verbas de artigo para artigo dentro de cada capitulo das tabellas.
Sei perfeitamente que o que uma lei decreta se póde fazer, mas sei tambem que se em certas leis se estabelecem os moldes ou os preceitos pelos quaes deve regular-se a administração, não se deve estar a todo o momento a alterar esses preceitos, ou a pôr de parte esses moldes."
Segundo a lei de contabilidade, as transferências não se podem fazer senão de artigo para artigo, e aqui são auctorisadas de capitulo para capitulo. Estou prevendo que para o diante havemos de com facilidade ser induzidos em erro por causa d'estas transferencias.
Falla se nas solemnidades determinadas no regulamento de contabilidade que devem ser executadas, exactamente na occasião em que outras prescripções mais importantes são esquecidas ou postas de parte.
E que capítulos são estes? O 6.° e o 9.° O 6.° trata das alfandegas, e o outro de empregados addidos e aposentados. É superior a 1.460:00$000 réis a verba destes dois capitulos. Era permittido dentro d'esses capitulos fazer nas
transferencias de artigo para artigo, e sabemos que assim a fiscalisação parlamentar e a do tribunal de contas é mais efficaz do que permittindo as transferencias de capitulo para capitulo, porque o arbítrio do ministro é mais cerceado, exerce se numa área mais pequena quando só póde transferir de artigo para artigo, sem sair do capitulo.
Já em tempo notei aqui no orçamento do ministerio do reino um defeito - o das verbas ali despendidas escaparem á fiscalisação, porque o que constituia materia para diversos artigos reunia-se em um só artigo para ser mais fácil a transferencia.
Isto não é bom para a administração dos dinheiros publicos, e por isso não entendo que esta auctorisação deva alargar-se.
O sr. ministro da fazenda, ao que me parece, melhor faria contentando-se com o que está no regulamento de contabilidade, assim como o sr. Hintze se contentava no seu projecto; a commissão dava mais áquelle ex-ministro, e agora veiu
ao sr. ministro da fazenda e alem d'este § 2.° deseja mais o § 3.°, que diz o seguinte:
"Se para occorrer ás despezas dos serviços aduaneiros de qualquer ordem, no actual exercicio, apesar das transferencias auctorisadas no paragrapho antecedente não bastarem as sommas descriptas nos mencionados capitulos 6.º e 9.° da respectiva tabella, poderá o governo, nos termos do citado regulamento geral de contabilidade publica, abrir os creditos supplementares necessarios para integral pagamento das mesmas despezas.
Isto é o mesmo que dizer, que ainda se deseja acrescentar a verba, porque se suppõe que a transferencia reciproca dos capitulos 6.° e 9.° não é sufficiente para pagar todas as despezas e auctorisa-se o governo a abrir creditos supplementares.
O regulamento de contabilidade não se ajusta com esta doutrina; os cavalheiros que se sentam nos bancos do governo têem bastantes vezes dito que o regulamento de contabilidade foi uma melhoria, mas n'este caso não seguiram as suas prescripções.
O regulamento de contabilidade não permitte creditos supplementares senão segundo o artigo 48.°, que diz assim:
"A lei aunual da despeza fixará restrictamente os artigos a que poderão ser applicados os creditos supplementares.
Este artigo do regulamento é exactamente o mesmo que se lê no § 2.° do artigo 24.° da lei de contabilidade de 20 de junho de 1881.
Porque este artigo 24.° diz assim:

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"É tambem permittido ao governo abrir creditos supplementares, quando se dê insufficiencia provada das sommas determinadas na lei com applicação a despezas variaveis.
Segue-se o § 1.° e o § 2.°, que diz o mesmo, como referi, que se lê no artigo 48.° do regulamento.
Por conseguinte as disposições da lei de contabilidade não são observadas nem sequer pelos cavalheiros que mais se gloriam de a ter feito. Os creditos supplementares podem abrir-se, mas é preciso que na lei annual das despezas se fixem os artigos a que poderão ser applicados; aqui por consequencia não é cumprida aquella prescripção.
O artigo 4.°(novo) diz:
"São renovadas, no exercicio corrente, a auctorisação e demais disposições relativas às províncias ultramarinas, de que trata a lei de 22 de junho de 1880, ficando, porém, limitado a 200:000-5000 róis o credito concedido, e devendo o movimento das respectivas operações ser descripto na conta geral do estado, sob titulo especial que demonstre em qualquer epocha a situação do mencionado credito.
Portanto ainda o orçamento rectificado vae necessariamente crescer.
Segue o antigo artigo 4.° que passa para 5.°
E acrescenta-se: "No mappa das receitas onde se lê: Sommas que o governo fica auctorisado a levantar por emprestimo, para fazer face às despezas d'este exercício, acrescente-se "podendo crear e dotar os títulos da divida publica necessarios para as respectivas cauções".
Ora eu lembrava ao sr. ministro da fazenda que não me parece bom dissimular uma auctorisação para crear e dotar titulos na explicação ao dizer de um mappa, era melhor introduzir essa disposição em um artigo da lei.
Parecia-me muito mais conveniente consignar claramente nos artigos da lei, o que aqui se diz, e não no mappa.
Naturalmente o illustre ministro teve esta mesma idéa; mas talvez se afigurasse a s. exa. que a commissão não acceitaria as suas modificações. Por isso eu pedia á commissão que concordasse com o sr. ministro para que esta disposição ficasse consignada na lei bem claramente.
Referir-me-hei agora ao artigo 3.° que puzera de parte.
O artigo 3.° diz: "É aberto um credito supplementar a favor do ministerio da marinha, e em relação ao exercício de 1884-1885, da quantia de 181:526$260 réis, sendo:

Para o artigo 6.° .... 3:160$224
Para o artigo 8.° .... 126:129$842
Para o artigo 9.° .... 7:383$584
Para o artigo 10.° .... 5:579$582
Para o artigo 18.° .... 24:460$613
Para o artigo 21.° .... 14:812$410

devendo as despezas pagas, em virtude desta auctorisação, ser escripturadas na actual gerencia em couta do referido exercido.
No anno passado fiquei surprehendiclo com esta indicação de credito supplementar porque não a entendia, mas neste anno ainda a entendo menos.
Já disse que me parecia melhor, termos começado por discutir a proposta de lei para o encerramento definitivo de certo numero de exercicios.
Nessa proposta de lei ver-se-hia que, alem das despezas auctorisadas tinham sido feitas outras.
O que quer dizer que os orçamentos tinham receita e despeza e que a despeza tinha excedido a auctorisação.
O que faz nessa proposta de lei o governo?
Todos os creditos para pagar despezas que excedem a auctorisação, chama-lhes creditos complementares, porque effectivamente creditos supplementares não são, não se parecem absolutamente nada com os que no regulamento de contabilidade se denominam supplementares.
Pois é exactamente o que se dá aqui, o exercício de 1884-1885 já findou, esta despeza que excedeu a quantia auctorisada, e, por consequencia, este credito não é supplernentar, dêem-lhe outro nome, acceitem aquelle que lhe deu o ministerio anterior, chamem-lhe como quizerem, o que consigno porém é que a denominação que se dá aqui a este credito é inexacta, porque não concorda com as disposições do regulamento de contabilidade.
Isto é o que entendo, e estou certissimo de que o sr. ministro da fazenda não deixará de acompanhar-me n'esta opinião.
S. exa. quiz ser extremamente benévolo com a commissão, e a commissão tambem estava muito benevola com s. exa.: benevolencia com benevolencia se paga; e o que succedeu foi, que quem pagou deveras nem foi nem o governo, nem a commissão: quem paga deveras é a inexactidão que aqui se encontra escripta.
São estas as observações que entendi dever fazer sobre o orçamento rectificado, observações que fiz não com o intuito de demorar o debate, porque não podia ser essa a minha intenção, (Apoiados.) mas com o proposito de contribuir com o pouco que posso e dentro dos limites das minhas forças para que os orçamentos se aperfeiçoem; todos os melhoramentos que se apresentam no orçamento logo os aponto e applaudo quem os introduz, por isso que, quanto mais aperfeiçoamentos elle trouxer e esclarecimentos apresentar, mais rasão haverá para não os pedir, e dispensar-nos observações.
Não faço propostas, limito-me unicamente a fazer estas indicações; espero que o illustre ministro acceite algumas d'ellas no caso de as julgar dignas de attenção, e de accordo com a opinião da commissão, porque não desejo lançar nota discordante entre a commissão e o governo; o que desejo é que uma e outro adoptem nas disposições da lei e na organisação do orçamento uma redacção mais conforme com os preceitos do regulamento de contabilidade, por isso que dessa forma com mais clareza podemos entrar nas questões que temos a tratar.
Tenho dito.
O sr. Arouca: - Mando para a mesa a seguinte proposta.
(Leu.)
Não justifico esta proposta, porque na sessão de hontem disse o que me parecia conveniente e que entendia que era necessario, para demonstrar a necessidade que havia de chegar-se a este accordo.
Leu-se na mesa a proposta.
É a seguinte:

Additamento

Artigo... Fica o governo auctorisado a transigir com a companhia dos canaes de Azambuja, a fim de terminarem os pleitos pendentes e sem augmento de despeza para o thesouro, nos termos seguintes:
1.° Rehaver as propriedades que a companhia possue;
2.° Ceder á camara municipal do concelho da Azambuja as propriedade denominada Esteiro e respectiva caldeira, e bem assim a casa do guarda que está no largo do Esteiro, ficando a referida camara obrigada á conservação e reparação das mesmas propriedades.
§ único. Esta auctorisação é permanente até se realisar o respectivo accordo, devendo o governo dar conta ás cortes do uso que d'ella fizer.
Sala das sessões, em 27 de fevereiro de 1886. = O deputado, Correia Arouca.

O sr. Presidente: - Não posso consultar a camara sobre a proposta do sr. deputado, por não haver numero na sala.

O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Darei brevissimas explicações ao illustre deputado que me precedeu no debate, e ao sr. Arouca, que mandou agora para a mesa uma proposta; direi que o governo a acceita conforme as declarações que hontem fiz em resposta a s. exa., acabando-se assim uma questão prejudicial para os

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interesses publicos, e em termos pouco agradaveis para o estado.
Emquanto às observações que fez o sr. Elias Garcia, s. exa. sabe que grande parte das doutrinas que sustentou hoje, tambem eu já sustentei, e portanto póde o illustre deputado estar certo de que hei de empenhar todos os esforços para aperfeiçoar a redacção dos orçamentos e leis de receita e despeza pelos meios ao meu alcance.
N'este ponto é forçoso confessar que tem havido um aperfeiçoamento consideravel, mas ainda assim envidaria todos os esforços para que o orçamento corresponda á inteira verdade dos factos.
Quer o illustre deputado que em alguns ministerios se façam reducções nas verbas propostas, mas, por uma consideração que fez o sr. ministro das obras publicas, póde s. exa. ver a impossibilidade de as conseguir; porque as despezas ou estão feitas, ou, se me é permittido a phrase, estão engajadas de tal modo, que o governo já não póde, em relação a este anno economico, reduzir a despeza, mas póde prometter ao illustre deputado que, dentro das verbas votadas, ha de gastar o menos possivel. Para confirmação do que acabo de dizer, lembro a s. exa. que o meu collega da marinha já declarou que em relação ao ultramar se poderá gastar neste anno uma verba bastante avultada, inferior aos calculos orçamentaes.
Outras considerações fez o illustre deputado, a que desejo responder, e são as que se referem ao § 3.° do artigo 2.° e artigo 4.° novo e ao mappa da receita.
Não se podem abrir creditos supplementares, sem que nas leis de receita e despeza se marquem os artigos em relação aos quaes esses mesmos creditos se devem abrir; mas é necessario notar que estamos em um anno excepcional, o que não prende só com a mudança ministerial, mas sim com a reforma das alfandegas.
Fez-se a reforma das alfandegas, mudou-se quasi radicalmente de regimen, e quando se calculava a priori que a despeza devia ser uma, ella augmentou muito, e portanto é impossivel marcar exactamente os artigos para os quaes serão precisos creditos supplementares.
E digo ao illustre deputado que ainda não chegámos ao fim, porque ha muitas disposições da reforma das alfandegas que o governo póde alterar sem sancção legislativa, S. exa. sabe que só para certos pontos a sancção legislativa é precisa. (Apoiados.) Eu terei seguramente, por acto do poder executivo, de modificar algumas disposições da reforma das alfândegas, e isso comprehende s. exa. que vae influir em diversos artigos do orçamento, sem que a priori se possa dizer em qual. Dali é que vem a necessidade de se votar a disposição com respeito aos creditos suplementares, por não se poder designar quaes são os artigos que carecerão delle. Illegalidade não ha, porque é uma lei excepcional inspirada em circumstancias verdadeiramente excepcionaes, que auctorisam a abrir creditos suplementares para a designação dos artigos. Quer dizer que nesta parte revogam-se temporariamente as disposições da lei de contabilidade publica.
A mesma cousa com relação às transferencias de capitulo para capitulo. O mais regular é effectivamente não auctorisar nunca essas transferencias, porque é mais fácil a fiscalisação legislativa e mesmo a fiscalisação administrativa. Mas s. exa. sabe que da reforma das alfandegas resultou consideravel alteração no numero de addidos e de aposentados, e variações na verba de serviço activo; e pareceu de melhor tactica financeira, em logar de augmentar consideravelmente os creditos suplementares, aproveitar as sobras do capitulo 9.° para occorrer às despezas do capitulo 6.° ou reciprocamente. É claro que esta auctorisação cessa desde que entremos em um regimen, que se possa reputar normal.
Finalmente, quanto á creação dos titulos, direi que estes titulos não são destinados para contrahir emprestimos, e não póde o governo realisal-os. A questão e que o governo era já auctorisado na proposta anterior a contrahir supprimentos, e eu propuz mais esta modificação para os baratear. O governo é auctorisado a occorrer às deficiencias da receita pelo recurso á divida fluctuante. O illustre deputado sabe que em todos os emprestimos se paga o juro do capital, a amortisação e o prémio que se póde chamar de risco; este prémio é tanto maior, quanto menores são as garantias que se dão. Dahi resulta que, não havendo titulos disponíveis para dar como garantia dos supprimentos, o encargo é geralmente maior, porque e o prémio do risco mais pesado. Criam-se pois estes titulos; inscreve-se na despeza a sua dotação, por que de outra maneira não teriam valor nenhum no mercado, mas por outro lado, na receita figuram os juros desses titulos como na posse da fazenda. Não ha nenhum augmento de despeza, e o estado fica com os titulos precisos para dar como garantia dos supprimentos, e habilitado a reduzir o juro da dirida fluctuante, o que é a melhor de todas as economias. (Apoiados.)
Parece me ter explicado os motivos das alterações que propuz, embora não tão conformes com os princípios que o illustro deputado deseja ver seguidos. Mas estamos em uma situação transitória, política e financeiramente fallando, e é isso que motiva a adopção de providencias, tambem transitorias.
Tenho concluido.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que estava dada, e mais os projectos n.ºs 13 e 14.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Proposta de lei apresentada nesta sessão pelo sr. ministro da fazenda

N.º 16-A

Senhores. - A administração da fazenda do concelho de Lisboa desde annos lucta com difficuldades gravissimas, em que procurou pôr termo a ultima reforma do município, modificando-lhe profundamente o modo de ser e creando-lhe receitas para fazer face aos seus multiplicados encargos.
D'essas mesmas difficuldades resultou que o governo julgasse conveniente antecipar á camara no primeiro semestre do anno economico corrente o subsidio que o estado lhe deve por todo este.
A camara actual de Lisboa, tendo se visto obrigada não só a pagar avultadas despezas correntes, mas ainda a ter em attenção bastantes dividas, que de sua antecessora herdou, acha-se ainda privada dos seus principaes meios de receita. Estando por construir a estrada da nova circumvallaçao não augmentam bastante os productos dos impostos de consumo para que attinja proporções valiosas a partilha do município no maior rendimento desses impostos.
Demorando o artigo 115.° da carta de lei de 24 de julho de 1880 o lançamento e cobrança de addicionaes sobre as contribuições directas, tambem á capital falham actualmente os meios que dessa origem podem provir lhe.
Finalmente, o pouco tempo decorrido desde o principio do anno, e a necessidade indeclinável de attender às urgências de serviços importantes e complexos não permittiram ainda que a administração municipal concluisse as negociações financeiras, em que anda empenhada.
Em tal situação a camara municipal para não ver-se compellida a interromper ou demorar os seus pagamentos, solicitou do governo um limitado auxilio financeiro até que possa ultimar uma operação de credito que projecta com fundadas esperanças de bom êxito. Reduz-se este auxilio ao adiantamento de quantia igual á consignação, que du-

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SESSÃO DE 27 DE FEVEREIRO DE 1886 565

rante o primeiro semestre do anno economico proximo futuro ella deve receber do thesouro publico, isto é, de réis 112:000$000.
A camara toma sobre si todos os encargos que ao thesouro resultam da referida antecipação, e reembolsará o estado logo que receba as quantias provenientes de emprestimos projectados, ou no caso deste não se realisar, pelo producto das consignações do thesouro e dos impostos de que tratam os artigos 115.° o 116.° da lei de 24 de julho de 1885.
N'estas circumstancias, considerando quanto aos interesses publicos convém a boa e regular administração do municipio de Lisboa, tendo em vista que o estado nenhum risco ou prejuizo soffre, temos a honra de apresentar á vossa consideração a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É auctorisado o governo a adiantar á camara municipal de Lisboa uma quantia igual á consignação que ella deve receber do thesouro publico durante o primeiro semestre do anno economico de 1886-1887, ficando a camara responsavel pelos encargos das operações que o thesouro tenha de fazer para realisar esse adiantamento, e reembolsando o estado logo que contrate o emprestimo municipal projectado, ou, não levando este a effeito, pelo producto das consignações e impostos de que tratam os artigos 115.° e 116.° da carta de lei de 24 de julho de 1885.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 27 de fevereiro de 1886. = José Luciano de Castro = Marianno Cyrillo de Carvalho.
Foi enviada á commissão de fazenda.

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